Roma (RV) – O Papa Francisco deixou na manhã desta quinta-feira o Vaticano transferindo-se para a Sede da FAO, a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação para participar da Segunda Conferência Internacional sobre Nutrição. O Papa foi recebido pelo Diretor-Geral do organismo, o brasileiro José Graziano da Silva e pela Diretora-Geral da OMS, Organização Mundial da Saúde, Dra. Margaret Chan. No discurso pronunciado aos Representantes de governos de todas as partes do mundo, Francisco saudou a decisão de reunir nesta Conferência representantes de Estados, instituições internacionais, organizações da sociedade civil, do mundo da agricultura e do setor privado, com a finalidade de estudar juntos as formas de intervenção para garantir a nutrição, assim como as mudanças necessárias que devem ser acrescentadas às estratégias atuais.
A Igreja, -
continuou o Papa - como vocês sabem, sempre procura estar atenta e solícita em
relação a tudo o que se refere ao bem-estar espiritual e material das pessoas,
primeiramente das que vivem marginalizadas e estão excluídas, para que sua
segurança e dignidade sejam garantidas.
Francisco
recordou que os destinos de cada nação estão mais do que nunca entrelaçados
entre si, como os membros de uma mesma família, que dependem uns dos outros.
Porém, - advertiu - vivemos numa época em que as relações entre as nações estão
demasiadas danificadas pela suspeita recíproca, que às vezes se converte em
formas de agressão bélica e econômica, mina a amizade entre irmãos e rechaça ou
descarta quem já está excluído. E quem conhece bem esta realidade – afirmou - é
quem carece do pão cotidiano e de um trabalho decente.
Esta é a
situação do mundo, em que é preciso reconhecer os limites de visões baseadas na
soberania de cada um dos Estados, entendida como absoluta, e nos interesses
nacionais, condicionados frequentemente por poucos grupos de poder.
O Santo Padre
citando a elaboração de novas normas e maiores compromissos para alimentar o
mundo, disse esperar que, na formulação desses compromissos, os Estados se
inspirem na convicção de que o direito à alimentação só será garantido se nos
preocuparmos com o sujeito real, ou seja, com a pessoa que sofre os efeitos da
fome e da desnutrição. E o Papa Francisco faz uma constatação:
“Hoje em dia se
fala muito em direitos, esquecendo com frequência os deveres; talvez nos
preocupemos muito pouco com os que passam fome. Além disso, dói constatar que a
luta contra a fome e a desnutrição é dificultada pela «prioridade do mercado» e
pela «preeminência da ganância», que reduziram os alimentos a uma mercadoria
qualquer, sujeita à especulação, inclusive financeira. E enquanto se fala de
novos direitos, o faminto está aí, na esquina da rua, e pede um documento de
identidade, ser considerado em sua condição, receber uma alimentação de base
saudável. Pede-nos dignidade, não esmola”.
Estes critérios
– continuou o Papa - não podem permanecer no limbo da teoria. Pessoas e povos
exigem que a justiça seja colocada em prática; não apenas a justiça legal, mas
também a contributiva e a distributiva.
Em seguida o
Papa citou o interesse pela produção, a disponibilidade de alimentos e o acesso
a eles; citou ainda as mudanças climáticas, o comércio agrícola, que devem
certamente inspirar regras e medidas técnicas, mas a primeira preocupação deve
ser a própria pessoa, aquelas que carecem de alimento cotidiano e que deixaram
de pensar na vida, nas relações familiares e sociais e lutam apenas pela
sobrevivência.
Recordando a
presença do Santo Papa João Paulo II, na inauguração da sala onde se realizou a
Primeira Conferência sobre Nutrição, em 1992, citou o seu predecessor que
alertou a comunidade internacional para o risco do “paradoxo da abundância”:
existe comida para todos, mas nem todos podem comer, enquanto o desperdício, o
descarte, o consumo excessivo e o uso de alimentos para outros fins estão sob
nossos olhos. Infelizmente, este “paradoxo” continua sendo atual.
O Papa citou
então dois desafios a serem superados no que diz respeito à fome. O primeiro: a
manipulação de dados, estatísticas, as exigências de segurança nacional, a
corrupção ou lamentos melancólicos sobre a crise econômica.
O segundo
desafio que se deve enfrentar é a falta de solidariedade. Nossas sociedades -
disse Francisco - se caracterizam por um crescente individualismo e pela
fragmentação; isto termina privando os mais frágeis de uma vida digna e
provocando revoltas contra as instituições. Quando falta a solidariedade em um
país, todos ressentem.
Também os
Estados, concebidos como uma comunidade de pessoas e de povos, se fossem
exortados a atuar de comum acordo, estariam dispostos a ajudar-se uns aos
outros, mediante princípios e normas que o direito internacional coloca à sua
disposição.
O Papa indica
como fonte inesgotável de inspiração, a lei natural, inscrita no coração
humano, que fala uma linguagem que todos podem entender: amor, justiça, paz,
elementos inseparáveis entre si. Como as pessoas, também os Estados e as
instituições internacionais são chamadas a acolher e cultivar estes valores, no
espírito de diálogo e escuta recíproca. Deste modo, o objetivo de nutrir a
família humana se torna factível.
Francisco chama
então a atenção para o fato que cada mulher, homem, criança, idoso, deve poder
contar com estas garantias. E é dever de todo Estado, atento ao bem-estar de
seus cidadãos, subscrevê-las sem reservas, e preocupar-se com a sua aplicação.
A Igreja
Católica procura oferecer também neste campo sua contribuição, através de uma
atenção constante à vida dos pobres em todos os lugares do planeta; nesta mesma
linha se insere o envolvimento ativo da Santa Sé nas organizações internacionais
e com seus múltiplos documentos e declarações.
O Papa pede
então critérios para o desenvolvimento de um sistema internacional equânime.
Critérios que, no plano ético, se baseiam em pilares como a verdade, a
liberdade, a justiça e a solidariedade; ao mesmo tempo, no campo jurídico, estes
mesmos critérios incluem a relação entre o direito à alimentação e o direito à
vida e a uma existência digna, o direito a ser protegidos pela lei, nem sempre
próxima à realidade de quem passa fome, e a obrigação moral de partilhar a
riqueza econômica do mundo.
O Papa precisou
mais uma vez que nenhuma forma de pressão política ou econômica na
disponibilidade de alimentos pode ser aceitável. Mas, acima de tudo, nenhum
sistema de discriminação, de fato ou de direito, vinculado à capacidade de
acesso ao mercado dos alimentos, deve ser tomado como modelo das ações
internacionais que se propõem a eliminar a fome.
O Papa concluiu
fazendo um apelo à comunidade internacional para que saiba escutar o chamado
desta Conferência e considere esse chamado uma expressão da comum consciência
da humanidade: dar de comer aos famintos para salvar a vida no planeta. (SP)
Fonte: radiovaticana.va
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