com mais de 200 bispos de todo o Brasil
e reflexão do cardeal Tolentino Mendonça
Bispos de todo o
Brasil reuniram-se virtualmente nesta quarta-feira, 25 de novembro. Este é o
encontro que reuniu mais membros do episcopado durante este ano de 2020, quando
não foi possível realizar a 58ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB) presencialmente, por conta da pandemia do novo
coronavírus. São mais de 200 bispos num total de 297 pessoas, compreendendo
assessores das comissões episcopais e representantes de pastorais e organismos vinculados
à CNBB.
A primeira parte
do encontro virtual foi uma meditação conduzida pelo cardeal português José
Tolentino de Mendonça, arquivista do Arquivo Apostólico do Vaticano e
bibliotecário da Biblioteca Apostólica Vaticana. Sua pregação partiu “da pausa
reflexiva que Jesus faz em seu discurso”, considerando o contexto da pandemia
que o mundo enfrenta na atualidade, “a dureza, a dificuldade, o pesado e
sofrido o caminho que o povo de Deus está fazendo nessa hora”.
Essa pausa citada
por dom Tolentino é um tipo de comunicação que Jesus utiliza algumas vezes nos
Evangelhos, “como que precisasse escutar melhor, ajustar o discurso à
realidade”. O cardeal então toma do capítulo 13 do Evangelho de São Lucas o
versículo 18: “’A que é semelhante o Reino de Deus, e com que poderei
compará-lo?’”.
Chamando a
aprender e a valorizar este recurso, o cardeal apontou três aprendizados. O
primeiro é que nem sempre é fácil interpretar a realidade em tantas situações
nas quais o real “resiste ao nosso modo de o descrever. A realidade põe em
crise nosso discurso”.
O segundo elemento
é que para explicar o Reino de Deus e a vida dos homens em profundidade, nós
precisamos de parábolas, de comparações. “As parábolas, sobretudo num tempo
difícil como esse, abrem espaço para um discurso não teórico, mas existencial e
não simbólico”. Na sequência, dom Tolentino cita a recente encíclica do Papa
Francisco, Fratelli Tutti, que “parte da pandemia para indicar o caminho da
Igreja e do mundo”.
A terceira lição é
que “a finalidade do discurso eclesial deve ser ganhar corações para o Reino de
Deus, em vez de ficar em exercícios de retórica”. Para o cardeal, a retórica
esconde a realidade debaixo das palavras, o que é diferente da persuasão
evangélica. Esta, procura gerar no sujeito a autoconsciência da sua história, o
kairós dentro do cronos. “Este momento dramático é também o momento do kairós,
momento de salvação e de graça. A interrogação de Jesus mostra como é
necessária uma hermenêutica profética da história”, afirmou.
O cardeal José Tolentino
seguiu com as reflexões sobre a necessidade de fazer perguntas neste contexto
da pandemia, incentivando que seja levada para os encontros orantes “a grande
tarefa de fazer ecoar as perguntas e entender essa hora como hora de sintonizar
o espaço reflexivo e orante que Jesus nos ensina”. A figura do Papa Francisco
também foi destacada como aquele que tem ajudado a Igreja com uma série de
parábolas, como o momento de oração realizado em março na praça de São Pedro
vazia.
“Ele quis fazer aquele momento de oração na
praça de São Pedro vazia. É como se o mundo estivesse vazio, como se as ruas
estivessem despejadas, todos os espaços públicos vazios, aquele vazio era o
vazio que a humanidade e a Igreja estavam sentindo. O vazio tornou-se uma
parábola. Uma das parábolas que o Papa quis abraçar, em vez de negar, é a
parábola do vazio, da dificuldade”, refletiu, apontando na sequência o texto
Evangelho sobre a tempestade acalmada.
“Um elemento chave
é o fato de todos estarem juntos na mesma barca. O Papa explorou também essa
parábola, de estarmos todos no mesmo barco, a remar juntos. E todos precisamos
de mútuo encorajamento. Então, naquela simbólica celebração, o Papa ofereceu
duas imagens, uma lê evangelicamente a outra”, disse.
Comunicados
As atividades da
manhã desta quarta-feira, após a meditação do cardeal Tolentino, consistiram em
comunicados e partilhas. O arcebispo de Belo Horizonte (MG) e presidente da
CNBB, dom Walmor Oliveira de Azevedo, recordou as diversas iniciativas da
Igreja no Brasil durante a pandemia, comparando com o “broto de esperança” do
tronco de Jessé da promessa no livro do profeta Isaías.
