Atenção, muita atenção!
Entrando no tempo do desejo
Frei Almir Guimarães
♦ Quatro semanas, vinte e poucos dias nos separam da comemoração do nascimento de Jesus. Os fatos são conhecidos e a fé nos diz que o Deus altíssimo e belo resolveu armar sua tenda entre nós. Somos convidados a fazer brotar em nós o desejo de Deus. Importante que o Natal do Senhor penetre em nossa vida e na vida da Igreja. Não pode ser uma comemoração rotineira e vazia de seu significado. Fundamental que nos abismemos diante de tão grande maravilha: o Altíssimo se faz presente na fragilidade humana.
♦ Elredo de Rielvaux, monge, afirma: “Determinou a Igreja com sabedoria que no tempo do Advento recitemos as palavras dos que antecederam a primeira vinda do Senhor e revivamos os seus desejos. E não celebramos o seu desejo só por um dia, mas por tempo mais prolongado, pois o objeto de nossos desejos, quando tarda, parece ao chegar, mais doce ao nosso amor”.
Desejo, anelo, esperança e expectativas perpassam a liturgia e devem acompanhar as batidas de nosso coração nessa quadra do ano. Não queremos viver um dezembro nas coisas que se repetem monótona e rotineiramente: compras, bolas coloridas, enfeites, presentes, almoço de Natal, panettone, missa do galo, roupa nova, ‘pisca-pisca chinês’, as mesmas coisas sempre as mesmas coisas. “Então é Natal!”
Alimentar o desejo de Deus. Tudo está feito e pressentimos que tudo precisa ser refeito. Falta plenitude em nossa vida pessoal, tudo está por acabar, há sempre este gosto de insatisfação, do inacabado. Somos convidados a vigiar. Caminhar serenamente pela vida mas cuidado de ter atenção. Atenção às visitas inesperadas do Senhor.
Viver despertos:
>> Significa seguir de verdade os passos de Jesus: seguimento.
>> Não cair no ceticismo e na indiferença diante da marcha do mundo: não se entregar ao pessimismo.
>> Não deixar que nosso coração endureça: delicadeza interior, sensibilidade.
>> Alimentar a esperança das pessoas desalentadas.
>> Atrever-nos a ser diferentes, sem afetação, crer na força do Evangelho vivido.
>>Não deixar que se apague o nosso desejo de buscar o bem para todos.
>> Viver com paixão a pequena aventura de cada dia.
>> Continuar a fazer pequenos gestos que aparentemente não servem para nada.
♦ Pagola tem palavras contundentes, mas que precisamos ouvir: “Um dos riscos que ameaçam nossa fé é cair numa vida superficial, mecânica, rotineira… Não é fácil escapar. Com o passar dos anos, os projetos, as metas, as ideias de muita gente acabam apagando-se. Não poucos acabam levantando-se cada dia “só para ir levando a vida”. O apelo de Jesus à vigilância nos chama a despertar da indiferença, da passividade ou do descuido com que vivemos frequentemente nossa fé. Para vivê-la de maneira lúcida precisamos conhecê-la mais profundamente, confrontá-la com outras atitudes possíveis perante a vida e procurar vive-las com todas as suas consequências. É muito fácil viver dormindo. Basta fazer o que todos fazem: imitar, amoldar-nos, ajustar-nos ao que está na moda. Basta viver buscando segurança externa ou interna. Basta defender o nosso pequeno bem-estar enquanto a vida vai se apagando em nós” (cf. Pagola, Lucas, p.213-214).
♦ Não é possível que as expressões de nossa fé se resumam ao cumprimento de ritos e à observância de meia dúzia de prescrições. Será preciso dar um espaço dentro de nós para acolhimento do mistério da encarnação. Precisamos um pouco ou muito de lentidão. José Tolentino Mendonça fala da urgência da lentidão que pode se traduzir em atenção para as visitas do Senhor: “Passamos pelas coisas sem as habitar, falamos com os outros sem os ouvir, juntamos informações que nunca chegamos a aprofundar. Tudo transita num galope ruidoso. Na verdade, a velocidade em que vivemos, impede-nos de viver”. O Natal não pode passar como num galope ruidoso. Afinal de contas, é a chegada no humano daquele que os espaços não podem conter.
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Texto seleto
Senhor, eis-nos à espera.
No fundo de nossas correrias, no coração desses dias agitados, que nos dividem literalmente ao meio, entre mil pequenas tarefas e mil pequenos pensamentos, há um silêncio que soletra o teu nome.
No fundo nós sabemos que só um Deus pode nos salvar.
Pode até ser que no meio de tanto ruído, que te dispensamos.
Pode até ser que não tenhamos a força dos verdadeiros gestos do Natal.
Mas eis-nos à espera,
Acredita que, por vezes, enquanto trocamos cartões, augúrios, presentes há um momento em que nossas mãos ficam vazias, fixas no ar, como se rezassem.
É quando te pedimos que faças brilhar em nós a estrela luminosa do teu Natal.
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Para refletir
Vigiar as visitas do Senhor com velas acesas:
Deixando que as mensagens dos acontecimentos alegres ou os apertos do coração possam apontar para insinuações do Senhor.
Sem nos desesperar com incômodos remorsos, servir-se deles para jogar-se no Senhor.
Saber que ele nos visita numa palavra ouvida ou lida que ressoa fortemente em nosso interior.
Na habitual convivência com a Palavra.
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FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.
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