Insistências do Papa Francisco
A presença entre
nós do Papa Francisco se constituiu em abundante semeadura. Cabe a nós agora
cultivar essas sementes, a começar pelas mais necessárias para a caminhada de
renovação eclesial em que nos encontramos.
Dom Demétrio Valentini |
Uma primeira
insistência é de ordem espiritual, e propõe uma atitude de muita confiança na
misericórdia de Deus. No começo, parecia que esta insistência na misericórdia
divina era meramente circunstancial, em vista do “domingo da misericórdia” que
estava sendo celebrado no início do seu pontificado. Mas logo se percebeu que
ultrapassava as circunstâncias concretas, e se constituía em mensagem central
do Evangelho. E não deixa de ser verdade que a misericórdia divina faz parte
do núcleo central do Evangelho de Cristo. A própria Igreja precisa assumir “as
entranhas maternas da misericórdia”.
Outra
insistência do Papa Francisco está ligada à simplicidade, à transparência e à
pobreza. A começar pelo testemunho que ele transmitiu, deixando bem claro que
ele não se identifica com ambientes de elite, onde prevalecem a ostentação e o
luxo. Foi enfático em advertir que não fica bem para as pessoas consagradas
para estarem ao serviço do povo se valham desta situação para buscar aparências
superficiais e enganosas.
A constatação de
que o próprio Deus se faz de necessitado, mostra o alcance desta atitude de
desprendimento e simplicidade. “Deus entra pelo subterfúgio de quem
mendiga”. Deus se faz de necessitado, para facilitar a acolhida e o
diálogo.
Outra
insistência se refere à “conversão pastoral”, que reiteradas vezes apareceu em
suas homilias. A recomendação concreta enfatiza a importância da proximidade
que a Igreja precisa ter face às pessoas e à sociedade. “A proximidade toma
forma de diálogo, e cria a cultura do encontro”. São dimensões que fazem pensar
nas situações cotidianas que envolvem a pastoral, e que precisam caracterizar a
postura da Igreja, chamada a criar espaços de diálogo e oportunidades de
encontro.
“Eu te darei as chaves do Reino dos Céus...” |
Uma insistência
“revolucionária” foi expressa pelo Papa Francisco em forma de abertura
missionária. A Igreja precisa “abrir as portas”, não só para acolher bem os que
a procuram, mas sobretudo para sair de si mesma, e ir ao encontro dos que estão afastados, ou mesmo já separados da própria Igreja.
Por aí passa a
mudança radical que o Papa está propondo. Se for assumida, mudam as
perspectivas eclesiais. De uma Igreja acuada e refugiada em suas próprias
estruturas, se passaria para uma Igreja que vai ao encontro das pessoas e da
sociedade, se faz próxima, e se coloca ao serviço das grandes causas do
Evangelho.
Na verdade, a
grande insistência do Papa se traduz na proposta de uma Igreja que deixa de ser
“auto referencial”, de ter a si mesma como medida para sua ação. Mas que, ao
contrário, escuta os apelos e os desafios que a realidade de hoje lhe
apresenta, para aí situar o sentido de sua presença e de sua atuação.
Ele fala numa
Igreja “descentrada”, que deixa de ter suas estruturas como referência, mas se
situa na “periferia”, e a partir da periferia ela pode reencontrar sua
verdadeira identidade e sua missão própria.
É importante
perceber como o Papa situou suas recomendações no horizonte da “Conferência de
Aparecida” com sua proposta de realizar uma “missão continental”, colocando a
Igreja em “estado permanente de missão”.
Tudo indica que
este documento, com o Papa Francisco, assumirá significado mundial,
ultrapassando os limites de sua destinação original para o continente latino
americano. Neste contexto, deciframos melhor o que o Papa quis nos dizer com
suas valiosas homilias.
Dom
Demétrio Valentini - Bispo de Jales (SP)
Fonte: www.cnbb.org.br Foto e ilustração: www.a12.com
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