Conectar a vida à esperança
Nossas vulnerabilidades ainda estão
expostas pela pandemia. Nosso país há muito não vivia uma situação como
esta, em que temos de conviver todos os dias com o risco, o medo, a
insegurança, os gráficos com números de contaminados, de hospitalizados, de
vacinados e de óbitos. Nesse contexto, onde foram parar os nossos sonhos? A
pandemia, no seu reverso, chama à esperança, atitude fundamental para não haver
resignação, mas, antes, o revigoramento das forças. A resiliência é a atitude
que mais se conjuga com a esperança. Em cada novo dia despertar-se com o olhar
atento e sereno de quem nutre no coração a teimosa energia da vida.
Dom João Justino |
Para os cristãos, a esperança é companheira
da fé e da caridade. Nesta hora longa e difícil é preciso abrir espaço para
este importantíssimo componente da identidade cristã e, portanto, da identidade
católica: a esperança. O apóstolo Paulo, diante da morte, exorta a comunidade
cristã a comportar-se de forma diferente “daqueles que não têm esperança” (1Ts
4,13). Os cristãos somos movidos pela fé na vitória da ressurreição. Vivemos,
de modo pascal, cada passo da história, sabedores de que “a esperança não decepciona,
porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que
habita em nós” (Rm 5,5).
Recorda-nos o Cardeal Tolentino que não se
pode reduzir a esperança cristã à “esperança imediata e utilitária de efetivar
isto ou aquilo, mas é a grande esperança que dá sentido e razão, a esperança
que finaliza a vida… Ela é uma tensão, um desejo, ‘um esperar que’, e ao mesmo
tempo supõe uma relação de confiança com outro, à maneira de um pacto dialógico
que nos faz dizer ‘espero em ti’”.
Péguy correlacionou, de modo brilhante,
esperança e caridade ao escrever: “a caridade ama aquilo que é… a esperança ama
o que será”. O horizonte pascal apresenta o futuro como vida plena em Deus. Os
empenhos diários para viver não se esgotam aqui, mas como elos de uma corrente
se projetam na vida definitiva em Deus, a vida eterna. Sustentados por essa
esperança pascal, as pessoas cristãs se casam no Senhor; os casais, na
expressão do amor conjugal, geram filhos e constituem famílias; os pais educam
seus filhos e lhes ensinam que a vida não se esgota nesta história, mas está
destinada ao Reino definitivo; homens e mulheres trabalham com energia e
criatividade para tornar este mundo fraterno, qual ensaio da fraternidade de
que desfrutaremos na Casa do Pai.
Paulo Soledade, nos anos 60, após se
recuperar de um grave problema pulmonar, compôs famosa canção com os seguintes
versos: “Vê, estão voltando as flores. Vê, nessa manhã tão linda. Vê, como é
bonita a vida. Vê, há esperança ainda. Vê, as nuvens estão passando. Vê, um
novo céu se abrindo. Vê, o sol iluminando por onde nós vamos indo”. Vamos
resgatar do patrimônio da fé cristã a força da esperança, para dar os
necessários passos em direção à confiança nas pessoas, aos cuidados, ainda que
paliativos, com os enfermos, ao anúncio da alegria do Evangelho aos que se
encontram abatidos e cansados. E, com São Paulo, desejar “Que o Deus da
esperança (n)os encha de toda a alegria e paz na fé, para que transborde(mos)
de esperança, pela força do Espírito Santo” (Rm 15,13).
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