sábado, 31 de dezembro de 2022

Solenidade da Santa Mãe de Deus, Maria:

Leituras e Reflexão
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1ª Leitura:  Números 6,22-27

Leitura do Livro dos Números:

O Senhor falou a Moisés, dizendo: “Fala a Aarão e a seus filhos: Ao abençoar os filhos de Israel, dizei-lhes: ‘O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e se compadeça de ti! O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!’ Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel, e eu os abençoarei”.

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Responsório: Sl 66(67),2-3.5.6.8
- Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção.
- Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção.

- Que Deus nos dê a sua graça e sua bênção, / e sua face resplandeça sobre nós! / Que na terra se conheça o seu caminho / e a sua salvação por entre os povos.

- Exulte de alegria a terra inteira, / pois julgais o universo com justiça; / os povos governais com retidão / e guiais, em toda a terra, as nações.

- Que as nações vos glorifiquem, ó Senhor, / que todas as nações vos glorifiquem! / Que o Senhor e nosso Deus nos abençoe, / e o respeitem os confins de toda a terra!

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2ª Leitura: Gálatas 4,4-7

Leitura da Carta de São Paulo aos Gálatas: 

Irmãos, quando se completou o tempo previsto, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sujeito à lei, a fim de resgatar os que eram sujeitos à lei e para que todos recebêssemos a filiação adotiva. E porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: Abá – ó Pai! Assim, já não és escravo, mas filho; e se és filho, és também herdeiro: tudo isso por graça de Deus.

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Evangelho: Lc 2,16-21

Proclamação do Evangelho de São Lucas:

Foram então, às pressas, e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura. Tendo-o visto, contaram o que o anjo lhes anunciara sobre o menino. E todos os que ouviam os pastores, ficaram maravilhados com aquilo que contavam. Maria, porém, conservava todos esses fatos, e meditava sobre eles em seu coração. Os pastores voltaram, glorificando e louvando a Deus por tudo o que haviam visto e ouvido, conforme o anjo lhes tinha anunciado.

Quando se completaram os oito dias para a circuncisão do menino, deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo, antes de ser concebido.

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Reflexão do padre Johan Konings:

Maria, “Porta do Céu

Nas ladainhas chamamos Maria “Porta do Céu”. Porta para nós subirmos, ou para Deus descer? A festa de hoje confirma as duas interpretações.

“Nascido de mulher, nascido sob a Lei”, assim Paulo qualifica Jesus (1ª leitura).

Jesus nasceu como todo ser humano de uma mãe humana, Maria, e dentro de uma sociedade humana, a sociedade de Israel, com sua “lei”, regime ao mesmo tempo religioso e sociopolítico. O evangelho narra que Jesus, no oitavo dia do nascimento, foi acolhido na sociedade judaica pela circuncisão e pela imposição do nome, como teria acontecido a qualquer masculino dentre nós se tivesse nascido naquela sociedade.

Maria é, portanto, mãe do verdadeiro homem e judeu Jesus de Nazaré, mas nós a celebramos hoje como “Mãe de Deus”… Como se conjugam essas duas maternidades? Não são duas, são uma só!.

O título “Mãe de Deus” foi conferido a Maria pelo Concílio de Éfeso no ano 431 d.C. Este mesmo concílio insistiu que Jesus foi igual a nós em tudo menos o pecado (cf. Hb 4, 15) e viveu e sofreu na carne de maneira verdadeiramente humana. Vinte anos depois, o concílio de Calcedônia chamou Jesus “verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem”. É por ser mãe de Jesus humanamente que Maria é chamada Mãe de Deus, pois a humanidade e a divindade de Jesus humanamente que Maria é chamada Mãe de Deus, pois a humanidade e a divindade de Jesus não se podem separar. Dando Jesus ao mundo Maria deu Deus a todos nós.

Em Jesus, Maria faz Deus nascer no meio do povo. Maria é o ponto de inserção de Deus na humanidade. Neste sentido ela é “porta do céu”, porta para Deus que desce até nós e pela qual nós temos acesso a Deus. Toda mulher-mãe é ponto de inserção de vida nova no meio do povo. Em Maria, essa vida nova é vida divina. Deus se insere no povo por meio da maternidade que ele mesmo criou.

De maneira semelhante, Deus respeita também a Lei que ele mesmo criou e comunicou ao povo. Seu Filho nasceu sob a Lei e foi circuncidado conforme a Lei. As estruturas políticas e sociais do povo, quando condizentes com a vontade de Deus, são instrumento para Deus se tornar presente em nossa história. Deus mostrou isso em Jesus. E quando as leis e estruturas são manipuladas a ponto de se tornarem injustas, o Filho de Deus as assume para as transformar no sentido do seu amor. Por isso, Jesus morreu por causa da Lei, injustamente aplicada a ele.

Assim como pela maternidade humano-divina Maria se tornou “Porta do Céu”, a comunidade humana é chamada a tornar-se acesso de Deus ao mundo e do mundo a Deus. A vida do povo, suas tradições, cultura e estruturas políticas e sociais devem ser um caminho de Deus e para Deus, não um obstáculo. Por isso é preciso transformar a vida humana e as estruturas da sociedade, quando não servem para Deus e não condizem com a dignidade que Deus lhes conferiu pelo nascimento de Jesus de mulher e sob a Lei.

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PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022. Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.

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Reflexão em vídeo de Frei Gustavo Medella:

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             Reflexão: franciscanos.org.br      Imagem: Frei Fábio Melo Vasconcelos     Baner: evaticannews.va

Conheça

o testamento espiritual de Bento XVI

O agradecimento a Deus, a lembrança da família, da Alemanha e da segunda pátria, a Itália constam no testamento espiritual de Bento XVI, que não deixa de ser também uma pequena aula de Teologia. Com uma certeza: "Jesus Cristo é realmente o caminho, a verdade e a vida — e a Igreja, com todas as suas insuficiências, é realmente o Seu corpo".

O meu testamento espiritual

Se nesta tarda hora da minha vida olho para as décadas que percorri, como primeira coisa vejo quantas razões tenho para agradecer. Agradeço antes de tudo ao próprio Deus, o dispensador de todo bom dom, que me doou a vida e me guiou através de vários momentos de confusão; levantando-me sempre toda vez que começava a escorregar e dando-me sempre novamente a luz da sua face. Retrospectivamente vejo e compreendo que mesmo os trechos obscuros e cansativos deste caminho foram para a minha salvação e que justamente neles Ele me guiou bem.

Agradeço aos meus pais, que me doaram a vida num tempo difícil e que, a custa de grandes sacrifícios, com o seu amor me prepararam uma magnífica morada que, com sua clara luz, ilumina todos os meus dias até hoje. A lúcida fé de meu pai me ensinou a nós, filhos, a crer, e como indicador sempre foi firme em meio a todas as minhas aquisições científicas; a profunda devoção e a grande bondade de minha mãe representam uma herança à qual jamais poderei agradecer suficientemente. Minha irmã me assistiu por décadas de maneira desinteressada e com afetuoso cuidado; meu irmão, com a lucidez dos seus juízos e a sua vigorosa determinação, sempre me abriu o caminho; sem este seu contínuo preceder-me e acompanhar-me, não poderia ter encontrado o caminho justo.

De coração agradeço a Deus pelos muitos amigos, homens e mulheres, que Ele sempre colocou ao meu lado; pelos colaboradores em todas as etapas do meu caminho; pelos mestres e os estudantes que Ele me deu. Agradecido, confio a todos à Sua bondade. E quero agradecer ao Senhor pela minha bela pátria nos pré-alpes bávaros, na qual sempre vi transparecer o esplendor do próprio Criador. Agradeço às pessoas da minha pátria, porque nelas pude sempre experimentar de novo a beleza da fé. Rezo para que a nossa terra permaneça uma terra de fé e vos peço, queridos compatriotas: não vos distraiais da fé.  E finalmente agradeço a Deus por todo o belo que pude experimentar em todas as etapas do meu caminho, especialmente, porém, em Roma e na Itália, que se tornou a minha segunda pátria.

A todos aqueles que de algum modo tenha cometido um erro, peço perdão de coração.

Aquilo que antes disse aos meus compatriotas, o digo agora a todos aqueles que na Igreja foram confiados ao meu serviço: permanecei firmes na fé! Não vos deixeis confundir! Com frequência, parece que a ciência – as ciências naturais de um lado e a pesquisa histórica (em particular a exegese da Sagrada Escritura) de outro — seja capaz de oferecer resultados irrefutáveis em contraste com a fé católica. Vi as transformações das ciências naturais desde tempos remotos e pude constatar como, ao contrário, tenham desaparecido aparentes certezas contra a fé, demonstrando-se ser não ciência, mas interpretações filosóficas somente aparentemente incumbentes à ciência; assim como, por outro lado, é no diálogo com as ciências naturais que também a fé aprendeu a compreender melhor o limite do alcance de suas afirmações e, portanto, a sua especificidade. São pelo menos 60 anos que acompanho o caminho da Teologia, em especial das Ciências Bíblicas, e com o subseguir-se das várias gerações vi ruir teses que pareciam inabaláveis, demonstrando-se serem simples hipóteses: a geração liberal (Harnack, Jülicher ecc.), a geração existencialista (Bultmann ecc.), a geração marxista. Vi e vejo como do emaranhado das hipóteses tenha emergido e emerja novamente a razoabilidade da fé. Jesus Cristo é realmente o caminho, a verdade e a vida — e a Igreja, com todas as suas insuficiências, é realmente o Seu corpo.

Por fim, peço humildemente: rezem por mim assim que o Senhor, não obstante todos os meus pecados e insuficiências, me acolher nas moradas eternas. A todos aqueles que me são confiados, dia após dia, vai de coração a minha oração,

Benedictus PP XVI

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                                                                                                                       Fonte: vaticannews.va

Morre Bento XVI,

"humilde trabalhador na vinha do Senhor"

Papa emérito morreu às 9h34 deste sábado, 31 de dezembro. O funeral será na quinta-feira, 5 de janeiro, às 9h30 locais na Praça São Pedro, presidido pelo Papa Francisco.

Comunicado do diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni:

“Com pesar informo que o Papa Emérito Bento XVI faleceu hoje às 9h34, no Mosteiro Mater Ecclesiae, no Vaticano. Assim que possível, serão enviadas novas informações”

Desde quarta-feira passada, quando o Papa Francisco afirmou que seu predecessor estava muito doente, fiéis do mundo inteiro se uniram em oração pela saúde do Papa emérito. Bento XVI tinha 95 anos e vivia no Mosteiro Mater Ecclesiae desde sua renúncia ao ministério petrino, em 2013.

O corpo do Papa emérito estará na Basílica de São Pedro para a saudação dos fiéis a partir da segunda-feira, 2 de janeiro. O funeral será na quinta-feira, 5 de janeiro, às 9h30 locais (05h30 no horário de Brasília) na Praça São Pedro, presidido pelo Papa Francisco.

Ainda de acordo com o diretor da Sala de Imprensa, Bento XVI recebeu a unção dos enfermos na quarta-feira, ao final da missa celebrada no Mosteiro e na presença das "Memores Domini", que há anos o assistem diariamente. 

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"Deus é amor", a chave do pontificado

Bento XVI, diante dos escândalos e do carreirismo eclesiástico, continuou a fazer apelos à conversão, à penitência e à humildade, propondo uma imagem da Igreja liberta de privilégios materiais e políticos para ser verdadeiramente aberta ao mundo.

