sábado, 12 de agosto de 2023

Aprendendo com o padre Paulo Adolfo:

O fundamento das Pastorais Sociais da Igreja Católica

Parte II

“Essa situação de extrema pobreza generalizada, adquire, na vida real,
feições concretíssimas, nas quais deveríamos reconhecer a face de Cristo sofredor que nos questiona”.
Puebla, 30

Compreensão básica de Pastoral Social

No artigo anterior, falei da centralidade da ação social para a fé cristã, como forma de viver a caridade. Falei também que a ação social da Igreja para ser, de fato, caridade precisa ir além do assistencial e da promoção, embora isso também seja necessário. Disse também que é preciso ser uma ação transformadora da sociedade a partir de suas estruturas e que a transformação estrutural da sociedade sofrerá reação dos que detém o poder e são beneficiados pelas estruturas assim como elas se encontram. Para isso, apresentei que os agentes das Pastorais Sociais devem estar bem preparados tanto tecnicamente como do ponto de vista da fé. É preciso uma espiritualidade do enfrentamento social.

Leia a parte I da reflexão do padre Paulo Adolfo Simões sobre as Pastorais Sociais.

No texto atual, trato especificamente sobre a Pastoral Social. A Pastoral Social é uma diaconia ou (colabor)ação organizada da Igreja na realização da justiça social, em vista das necessidades e dos direitos dos pobres e marginalizados de nossa sociedade. Por um lado, sua ação é como denúncia e enfrentamento de toda forma de injustiça, exploração, discriminação e marginalização, bem como dos mecanismos que produzem essas situações. Por outro lado, é de anúncio eficaz de uma nova forma de organização da sociedade: insiste na inaceitabilidade da injustiça social; mobiliza pessoas e grupos a lutarem por seus direitos e a buscarem e criarem alternativas de vida; articula e projeta essas lutas e alternativa; fortalece as lutas populares concretas com a força social da Igreja e explicita e potencializa o caráter salvífico dessas lutas.

É preciso compreender que as estruturas da sociedade não são simplesmente estruturas econômicas, políticas, sociais, culturais, de gênero, entre outras. São também estruturas teologais nas quais se manifesta Graça Divina ou o pecado. É preciso também ter presente que a consciência explícita dessa problemática e desse desafio é relativamente recente na Igreja, embora a Sagrada Escritura e a Tradição da Igreja já apontem sobejamente para a questão. Haja vista as denúncias dos profetas contra a acumulação de riquezas, contra a violação do direito das viúvas nos tribunais, contra a espoliação dos bens dos pequenos e, sobretudo, em sua defesa radical do direito do pobre, do órfão, da viúva e do estrangeiro. Lembremo-nos da Doutrina Social da Igreja (DSI) e de seus princípios. Contudo, a consciência explícita das questões sociais começa a se desenvolver na Europa no século XIX.

Um marco importante no surgimento da consciência da dimensão estrutural da fé foi o “catolicismo social” que se desenvolveu no contexto da revolução industrial e da situação da classe e do movimento operários nascentes. É nesse contexto que se insere a encíclica Rerum Novarum, do papa Leão XIII (1891), que trata da condição dos operários e se torna o “texto fundador” da DSI. Essa consciência ganha novo impulso, novas perspectivas e novas dimensões com o Concílio Vaticano II (1962-1965) e a Constituição Pastoral Gaudium et spes (1965), sobre a Igreja no mundo de hoje. Além disso, é na Igreja da América Latina e a partir dela que essa consciência se torna mais explícita e é levada às últimas consequências, tanto em termos teológicos, quanto em termos pastorais. A Conferência de Medellín (1968) já falava de “estruturas opressoras”, “estruturas injustas”, “violência institucionalizada”. A Conferência de Puebla (1979) reconhece que a pobreza “não é uma etapa casual, mas sim o produto de determinadas situações e estruturas econômicas, sociais e políticas” e fala explicitamente de “dimensão social do pecado”, de “estruturas de pecado” ou de “pecado social”.

Essas intuições, que depois vão foram aprofundadas e desenvolvidas na reflexão teológico-pastoral na América Latina e assumidas, em grande medida, pelo magistério oficial para o conjunto da Igreja, estão na base do engajamento de cristãos, comunidades, grupos e mesmo da Igreja enquanto instituição nos mais diversos processos de organização e luta populares ou do que se convencionou chamar de “Pastoral Social”, enquanto dimensão socioestrutural da caridade cristã.

O engajamento da Igreja na transformação das estruturas socais dá-se de diversos modos: na atuação de cristãos em diversos movimentos e organizações sociais (serviços, pastorais e organismos de apoio, acompanhamento e defesa de setores marginalizados e de suas lutas e organizações populares) ou pela tomada de posição da Igreja enquanto instituição e força social através da hierarquia e de seus organismos de comunhão pastoral (bispos, conferências episcopais, coordenações e articulações pastorais, entre outros). Podemos citar o engajamento de milhares de cristãos nas mais diversas lutas sociais (terra, água, moradia, educação, saúde, liberdade política, igualdade racial e de gênero e justiça socioambiental) e nas mais diversas organizações populares (sindicatos, associações, partidos e movimentos populares). A tomada de posição pública de Igrejas locais em favor de comunidades, grupos ou setores injustiçados e marginalizados, os diversos serviços, organismos e pastorais sociais criados na Igreja para acompanhar determinados grupos e setores sociais marginalizados e colaborar com suas lutas e organizações sociais; a tomada de posição da Igreja do Brasil como instituição frente a determinados acontecimentos; a promoção e participação em campanhas, eventos e processos de discussão e mobilização sociais em torno de direitos fundamentais negados ou de mecanismos que produzem injustiça; discussões, articulações e mobilizações em âmbito mundial dentro da Igreja e da Igreja com diversas forças sociais.

Por fim, é preciso ressaltar que nem toda ação, serviço social ou ajuda aos pobres e marginalizados, por mais nobre e evangélico que seja, é, sem mais, uma Pastoral Social. O que caracteriza uma Pastoral Social é seu intento de interferir na organização da sociedade e transformá-la a partir e em vista das necessidades e dos direitos e pobres e marginalizados, como nos ensina o Evangelho.

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                                                                                                        Fonte: arquidiocesepa.org.br

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