domingo, 2 de janeiro de 2022

Reflexões para o Domingo da Epifania do Senhor:

Dos que buscam a casa de Deus

Frei Almir Guimarães

Hoje, os Magos que o procuravam resplandecente nas estrelas, o encontram no berço. Hoje, os Magos veem claramente, envolvido em panos, aquele que há muito tempo procuravam de modo obscuro nos astros (São Pedro Crisólogo).

Domingo da Epifania, domingo dos Magos. Desde nossa infância esses personagens misteriosos foram pedindo licença para ocupar lugar importante de nossa atenção. Havia o presépio das coisas singelas e simples e, de repente, alguém tirava de uma caixa de papelão esses senhores com pompa e coroas, montados em camelos e dando uma tonalidade um tanto grandiosa ao presépio do frágil menino. Ficamos sabendo que eram três. Chegou-se mesmo a dar-lhes nomes: Melchior, Gaspar e Baltasar. Mateus é o único evangelista a mencionar esses personagens que povoaram de cores e luzes nossa imaginação de crianças. O evangelista simplesmente diz que eram Magos e nada mais. Depois, bem depois, místicos e espirituais, nos disseram que eram buscadores de Deus, peregrinos da casa de Deus. Que significado tem esse episódio para nós?

“É nossa própria história, história de nossa peregrinação sem fim, quem deciframos através dos doze versículos do evangelho de Mateus que nos falam desse magos vindos da longínqua Babilônia, guiados pela estrela, obstinados vencedores da imensidão dos desertos como da indiferença e da política na terra em que nasceu o Menino, chegando finalmente a encontrar a Criança e adorar o Deus salvador. É nossa história que lemos ou, dizendo melhor, que devíamos ler neste relato. Não somos todos peregrinos e viajantes, pessoas sem domicilio fixo mesmo quando nunca deixamos nossa casa? Vejam como o tempo passa, como os dias terminam, como a mudança é lei eterna de nossa existência, como estamos sempre indo para frente. Se sinceros somos podemos nos descrever como peregrinos…

O profeta Isaías, na primeira leitura desta solenidade tem palavras de ânimo e de alento. “Levanta-te, acende as luzes Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor. Eis que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos; mas sobre ti apareceu o Senhor e a sua glória já se manifesta sobre ti. Os povos caminham à tua luz e os reis, ao clarão de tua aurora” (Is 60, 1-3). Luz, claridade, estrela… Os passos desses buscadores da casa de Deus serão guiados pela estrela.

O Menino deitado nas palhas, no despojamento total, é a verdadeira luz que ilumina a todo homem que vem a este mundo. Veio para todo o orbe. Vemos, com a chegada dos Magos, a procissão dos estrangeiros e dos diferentes que buscam a Deus guiados pela estrela. Os Magos representam homens e mulheres que carregam questionamentos e interrogações, que se sentem mal com uma vida vivida pela metade, que querem um sentido de vida pujante, que têm sede de plenitude. Fazem parte do grupo daqueles que Agostinho designa de gente de coração inquieto.

“Hoje os contemplam maravilhados, no presépio, o céu na terra, a terra no céu, o homem em Deus, Deus no homem e, incluído no corpo pequenino de uma criança, aquele que o universo não pode conter. Vendo-o, proclamam sua fé e não discutem, oferecendo-lhe místicos presentes, incenso a Deus, ouro ao rei e mirra ao que haveria de morrer” (São Pedro Crisólogo).

Deus em nosso meio, Deus com rosto de homem, irmão. Mistura do divino e do humano. Deus próximo, Deus Emanuel, Deus dos caminhos do Oriente e Jesus ressuscitado que vive nos chamando para segui-lo. Ele luz que veio a esse mundo para abrir os olhos aos cegos. Claridade da fé.

Os buscadores de Deus:

Muitos nascemos em famílias católicas e fomos sendo envolvidos em ritos e símbolos. Passamos a viver no regime da religião. Muitos desses que foram batizados em criança tiveram ocasião de crescer no conhecimento do Senhor e sempre conservaram saudade da luz. Pode acontecer, no entanto, que muitas pessoas tenham se acostumado com a fé. Há o perigo da rotina, da separação de fé e vida, da privatização da fé. Tais pessoas perderam o gás, não têm o fogo de que fala o Evangelho. Deus não pode ser um mero acessório em nossa vida, ao lado de tudo o que chamamos de vida, de nossa vida.

 Há aqueles que tiveram uma catequese falha, que depois de um tempo de prática deixaram tudo. Formulam perguntas. Acham Deus mudo demais, indiferente a tudo, ao mundo, ao amanhã. Para estes talvez Deus tenha morrido.

Há aqueles que interpelados pelo maravilhoso ou pelo trágico da vida sentem o brilhar de uma estrela, o mero cintilar de uma estrela: um filho que nasce, um fracasso conjugal, a união numa família toda complicada, uma visita na vida de pessoa que era como que um anjo do céu. E tudo mudo.

Há os que encontram ou reencontram a fé frequentando as páginas dos Evangelhos e tentando descobrir o Deus de Jesus Cristo em suas posturas, no comportamento de gente que viveu perto de Jesus, na audácia de Paulo. São pessoas que aos poucos vão dando suas mãos a Zaqueu, ao filho pródigo, à viúva que deposita no cofre do templo tudo o que tem.

Há os que descobrem a Deus na dedicação aos outros. Sua fé é marcada pelo encontro do Senhor nos seres humanos mais abandonados.

Muitos conseguem alimentar sua fé frequentando grupos de pessoas límpidas que perscrutam suas vidas, iluminam suas historias com o evangelho. Pessoas que carregam uma pergunta: “Senhor, onde é a tua casa?

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Quem são esses Magos?
São esses diferentes, esses outros que chegam nesse tempo plural.
São caminhantes rumo a uma Jerusalém bem assentada.
São nômades que chegam a um mundo instalado.
São espreitadores de uma sociedade adormecida.
Constituem a alegria para um mundo triste.
Chegam a Jerusalém com uma pergunta nos lábios:
“Onde está o rei do judeus que acaba de nascer?”
Não precisamos de carregadores de perguntas nós que somos daqueles que conhecem todas as respostas?
Nós que sabemos tudo.
Os Magos chegam à cidade colocar uma bomba.
Chegam ao mais secreto de nós mesmos.
Veem para nos questionar.
São diferentes.
São o outro.
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FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

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Assista à reflexão do Frei Gustavo Medella:

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