ANDREA TORNIELLI - Vatican News

Desde 1417, a morte de um (ex) Papa não significava o fim de um pontificado. A morte de Bento XVI, nome de batismo Joseph Ratzinger, ocorreu hoje no Vaticano, quase dez anos após sua renúncia, que ele anunciou de surpresa em 11 de fevereiro de 2013, com a leitura de uma breve declaração em latim diante dos cardeais estupefatos. Nunca em dois milênios de história da Igreja um Papa deixou a Cátedra por sentir-se fisicamente inadequado para suportar o peso do pontificado. Ademais, em uma resposta dada ao jornalista Peter Seewald no livro-entrevista "Luz do Mundo" publicada três anos antes, ele havia de algum modo antecipado um: "Quando um Papa chega à conclusão clara de que não é mais capaz física, mental e espiritualmente de realizar a tarefa que lhe foi confiada, então ele tem o direito e em algumas circunstâncias até o dever de renunciar". Apesar do fato de que o epílogo de seu reinado foi anterior ao fim de sua vida, constituindo um precedente histórico de enorme significado, não seria generoso lembrar Bento XVI apenas por isso.

'Teen ager' teológico no Concílio

Nascido em 1927, filho de um gendarme, em uma família simples e muito católica na Baviera, Joseph Ratzinger foi um protagonista na Igreja do século passado. Ordenado sacerdote junto com seu irmão Georg em 1951, tornou-se doutor em teologia dois anos mais tarde e em 1957 recebeu a licença para ensinar como professor de teologia dogmática. Ele ensinou em Freising, Bonn, Münster, Tübingen e, por fim, em Regensburg. Com ele falece o último dos Pontífices pessoalmente envolvidos nos trabalhos do Concílio Vaticano II. Como um teólogo muito jovem e já estimado, Ratzinger havia acompanhado de perto a assembleia como um especialista do cardeal Frings de Colônia, que estava próximo à ala reformista. Ele estava entre aqueles que criticaram fortemente os esquemas preparatórios feitos pela Cúria Romana, mais tarde varridos pela decisão dos bispos. Para o jovem teólogo Ratzinger, os textos "devem dar respostas às perguntas mais urgentes e devem fazê-lo, na medida do possível, não julgando e condenando, mas usando uma língua materna". Ratzinger elogia a reforma litúrgica que estava chegando e as razões de sua inevitabilidade providencial. Ele diz que, para redescobrir a verdadeira natureza da liturgia, era necessário "romper o muro do latim".

Custódio da fé com Wojtyla

Mas o futuro Bento XVI também testemunhou diretamente a crise pós-conciliar, a contestação nas universidades e nas faculdades teológicas. Ele testemunha o questionamento das verdades essenciais da fé e da experimentação selvagem em âmbito litúrgico. Já em 1966, um ano após o final do Concílio, ele disse ver o avanço de um "cristianismo a preços rebaixados".

Paulo VI o nomeou arcebispo de Munique em 1977, aos 50 anos de idade e algumas semanas mais tarde o criou cardeal. Em novembro de 1981, João Paulo II confiou-lhe a condução da Congregação para a Doutrina da Fé. Era o início de uma forte parceria entre o Papa polonês e o teólogo bávaro, destinada a desfazer-se somente com a morte de Wojtyla, que até o final recusou a renúncia de Ratzinger, não querendo se privar dela. Estes foram os anos em que o ex Santo Ofício colocou os pontos nos "is" em muitos assuntos: colocou freios na Teologia da Libertação, que usa a análise marxista, e tomou uma posição diante do surgimento de grandes problemas éticos. A obra mais importante é certamente o novo Catecismo da Igreja Católica, um trabalho que durou seis anos e que viu a luz em 1992.

"Humilde trabalhador na vinha"

Após a morte de Wojtyla, o conclave de 2005 chamou para sucedê-lo em menos de 24 horas um homem já idoso - ele tinha 78 anos de idade - universalmente estimado e respeitado até mesmo por seus oponentes. Da sacada da Basílica de São Pedro, Bento XVI se apresenta como "um humilde trabalhador na vinha do Senhor". Alheio a qualquer protagonismo, ele diz que não tem "programa", mas quer "ouvir, com toda a Igreja, a palavra e a vontade do Senhor".

Auschwitz e Regensburg

Inicialmente tímido, ele não renunciou a viajar: seu pontificado também será itinerante como o de seu antecessor. Um dos momentos mais comoventes foi a visita a Auschwitz em maio de 2006, com o Papa alemão dizendo: "Em um lugar como este, as palavras falham, só um silêncio perplexo pode permanecer - um silêncio que é um grito interior a Deus: Por que pudeste tolerar tudo isso?" 2006 é também o ano do caso Regensburg, quando uma frase antiga sobre Maomé, que o Pontífice cita sem fazer sua na universidade onde foi professor, é instrumentalizada e desencadeia protestos no mundo islâmico. Desde então, o Papa multiplicará seus sinais de atenção em relação aos muçulmanos. Bento XVI enfrenta viagens difíceis, se confronta com a secularização galopante das sociedades descristianizadas e a dissidência dentro da Igreja. Ele celebra seu aniversário na Casa Branca junto com George Bush Jr. e alguns dias depois, em 20 de abril de 2008, reza no Ground Zero abraçando os parentes das vítimas do 11 de setembro.

A encíclica sobre a alegria

Embora, como prefeito do ex Santo Ofício, ele foi frequentemente etiquetado como "panzerkardinal", como Papa ele fala constantemente da "alegria de ser cristão", e dedica sua primeira encíclica ao amor de Deus, "Deus caritas est". No começo do ser cristão - escreve ele - não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um evento, com uma Pessoa". Ele também encontra tempo para escrever um livro sobre Jesus de Nazaré, uma obra única que será publicada em três tomos. Entre as decisões a serem lembradas estão o Motu proprio liberalizando o missal romano pré-conciliar e o estabelecimento de um Ordinariato para permitir que as comunidades anglicanas retornem à comunhão com Roma. Em janeiro de 2009, o Papa decidiu revogar a excomunhão dos quatro bispos ordenados ilicitamente por dom Marcel Lefebvre, entre eles também Richard Williamson, negacionista das câmaras de gás. As polêmicas explodem no mundo judeu, o Papa pega caneta e papel e escreve para os bispos do mundo assumindo toda a responsabilidade.

A resposta aos escândalos

Os últimos anos são marcados pelo retorno explosivo do escândalo da pedofilia e pelo Vatileaks, o vazamento de documentos retirados da escrivaninha papal e publicados em um livro. Bento XVI é determinado e duro em enfrentar o problema da "sujeira" dentro da Igreja. Ele introduz regras muito rigorosas de combate ao abuso contra menores, pede à Cúria e aos bispos que mudem mentalidade. Ele chega a dizer que a mais grave perseguição para a Igreja não vem de seus inimigos externos, mas do pecado dentro dela. Outra reforma importante é a financeira: é o Papa Ratzinger quem introduz a regulamentação contra a lavagem de dinheiro no Vaticano.

Igreja livre de dinheiro e poder

Diante dos escândalos e do carreirismo eclesiástico, o idoso Papa alemão continua a fazer apelos à conversão, à penitência e à humildade. Durante sua última viagem à Alemanha, em setembro de 2011, pediu que a Igreja fosse menos mundana: "Exemplos históricos mostram que o testemunho missionário de uma Igreja "desmundanizada" emerge mais claramente. Livre de fardos e privilégios materiais e políticos, a Igreja pode dedicar-se melhor e de forma verdadeiramente cristã ao mundo inteiro, pode estar verdadeiramente aberta ao mundo...".

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Simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor

Bento XVI, o grande

"A notícia divulgada nesta manhã do último dia do ano de 2022 é para nós uma oportunidade de um grande exame de consciência no ano que termina e de nos colocarmos disponíveis para o novo ano que se inicia, agora com o olhar retrospectivo de um grande homem de Deus que partiu e que serviu à Igreja como “simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor", é o convite de Dom Orani Tempesta.



Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist. - Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

Ao apresentar-se ao mundo como novo Pontífice, assim se dirigiu ao povo o Papa Bento XVI: “Depois do grande Papa João Paulo II, os Senhores Cardeais elegeram-me, simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor”. O Papa emérito Bento XVI, o grande, despediu-se hoje, último dia do ano de 2022, de nosso tempo e voltou para a casa do Pai. Acompanhamos com as orações para que esteja junto de Deus na glória e agradecemos a Deus pela sua missão entre nós. Permanecerá seu exemplo, seus escritos, seu legado.

Na homilia na basílica de São João de Latrão, em 7 de maio de 2005, o grande Papa Bento deu sinais claros de que estava a serviço da Palavra de Deus que é única, mas chega até nós por dois canais: a Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição (cf. Catecismo da Igreja Católica n. 74-100). Em outras palavras, o Papa é o guardião primeiro e zeloso do patrimônio da fé e não o seu dono. Afirma ele, então, com palavras marcantes: “O poder conferido por Cristo a Pedro e aos seus sucessores é, em sentido absoluto, um mandato para servir. O poder de ensinar, na Igreja, obriga a um compromisso ao serviço da obediência à fé. O Papa não é um soberano absoluto, cujo pensar e querer são leis. Ao contrário: o ministério do Papa é garantia da obediência a Cristo e à Sua Palavra. Ele não deve proclamar as próprias ideias, mas vincular-se constantemente a si e à Igreja à obediência à Palavra de Deus, tanto perante todas as tentativas de adaptação e de adulteração, como diante de qualquer oportunismo. [...] O Papa tem a consciência de que está, nas suas grandes decisões, ligado à grande comunidade da fé de todos os tempos, às interpretações vinculantes que cresceram ao longo do caminho peregrinante da Igreja. Assim, o seu poder não é superior, mas está a serviço da Palavra de Deus, e sobre ele recai a responsabilidade de fazer com que esta Palavra continue a estar presente na sua grandeza e a ressoar na sua pureza, de modo que não seja fragmentada pelas contínuas mudanças das modas”.

Estamos próximos de mais um Curso para os Bispos aqui no Rio de Janeiro, e é impossível não recordar que o primeiro conferencista foi exatamente o então Cardeal Ratzinger, depois o Papa Bento XVI. Marcou o início de nosso Curso, que, sem dúvida, neste ano terá uma bela homenagem a ele.

Notemos que, antes, na Missa para o início do ministério petrino, Bento XVI já dizia: “O meu verdadeiro programa de governo é não fazer a minha vontade, não perseguir ideias minhas, pondo-me, contudo, à escuta, com a Igreja inteira, da palavra e da vontade do Senhor e deixar-me guiar por Ele, de forma que seja Ele mesmo quem guia a Igreja nesta hora da nossa história. [...] ‘Apascenta as minhas ovelhas’, diz Cristo a Pedro, e a mim, neste momento. Apascentar significa amar, e amar quer dizer também estar prontos para sofrer. Amar significa: dar às ovelhas o verdadeiro bem, o alimento da verdade de Deus, da palavra de Deus, o alimento da sua presença, que ele nos oferece no Santíssimo Sacramento. Queridos amigos, neste momento eu posso dizer apenas: rezai por mim, para que eu aprenda cada vez mais a amar o Senhor. Rezai por mim, para que eu aprenda a amar cada vez mais o seu rebanho vós, a Santa Igreja, cada um de vós singularmente e todos vós juntos. Rezai por mim, para que eu não fuja, por receio, diante dos lobos. Rezai uns pelos outros, para que o Senhor nos guie e nós aprendamos a guiar-nos uns aos outros”.

A escolha do nome definia a sua admiração ao Papa Bento XV (1914-1922) e o seu amor a São Bento de Nursia, patriarca dos monges do Ocidente, assim como demonstrava os rumos do seu pontificado. Deixemos que o próprio Bento XVI nos fale: “Neste primeiro encontro, gostaria antes de tudo de falar sobre o nome que escolhi ao tornar-me Bispo de Roma e Pastor universal da Igreja. Quis chamar-me Bento XVI para me relacionar idealmente com o venerado Pontífice Bento XV, que guiou a Igreja num período atormentado devido ao primeiro conflito mundial. Ele foi um profeta corajoso e autêntico de paz e comprometeu-se com coragem infatigável primeiro para evitar o drama da guerra e depois para limitar as consequências nefastas. Nas suas pegadas, desejo colocar o meu ministério a serviço da reconciliação e da harmonia entre os homens e os povos, profundamente convencido de que o grande bem da paz é antes de tudo dom de Deus, dom frágil e precioso que deve ser invocado, tutelado e construído dia após dia com o contributo de todos” (Audiência Geral, 27/04/2005).

