Estar presente e tornar-se uma dádiva
Na caminhada de
preparação ao Natal que, acima de tudo, é Cristo, temos que tomar cuidado de
não perder o motivo da festa e da alegria. Trata-se, não tanto de pensar em
presentes ou presentear, mas de estar presente nos relacionamentos com nossos
familiares, amigos e, sobretudo, com os pobres e sofredores neste tempo de
cuidar. A figura bonachona do Papai Noel pode nos confundir pela sua
sobreposição ao Menino Jesus.
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Dom Roberto |
São Nicolau, o
bispo de Mira, que deu origem e inspiração ao Papai Noel, é, antes que nada, um
exemplo a seguir de como acolher a dádiva grandiosa do Filho de Deus, para com
Ele tornar-se uma dádiva, um dom, uma graça do amor divino para os outros.
Recordemos que São Nicolau protegeu crianças, resgatou meninas e jovens que
seriam prostituídos, e distribuiu os seus bens entre os necessitados, morrendo
mártir, testemunhando o seu amor fiel a Cristo, o Salvador que esperamos.
As coisas
materiais perdem, em pouco tempo, seu valor, e o que faz que o Natal aconteça e
nos encontremos com o Deus Criança é nossa ternura inocente, nosso amor
generoso e incondicional. Não precisamos colocar um gorro de Papai Noel, mas
buscar sermos capazes de autêntica doação, escuta e partilha da nossa vida,
mostrando aos nossos irmãos de caminhada e todas as criaturas que somos alegres
e felizes em viver com eles a comunhão e fraternidade que nos vem do Menino da
manjedoura.
O Advento nos impele
a reavivar a imaginação profética com o sonho de Deus, recuperar nossa
capacidade de pensar um modo diferente de viver e conviver, mais harmonioso e
equilibrado, mais belo e essencial. Percorrer a estrada que nos leva a Belém e
ao presépio significa, antes de tudo, empreender uma jornada espiritual de
simplicidade, desapego e profunda compaixão para com todos e toda a Criação.
Natal é tempo de
celebrar a vida, de nos curar não só das pandemias, mas das desilusões, das
mágoas e cicatrizes ainda abertas para deixar-nos inspirar pela criança
interior onde sempre nasce Jesus. Deus seja louvado!
Dom Roberto Francisco Ferreria Paz - Bispo de Campos (RJ)
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Tempo de esperançar
O profeta Isaías, pelos idos do século VIII antes de Cristo, quando o povo enfrentava realidade adversa, investe, fortemente, na arte de esperançar. Ele compreende algo que é incontestável: a desesperança constitui um fosso de derrotas e fracassos. O profeta, no exercício de sua missão educativa, trabalha para devolver ao povo a esperança perdida por várias razões. Contribui, assim, para despertar nas pessoas a força capaz de recuperar clarividências civilizatórias, recompor a identidade e encontrar rumos na construção da própria história. Esperança é pilar de uma sociedade com incidência na vida de cada cidadão.
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Dom Walmor |
Desiste de lutar
quem está desesperançado, pois carece de uma luz e de uma força que conferem
sentido ao viver. As catástrofes, pandemias e descompassos do dia a dia e da
história não podem ser superados sem a virtude da esperança, que nunca deve ser
confundida com sentimentos efêmeros ou promessas inexequíveis. Essa confusão
também leva a fracassos e prejuízos. Vale se lembrar da palavra proclamada pelo
profeta Isaías, conhecido por sua rica e poética literatura, para reconhecer a
força restauradora da genuína esperança. Ele anuncia ao povo que “um broto vai
surgir do tronco seco de Jessé, das velhas raízes, um ramo brotará”. É
educativo estabelecer reflexão sobre esse anúncio de esperança no contexto
atual, quando uma pandemia se abate sobre a vida do planeta e todos aguardam
por uma vacina.
O caminho deste
tempo desesperador, incerto e inquietante desafia a existência humana nos seus
alicerces. A falta de uma indicação sobre o rumo a seguir esvazia o sentido da
vida, aproximando a humanidade da morte. Torna-se, pois, ainda mais necessária
uma prática reconfortante e restauradora oferecida pela fé cristã a cada
pessoa: prestar atenção, ouvir e se deixar interpelar pelos percursos das
quatro semanas do tempo do Advento, preparação para o Natal do Senhor,
iluminados pela Palavra de Deus.
O broto de
esperança é uma pessoa. Seu nome é Jesus Cristo, o Salvador da humanidade, o
único que valida a inexorável esperança fidedigna. Deve-se prestar atenção ao
anúncio do profeta Isaías, compreendê-lo para restaurar a própria interioridade
e, assim, fortalecer o alicerce que sustenta a vida e qualifica a cidadania. O
profeta Isaías, reacendendo luzes de esperança, anuncia: “O povo que andava na
escuridão viu uma grande luz, para os que habitavam as sombras da morte uma luz
resplandeceu”. Na esperança cristã o povo encontra força para reconstruir seus
rumos e conquistar novo tecido sociocultural. Cada pessoa que cultiva a
esperança cristã é capaz de adotar um estilo de vida renovado.
A esperança cristã
tempera e impulsiona uma concretização política qualificadora da civilização
que nenhuma ideologia partidária tem competência para alcançar. Alicerça
a vida de um povo sobre parâmetros humanísticos indispensáveis para vencer este
momento de luto e perdas. Alimenta estratégias que possibilitam conquistas a
partir do princípio da solidariedade – grande remédio para vencer desastres de
todo tipo. No ar está uma inquietante pergunta quando se fala em esperança: o
se pode esperar? Essa interrogação existencial, humana e social, para ser
respondida, exige humildade para reconhecer a centralidade da pessoa que é a
esperança fidedigna. Oportuno, nesse caminho, dedicar-se aos versos de Thiago
de Mello, em Memória da Esperança: “Na fogueira do que faço por amor me queimo
inteiro. Mas, simultâneo renasço para ser barro do sonho e artesão do que
serei. Do tempo que me devora me nasce a fome de ser. Minha força vem da frágil
flor ferida que se entreabre resgatada pelo orvalho da vida que vivi. Qual a
flama que darei para acender o caminho da criança que vai chegar? Não sei. Mas,
sei que já dança, canção de luz e sombra na memória da esperança”.
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