“Cada irmão bispo,
cada diocese, com seus evangelizadores e ministros, nesse tempo de pandemia,
com muitas respostas bonitas de confiança e trabalhos realizados. E nessa hora,
cada um pode repassar esses meses exigentes, sobretudo o sofrimento dos pobres,
dos sofredores, das famílias enlutadas. Tudo isso é um broto de esperança que
colocamos diante de Deus”, afirmou.
Dom Walmor citou
iniciativas como os avanços em torno do tema central da próxima Assembleia
Geral da CNBB; o trabalho de gestão na sede e nos regionais da conferência, com
“avanços importantes” do ponto de vista do equilíbrio administrativo e
financeiro; a implementação do Pacto pela Vida e pelo Brasil; a presença da
CNBB no Observatório de Direitos Humanos do Poder Judiciário; e o processo de
construção do novo estatuto da CNBB.
Mensagem ao Papa e
ao povo brasileiro
Os bispos também
preparam uma mensagem que será enviada para o Papa Francisco, como é realizado
a cada ano, por ocasião das assembleias gerais. O arcebispo de São Paulo (SP),
cardeal Odilo Pedro Scherer, coordenou a construção do texto que está baseado
na proximidade dos bispos do Brasil com o Papa e no agradecimento pela
proximidade do Santo Padre com o Brasil. Uma mensagem ao povo brasileiro
por conta da pandemia do novo coronavírus também foi preparada pelos bispos.
Ação evangelizadora
da Igreja na pós pandemia
No período da
tarde, a reunião dos bispos seguiu com uma reflexão da teóloga e
professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, Maria
Clara Bingemer. Coube à professora apresentar pontos para uma reflexão sobre a
ação evangelizadora da Igreja num cenário pós pandemia. Ela destacou cinco
pontos: a) Retomar o luto com o olhar pascal; b) Parceria mais estreita com a
ciência; c) Abrir mais espaço para a beleza e arte como elementos para
reencantar os corações; d) Revalorizar o espaço doméstico e a experiência da
Igreja nas casas; e) Cuidado da terra e cuidado com a casa comum.
Partilhas
Na sequência da
reunião, os bispos deram continuidade da primeira parte de uma série de
partilhas sobre as atividades de Comissões, regionais e pastorais iniciada pela
manhã. A presidência da CNBB apresentou uma atualização da campanha É Tempo de
Cuidar e também um balanço sobre a gestão administrativo-financeira da CNBB no
contexto da pandemia.
.........................................................................................................................................................................
Em Mensagem ao Povo de Deus, CNBB reforça
a Esperança, a Caridade,
e Missão da Igreja no
Brasil no contexto da Pandemia
A Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) emitiu, como resultado da reunião
realizada na quarta-feira, 25 de novembro, uma Mensagem ao Povo Brasileiro
em tempo de pandemia. O documento foi referendado pelos mais de 200 bispos, num
total de 297 pessoas, compreendendo assessores das comissões episcopais e
representantes de pastorais e organismos vinculados à CNBB que participaram da
reunião.
A mensagem busca
refletir sobre a presença e missão da Igreja na realidade brasileira e
expressar uma mensagem de esperança e proximidade no contexto do novo
Coronavírus. O documento destaca ainda que a Igreja no Brasil é impelida a
perseverar na caridade, dando continuidade, nas paróquias, comunidades
eclesiais missionárias e instituições religiosas de todo país, das redes de
solidariedade em defesa da vida que se multiplicaram-se neste ano em razão da
pandemia.
“Como discípulos missionários, queremos crescer nesse tempo difícil, empenhados em remover as desigualdades e sanar a injustiça. A humanidade aguarda uma vacina que, distribuída com equidade, possa ajudar a garantir a vida e a saúde para todos”, diz um trecho do documento.
............................................................................................................................................................................
Mensagem ao Povo
de Deus em tempo de pandemia
Amado Povo de
Deus, nós bispos do Brasil, reunidos num encontro virtual para refletir sobre a
atual presença e missão da Igreja, queremos expressar nossa mensagem de
esperança e proximidade.