E prossegue: “Além disso, o nome Bento recorda também a extraordinária figura do grande ‘Patriarca do monaquismo ocidental’, São Bento de Núrsia, co-padroeiro da Europa juntamente com os santos Cirilo e Metódio e as mulheres santas, Brígida da Suécia, Catarina de Sena e Edith Stein. A expansão progressiva da Ordem beneditina por ele fundada exerceu uma influência enorme na difusão do cristianismo em todo o Continente. Por isso, São Bento é muito venerado também na Alemanha e, em particular, na Baviera, a minha terra de origem; constitui um ponto de referência fundamental para a unidade da Europa e uma forte chamada às irrenunciáveis raízes cristãs da sua cultura e da sua civilização. Deste Pai do Monaquismo ocidental conhecemos a recomendação deixada aos monges na sua Regra: ‘Nada anteponham absolutamente a Cristo’ (Regra 72, 11; cf. 4, 21). No início do meu serviço como Sucessor de Pedro peço a São Bento que nos ajude a manter firme a centralidade de Cristo na nossa existência. Que ele esteja sempre no primeiro lugar nos nossos pensamentos e em cada uma das nossas atividades!” (idem).

No seu pontificado, Bento publicou, além de quatro exortações apostólicas – “Ecclesia in Medio Oriente”, “Africae múnus”, “Verbum Domini” e “Sacramentum Caritatis” –, além das cartas apostólicas, constituições apostólicas e três encíclicas: “Deus caritas est”, “Spe salvi” e “Caritas in veritate”. Na primeira, recorda que “‘Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele’ (1 Jo 4, 16). Estas palavras da I Carta de João exprimem, com singular clareza, o centro da fé cristã: a imagem cristã de Deus e também a consequente imagem do homem e do seu caminho. Além disso, no mesmo versículo, João oferece-nos, por assim dizer, uma fórmula sintética da existência cristã: ‘Nós conhecemos e cremos no amor que Deus nos tem’ [...]. Num mundo em que ao nome de Deus se associa às vezes a vingança ou mesmo o dever do ódio e da violência, esta é uma mensagem de grande atualidade e de significado muito concreto” (n. 1).

Na segunda lembra, a partir de Rm 8,24, que é na esperança que fomos salvos. “A ‘redenção’, a salvação, segundo a fé cristã, não é um simples dado de fato. A redenção é-nos oferecida no sentido que nos foi dada a esperança, uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo presente: o presente, ainda que custoso, pode ser vivido e aceite, se levar a uma meta e se pudermos estar seguros desta meta, se esta meta for tão grande que justifique a canseira do caminho” (n. 1). Já na terceira e última encíclica do seu pontificado, Bento XVI se volta para a Doutrina Social da Igreja com a Caritas in veritate. Aí o Papa constata, de modo muito oportuno, que “a caridade é amor recebido e dado; é ‘graça’ (cháris). A sua nascente é o amor fontal do Pai pelo Filho no Espírito Santo. É amor que, pelo Filho, desce sobre nós. É amor criador, pelo qual existimos; amor redentor, pelo qual somos recriados. Amor revelado e vivido por Cristo (cf. Jo 13,1), é ‘derramado em nossos corações pelo Espírito Santo’ (Rm 5,5). Destinatários do amor de Deus, os homens são constituídos sujeitos de caridade, chamados a fazerem-se eles mesmos instrumentos da graça, para difundir a caridade de Deus e tecer redes de caridade” (n. 4).

E continua: “A esta dinâmica de caridade recebida e dada, propõe-se dar resposta a doutrina social da Igreja. Tal doutrina é ‘caritas in veritate in re sociali’, ou seja, proclamação da verdade do amor de Cristo na sociedade; é serviço da caridade, mas na verdade. Esta preserva e exprime a força libertadora da caridade nas vicissitudes sempre novas da história. É ao mesmo tempo verdade da fé e da razão, na distinção e, conjuntamente, sinergia destes dois âmbitos cognitivos. O desenvolvimento, o bem-estar social, uma solução adequada dos graves problemas socioeconômicos que afligem a humanidade precisam desta verdade. Mais ainda, necessitam que tal verdade seja amada e testemunhada. Sem verdade, sem confiança e amor pelo que é verdadeiro, não há consciência e responsabilidade social, e a atividade social acaba à mercê de interesses privados e lógicas de poder, com efeitos desagregadores na sociedade, sobretudo numa sociedade em vias de globalização que atravessa momentos difíceis como os atuais” (n. 5).

Por fim, quando, em 11/02/2013, Bento XVI renunciou ao múnus petrino, surgiram muitas especulações e era o ano da JMJ no Rio de Janeiro, sede que ele mesmo escolheu para esse grande evento. Sobre a renúncia reporto um texto de nosso irmão aqui do Regional Leste 1, D. Rifan: “Um grande desapego do alto cargo e influente posição, declarando-se apenas um humilde servidor, uma profunda humildade, não se julgando necessário e reconhecendo a própria fraqueza e incapacidade, de corpo e de espírito, para exercer adequadamente o ministério petrino, e ao pedir perdão – ‘peço perdão por todos os meus defeitos’. (Por trás da renúncia, 19/02/2013, online).

Bento XVI, depois da renúncia, agiu sempre na discrição e na obediência ao único legítimo sucessor de Pedro, o Papa Francisco. Afirmou Bento: “O Papa é um só, Francisco” (Vatican.news, 27/06/2019, online). Da parte do Papa Francisco nunca faltou, nas visitas e nas palavras, carinho e respeito para com o Papa emérito e sua última missão de ser, a partir do mosteiro Mater Ecclesiae, uma voz orante que ajuda a sustentar a Igreja. Disse o Santo Padre, em sua Audiência do dia 28 de dezembro último, sob calorosos aplausos dos peregrinos: “Uma oração especial pelo Papa emérito Bento 16, que no silêncio está sustentando a Igreja. Recordemos, ele está muito doente, pedindo ao Senhor que o console e o sustente neste testemunho de amor à Igreja até o fim”. E logo depois foi visitar Bento XVI onde, segundo dizem, ministrou-lhe a unção dos enfermos.

Pessoalmente tenho que agradecer, sem mérito nenhum de minha parte, ao Papa Bento XVI a minha nomeação para Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará em 13 de outubro de 2004 a e a minha nomeação para Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro a 27 de fevereiro de 2009.

Não poderia deixar de tributar meu sincero agradecimento pela sua escolha pessoal para que, após a jornada em Madrid, de que a Jornada Mundial da Juventude – JMJ – 2013 – fosse celebrada no Rio de Janeiro. Ele não pode estar conosco, mas o Papa Francisco colheu a alegria, o entusiasmo e o calor humano dos milhares e milhares de jovens que encheram a Praia de Copacabana para escutar o Sucessor de Pedro. Eu, como monge cisterciense, sempre tive uma sintonia espiritual com o precioso tesouro espiritual que foi o Magistério e o Pontificado do Papa Bento XVI, um magno e sumo pastor, em especial pelo seu nome, já que os cistercienses seguem a Regra de São Bento.

A notícia divulgada nesta manhão do último dia do ano de 2022 é para nós uma oportunidade de um grande exame de consciência no ano que termina e de nos colocarmos disponíveis para o novo ano que se inicia, agora com o olhar retrospectivo de um grande homem de Deus que partiu e que serviu à Igreja como “simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor. Ao me deslocar para Roma nestes dias para suas exéquias recordo com carinho dos vários encontros pessoais que tivemos com ele e, em especial, seu grande amor à Igreja e à Cristo que marcou sua vida e missão. Para mim são profundas as palavras do ministério do Papa Bento XVI: “Cooperatores veritatis!”. Sempre busquemos ser, com Cristo, cooperadores da Verdade do Evangelho! Agora no céu, suplicamos, que o Papa Bento XVI junto de Deus interceda por todos nós que o amamos e continuamos reverenciando a sua obra, o seu pontificado, e o seu sorriso discreto e amável, uma das maiores obras teológicas e pastorais de todos os tempos. Descanse em paz! Deus lhe pague pelo seu testemunho de construtor de pontes, sem jamais renunciar a verdade da fé católica e apostólica.

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A renúncia:

o primeiro Papa emérito

“Quando um papa chega à clara consciência de já não se encontrar em condições físicas, mentais e espirituais de exercer o cargo que lhe foi confiado então tem o direito – e, em algumas circunstâncias, também o dever - de renunciar”: são palavras de Bento XVI no livro-entrevista “Luz do Mundo” de 2010. Em 2013, eis que chega aquele momento, e a Igreja e o mundo se encontram com o primeiro Papa emérito.



Pe. Bernd Hagenkord (in memoriam) – Cidade do Vaticano

Mas o Papa Bento foi realmente o primeiro? Logo depois do fatídico anúncio por parte de Bento XVI, em 11 de fevereiro de 2013, começou a desenfreada busca para verificar se na história já tinha acontecido alguma coisa do gênero. E logo foi encontrado o Papa da Idade Média Celestino V (Pietro Morrone, morto em 1296) que, pouco depois de cinco meses na Cátedra de Pedro, manifestou o desejo de voltar à sua vida de eremita para depois ser preso pelo seu sucessor e morrer em condições miseráveis.

De um ponto de vista histórico não é claro se Celestino V seja verdadeiramente um “precursor” de Bento XVI porque os estudiosos duvidam da “espontaneidade” do seu gesto. Além disso há papas e antipapas obrigados à renúncia como por exemplo Gregório XII que renunciou a pedido do Concílio de Constância, para ajudar a acabar com o Grande Cisma do Ocidente. Mas em 2013 foi somente Celestino a ser citado como exemplo.

Na “Divina Comédia”, Dante Aleghieri manifestou pouca simpatia por Celestino V e colocou o papa vil no Inferno, “colui / che fece per viltade il gran rifiuto (Inf., III, 59-60)”. Em alguns âmbitos eclesiásticos a decisão de Bento XVI recebeu uma consideração semelhante, e a expressão de que não se desce da cruz, começou a se espalhar em todo o mundo. Mas a grande maioria - católicos e não católicos – entenderam essa decisão e a respeitaram, também pela vida de silencioso retiro à que se dedicou. Foi deste modo que Bento XVI demonstrou a sua grandiosidade e por isso mesmo, apesar de todos os precursores, na realidade é o primeiro.

O Direito canônico

O Direito canônico apresenta esta possibilidade. De fato, segundo o cân. 332 § 2 “Se acontecer que o Romano Pontífice renuncie ao cargo, para a validade requer-se que a renúncia seja feita livremente, e devidamente manifestada, mas não que seja aceite por alguém”. E no Consistório de 11 de fevereiro foram respeitadas as duas condições.

Eis que o direito reflete a posição jurídica única do Pontífice: no cân. 331 afirma-se que o Papa tem “poder ordinário, supremo, pleno, imediato e Universal. Portanto para a Igreja ele é o supremo legislador.

Esta autoridade remonta ao Apóstolo Pedro, ao qual Jesus Cristo dirige as mesmas palavras que são legíveis, em letras garrafais, no círculo interno da cúpula de São Pedro: “Por isso, eu te digo: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as forças do Inferno não poderão vencê-la” (Mt 16-18).

Mas como vive um Papa emérito e qual o seu papel na Igreja, se não consta no Direito Canônico. É um “Bispo de Roma emérito”, um “Papa emérito” ou volta a ser um cardeal? Continua a usar o nome como Pontífice ou volta a ser Joseph Ratzinger? Continua a usar as vestes brancas? São as perguntas que foram levantadas depois de 11 de fevereiro de 2013. Em uma entrevista ao jornal alemão FAZ - Frankfurter Allgemeine Zeitung – de dezembro de 2014, o Papa emérito admitiu que num primeiro momento tinha pensado em escolher o nome “padre Bento”, para criar um claro afastamento. Porém, depois prevaleceu a escolha do nome “Papa emérito Bento”; e continuou a usar vestes brancas.

