O homenzinho e o mundo
Numa casinha muito pequena, sem janelas e sem sacadas, morava um homenzinho. No telhado tinha instalado todo tipo de antena de televisão. Com toda aquela parafernália ele conseguia captar programas de todas as televisões do mundo inteiro. Por causa disso, o homenzinho nunca saía de casa.
–– Por que deveria sair? – ele dizia a si mesmo –
tenho o mundo inteiro em casa: daqui eu posso ver, ouvir, saber tudo o que
acontece.
O nosso amigo tinha adquirido o costume de assistir
à televisão desde criança. Não lembrava o dia, ou o momento, no qual, em sua
casa, a telinha tivesse sido desligada. Do mesmo jeito, não lembrava nada das
cantigas de ninar de papai e mamãe. O homenzinho tinha crescido assim: na
companhia da televisão. Nem por isso estava triste, ao contrário, ficava cheio
de orgulho pensando conhecer tão bem o mundo e tudo o que nele acontecia. Um
belo dia, ouviu bater à porta de sua casa e, quando a abriu, viu à sua frente
alguém que lhe dizia:
–– Dá licença, posso entrar?
––
Mas o senhor quem é? – perguntou o homenzinho aborrecido.
–– Como? O
senhor não me reconhece? Eu sou o mundo.
Isso
mesmo, ali estava o mundo querendo entrar, mas o homenzinho não se deixou
convencer.
––
Não fale bobagem – respondeu e fechou a porta na cara do desconhecido.
Com
efeito, o mundo era tão diferente de como ele o via na televisão que não o
havia reconhecido.
Quantas vezes nós construímos uma ideia sobre uma
pessoa e chegamos a pensar em conhecê-la o suficiente ou até muito bem. Na
realidade, conhecer alguém de maneira não superficial não é nada fácil. Precisa
tempo, convivência, muito diálogo e com certeza, também atenção e carinho. Se a
pergunta de Jesus, que encontramos no evangelho deste domingo: “E vós, quem
dizeis que eu sou?” fosse endereçada a nós, o que iríamos responder? Hoje
poderíamos pesquisar na internet, opção que Pedro não tinha naquele tempo...
Mas quem disse que lá iríamos encontrar a resposta certa? Talvez uma afirmação
correta para um programa televisivo de perguntas e respostas e relativos
prêmios. Sem dúvida não uma explicação capaz de mudar a nossa vida e o nosso
coração. O próprio evangelho sugere os passos que devemos dar para conhecer
Jesus de verdade.
Primeiro, encontramos algumas palavras confusas e
depois, a declaração de Pedro: “Tu és o Messias”. Jesus não diz que esta
resposta está errada, a questão é outra: qual tipo de Messias será Jesus?
Poderoso e esmagador de inimigos? Ele mesmo responde que será, sim, o salvador,
mas através do sofrimento da cruz, nada de força, dominação e sucesso. Pedro,
que talvez achasse ter acertado, insiste. Jesus responde dizendo-lhe que não
pensa como Deus, mas como os homens. Aqui está a primeira derrota de quem
pensava já ter descoberto o grande segredo de Jesus. Ainda estamos muito longe.
Eis os outros passos.
Somente
pode confiar num Messias crucificado quem aceita passar também pela cruz. Sem
pensar em situações extraordinárias (que não buscamos, mas que, todavia, sempre
podem acontecer em nossa vida) carregar a nossa cruz pode significar
simplesmente ser fiéis aos valores do reino de Deus; aqueles que o mundo
proclama esvazia e desvirtua. Por exemplo, a justiça. Todos a querem, mas,
muitas vezes, que esteja ao seu lado e que lhe dê lucro. A paz? Absoluta,
contanto que esteja sob o controle do seu poder ou das suas armas. A
solidariedade? Uma maravilha, na condição que não exija a renúncia aos seus
privilégios e regalias.
Terceiro
passo. Somente pode entender a cruz de Jesus quem tenha experimentado, ao menos
um pouco, a loucura do amor que doa a sua própria vida. Quem segurar a sua
vida, por medo de perdê-la, no fim ficará sem nada. Aqueles, porém, que
souberam fazer da própria vida um dom, a salvarão, porque a entregaram nas mãos
de Deus, amando-o e servindo-o no seu próximo.
Quem diz conhecer Jesus, mas não o segue no caminho
da cruz, quem não quer renunciar aos seus projetos de poder, para amar e
servir, e não sabe ser generoso abrindo o seu coração aos pobres e pequenos, de
fato, ainda está muito longe de compreender quem Ele é de verdade. Para
conhecer Jesus precisa estar onde ele esteve: no meio do povo que luta para
sobreviver, de joelho, lavando os pés dos pobres, no Calvário junto aos
sofredores e excluídos da vida.
Jesus nunca será um quadro de parede, um show de
televisão, uma pesquisa de internet. Se ficarmos somente nisso, quando ele
bater à porta da nossa vida, não saberemos reconhecê-lo. Assim poderá ficar
fora para sempre. Uma pena.
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá (AP)
Bispo de Macapá (AP)
Fonte: Site da CNBB / Ilustração: domhilario.blogspot.com.br
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