sábado, 7 de outubro de 2023

Bela reflexão:

O perigo de calar a voz dos profetas

José Antonio Pagola

Quando no ano 70 as tropas romanas destruíram Jerusalém e o povo judeu desapareceu como nação, os cristãos fizeram uma leitura terrível deste fato trágico. Israel, aquele povo tão querido por Deus, não soube responder a seus apelos. Seus dirigentes religiosos foram matando os profetas enviados por Ele; crucificaram, por último, seu próprio Filho. Agora, Deus os abandona e permite sua destruição: Israel será substituído pela Igreja cristã.

Assim liam os primeiros cristãos a Parábola dos “Vinhateiros Homicidas”, dirigida por Jesus aos sumos sacerdotes de Israel. Os lavradores encarregados de cuidar da “vinha do Senhor” vão matando um depois do outro os criados que ele envia para recolher os frutos. Por último matam também o filho do proprietário, com a intenção de suprimir o herdeiro e ficar com a vinha. O senhor não pode fazer outra coisa senão dar-Ihes a morte e entregar sua vinha a outros lavradores mais fiéis.

Esta parábola não foi coligida pelos evangelistas para alimentar o orgulho da Igreja, novo Israel, diante do povo judeu, derrotado por Roma e disperso por todo o mundo. A preocupação era outra: será que pode acontecer com a Igreja cristã o mesmo que sucedeu ao antigo Israel? Pode ela defraudar as expectativas de Deus? E se a Igreja não produz os frutos que Deus espera, que caminhos Ele seguirá para realizar seus planos de salvação?

O perigo é sempre o mesmo. Israel se sentia seguro: tinha as Sagradas Escrituras, possuía o templo, celebrava escrupulosamente o culto, pregava a Lei e defendia as instituições. Não parecia necessário nada de novo. Bastava conservar tudo em ordem. É o mais perigoso que pode acontecer a uma religião: que ela faça calar a voz dos profetas e que os sacerdotes, sentindo-se os donos da “vinha do Senhor”, queiram administrá-la como propriedade deles. Este é também o nosso perigo: pensar que a fidelidade da Igreja está garantida porque ela pertence à Nova Aliança; sentir-nos seguros por termos Cristo como propriedade. Mas Deus não é propriedade de ninguém. Sua vinha pertence só a Ele. E, se a Igreja não produz os frutos que Ele espera, Deus continuará abrindo novos caminhos de salvação.

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JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.

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                                              Fonte: franciscanos.org.br       Banner: Fr. Fábio M. Vasconcelos

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