Como amadureceu a decisão

A renúncia não foi uma decisão impulsiva. No decorrer de muitas entrevistas com pessoas de sua confiança, pôde-se constatar, sucessivamente, que há muito tempo Papa Bento meditava sobre esta decisão, que amadureceu com o tempo. Já em 2010 no livro-entrevista ele falava da sua eleição ao Pontificado como de “uma guilhotina”. “Tinha certeza que este cargo não seria destinado a mim, mas que Deus, depois de tantos anos de fadiga, teria me concedido um pouco de paz e tranquilidade”: palavras suas em 2010 (Opera omnia, 13.2, p. 864).

No mesmo livro-entrevista ele disse também que considerava possível uma sua renúncia e na ocasião falou do direito e do dever da renúncia (p. 868). Alguns anos depois serviu-se deste direito – que talvez ele considerasse também um dever.

Com este gesto, Papa Bento mudou o ministério. Mesmo se talvez a possibilidade sempre tenha existido e se os papas que o precederam, como Paulo VI, por exemplo, ou João Paulo II, talvez tenham pensado nisso, mas Bento XVI viu claramente que se tratava de um “direito e, em algumas circunstâncias, também um dever”, e agiu deste modo quando, segundo sua avaliação, tinha chegado o momento.

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Bento XVI

eventos importantes do pontificado

Em 19 de abril de 2005, aos 78 anos, o cardeal Joseph Ratzinger, então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé ,foi eleito 265º Papa da Igreja Católica depois de dois dias de Conclave, assumindo o nome de Bento XVI.

Com a morte do Papa emérito Bento XVI aos 95 anos, ocorrida neste sábado, 31 de dezembro de 2022, destacamos acontecimentos que marcaram o seu pontificado.

Um pontificado intenso para restituir “Deus ao centro”

Sete anos, dez meses e nove dias. Foi o tempo do pontificado de Bento XVI, iniciado em 19 de abril de 2005 e concluído em 28 de fevereiro de 2013, depois do anúncio supresa, dia 11 de fevereiro, da sua renúncia ao Ministério Petrino. Um pontificado bem mais breve do que seu predecessor São João Paulo II, o segundo mais longo da história, mas não menos intenso, durante o qual Papa Ratzinger fez, entre outras coisas, 24 viagens apostólicas ao exterior; participou de três Jornadas Mundiais da Juventude e a um Encontro Mundial das Famílias; escreveu três encíclicas, uma constituição apostólica, três exortações apostólicas; convocou quatro Sínodos (2 ordinários e 2 especiais); criou 84 cardeais; proclamou 45 santos e 855 beatos, entre os quais Papa Wojtyla.

O fio condutor deste pontificado foi a vontade de anunciar ao mundo o Evangelho do Amor de Cristo evocado pela sua primeira Encíclica “Deus caritas est”, para restituir “Deus ao centro” em um mundo que “a fé corre o risco de apagar-se” (Carta aos Bispos de todo o mundo, 10 de março de 2009), na consciência de que isto requer a purificação da Igreja e a conversão dos homens e das estruturas.

O Papa do diálogo entre fé e razão

Seguindo o caminho de seus predecessores – de João XXIII a João Paulo II – e as linhas “programáticas” indicadas na “Deus Caritas est”, Bento XVI foi um Papa que deu muita atenção ao diálogo inter-religioso e intercultural (um aspecto, muitas vezes pouco considerado do seu pontificado). Podemos citar o diálogo com o judaísmo e com as outras religiões, com os irmãos cristãos separados; com a ciência e o pensamento leigo; com os católicos separados da Igreja como a Fraternidade São Pio X. Diálogos marcados por muitas dificuldades, mal-entendidos e também inesperados bloqueios, mas que não desanimaram o Papa teólogo que prosseguiu com perseverança, partindo da relação entre fé e razão que, junto a da caridade e verdade, foram a marca do seu magistério. A ideia de fundo que se encontra em muitos de seus discursos e escritos era que “a razão nada perde abrindo-se aos conteúdos da fé”, enquanto que “a fé supõe a razão e aperfeiçoa-a”. Podemos pensar no famoso (e muito mal-entendido) discurso de Regensburg (2006), ou aos representantes do mundo da cultura no Collège dês Bernardins em Paris (2008), também ao histórico na Westminster Hall (2010) assim como também o histórico discurso ao Bundestag alemão (2011) só para citar alguns, aos quais deve-se acrescentar os seus documentos magisteriais sobre o assunto.

Um Papa no timão do barco na tempestade

O pontificado de Bento XVI coincidiu também com um momento particularmente difícil para a Igreja, marcado principalmente pelo escândalo da pedofilia e do caso Vatileaks. Crise que o pontífice alemão, que desde seus primeiros pronunciamentos denunciava a “sujeira” na Igreja (Via-Sacra 2005), soube enfrentar com lucidez e determinação, preparando o terreno às reformas que seriam levadas adiante pelo Papa Francisco. A luta sem fronteiras contra a pedofilia foi, com efeito, um dos aspectos que distinguiu o pontificado de Bento XVI, como confirma também o grande aumento dos sacerdotes suspensos nos anos de 2011 e 2012 (400), por envolvimento em casos de abuso, assim como o número de bispos afastados pela má gestão do problema. Números que foram os primeiros casos visíveis da reforma desejada pelo Pontífice através das Normas “De gravioribus delictis” para tornar mais eficaz a ação de contraste e prevenção. Também em relação aos escândalos financeiros que envolveram o Vaticano, deve-se a Bento XVI a introdução de medidas levadas adiante pelo Papa Francisco para tornar mais transparente a gestão financeira da Santa Sé. Começando pelo Motu Proprio de 30 de dezembro de 2010 sobre a “Prevenção e o contraste da lavagem de capitais provenientes de atividades criminosas e ao financiamento do terrorismo”.

Cronologia esquemática

2005

19 de abril de 2005

O cardeal Joseph Ratzinger, aos 78 anos, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé foi eleito 265º Papa da Igreja Católica depois de dois dias de conclave, assumindo o nome de Bento XVI. No dia anterior, durante a Messa pro eligendo pontefice, à qual presidiu na qualidade de Decano do Colégio cardinalício, o cardeal Ratzinger fez uma homilia que antecipava os pontos chave do seu futuro magistério. Começando com a célebre observação: “A pequena barca do pensamento de muitos cristãos foi muitas vezes agitada por estas ondas lançada de um extremo ao outro: do marxismo ao liberalismo, até à libertinagem, do coletivismo ao individualismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso; do agnosticismo ao sincretismo…”. Derivas contra as quais pusera a mesma objeção que repetiria muitas vezes durante o seu pontificado: “Ter uma fé clara, segundo o Credo da Igreja, muitas vezes é classificado como fundamentalismo. Enquanto o relativismo, isto é, deixar-se levar ‘aqui e além por qualquer vento de doutrina’, aparece como a única atitude à altura dos tempos hodiernos. Vai-se constituindo uma ditadura do relativismo que nada reconhece como definitivo e que deixa como última medida apenas o próprio eu e as suas vontades”.

13 de maio de 2005 Bento XVI encaminha a causa de beatificação de João Paulo II, sem esperar os cinco anos canônicos.

18-21 de agosto de 2005 1ª Viagem Apostólica: Alemanha, para a Jornada Mundial da Juventude de Colônia, convocada pelo seu predecessor. Entre as etapas significativas da viagem, a visita à Sinagoga de Colônia, em 19 de agosto.

29 de agosto de 2005 Bento XVI recebe em Castel Gandolfo, D. Bernard Fellay Superior Geral da Fraternidade São Pio X. Trata-se do primeiro encontro do novo pontífice com o expoente da comunidade tradicionalista fundada por D. Marcel Léfebvre, excomungado por João Paulo II em 1988.

2-23 de outubro de 2005 XI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos sobre o tema “A Eucaristia, fonte e ápice da vida e da missão da Igreja”.

2006

25 de janeiro de 2006 Bento XVI publica a sua primeira Carta Encíclica “Deus Caritas est” (“Deus é amor”).

19 de maio de 2006: Bento XVI condena Marcial Maciel Degollado a uma vida reservada de oração e penitência renunciado a todos os ministério públicos. O fundador dos Legionários de Cristo, acusado de pedofilia e de uma vida dupla com mulher e filhos, não foi submetido ao processo canônico somente por questão de idade.

25-28 de maio de 2006 A 2ª Viagem Apostólica: Polônia, foi uma ocasião para homenagear o seu grande predecessor. Entre os momentos mais comovedores a visita a ao Campo de Concentração Auschwitz-Birkenau, “o lugar da memória e do Holocausto”, onde pronuncia estas significativas frases: “Tomar a palavra neste lugar de horror, de acúmulo de crimes contra Deus e contra o homem sem igual na história, é quase impossível e é particularmente difícil e oprimente para um cristão, para um Papa que provém da Alemanha. Num lugar como este faltam as palavras, no fundo pode permanecer apenas um silêncio aterrorizado um silêncio que é um grito interior a Deus: Senhor, por que silenciaste? Por que toleraste tudo isto? É nesta atitude de silêncio que nos inclinamos profundamente no nosso coração face à numerosa multidão de quantos sofreram e foram condenados à morte; todavia, este silêncio torna-se depois pedido em voz alta de perdão e de reconciliação, um grito ao Deus vivo para que jamais permita uma coisa semelhante”.

8-9 de julho de 2006 3ª Viagem Apostólica: Espanha para o 5º Encontro Mundial das Famílias em Valência.

9-14 de setembro de 2006 4ª Viagem Apostólica: Alemanha. Bento XVI visita Marktl-am-Inn, sua cidade natal e a Universidade de Regensburg, onde pronuncia a célebre Lectio magistralis que causou duras reações no mundo muçulmanos por causa de uma citação do imperador bizantino Manuel II Paleologo, tirada de um seu escrito sobre a guerra santa. Os temas centrais abordados na lição são: a relação entre fé e a razão; a analogia na diferença entre Deus e o homem, o nexo entre religião e civilização; a cientificidade moderna, com o seu valor; a necessidade de ‘alargar o iluminismo’. Aquilo que interessa ao Papa alemão é afirmar que a conversão mediante a violência não é agir segundo a razão e é contrária à natureza de Deus.

28 de outubro de 2006

Bento XVI pronuncia um duro discurso aos bispos irlandeses em visita ad limina no Vaticano, no qual define os abusos sexuais contra menores dentro da Igreja como “crimes hediondos”.

28 de novembro-1º de dezembro: 5ª Viagem Apostólica: Turquia. O Papa encontra o Patriarca Ecumênico de Constantinopla, Bartolomeu I e reza na Mesquita Azul de Instambul.

2007

16 de abril de 2007: Publicação do primeiro livro da série “Jesus de Nazaré”.

9-14 de maio de 2007: 6ª Viagem Apostólica: Brasil para a V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano (CELAM) em Aparecida. O Papa canoniza Santo Antônio de Sant’Ana Galvão (Frei Galvão), sacerdote e religioso franciscano, primeiro Santo nascido no Brasil.

30 de junho de 2007: Publicação da Carta aos Católicos Chineses, na qual Bento XVI convida as autoridades e Pequim a garantirem “uma autêntica liberdade religiosa” no país.

7 de julho de 2007: Publicação do Motu Proprio 'Summorum Pontificum' com as indicações jurídicas e litúrgicas para a celebração da chamada Missa Tridentina, ou seja, a Missa celebrada segundo o “Missal Romano de S. Pio V”.

7-9 de setembro de 2007: 7ª Viagem Apostólica: Áustria, onde Bento XVI coloca no itinerário também a visita ao Santuário Mariano de Mariazell.

30 de novembro de 2007: Bento XVI publica a sua segunda Carta Encíclica “Spe salvi”, dedicada à “esperança cristã”.

