domingo, 5 de outubro de 2025

Reflexão para este domingo:

A audácia de crer

José Antonio Pagola

Há alguns anos, o filósofo e sociólogo de origem belga C. Lévi-Strauss fazia uma declaração que reflete bem a atitude agnóstica de não poucos contemporâneos: “Não me sinto preocupado com o problema de Deus; para mim é absolutamente tolerável viver consciente de que nunca poderei explicar-me a totalidade do universo”. Para este tipo de agnósticos, o universo está aí como uma realidade “inexplicável”, cuja origem e fundamento resultam insondáveis, mas diante desta realidade só sentem despreocupação e falta de interesse.

Nós crentes nos distinguimos destes agnósticos não porque tentemos dizer “algo” sobre Deus, enquanto eles negam o que nós confessamos. Não está aí o fundo da questão. A pergunta sobre o mistério do universo parece inevitável para todos. A característica própria dos crentes, ao contrário dos agnósticos, é que nós nos atrevemos a abandonar-nos confiantemente a esse Mistério que subjaz à “totalidade do universo”.

Como dizia Karl Rahner, este “abandonar-nos” próprio da fé é “a máxima ousadia do homem”. Uma partícula ínfima do cosmos se atreve a relacionar-se com a “totalidade incompreensível e fundante do universo” e, além disso, o faz confiando absolutamente em seu poder e em seu amor. Nós, cristãos, precisamos conscientizar-nos mais da audácia inaudita implicada no ato de atrever-nos a confiar no mistério de Deus.

A mensagem mais nuclear e original de Jesus consistiu precisamente em convidar o ser humano a confiar incondicionalmente no Mistério insondável que está na origem de tudo. É isto que ressoa em seu anúncio: “Não tenhais medo. Confiai em Deus. Chamai-o Abbá, Pai querido. Ele cuida de vós. Até os cabelos de vossa cabeça estão contados. Tende fé em Deus”.

Esta fé radical em Deus está na base de toda oração. Orar não é uma ocupação a mais entre muitas outras possíveis. É a ação mais séria e fundamental da pessoa, pois na oração nos aceitamos a nós mesmos em nosso mistério mais profundo como criaturas que têm sua origem e fundamento em Deus.

O ser humano está se afastando hoje de Deus não porque esteja convencido de sua não existência, mas porque não se atreve a abandonar-se confiantemente a Ele. O primeiro passo para a fé consistiria, para muitos, em prostrar-se diante do Mistério insondável do universo e atrever-se a dizer com confiança: “Pai”. Nestes tempos em que esta confiança parece debilitar-se, nossa oração deveria ser a que os discípulos dirigem a Jesus: “Aumenta-nos a fé”.

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JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.

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                                          Fonte: franciscanos.org.br   Banner: Frei Fábio M. Vasconcelos

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