Neste ano irrompeu
inesperadamente a pandemia da COVID19, alterando nossas rotinas, revelando
outras enfermidades de nosso tempo e causando grande impacto num já fragilizado
sistema de saúde, na seguridade social, nos sistemas produtivos, na educação,
na vida familiar, social e religiosa em geral. O Papa Francisco alerta que “a
tribulação, a incerteza, o medo e a consciência dos próprios limites, que a
pandemia despertou, fazem ressoar o apelo a repensar os nossos estilos de vida,
as nossas relações, a organização das nossas sociedades e, sobretudo, o sentido
da nossa existência”. (Fratelli Tutti, 33)
Estamos num tempo
de muitos questionamentos e cabe-nos escutar o que o Espírito tem a dizer para
a Igreja (Ap 2,7) nesse contexto. A provação tem favorecido importantes
aprendizados e oportunidades para a vivência e o anúncio do Evangelho.
Reconhecemos, com gratidão, o empenho de tantas comunidades cristãs que foram
criativas para manter a ação evangelizadora, especialmente pelas mídias
sociais, promovendo a transmissão de celebrações litúrgicas, catequeses e
aconselhamento aos fiéis. A Igreja doméstica foi fortalecida, em sintonia com
as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora, que promovem a comunidade cristã
como Casa da Palavra, do Pão, da Caridade e da Missão. Percebe-se o
protagonismo dos leigos e, especialmente, das mulheres na promoção da Igreja
nas casas.
Igualmente somos
impelidos pelo Evangelho a perseverar na caridade. Nas paróquias, comunidades
eclesiais missionárias e instituições religiosas de todo país, multiplicaram-se
as redes de solidariedade em defesa da vida. Por isso, foi coloca em prática a
ação solidária É Tempo de Cuidar, voltada a atender demandas de primeira
necessidade das pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social
no contexto da pandemia. Unidos a outras entidades da sociedade civil, estamos
buscando concretizar o Pacto pela Vida e pelo Brasil, conclamando toda a
sociedade para que, nesse tempo de pandemia, ninguém seja deixado para trás.
Como nos tem provocado
o Papa Francisco, precisamos escutar o clamor das famílias, trabalhar por uma
economia “mais atenta aos princípios éticos” (Fratelli Tutti, 170), oferecer
uma política melhor, sem desvios na garantia do bem comum, propor uma educação
humanista e solidária, comprometidos na permanente construção da democracia. É
urgente combater o racismo que se dissimula, mas não cessa de reaparecer.
(Fratelli Tutti, 20) Queremos assegurar a vida desde a concepção até a morte
natural, preservar o meio ambiente e trabalhar em defesa das populações
vulneráveis, particularmente indígenas e quilombolas. Preocupa-nos o
crescimento das várias formas de violência, entre elas, o feminicídio. “Cada
ato de violência cometido contra um ser humano é uma ferida na carne da humanidade;
cada morte violenta “diminui-nos” como pessoas”. (Fratelli Tutti, 227)
Como discípulos
missionários, queremos crescer nesse tempo difícil, empenhados em remover as
desigualdades e sanar a injustiça. A humanidade aguarda uma vacina que,
distribuída com equidade, possa ajudar a garantir a vida e a saúde para todos.
Pedimos que Deus
acolha junto a Si os que morreram neste tempo e dê consolação e paz às famílias
enlutadas. Abençoamos especialmente os incansáveis profissionais da saúde, os
professores, os cuidadores e todos que atuam em serviços essenciais. Nossa
prece também pelos presbíteros, diáconos permanentes, consagrados e
consagradas, leigos e leigas de nossas igrejas, para que se sintam encorajados.
O Advento é um
tempo de renovar nossa esperança. Confiantes, afirmamos que a fé em Cristo
nunca se limitou a olhar só para trás nem só para o alto, mas olhou sempre
também para a frente (Spe Salvi, 41). Não desanimemos, não estamos sozinhos: o
Senhor está conosco!
Acompanhe-nos a
Santa Mãe de Deus, Senhora Aparecida, consolo dos aflitos, saúde dos enfermos e
esperança nossa! Invocamos sobre todos a bênção da Santíssima Trindade, que sua
misericórdia continue fortalecendo e animando o povo brasileiro.
Brasília-DF, 25 de
novembro de 2020
Confira em formato pdf, a íntegra da mensagem
Nenhum comentário:
Postar um comentário