2008

15-21 de abril de 2008: 8ª Viagem Apostólica: Estados Unidos. Papa Bento XVI discursa na Assembleia Geral das Nações Unidas. Falaram também na mesma tribuna Paulo VI e João Paulo II, o Papa fala de temas muito caros a ele como o relativismo, a defesa da liberdade religiosa, os limites éticos da pesquisa científica, os deveres da ingerência, os limites da ação da ONU. A dignidade do homem, “criado à imagem de Deus” repete, deve estar no centro da ação da Comunidade internacional.

Em Washington, em 17 de abril encontra pela primeira vez as vítimas de abusos sexuais cometidos por sacerdotes. Durante a viagem fala sobre o tema. No mesmo dia 17, na Missa celebrada no National Stadium de Washington, comenta: “Nenhuma palavra minha poderia descrever a dor e o prejuízo causados pelo abuso sexual de menores. Protejam as crianças”. E também no dia 19 de abril, na homilia da Santa Missa junto à Catedral de São Patrício em Nova York, adverte: “O abuso sexual de menores por parte dos sacerdotes causou tanto sofrimento. Que este seja um tempo de purificação, seja um tempo de cura”. Durante o voo de ida, em 15 de abril, dissera com clareza: “Excluiremos rigorosamente os pedófilos do ministério sagrado: é absolutamente incompatível e quem é realmente culpado de ser pedófilo não pode ser sacerdote”, enquanto que no dia 16 de abril, no seu discurso aos bispos norte-americanos repete que “Entre os sinais contrários ao Evangelho da vida, há um que causa uma profunda vergonha: o abuso sexual de menores”.

12-21 de julho de 2008 9ª Viagem Apostólica: Austrália para a Jornada Mundial da Juventude em Sydney. Aqui também, em 21 de junho encontra um grupo de vítimas de abusos sexuais. Sobre os padre pedófilos, na coletiva de imprensa do voo de ida para a Austrália, o Papa adverte: “temos que refletir sobre o que foi insuficiente na nossa educação, no nosso ensinamento nas recentes décadas”, enquanto que na homilia na Catedral de Sydney repete: “Os abusos sexuais sobre os menores cometidos por alguns sacerdotes, são agravos que devem ser condenados de modo inequívoco. Lamento verdadeira e profundamente”.

12-15 de setembro de 2008: 10ª Viagem Apostólica: França. Papa Bento faz um importante discurso em Paris para os representantes do mundo da cultura e reitera que: “uma cultura meramente positivista que relegasse para o âmbito subjectivo, como não científica, a pergunta acerca de Deus, seria a capitulação da razão, a renúncia às suas possibilidades mais elevadas e, portanto, o descalabro do humanismo, cujas consequências não deixariam de ser graves”. Em Lourdes, preside a Missa com os bispos da França no 150º aniversário das aparições de Nossa Senhora.

5-26 de outubro de 2008 XII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos sobre “A palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”.

2009

24 de janeiro de 2009: Remissão da excomunhão a quatro bispos da Fraternidade São Pio X consagrados pelo bispo cismático Marcel Lefebvre. Entre os quais o bispo negacionista britânico Richard Williamson. Em uma carta posterior publicada em 10 de março de 2009 aos bispos da Igreja Católica, Bento XVI “lamentava” pelo fato do caso Williamson ter se sobreposto à remissão da excomunhão”.

17-23 de março de 2009: 11ª Viagem Apostólica: Camarões e Angola. O objetivo principal da viagem é a entrega aos bispos africanos do “Instrumentum laboris” do segundo Sínodo Especial para a África programado para outubro de 2009. Uma frase pronunciada na coletiva de imprensa durante o voo para a África, sobre o uso do preservativo na luta contra a Aids (“O problema da Aids não se resolve com a distribuição dos preservativos, ao contrário, aumentam o problema”) provocaram grandes reações na mídia.

31 de março de 2009: Bento XVI ordena uma Inspeção Apostólica na Congregação dos Legionários de Cristo.

8-15 de maio de 2009: 12ª Viagem Apostólica: Jordânia, Israel e Territórios Palestinos. Para contribuir à paz e dar apoio aos cristãos da região. Dia 12 de maio o Pontífice reza diante do Muro Ocidental de Jerusalém.

16 de junho de 2009 Na Carta de proclamação do Ano Sacerdotal, Bento XVI escreve: “Infelizmente existem também situações, nunca suficientemente deploradas, em que é a própria Igreja a sofrer pela infidelidade de alguns dos seus ministros. Daí advém então para o mundo motivo de escândalo e de repulsa”.

7 de julho de 2009: Bento XVI publica sua terceira Encíclica, “Caritas in Veritate” dedicada ao desenvolvimento humano integral na caridade e na verdade.

8 de julho de 2009: Publicação do Motu Proprio "Unitatem Ecclesiae" para encaminhar o diálogo doutrinal com a Fraternidade São Pio X.

26-28 de setembro de 2009: 13ª Viagem Apostólica: República Tcheca. Na sua chegada o Papa convida todos os cidadãos tchecos a redescobrir as tradições cristãs que plasmaram sua cultura e que foram ofuscadas pelo passado regime comunista e exorta “a comunidade cristã a continuar a fazer ouvir a sua voz enquanto a nação deve enfrentar os desafios do novo milênio”.

4-25 de outubro de 2009: II Assembleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos sobre o tema “A Igreja ao serviço da reconciliação, da justiça e da paz”.

26 de outubro de 2009 Primeiro encontro da Comissão de Estudo, formada por especialistas da Pontifícia Comissão “Ecclesia Dei” e da Fraternidade Sacerdotal S. Pio X, com o objetivo de examinar as dificuldades doutrinais que ainda subsistem entre a Fraternidade e a Sé Apostólica.

14 de novembro de 2009 Publicação da Constituição Apostólica “Anglicanorum Coetibus”, sobre a instituição de Ordinariatos pessoais para anglicanos que entram na plena comunhão com a Igreja Católica.

19 de dezembro de 2009: Bento XVI proclama as “virtudes heroicas” do seu predecessor João Paulo II, passo decisivo antes da beatificação, e as de Pio XII.

2010

17 gennaio 2010 Visita de Bento XVI à Sinagoga de Roma. Trata-se da segunda visita de um pontífice no templo judaico da capital italiana depois da histórica visita de João Paulo II em 13 de abril de 1986, uma ocasião para reforçar a “proximidade e fraternidade espirituais” que unem a Igreja e os “irmãos mais velhos” dos cristãos depois de séculos de incompreensões e perseguições.

20 de março de 2010 Bento XVI envia uma Carta Pastoral a todos os católicos da Irlanda com a qual exprime profunda dor e tristeza pelos abusos cometidos por sacerdotes e religiosos e pelo modo como tais situações foram enfrentadas no passado. Além disso anuncia uma Inspeção Apostólica em algumas dioceses na Irlanda, assim como em seminários e institutos religiosos irlandeses, incluindo o de Roma. Cerca de dois meses mais tarde, em 31 de maio de 2010, a Santa Sé apresenta os detalhes da Inspeção confiada a nove inspetores apostólicos.

De março de 2010 – junho de 2010. Desencadeia-se uma violenta campanha midiática contra Bento XVI sobre a pedofilia. Entre os meios de comunicações os mais agressivos são o New York Times, Der Spiegel e a Associated Press. As insinuações totalmente infundadas, são de que estaria envolvido na cobertura de padres pedófilos quando era cardeal, antes de 2001, e na transferência de um sacerdote na Arquidiocese de Munique quando era arcebispo da mesma.

17-18 de abril de 2010: 14ª Viagem Apostólica: Malta, onde encontra novamente, em 18 de abril, algumas vítimas de abusos sexuais na Igreja. Durante a voo, a propósito de abusos, o Papa afirma: “Sei que Malta ama Cristo e ama a sua Igreja que é o seu Corpo e sabe que, mesmo se este Corpo está ferido pelos nossos pecados, contudo o Senhor ama esta Igreja e o seu Evangelho é a verdadeira força que purifica e cura”.

11-14 de maio de 2010 15ª Viagem Apostólica: Portugal, onde confia à Nossa Senhora de Fátima “as esperanças e o sofrimento” da humanidade e da Igreja. Durante o voo para Lisboa a propósito da chaga da pedofilia o Papa revela: “A maior perseguição à Igreja não vem dos inimigos externos, mas nasce do pecado na Igreja, e que a Igreja, portanto, tem uma profunda necessidade de re-aprender a penitência, de aceitar a purificação, de aprender por um lado o perdão, mas também a necessidade da justiça. O perdão não substitui a justiça”.

4-6 de junho de 2010 16ª Viagem Apostólica: Chipre para a entrega do Instrumentum laboris do Sínodo para o Oriente Médio.

11 de junho de 2010 Na homilia de encerramento do Ano Sacerdotal, Bento XVI afirma: “Também nós pedimos insistentemente perdão a Deus e às pessoas envolvidas, enquanto pretendemos e prometemos fazer todo o possível para que um tal abuso não possa mais suceder”.

9 de julho de 2010: Bento XVI nomeia D. Velasio De Paolis, Delegado Pontifício para os Legionários de Cristo, com o encargo de acompanhar a Congregação em um profundo processo de revisão da sua ordem depois dos “delitos” cometidos pelo fundador Marcial Maciel.

15 de julho de 2010  A Congregação para a Doutrina da Fé reforça as "Normae de gravioribus delictis", Normas aplicativas e processuais promulgadas em 2001 durante o pontificado de João Paulo II sobre os delitos particularmente graves cometidos por sacerdotes e expoentes da Igreja, entre os quais a pedofilia. A nova normativa apresenta novidades de relevo: a passagem do prazo de prescrição de dez para vinte anos (permanecendo sempre a possibilidade de derrogação também além do mesmo prazo); a equiparação com os menores das pessoas com uso limitado de razão, e a introdução de um novo caso: a pornografia infantil. Além disso os procedimentos são acelerados e simplificados e, nos casos mais graves, pode-se apresentar ao Santo Padre a renúncia do estado clerical. Confirma-se todavia que “Deve ser dada sempre continuidade às disposições da lei civil no que se refere à remetência de crimes às autoridades competentes".

16-19 de setembro de 2010: 17ª Viagem Apostólica: Escócia e Inglaterra. O Papa celebra a beatificação do cardeal inglês John Henry Newman (1801-1890), ex-anglicano convertido ao catolicismo no século XIX e, na Westminster Hall, a sala mais antiga do parlamento inglês, pronuncia um discurso muito aplaudido sobre a paridade e a complementaridade de fé e razão, sobre o papel da religião na vida pública e sobre a exigência de um fundamento da política nos princípios éticos racionais.

Na mesma viagem, em 18 de setembro, encontra um grupo de vítimas de abusos. No mesmo dia, durante a homilia na catedral do Preciosíssimo Sangue o Papa diz: “Juntamente convosco, reconheço também a vergonha e a humilhação que todos nós sofremos por causa daqueles pecados”, enquanto que a um grupo de profissionais e de voluntários repete: “É deplorável que, em um contraste tão marcante com a longa tradição da Igreja no cuidado aos jovens, eles tenham sofrido abusos e maus-tratos por obra de alguns sacerdotes e religiosos”.

12 de outubro de 2010 Bento XVI institui o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização.

18 de outubro de 2010 Em uma extraordinária Carta aos seminaristas na conclusão do Ano Sacerdotal o Papa escreve: “Recentemente, tivemos de constatar com grande mágoa que sacerdotes desfiguraram o seu ministério, abusando sexualmente de crianças e adolescentes. Em vez de levar as pessoas a uma humanidade madura e servir-lhes de exemplo, com os seus abusos provocaram devastações, pelas quais sentimos profunda pena e desgosto”.

