sábado, 7 de setembro de 2024

Reflexão para seu dia:

Não fechar-nos ao mistério da vida

José Antonio Pagola

Albert Camus descreveu como poucos o vazio da vida monótona de cada dia. Escreve assim em “O mito de Sísifo”: “Acontece que todos os cenários vêm abaixo. Levantar-se, o bonde, quatro horas de repartição pública ou escritório, almoço, bonde, quatro horas de trabalho, descanso, dormir, e a segunda-terça-quarta-quinta-sexta-sábado, sempre o mesmo ritmo, seguindo o mesmo caminho de sempre. Um dia surge o ‘porquê’ e tudo volta a começar no meio desse cansaço tingido de admiração”.

Não é difícil sintonizar com os sentimentos do escritor francês. Às vezes é a vida monótona de cada dia que nos formula, em toda a sua rudeza, as interrogações mais profundas de nosso ser: “Tudo isto para quê? Para que vivo? Vale a pena viver assim? Tem sentido esta vida?

O risco é sempre a fuga. Enclausurar-nos sem mais na ocupação de cada dia. Viver sem interior idade. Caminhar sem bússola. Não refletir. Perder, inclusive, o desejo de viver com mais profundidade.

Não é tão difícil viver assim. Basta fazer o que quase todos fazem. Seguir a corrente. Viver de maneira mecânica. Substituir as exigências mais radicais do coração por todo tipo de “necessidades” supérfluas. Não escutar nenhuma outra voz. Permanecer surdos a qualquer chamado profundo.

O relato da cura do surdo-mudo é um chamado à abertura e à comunicação. Aquele homem surdo e mudo, fechado em si mesmo, incapaz de sair de seu isolamento, precisa deixar que Jesus trabalhe seus ouvidos e sua língua. A palavra de Jesus ressoa também hoje como um imperativo para cada um: “Abre-te”.

Quando não escuta os anseios mais humanos de seu coração, quando não se abre ao amor, quando, em suma, se fecha ao Mistério último que nós crentes chamamos “Deus”, a pessoa se separa da vida, se fecha à graça e tapa as fontes que a poderiam fazer viver.

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JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.

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                                                        Fonte: franciscanos.org.br       Banner: Frei Fábio M. Vasconcelos

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