quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Sábia reflexão de dom Lindomar Rocha:

Graça e discipulado

Muito tem se falado daquela graça barata, que parece preencher muitas vertentes do cristianismo contemporâneo. Uma espécie de filiação pentecostal que credita a salvação a um ato declaratório, eximindo o crente das responsabilidades da vida. Um grito de separação entre fé e vida, onde já não se tem mais o referencial daquele que nos ofertou a Graça. 

Dom Lindomar Rocha

A graça barata é aquela que já não pede mais nada do cristão. Se a Graça recebida não levar ao discipulado é Graça barateada que segue um caminho falido, como nos alerta Dietrich Bonhoeffer, em seu livro, Discipulado.

A Graça chancelada nos limiares do Evangelho é conquistada com o esforço extremo daquele que nos resgatou. Na doação completa de sua vida, Jesus não nos autorizou a vivermos em devaneios psicológicos de uma justificação irresponsável, onde se acredita estar plenamente liberado à vida sem compromisso. Por isso mesmo, é aterrorizante a multiplicação de cristianismos surgentes, no qual essa “graça” já autorizou até mesmo a ruptura com Cristo. 

A volta à concretude da vida evangélica, recomenda uma compreensão completa da Graça recebida para viver o discipulado. 

Não se recebe a Graça para viver em devaneio. Isto seria, nas palavras de Bonhoeffer: “a afronta mais diabólica contra a graça”. Isto é, não se comprometer e até pecar contando com a graça recebida de Deus; e continua ele: “o Catecismo Católico não estaria correto ao reconhecer aí o pecado contra o Espírito Santo”? 

Devemos reconhecer que sim. Uma graça recebida que autoriza o afastamento de sua fonte e de sua finalidade, se usada para justificar os descaminhos e supressão do discipulado é realmente o pecado contra o Espirito Santo. 

Reconstituir o caminho do discipulado, portanto, é urgente para superar a teologia da graça barata, e reaprumar o objetivo para a Graça que Cristo nos conquistou. 

Não temos outro referencial, se não aquele concreto modo de vida que Jesus nos deu no limiar de sua própria vida, e serviu de alavanca para os primeiros cristãos. 

Os primeiros discípulos são abundantes. Os Evangelhos e o novo testamento os apresentam por toda a parte. Inúmeras as figuras que remetem à Graça que Cristo conquistou com a própria vida. 

Tomando Paulo como exemplo, é possível ver o homem perdido diante da lei, que foi salvo pela Graça. O seu encontro com Cristo, que estendeu os braços muito além daqueles doze que conhecemos, alinhou o objetivo de Paulo com o seu próprio objetivo. Por isso mesmo, o seu destino se assemelhou ao do Mestre. 

Também o olhar de Pedro e João, ao assumirem plenamente o discipulado, entrando no templo se preocuparam, primordialmente, com o irmão que jazia jogado no chão, a causa da enfermidade (At 3,6). 

Nenhum dos discípulos ficou estagnado naquilo que era. A Graça não produz resultados, ela gera atividade que faz com aquele que a recebeu se aplique na seara do Reino. 

A justificação como decreto, que imobiliza o cristão na comunidade, no grupo e na vida, é graça barata que não se sustenta diante de Deus. Seria semelhante a passar a vida gritando Senhor, Senhor, e esperar entrar no Reino dos Céus. 

A Graça que Cristo nos conquistou, como fez com Pedro, Paulo e demais cristãos da primeira hora, faz com que todo aquele que a recebeu se torne um Discípulo. Sem um discipulado temos uma graça barata ou barateada, que, em seu limite, conduz ao pecado e a morte.  

Dom Lindomar Rocha Mota - Bispo de São Luís de Montes Belos (GO) 

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