10-24 de outubro de 2010 Assembleia Especial para o Oriente Médio do Sínodo dos Bispos, sobre o tema “A Igreja Católica no Oriente Médio: comunhão e testemunho”. Como explica a introdução aos lineamenta, o Sínodo testemunha a atenção da Igreja universal para com as Igrejas no Oriente.

6-7 de novembro de 2010 18ª Viagem Apostólica: Espanha, com etapas em Santiago de Compostela e em Barcelona. Durante a visita, Bento XVI convida a Europa a “abrir-se cada vez mais a Deus”. Em Barcelona, visita a Basílica da Sagrada Família.

11 de novembro de 2010 Publicação da Exortação Apostólica pós-sinodal “Verbum Domini” , fruto do Sínodo sobre a Palavra de Deus em 2008.

30 de dezembro de 2010: Bento XVI publica um Motu proprio para a prevenção e contraste das atividades ilegais em campo financeiro e monetário. A nova lei impõe a todos os órgãos da Santa Sé as normas internacionais sobre os crimes econômicos e institui a Autoridade para a Informação Financeira (AIF) para o contraste da lavagem de capitais provenientes de atividades criminosas e ao financiamento do terrorismo.

2011

13 de janeiro de 2011 Bento XVI nomeia D. Leopoldo Girelli, arcebispo titular de Carpi a representante pontifício não-residente para o Vietnã. Trata-se do primeiro passo na direção do estabelecimento das relações diplomáticas entre o Vaticano e Hanói, interrompidas em 1975 depois da ocupação de Saigon.

15 de janeiro de 2011 A Congregação para a Doutrina da Fé institui um Ordinariato Pessoal para os grupo de pastores e os fiéis provenientes da Comunhão Anglicana que querem “entrar na plena e visível comunhão com a Igreja Católica”, nos termos da Constituição Apostólica “Anglicanorum Coetibus” de 2009.

10 de março de 2011 Publicação do segundo volume do livro “Jesus de Nazaré”, sobre a morte e a ressurreição de Cristo.

25 de abril de 2011: no Regina Coeli o Papa saúda a Associação Meter e reza pelas crianças vítimas da violência, da exploração e da indiferença.

1º de maio de 2011 Bento XVI proclama João Paulo II beato a apenas seis anos da sua morte.

16 de maio de 2011 Foi publicada a Carta Circular da Congregação para a Doutrina da Fé para ajudar as Conferências Episcopais na preparação de linhas diretrizes no tratamento dos casos de abuso sexual contra menores por parte de clérigos.

6 de junho de 2011 Conclusão da primeira fase da Inspeção Apostólica na Irlanda sobre os casos de pedofilia.

4-5 de junho de 2011 19ª Viagem Apostólica: Croácia por ocasião do Dia Nacional das Famílias Católicas croatas em Zagreb com o lema “Juntos em Cristo” e oração junto ao túmulo do Beato Alojzije Viktor Stepinac  (1898-1960) em Krašić.

18 de julho de 2011 Estabelecimento das relações diplomáticas entre a Santa Sé e a Malásia, país com a grande maioria de religião muçulmana.

18-21 de agosto de 2011 20ª Viagem Apostólica: Espanha por ocasião da XXVI Jornada Mundial da Juventude.

14 de setembro de 2011 No final de uma audiência entre a Congregação para a Doutrina da Fé e a direção da Fraternidade de São Pio X, a Santa Sé anuncia ter submetido à Fraternidade um “Preâmbulo doutrinal” para a aceitação do Concílio Vaticano II e do sucessivo magistério. A eventual aceitação deste preâmbulo seria uma premissa para o reconhecimento canônico da Fraternidade e para o exame teológico de algumas expressões ou formulações dos textos do Concílio Vaticano II e do magistério.

22-25 de setembro de 2011: 21ª Viagem Apostólica: Alemanha. Trata-se da sua terceira visita à sua terra natal como Pontífice. Em Berlim o Papa faz um histórico discurso ao Bundestag no qual, alerta novamente a uma “razão positivista, que se apresenta de modo exclusivista e não é capaz de perceber algo para além do que é funcional”. Em 23 de setembro em Erfurt encontra mais uma vez as vítimas de padres pedófilos e os representantes da Igreja Luterana. A propósito de pedofilia, durante sua viagem a Berlim no dia anterior ao falar com os jornalistas disse: “Distingamos, talvez, antes de tudo, a motivação específica daqueles que se sentem escandalizados por estes crimes, que se revelaram nestes últimos tempos. Posso compreender que, à luz de tais informações, sobretudo quando se trata de pessoas próximas, há quem diga: ‘Esta já não é a minha Igreja. A Igreja era para mim força de humanização e de moralização. Se representantes da Igreja fazem o contrário, já não posso viver com esta Igreja’”.

Em Friburgo o Papa pede: “uma Igreja aliviada dos elementos mundanos é capaz de comunicar aos homens precisamente no âmbito sócio-caritativo, –– tanto aos sofredores como àqueles que os ajudam –– a força vital particular da fé cristã”.

19 de outubro de 2011: O Delegado Pontifício cardeal De Paolis, apresenta as primeiras conclusões sobre os caminhos dos membros consagrados do Regnum Christi depois da Inspeção apostólica.

23 de outubro de 2011 Canonização de três beatos, subindo para 37 o número total dos santos proclamados por Bento XVI desde o início do seu pontificado. No final do pontificado serão 45.

27 de outubro de 2011  Após 25 anos de primeiro encontro pela paz convocado em Assis por João Paulo II, Bento XVI reúne na cidade de São Francisco os representantes das comunidades eclesiais e as maiores religiões do mundo.

18-20 de novembro de 2011 22ª Viagem Apostólica: Benin, por ocasião do 150º aniversário da evangelização da África ocidental e para entrega da Exortação Apostólica pós-sinodal “Africae Munus”.

21 de novembro de 2011: Carta do cardeal De Paolis com a qual o delegado pontifício para os Legionários de Cristo dá indicações sobre o caminho que os consagrados do Regnum Christi devem percorrer para modificar seu núcleo normativo.

26 de novembro de 2011 Ao receber os Bispos dos Estados Unidos em audiência, Bento XVI afirma: “Quis reconhecer pessoalmente os sofrimentos causados às vítimas e os esforços sinceros realizados para garantir a segurança das nossas crianças e para enfrentar de forma adequada e transparente as acusações de abusos, quando surgem. Espero que os esforços conscientes da Igreja a fim de abordar esta realidade possam ajudar a comunidade em geral a reconhecer as causas, a verdadeira dimensão e as consequências devastadoras dos abusos sexuais, e a responder com eficácia a este flagelo que atinge todos os níveis da sociedade. Devido à mesma razão, assim como a Igreja justamente se adapta aos padrões específicos sobre este aspecto, também todas as instituições, sem excepção, deveriam seguir as mesmas normas.

2012

18 de fevereiro de 2012 No seu 4º Consistório, Bento XVI cria 24 novos cardeais, levando a 84 os novos príncipes da Igreja nomeados sob o seu pontificado.

20 de março de 2012. A Santa Sé publica o documento conclusivo da Inspeção Apostólica, ordenada por Bento XVI na Carta aos Católicos Irlandeses depois dos escândalos de pedofilia no clero local.

23-28 de março de 2012: 23ª Viagem Apostólica: México e Cuba. Em Havana encontra Fidel Castro.

23 de maio de 2012: O mordomo do Papa, Paolo Gabriele, foi preso pela Gendarmaria vaticana com a acusação de roubo agravado de documentos reservados da Santa Sé no âmbito do escândalo Vatileaks, ou seja a fuga de informações relativas ao Papa e a alguns casos internos da Cidade do Vaticano.

24 de maio de 2012: Ettore Gotti Tedeschi pede demissão do cargo de presidente do Instituto para as Obras de Religiões (IOR), por não receber apoio do Conselho “leigo” de supervisão do IOR. Sua demissão faz parte do escândalo Vatileaks.

13 de junho de 2012: O Superior Geral da Fraternidade de São Pio X, Bernard Fellay foi recebido no Vaticano, na ocasião recebeu a avaliação da resposta ao “Preâmbulo doutrinal”, documento que a Santa Sé submeteu à Fraternidade, e que tinha sido entregue em abril. Nos meses seguintes, a perspectiva de volta da Comunidade cismática à plena comunhão com Roma será cada vez mais incerta.

17 de junho de 2012 Na mensagem vídeo por ocasião do encerramento do 50º Congresso Eucarístico Internacional em Dublin (Irlanda), Bento XVI afirma: “A gratidão e a alegria por uma história tão grande de fé e amor foram recentemente abaladas de maneira horrível pela revelação de pecados cometidos por sacerdotes e consagrados contra pessoas confiadas aos seus cuidados. Em vez de lhes mostrar o caminho para Cristo, para Deus, em vez de dar testemunho da sua bondade, abusaram delas e minaram a credibilidade da mensagem da Igreja. Como se pode explicar o facto de pessoas, que regularmente receberam o Corpo do Senhor e confessaram os seus pecados no sacramento da Penitência, terem incorrido em tais transgressões? Continua um mistério. Evidentemente, porém, o seu cristianismo já não era alimentado pelo encontro jubiloso com Jesus Cristo: tornara-se meramente uma questão de hábito”

18 de julho de 2012 Moneyval, o órgão do Conselho da Europa que avalia as normas contra a lavagem de dinheiro dos sistemas financeiros, publica o seu primeiro relatório sobre o Vaticano, no qual convida a Santa Sé a “reforçar o próprio regime de vigilância”. Todavia o sistema Vaticano resulta adequado, ou amplamente adequado em 9 das 16 recomendações centrais sobre aspectos como a reciclagem de dinheiro, as medidas de apreensão, as leis de proteção de dados pessoais, a documentação, a assistência legal recíproca, o tratamento penal ao financiamento do terrorismo, a cooperação internacional e outros. Dom Ettore Balestrero, chefe da delegação do Vaticano junto ao Moneyval, manifestou “satisfação pelos resultados alcançados, consciente de todo o trabalho que ainda deve ser feito”.

14-16 de setembro de 2012 24ª Viagem Apostólica: Líbano, na ocasião entrega a Exortação Apostólica Pós-Sinodal fruto do Sínodo para o Oriente Médio.

29 de setembro-6 de outubro de 2012 Processo a Paolo Gabriele. O mordomo infiel foi condenado pelo Tribunal do Estado da Cidade do Vaticano a 18 meses de reclusão. Em 22 de dezembro, Bento XVI lhe concederá a graça. Um mês depois, em 5 de novembro de 2012, terá início um outro processo contra o técnico de informática Claudio Sciarpelletti, também ele envolvido no caso, e que será condenado a 4 meses de reclusão, reduzidos a 2 com pena suspensa por 5 anos.

7-28 de outubro de 2012 XIII Assembleia Geral ordinária do Sínodo dos Bispos sobre o tema “A nova evangelização para a transmissão da fé cristã”.

11 de outubro de 2012 No final da procissão de velas organizada no dia de abertura do Ano da Fé, Bento XVI, afirma: “Nestes cinquenta anos aprendemos e experimentamos que o pecado original existe e que se traduz, sempre de novo, em pecados pessoais, que podem também tornar-se estruturas de pecado. Vimos que no campo do Senhor há sempre o joio. Vimos que na rede de Pedro se encontram também peixes maus. Vimos que a fragilidade humana está presente também na Igreja, que a barca da Igreja continua a navegar inclusive com vento contrário, com tempestades que ameaçam a barca, e às vezes pensamos: ‘O Senhor dorme e esqueceu-nos’”.

21 de novembro de 2012  Publicação do livro “A infância de Jesus”, o último volume da trilogia sobre Jesus escrito por Joseph Ratzinger-Bento XVI.

2013

4 de janeiro de 2013 Segundo informações da Prefeitura Pontifícia, até esta data, mais de 20 milhões de pessoas participaram às audiências, celebrações litúrgicas e à oração do Angelus na presença de Bento XVI desde o início do seu pontificado.

