"Ouso dizer: a Igreja nunca esteve tão bem como hoje"
Cidade do
Vaticano (RV) – “Mesmo agora que sou Papa me sinto ainda um sacerdote”.
Esta é uma das passagens chaves do diálogo que o Papa Francisco teve, na manhã
desta segunda-feira, com os sacerdotes da Diocese de Roma, a sua Diocese,
reunidos na Basílica São João de Latrão. A acolher o Papa, 20 minutos antes do
previsto, foi o Cardeal Vigário Agostino Vallini, que na sua saudação comentou
que este encontro foi programado pelo novo Bispo de Roma, logo após ter sido
eleito.
Sinto-me ainda sacerdote |
“O que é o
cansaço para um Sacerdote, para um Bispo e mesmo para o Bispo de Roma?” O Papa
Francisco desenvolveu o seu pronunciamento introdutivo, detendo-se neste
questionamento. E confiou que a inspiração lhe veio após ler a carta enviada
por um sacerdote idoso, que justamente lhe falava sobre este cansaço, um “cansaço
no coração”. “Existe – disse o Papa – um cansaço do trabalho e isto todos
conhecemos. Chegamos de noite, cansados de trabalhar e passamos diante do
Tabernáculo para saudar o Senhor. Sempre – advertiu – é necessário passar pelo
Tabernáculo”:
“Quando um
sacerdote está em contato com o seu povo, se cansa. Quando um padre não está em
contato com o seu povo, se cansa, mas mal e para dormir deve tomar um
comprimido, não? Ao invés disso, aquele que está em contato com o povo – que de
fato o povo tem tantas exigências, tantas exigências! Mas são as exigências de
Deus, não? – este cansa realmente e não tem necessidade de tomar comprimidos”.
Existe, porém,
um “cansaço final” – prosseguiu Francisco – que se vê antes do “crespúsculo da
vida” onde “existe a luz escura e o escuro um pouco luminoso”. É “um cansaço
que vem no momento em que deveria existir o triunfo”, mas ao invés disto “vem
este cansaço”. Isto – afirmou – acontece quando “o sacerdote se questiona sobre
sua existência, olha para trás, ao caminho percorrido e pensa nas renúncias,
aos filhos que não teve e se pergunta se não errou, se a sua vida “falhou”. É
justamente sobre o “cansaço do coração” de que o sacerdote escrevia na carta.
O Papa citou
então, o cansaço em tantas figuras bíblicas, de Elias a Moisés, de Jeremias até
João Batista. Este último, afirmou, na “escuridão da prisão” vive o “escuro de
sua alma” e manda os seus discípulos perguntarem a Jesus se Ele é realmente
aquele que estão esperando. O que pode fazer então um sacerdote que vive a
experiência de João Batista? Rezar, “até dormir diante do Tabernáculo, mas
estar ali”. E depois “procurar a proximidade com os outros padres, e sobretudo,
com os bispos”:
“Nós, Bispos,
devemos ser próximos aos sacerdotes, devemos ser caridosos com o próximo e os
mais próximos são os sacerdotes. Os mais próximos do Bispo são os sacerdotes.
(aplausos). Vale também o contrário, eh! (risos e aplausos): o mais próximo dos
padres deve ser o bispo, o mais próximo. A caridade para com o próximo, o mais
próximo é o meu bispo. O Bispo diz: os mais próximos são os meus padres. É
bonita esta troca, não? Isto, acredito, é o momento mais importante da
proximidade, entre o bispo e os sacerdotes: este momento sem palavras, porque
não existem palavras para este cansaço”.
A partir deste
ponto, iniciou-se o diálogo do Papa Francisco com os sacerdotes, aos quais
pediu para sentirem-se livres para perguntar qualquer coisa. Respondendo à
primeira pergunta, o Papa Francisco disse que no serviço pastoral, não deve se
“confundir a criatividade com fazer alguma coisa nova”. A criatividade –
afirmou – “é buscar o caminho para que o Evangelho seja anunciado” e isto “não
é fácil”. Criatividade “não é somente mudar as coisas”. É uma outra coisa, vem
do Espírito e se faz com a oração e se faz falando com os fiéis, com as
pessoas. O Papa, então, recordou uma experiência vivida quando era Arcebispo de
Buenos Aires. Com um sacerdote, disse, procurava entender como tornar a sua
igreja mais acolhedora:
“Ah, se passa
tanta gente aqui, talvez seria bonito que a igreja ficasse aberta durante todo
o dia...Boa idéia! Também seria bonito que tivesse sempre um confessor à
disposição, alí...Boa idéia! E assim foi”.
