Sou um Papa com o coração de pároco
Cidade do
Vaticano (RV) - A paz no Oriente Médio, a Igreja a serviço dos pobres, a
reforma do Vaticano e ainda a renúncia de Bento XVI, Pio XII e o Holocausto e
as deficiências do atual sistema econômico mundial. São alguns dos temas
principais abordados pelo Papa Francisco numa longa entrevista concedida ao
jornal espanhol "La Vanguardia", publicada nesta sexta-feira.
O Papa diz
querer ser recordado "como uma boa pessoa que fez o possível". E
sobre a Copa do Mundo, iniciada esta quinta-feira, brinca: "Os brasileiros
me pediram para ser neutro e eu mantenho a palavra". Apresentamos aqui
algumas passagens candentes da entrevista.
A violência em
nome de Deus "é uma contradição" que "não corresponde a nosso
tempo": afirma o Pontífice no início da entrevista. Francisco denuncia o
fundamentalismo, risco presente em todas as religiões e se detém sobre "a
invocação em favor da paz" com os presidentes israelense e palestino.
Sacerdote, profeta e pastor |
O Santo Padre
revela que no início, no Vaticano, "99% diziam que o encontro não se
realizaria, depois o 1% cresceu". Não era "absolutamente um ato
político", evidencia, mas um "ato religioso" a fim de
"abrir uma janela para o mundo".
Ademais, o Papa
chama a atenção para a questão do antissemitismo: "é uma loucura negar o
Holocausto". E afirma que "não se pode ser um verdadeiro cristão, se
não reconhece as próprias raízes judaicas".
O diálogo entre
cristãos e judeus, observa, é "um desafio, uma batata quente, mas se pode
fazer como irmãos". Quanto ao Papa Pio XII, Francisco se diz certo de que
a abertura dos Arquivos fará muitas elucidações.
"Sobre o
pobre Pio XII" – observa – devemos recordar que antes era visto como o
grande defensor dos judeus". E recorda que escondeu muitos deles nos
conventos de Roma e de outras cidades italianas, e também na residência de
verão de Castel Gandolfo.
"Não quero
dizer que Pio XII não tenha cometido erros, eu mesmo cometo muitos – admite o
Pontífice – porém, o seu papel deve ser lido no contexto de sua época."
Em seguida,
Francisco responde a uma pergunta sobre a Igreja e os pobres. A "pobreza e
a humildade – recorda – estão no centro do Evangelho", em "sentido
teológico, sociológico". "Não se pode compreender o Evangelho –
reitera – sem pobreza, que, porém, se deve distinguir do pauperismo." Os
bispos, acrescenta, devem ser "servidores" e não
"príncipes".
O Santo Padre
denuncia alguns males do sistema econômico mundial, no centro do qual – observa
– "colocamos o dinheiro" e assim caímos "no pecado da
idolatria". Reitera que jovens e anciãos são tratados como
"descarte" e se diz muito preocupado com o desemprego entre os
jovens.
Na Europa,
observa, existem 75 milhões de jovens desempregados e essa "é uma
barbárie". O Papa denuncia que "para manter um sistema econômico que
não está mais de pé" se deve "fazer a guerra" e visto que
"não se pode fazer a III guerra Mundial", então "se fazem
guerras locais". Assim, adverte, "se fabricam e se vendem armas"
para "sanar os balanços das economias idólatras".
O Bispo de Roma
detém-se, em seguida, sobre a reforma da Cúria. "Não tenho nenhuma iluminação,
não tenho nenhum projeto pessoal", afirma: "O que estou fazendo é
realizar aquilo que os cardeais refletiram nas Congregações Gerais antes do
Conclave".
Uma decisão
importante, evidencia, "tinha sido que o futuro Papa deveria poder contar
com um conselho externo, um grupo de conselheiros que não vivesse no
Vaticano". O que agora é chamado de o "Conselho dos 8".
Francisco
responde também a uma pergunta se se sente um "revolucionário". Para
mim, afirma, "a grande revolução é ir às raízes", "creio que o
modo para fazer verdadeiras mudanças é partir da identidade".
A propósito do
fato de ser percebido como um pároco do povo, reconhece que a dimensão do
pároco é a que mais responde à sua vocação. "Servir ao povo – ressalta é
algo que vem de dentro de mim." "Mas – observa – me sinto também
Papa. Ajuda-me a fazer as coisas com seriedade."
"Não se
deve brincar de Papa-pároco – acrescenta –, seria imaturo. Quando chega um
chefe de Estado, devo recebê-lo com a dignidade e o protocolo que merece. É
verdade que tenho meus problemas com o protocolo, porém, deve ser
respeitado."
Por outro lado,
Francisco admite que não quer barreiras quando se trata de encontrar as
pessoas. "Sei que alguma coisa me pode acontecer – reconhece –, porém tudo
está nas mãos de Deus." O Pontífice recorda que no Brasil lhe haviam
preparado o papamóvel fechado. "Porém – afirma – não posso cumprimentar um
povo e dizer-lhe que o amo estando dentro de uma lata de sardinha",
"isso para mim é um muro". (RL)
Fonte: radiovaticana.va
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