16 de janeiro de 2013 Bento XVI publica o Motu Proprio “Fides per doctrinam” com o qual modifica a Constituição Apostólica “Pastor Bonus” e transfere a responsabilidade sobre a catequese da Congregação para o Clero ao Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização.

11 de fevereiro de 2013 Bento XVI anuncia durante o Consistório convocado no Vaticano a sua renúncia ao Ministério Petrino que será concluído em 28 de fevereiro.

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Bento XVI:

o Papa que uniu fé e razão, esperança e caridade

Bento XVI, afirmou Papa Francisco, foi “um grande Papa” pelo “seu amor à Igreja e aos seres humanos”. Um amor que inspirou o Pontificado no qual o Pastor moderado e firme, por 8 anos, segurou – com coragem e sabedoria – o timão do Barco de Pedro, mesmo navegando em águas agitadas e com ventos contrários.

Na reportagem especial de Alessandro Gisotti, voltamos a reviver alguns dos momentos do Pontificado de Bento XVI, o Papa que, por amor à Igreja, renunciou ao Ministério Petrino.

27 de abril de 2014. Um milhão de olhares se dirige ao sagrado da Basílica de São Pedro, no Vaticano. Em maior número são aqueles que assistem ao evento em cadeia internacional: Bento XVI, o Papa emérito, abraça Francisco, o Papa reinante.

O abraço fraterno acontece sob as tapeçarias dos dois Pontífices Santos, João XXIII e João Paulo II. O primeiro remete imediatamente ao Concílio Vaticano II, onde o jovem e brilhante teólogo Joseph Ratzinger participou como conselheiro do Cardeal Frings. O segundo refere-se, naturalmente, à especial amizade e à fecunda colaboração entre o Papa polonês e o cardeal alemão. Naquele momento, impensável até um ano antes, se encerra o sentido da vida e do ministério petrino de Papa Bento XVII.

O dia memorável dos “quatro Papas”

Dois Papas que celebram dois Papas santos: são as manchetes dos jornais em todo o mundo. Um evento quase inacreditável. Mas “inacreditável” já tinha sido o primeiro sentimento com o qual o mundo inteiro tinha escutado estas palavras, em 11 de fevereiro de 2013:

“Conscientia mea iterum atque iterum coram Deo explorata ad cognitionem certam perveni vires meas ingravescente aetate non iam aptas esse ad munus Petrinum aeque administrandum…” (11 de fevereiro de 2013)

A Renúncia pelo amor à Igreja

Um conhecido teólogo italiano afirma – com sinceridade – que “não estamos preparados para um Papa que se demite”. Reação que une crentes e não-crentes, e levanta um dilúvio de comentários e declarações quase como se se fosse obrigado a dizer alguma coisa para acalmar a inquietação gerada por um evento imprevisível. Ainda mais enunciado numa língua, o latim, que na era do hi tech parece um eco que soa da pré-história.

Quando, porém, se deposita o pó erguido pelo terremoto – que teve seu epicentro na Sala do Consistório do Palácio Apostólico – a figura do Pastor é que permanece em pé e que, para o bem do seu rebanho, não tem medo de escolher uma estrada nunca antes percorrida:

“Queridos irmãos e irmãs, como sabem, decidi… (aplausos)… Obrigado pela simpatia… (aplausos)… Decidi renunciar ao ministério que o Senhor me confiou em 19 de abril de 2005. Fiz isso em plena liberdade para o bem da Igreja, depois de ter rezado por muito tempo e de ter examinado diante de Deus a minha consciência, bem consciente da gravidade desse ato, mas também consciente de já não estar em condições de prosseguir no ministério petrino com aquela força ele exige.” (Audiência Geral de 13 de fevereiro de 2013)

São passadas 48 horas do clamoroso anúncio quando Bento XVI pronuncia essas palavras e abre a porta do seu coração aos fiéis, reunidos na Sala Paulo VI, de maneira que possam aproximar-se aos seus sentimentos. Então se começa a compreender que a Renúncia do Papa não é nenhum “abandono”, mas, ao contrário, um ato supremo de amor a Cristo, inspirado pelo Espírito Santo.

Não deixo a Cruz, servirei à Igreja em oração

Depois de poucas horas da conclusão do seu ministério, em 27 de fevereiro, na sua última Audiência Geral, Bento XVI reitera che não está deixando a Cruz, “mas à serviço da oração” permanece, “por assim dizer, no recinto de São Pedro”. Naquele mesmo dia, o Papa encontra os purpurados que se preparam ao Conclave. Entre eles, está inclusive o Cardeal Bergoglio. Para todos o Pontífice tem palavras de afeto e incentivo:

“Que o Senhor lhes mostre aquilo que é da vontade dEle. E, entre os senhores, no Colégio dos cardeais, está também o futuro Papa, ao qual prometo, já de hoje, a minha reverência incondicional e obediência.” (Encontro com os cardeais em 28 de fevereiro de 2013)

Um humilde trabalhador na Vinha do Senhor

A humildade de Bento XVI comove, mas não surpreende, porque é bem essa a virtude que sempre o caracterizou, como o mundo já pôde apreciar das primeiras palavras pronunciadas depois da eleição como Sucessor de Pedro:

“Queridos irmãos e irmãs, depois do grande Papa João Paulo II... (aplausos)... os senhores cardeais me elegeram, um simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor. Consola-me o fato de que o Senhor sabe trabalhar e agir também com instrumentos insuficientes. E, sobretudo, confio nas suas orações. Na alegria do Senhor ressuscitado, confiantes do seu apoio permanente, vamos em frente. O Senhor nos ajudará, e Maria, Sua Santíssima Mãe, está do nosso lado.” (19 de abril de 2005)

Um trabalhador humilde a quem a coragem não falta. “O pastor moderado e firme” enfrenta com excepcional determinação alguns escândalos que surgiram na Igreja, como a terrível ferida dos abusos sexuais em menores por parte de membros do clero. Bento XVI é o primeiro Pontífice que encontra as vítimas desse crime horrível: e faz sem clamor, longe dos refletores, em Malta, nos Estados Unidos, na Austrália e no Reino Unido.

Dispõe novas regras que assegurem uma “tolerância zero” àqueles que se mancham desse delito. E, no Ano Sacerdotal, há 150 anos da morte de Curato d’Ars, envoca uma nova transparência. As suas palavras têm a força de uma profecia:

“Devemos encontrar uma nova resolução na fé e no bem. Devemos ser capazes de penitência. Devemos nos esforçar para tentar tudo o que for possível, na preparação do sacerdócio, para que uma coisa semelhante não aconteça mais. Mas este também é o lugar para agradecer de coração todos aqueles que se comprometem em ajudar as vítimas e em dar, novamente a elas, a confiança na Igreja, na capacidade de acreditar na sua mensagem.” (20 de dezembro de 2010)

Pastor moderado e firme, comprometido com a transparência

Bento XVI expressa a mesma determinação no processo de renovação do Ior e da gestão das atividades econômicas no Vaticano. E isso, mesmo com os sofrimentos, inclusive pessoais, que deverá suportar por causa do escândalo “Vatileaks”. Mais uma vez, atinge a brandura do Papa que perdoa o assistente de quarto que lhe tinha roubado documentos privados. Um gesto que lembra o perdão de João Paulo II a Ali Agca.

Mesmo empenhado em reagir à crise e imprevistos, o Pontificado de Bento XVI será pró-ativo e inovativo em muitos aspectos, como demonstra também a instituição de um Ordinariado pessoal para os anglicanos que entram em plena comunhão com a Igreja Católica, depois da publicação da Constituição “Anglicanorum Coetibus”.

Nasce o “Pátio dos Gentios”, dialogar com os não-crentes

O Papa leva adiante o confronto com os não-crentes e acelera a nova evangelização para combater “a eclipse de Deus”. Convicto, como o seu amado Santo Agostinho que a opção cristã é “aquela mais racional”, Papa Bento lança a ideia de um “Pátio dos Gentios” (Cortile dei gentili), um espaço privilegiado de diálogo com os “distantes”:

“Ao diálogo com as religiões se deve acrescentar hoje, sobretudo, o diálogo com aqueles pelos quais a religião é uma coisa estranha, aos quais Deus não é conhecido e que, todavia, não gostariam de ficar simplesmente sem Deus, mas aproximá-lo ao menos como Desconhecido.” (21 de dezembro de 2009)

Peregrino no mundo, do Ground Zero à Mesquita Azul

O humilde trabalhador da vinha planta sementes inclusive no terreno do diálogo inter-religioso. Visita as sinagogas de Roma, Colônia e Nova Iorque, e convoca um novo Dia pela Paz em Assis, em outubro de 2011, aberta não somente aos homens de fé, mas também aos não-crentes.

Também com o mundo muçulmano, depois da incompreensão desencadeada por uma citação no discurso de Ratisbona, o diálogo se reforça graças inclusive à carta aberta de 38 “sábios muçulmanos” que se transformam em 138 e, depois, em 216, para encontrar um terreno comum de encontro. O que sintetiza esse diálogo renovado é a imagem de Bento XVI que, na Mesquita Azul, se recolhe em meditação ao lado do Imam de Istambul.

“Permanecendo alguns minutos em recolhimento naquele lugar de oração, me dirigi ao único Senhor do céu e da terra, Pai misericordioso da inteira humanidade. Possam todos os crentes se reconhecer como suas criaturas e dar testemunho de verdadeira fraternidade!” (Audiência Geral de 6 de dezembro de 2006)

O diálogo ecumênico merece um capítulo especial. Papa Bento recolhe frutos importantes: encontra várias vezes o Patriarca de Constantinopla Bartolomeu I e abre uma nova fase de relações com o Patriarcado Ortodoxo de Moscou. Altamente simbólica foi a visita a Erfurt, no convento agostiniano de Martinho Lutero, e o encontro em Londres com Rowan Williams, da Comunidade Anglicana.

Enfim, todas as 24 viagens internacionais de Bento XVI deixam um sinal: daquele comovente no Líbano, onde encontra os jovens sírios refugiados, àquele histórico em Nova Iorque, onde reza no Ground Zero e fala às Nações Unidas. De Camarões ao Brasil, da Austrália a Cuba, o Papa visita nos seus 8 anos de Pontificado todos os 5 “continentes geográficos”.

Em Auschwitz, como filho da Alemanha

Difícil escolher um momento em tantos, mas claramente a visita de um Papa, “filho da Alemanha” ao campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, tem um valor extraordinário:

“Papa João Paulo II veio aqui como filho do povo polonês. Eu estou aqui hoje como filho do povo alemão e, justamente por isso, devo e posso dizer como ele: não podia não vir aqui. Tinha que vir. Era e é um dever perante a verdade e ao direito de tantos que sofreram, um dever diante de Deus, de estar aqui como sucessor de João Paulo II e como filho do povo alemão.” (29 de maio de 2006)

“Colaborador da Verdade”, como diz o seu lema episcopal, Papa Bento é também testemunha de Caridade. Os cristãos perseguidos em tantos lugares do mundo encontram nele um baluarte seguro. É o primeiro Pontífice a falar de “cristianofobia” e a denunciar as violações da liberdade religiosa, como acontece no Paquistão com a lei da blasfêmia.

Através do Cor Unum está na linha de frente para ajudar as populações atingidas pelas guerras e desastres naturais. Emocionantes as suas visitas aos pobres, aos idosos, aos doentes na Itália e no exterior, em especial, aos pequenos pacientes do Hospital Bambino Gesù, de Roma, e ao Hospital Caritas Baby, de Belém.

No Brasil, vai encontrar os jovens toxicodependentes da Fazenda da Esperança. Na Jordânia, nos Estados Unidos e na Espanha visita os portadores de deficiência dos centros de assistência. Gestos que enaltecem como, aos olhos de Deus, cada pessoa seja única e preciosa.