Esta –
acrescentou – é uma ‘corajosa criatividade’. Também em relação aos cursos em preparação
ao Batismo “é necessário superar o obstáculo dos pais e das mães que trabalham
toda a semana e no domingo gostariam de repousar”. Então, é necessário “buscar
novos caminhos”, como uma “missão no bairro” promovida pelos leigos. E esta é a
“conversão pastoral”. A Igreja, “também o Código de Direito canônico nos dá
tantas, tantas possibilidades, tanta liberdade para buscarmos estas coisas”. É
necessário – destacou – procurar os momentos de acolhida, quando os fiéis devem
ir à paróquia por um motivo ou outro. E criticou severamente quem, numa
paróquia, está mais preocupado em pedir dinheiro por um certificado que pelo
Sacramento e assim “afastam as pessoas”. É necessário, ao invés disto, “a
acolhida cordial”: “que aquele que venha à igreja se sinta como na sua casa. Se
sinta bem. Que não se sinta explorado”:
“Um sacerdote,
uma vez – não da minha Diocese, de uma outra -, me dizia: ‘Mas, eu não faço
pagar nada, nem mesmo as intenções da Missa. Tenho alí uma caixa e eles deixam
aquilo que querem. Mas Padre: tenho quase o dobro do que tinha anteriormente.
Porque as pessoas são generosas, e Deus abençoa estas coisas’.
“Se, ao invés
disto, a pessoa vê que existe um interesse econômico, então se afasta”,
observou Francisco. O Papa então, respondeu a quem lhe perguntava como ele se
define agora, visto que, como Arcebispo de Buenos Aires, gostava definir-se
simplesmente como ‘sacerdote’:
“Mas, eu me
sinto padre, é sério. Eu me sinto padre, sacerdote, é verdade, bispo...Me sinto
assim, não? E agradeço ao Senhor por isto. (aplausos) Teria medo de sentir-me
um pouco mais importante, não? Isto sim, tenho medo disto, pois o diabo é
esperto, eh!, é esperto e te faz sentir que agora tu tem poder, que tu pode
fazer isto, que tu podes fazer quilo...mas sempre girando, girando em volta,
como um leão – assim diz São Pedro, não! Mas graças a Deus, isto não perdi,
ainda, não? E se vocês virem que eu perdi isto, por favor, me digam e se não
puderem me dizer privadamente, digam publicamente, mas digam: ‘Olha,
converta-te!’, porque está claro, não?” (aplausos)|
Após, o Santo
Padre falou sobre os sacerdotes misericordiosos. Um padre enamorado – disse –
deve sempre recordar-se do primeiro amor, de Jesus, “retornar àquela fidelidade
que permanece sempre e nos espera”. Para mim, isto é “o ponto-chave de um
sacerdote enamorado: que tenha a capacidade de voltar à recordação do primeiro
amor”. E acrescentou: “uma Igreja que perde a memória, é uma Igreja eletrônica:
não tem vida”. Assim, é necessário guardar-se dos padres rigorosos e negligentes.
O sacerdote misericordioso – afirmou – é aquele que diz a verdade, mas
acrescenta: “Não te apavores, o Deus bom te espera, Caminhemos juntos”. A isto
acrescentou: “devemos tê-lo sempre sob os olhos: acompanhar. Ser companheiros
de caminho”. “A conversão sempre se faz assim – disse – a caminho e não no
laboratório”.
“A verdade de
Deus é esta verdade, digamos assim dogmática, para dizer uma palavra, ou moral,
mas acompanhada do amor e da paciência de Deus, sempre assim”.
“Na Igreja –
acrescentou - existem certos escândalos, mas também tanta santidade e esta é
maior. E existe também esta “santidade cotidiana”, escondida, “aquela santidade
de tantas mães e de tantas mulheres, de tantos homens que trabalham todo o dia
pela família”. Palavras estas acompanhadas de um encorajadora convicção:
“Eu ouso dizer
que a Igreja nunca esteve tão bem como hoje. A Igreja não cai: estou seguro
disto, estou seguro!”
O Papa então,
voltou ao tema das periferias existenciais, retomando as suas palavra sobre
“conventos vazios” e a generosidade para com os mais necessitados. Por fim,
refletiu sobre o tema da família, e em particular, sobre a delicada questão da
nulidade dos matrimônios e sobre as segundas uniões. "Um problema –
recordou – que Bento XVI tinha no seu coração". “O problema não pode ser
reduzido à questão do fazer a comunhão ou não - afirmou - porque quem coloca o
problema somente nestes termos não entende qual é o verdadeiro problema”.
“É um problema
grave – observou - de responsabilidade da Igreja em relação às famílias que
vivem esta situação”. A Igreja – afirmou ainda – neste momento deve fazer
alguma coisa para resolver os problemas das nulidades matrimoniais. Um tema
sobre o qual falará com o grupo dos 8 Cardeais que se reunirão nos primeiros
dias de outubro, no Vaticano. E será tratado também no próximo Sínodo dos
Bispos, pois é uma verdadeira "periferia existencial”.
Por fim, o Papa
Francisco recordou que no próximo 21 de setembro ocorre o 60º aniversário de
sua vocação ao sacerdócio. (JE)
Fonte: www.radiovaticana.va..................................................................................................................................
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