Um magistério global, das Encíclicas ao Twitter

De outro lado, justamente ao amor cristão dedica a sua primeira Encíclica Deus Caritas est (2006). Seguem, então, Spe Salvi, sobre a esperança, e Caritas in Veritate (2009), sobre o desenvolvimento humano integral. Essa chegou a ser lida pelos operadores de Wall Street: em meio à crise econômica mundial que começou nos Estados Unidos, oferece a reflexão original da Igreja para colocar a pessoa no centro das dinâmicas econômicas:

“Não devemos esquecer… como lembravo na Encíclica Caritas in veritate, que também no campo da economia e das finanças há intenção, transparência e busca de bons resultados compatíveis e que nunca devem ser dissociados.” (10 de dezembro de 2011)

Além das três Encíclicas, o Papa publica também 4 Exortações Apostólicas pós-sinodais e 19 motu proprio, entre eles, o Summorum Pontificum, sobre a liturgia e a histórica carta dirigida aos católicos chineses, de 2007.

Inovador é o seu livro-entrevista “Luz do mundo”, em que oferece a sua visão a 360° sobre os desafios da Igreja, e a trilogia sobre Jesus de Nazaré – um best seller mundial, no qual Joseph Ratzinger oferece a sua pesquisa de crente sobre a figura histórica de Jesus.

Mas o surpreendente é, sobretudo, a convicção com a qual o teólogo Bento se encaminha pelas estradas da comunicação, inexploradas por um Papa. Em ocasião da JMJ, envia um sms ao jovens do mundo inteiro, se conecta via satélite com os austronautas de uma estação espacial e assina um editorial para o Financial Times.

Sobretuto encoraja a mídia católica e vaticana a evangelizar o “continente digital”. E dá o bom exemplo abrindo, em 2012, a conta no Twitter, @Pontifex:

“Hoje somos chamados a descobrir, também na cultura digital, símbolos e metáforas significativas para as pessoas que possam ser de ajuda ao falar do Reino de Deus ao homem contemporâneo.” (28 de fevereiro de 2011 – Discurso ao Pontifício Conselho das Comunicações Sociais)

A Igreja se comprometa com as famílias feridas, na esteira do Concílio

E, ao homem contemporâneo, Bento XVI não deixa de lembrar da sacralidade da vida, da beleza do matrimônio natural entre um homem e uma mulher, da urgência da liberdade educativa. Aqueles valores que não mudam com o tempo e, por isso, “não são negociáveis”.

A família é um dos temas que mais importa ao Papa que vê com particular atenção os casais feridos, de quem viveu o drama de uma separação. Significativas também, considerando o caminho sinodal sucessivo a pedido de Francisco, as palavras que Bento XVI pronuncia no Encontro Mundial das Famílias em Milão, em 2012:

“Parece-me uma grande tarefa de uma paróquia, de uma comunidade católica, a de fazer realmente o possível para que eles se sintam amados, aceitados, que não estão ‘fora’, mesmo se não podem receber a absolvição e a Eucaristia; devem saber que, assim mesmo, vivem plenamente na Igreja.” (3 de junho de 2012)

Uma igreja que Bento XVI serviu por toda a sua vida, desde jovem e brilhante teólogo até como Sucessor de Pedro, tendo sempre como “bússola” o Concílio Vaticano II que – e são palavras suas – “permite à Igreja de proceder em mar aberto”. (AG/AC)

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A biografia de Bento XVI

Jospeh Ratzinger recebeu a Ordenação Sacerdotal em 29 de junho de 1951. Em 25 de março de 1977, o Papa Paulo VI nomeou-o arcebispo de München e Freising. Em 28 de maio seguinte, recebeu a sagração episcopal. Paulo VI criou-o cardeal no Consistório de 27 de junho desse mesmo ano.

O cardeal Joseph Ratzinger, Papa Bento XVI, nasceu em Marktl am Inn, Diocese de Passau (Alemanha), no dia 16 de abril de 1927 (Sábado Santo), e foi batizado no mesmo dia. O seu pai, comissário da polícia, provinha duma antiga família de agricultores da Baixa Baviera, de modestas condições econômicas. A sua mãe era filha de artesãos de Rimsting, no lago de Chiem, e antes de casar trabalhara como cozinheira em vários hotéis.

Passou a sua infância e adolescência em Traunstein, uma pequena localidade perto da fronteira com a Áustria, a trinta quilômetros de Salisburgo. Foi neste ambiente, por ele próprio definido “mozarteano”, que recebeu a sua formação cristã, humana e cultural.

O período da sua juventude não foi fácil. A fé e a educação da sua família prepararam-no para enfrentar a dura experiência daqueles tempos, em que o regime nazista mantinha um clima de grande hostilidade contra a Igreja Católica. O jovem Joseph viu os nazistas açoitarem o pároco antes da celebração da Santa Missa.

Precisamente nesta complexa situação, descobriu a beleza e a verdade da fé em Cristo; fundamental para ele foi a conduta da sua família, que sempre deu um claro testemunho de bondade e esperança, radicada numa conscienciosa pertença à Igreja.

Até o mês de setembro de 1944 esteve alistado nos serviços auxiliares anti-aéreos.

Recebeu a Ordenação Sacerdotal em 29 de junho de 1951.

Um ano depois, começou a sua atividade de professor na Escola Superior de Freising.

No ano de 1953, doutorou-se em teologia com a tese “Povo e Casa de Deus na doutrina da Igreja de Santo Agostinho”. Passados quatro anos, sob a direcção do conhecido professor de teologia fundamental Gottlieb Söhngen, conseguiu a habilitação para a docência com uma dissertação sobre “A teologia da história em São Boaventura”.

Depois de desempenhar o cargo de professor de teologia dogmática e fundamental na Escola Superior de Filosofia e Teologia de Freising, continuou a docência em Bonn, de 1959 a 1963; em Münster, de 1963 a 1966; e em Tubinga, de 1966 a 1969. A partir deste ano de 1969, passou a ser catedrático de dogmática e história do dogma na Universidade de Regensburg, onde ocupou também o cargo de Vice-Reitor da Universidade.

De 1962 a 1965, prestou um notável contributo ao Concílio Vaticano II como “perito”; viera como consultor teológico do Cardeal Joseph Frings, Arcebispo de Colônia.

A sua intensa atividade científica levou-o a desempenhar importantes cargos ao serviço da Conferência Episcopal Alemã e na Comissão Teológica Internacional.

Em 25 de março de 1977, o Papa Paulo VI nomeou-o Arcebispo de München e Freising. A 28 de maio seguinte, recebeu a sagração episcopal. Foi o primeiro sacerdote diocesano, depois de oitenta anos, que assumiu o governo pastoral da grande arquidiocese bávara. Escolheu como lema episcopal: “Colaborador da verdade”; assim o explicou ele mesmo: “Parecia-me, por um lado, encontrar nele a ligação entre a tarefa anterior de professor e a minha nova missão; o que estava em jogo, e continua a estar – embora com modalidades diferentes –, é seguir a verdade, estar ao seu serviço. E, por outro, escolhi este lema porque, no mundo atual, omite-se quase totalmente o tema da verdade, parecendo algo demasiado grande para o homem; e, todavia, tudo se desmorona se falta a verdade”.

Paulo VI criou-o cardeal, do título presbiteral de “Santa Maria da Consolação no Tiburtino”, no Consistório de 27 de junho desse mesmo ano.

Em 1978, participou no Conclave, celebrado de 25 a 26 de agosto, que elegeu João Paulo I; este nomeou-o seu Enviado especial ao III Congresso Mariológico Internacional que teve lugar em Guayaquil (Equador) de 16 a 24 de setembro. No mês de outubro desse mesmo ano, participou também no Conclave que elegeu João Paulo II.

Foi Relator na V Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos realizada em 1980, que tinha como tema “Missão da família cristã no mundo contemporâneo”, e Presidente Delegado da VI Assembleia Geral Ordinária, celebrada em 1983, sobre “A reconciliação e a penitência na missão da Igreja”.

João Paulo II nomeou-o Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e Presidente da Pontifícia Comissão Bíblica e da Comissão Teológica Internacional, em 25 de novembro de 1981. No dia 15 de fevereiro de 1982, renunciou ao governo pastoral da arquidiocese de München e Freising. O Papa elevou-o à Ordem dos Bispos, atribuindo-lhe a sede suburbicária de Velletri-Segni, em 5 de abril de 1993.

Foi Presidente da Comissão encarregada da preparação do Catecismo da Igreja Católica, a qual, após seis anos de trabalho (1986-1992), apresentou ao Santo Padre o novo Catecismo.

A 6 de novembro de 1998, o Santo Padre aprovou a eleição do Cardeal Ratzinger para Vice-Decano do Colégio Cardinalício, realizada pelos Cardeais da Ordem dos Bispos. E, no dia 30 de novembro de 2002, aprovou a sua eleição para Decano; com este cargo, foi-lhe atribuída também a sede suburbicária de Óstia.

Em 1999, foi como Enviado especial do Papa às celebrações pelo XII centenário da criação da diocese de Paderborn, Alemanha, que tiveram lugar a 3 de janeiro.

Desde 13 de novembro de 2000, era Membro honorário da Academia Pontifícia das Ciências.

No dia 6 de fevereiro de 2013, durante o Consistório Ordinário Público para a canonização de alguns Santos, anunciou a decisão de renunciar ao ministério petrino com estas palavras: “Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idóneas para exercer adequadamente o ministério petrino. Estou bem consciente de que este ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras e com as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando. Todavia, no mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor este, que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado. Por isso, bem consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade, declaro que renuncio ao ministério de Bispo de Roma, Sucessor de São Pedro”.

O seu pontificado se concluiu em 28 de fevereiro de 2013.

Em seguida, Bento XVI foi morar na Cidade do Vaticano, junto ao Mosteiro “Mater Ecclesiae”, como Papa Emérito.

Na Cúria Romana, foi Membro do Conselho da Secretaria de Estado para as Relações com os Estados; das Congregações para as Igrejas Orientais, para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, para os Bispos, para a Evangelização dos Povos, para a Educação Católica, para o Clero, e para as Causas dos Santos; dos Conselhos Pontifícios para a Promoção da Unidade dos Cristãos, e para a Cultura; do Tribunal Supremo da Signatura Apostólica; e das Comissões Pontifícias para a América Latina, “Ecclesia Dei”, para a Interpretação Autêntica do Código de Direito Canónico, e para a revisão do Código de Direito Canónico Oriental.

Entre as suas numerosas publicações, ocupam lugar de destaque o livro “Introdução ao Cristianismo”, uma compilação de lições universitárias publicadas em 1968 sobre a profissão de fé apostólica, e o livro “Dogma e Revelação” (1973), uma antologia de ensaios, homilias e meditações, dedicadas à pastoral.

Grande ressonância teve a conferência que pronunciou perante a Academia Católica Bávara sobre o tema “Por que continuo ainda na Igreja?”; com a sua habitual clareza, afirmou então: “Só na Igreja é possível ser cristão, não ao lado da Igreja”.

No decurso dos anos, continuou abundante a série das suas publicações, constituindo um ponto de referência para muitas pessoas, especialmente para os que queriam entrar em profundidade no estudo da teologia. Em 1985 publicou o livro-entrevista “Informe sobre a Fé” e, em 1996, “O sal da terra”. E, por ocasião do seu septuagésimo aniversário, publicou o livro “Na escola da verdade”, onde aparecem ilustrados vários aspectos da sua personalidade e da sua obra por diversos autores.

Recebeu numerosos doutoramentos “honoris causa”: pelo College of St. Thomas em St. Paul (Minnesota, Estados Unidos), em 1984; pela Universidade Católica de Eichstätt, em 1987; pela Universidade Católica de Lima, em 1986; pela Universidade Católica de Lublin, em 1988; pela Universidade de Navarra (Pamplona, Espanha), em 1998; pela Livre Universidade Maria Santíssima Assunta (LUMSA, Roma), em 1999; pela Faculdade de Teologia da Universidade de Wroclaw (Polônia) no ano 2000.

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                                                                                                                       Fonte: vaticannews.va