a Eucaristia:
o pão para a vida eterna
O Corpus Christi é uma festa celebrada após
a Páscoa, Pentecostes e Santíssima Trindade. Vivenciamos a presença de Cristo
no pão consagrado para que, assim, fé e vida caminhem juntas para testemunhar
ao mundo o seguimento a Jesus Cristo e a Sua Igreja.
A solenidade do Corpus Christi é uma
manifestação pública da presença de Jesus na eucaristia, que nos é ofertada por
Deus Pai, na pessoa do Seu Filho e no manancial de amor do Espírito Santo como
alimento para a nossa vida eterna. É uma celebração que nos une à quinta-feira
santa, naquela ceia derradeira em que Jesus se entrega em corpo e sangue,
passando pela cruz, para a salvação do mundo inteiro.
O Corpus Christi é uma festa celebrada após
a Páscoa, Pentecostes e Santíssima Trindade. Vivenciamos a presença de Cristo
no pão consagrado para que, assim, fé e vida caminhem juntas para testemunhar
ao mundo o seguimento a Jesus Cristo e a Sua Igreja. A eucaristia é uma palavra
grega, cujo significado é ação de graças[1], sacramento do pão e vinho
consagrados, onde está presente o Senhor Jesus Cristo, que se entrega a todos
nós. A eucaristia designa a ceia cristã, a benção consecratória, a própria ação
eucarística[2]. A seguir, apresentamos uma visão da doutrina sobre a
eucaristia, segundo alguns padres da Igreja, os primeiros escritores cristãos,
fundamentada na Sagrada Escritura.
A eucaristia na celebração dominical
A Didaqué, documento doutrinário dos doze
apóstolos, instruiu a tradição posterior como era celebrada a eucaristia na
comunidade eclesial. No dia do Senhor, o domingo, as pessoas se reuniam para
partir o pão e agradecer a Deus após confessarem os seus pecados. A
reconciliação com o próximo estava presente na comunidade para a recepção da
eucaristia[3].
Remédio de imortalidade
Santo Inácio, bispo de Antioquia, do século
I, afirmava que a eucaristia deveria ser celebrada pelo bispo e em unidade com
o presbitério, na qual haveria a partilha do mesmo pão, que é remédio de
imortalidade, antídoto para não morrer, mas para viver em Jesus Cristo para
sempre[4]. Ele pedia aos fiéis para considerar como legítima a eucaristia
presidida pelo bispo e, onde ele aparecia, estaria presente Jesus Cristo e a
Sua Igreja[5].
A eucaristia celebrada no domingo
São Justino de Roma, padre dos séculos I e
II, afirmou que a eucaristia do pão e do vinho consagrados é celebrada pelos
cristãos em todo lugar da terra[6]. Os cristãos aprenderam a celebrar a
partilha do pão e do vinho como recordação da Paixão em que o Filho de Deus
sofreu por eles[7].
São Justino destacou a importância da
eucaristia para os fiéis que eram preparados para os sacramentos da iniciação
cristã. A pessoa era conduzida ao lugar em que os fiéis estavam reunidos para
elevar orações por si mesmas e por toda a humanidade. Aquele que presidia a
reunião oferecia pão e uma vasilha com água e vinho aos irmãos presentes, ao
tempo em que louvava e glorificava ao Pai do universo através do nome de Seu
Filho e do Espírito Santo, e pronunciava uma longa ação de graças por ter-nos
concedido esses dons que Dele provêm. O povo dizia amém, cujo significado é
assim seja. As pessoas tomavam as espécies consagradas e os diáconos as levavam
aos ausentes[8]. São Justino tinha presente também à teologia da eucaristia, na
qual os cristãos não tomavam pão e vinho de uma forma ordinária, mas como carne
e sangue de Jesus encarnado, Nosso Salvador, feito carne por força do Verbo de
Deus[9]. Tudo isso era oferecido no dia do sol para os pagãos, mas, para os
cristãos, era no domingo, com uma reunião de todos os que moravam nas cidades
ou nos campos[10].
A eucaristia, páo para a vida eterna
Santo Irineu de Lião, bispo dos séculos II
e III, rebatia os gnósticos por não valorizarem a eucaristia como pão para a
vida eterna. O bispo chamou de estultos os que rejeitavam toda a economia de
Deus, negando a salvação da carne e declarando que esta seria incapaz de
receber a incorruptibilidade. Segundo Irineu, se não é possível que a carne
seja salva, então o Senhor não teria salvado o gênero humano com Sua carne e
Seu sangue, nem o cálice eucarístico é comunhão de Seu sangue e nem o pão que é
partido é a comunhão com Seu corpo. O bispo de Lyon afirmou contra os gnósticos
que o pão e o vinho consumidos pelos fiéis, recebendo a palavra de Deus, se
tornam eucaristia, isto é, o corpo e o sangue de Cristo, de modo que os nossos
corpos alimentados pela eucaristia, depois de serem decompostos na terra,
ressuscitarão no seu tempo, quando o Verbo de Deus os fará ressuscitar para a
glória de Deus Pai, dando-lhe a imortalidade ao que é mortal e a
incorruptibilidade ao que é corruptível, pois o poder de Deus se manifesta na
fraqueza[11].
A comunidade ouvia a Sagrada Escritura e tinha a Eucarisitia
Tertuliano, padre dos séculos II e III,
discorreu que a comunidade se encontrava para juntos lerem e comentarem as
Escrituras Sagradas, para que estas fossem motivo de admoestação no presente e
no futuro, auxiliando-os a interpretar o passado. Com aquelas santas palavras,
eles alimentavam a fé, levando em alto a esperança, aprofundando a confiança e,
ao mesmo tempo, tornavam mais sólida a disciplina e a caridade entre eles.
Havia uma caixa comum onde as pessoas depositavam as suas ofertas para os
pobres e, em seguida, ocorria a refeição, o banquete digno, pois louvavam a
Deus. A comunidade não se sentava à mesa antes de ter feito uma oração a
Deus[12]. Tudo era feito pela eucaristia, pão para a vida eterna.
A eucaristia com o seu significado espiritual
Orígenes, padre dos séculos II e III,
enfatizou o significado espiritual da carne e do sangue de Cristo. Ao
interpretar a passagem de João 6,54, “quem come a minha carne e bebe
o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia”, o padre
explica que toda a carne do Senhor é alimento, bem como o sangue é bebida. Toda
a Sua obra é santa e toda a Sua palavra é verdadeira, de modo que a Sua carne é
verdadeiro alimento e o Seu sangue é verdadeira bebida[13]. O ser humano fica
saciado com este alimento de vida eterna.
O alimento eucarístico para o corpo e para o espírito
São Gregório de Nissa, bispo do século IV,
afirmou a importância do pão consagrado como alimento para o corpo e para o
espírito. Muitos são os alimentos na natureza e eles têm as suas finalidades
para a vida. O ser humano tem, entre outros alimentos, o pão. Para saciar a
sede, existe a água e esta, quando misturada com o vinho, serve para ajudar ou
manter o equilíbrio térmico do corpo. Aqueles elementos, uma vez transformados
pela graça do Senhor, tornam-se sangue e corpo de Cristo dentro da pessoa
humana. Desta forma, o corpo do Senhor vivifica a natureza humana para as
pessoas que têm fé, distribuído a todos sem Ele mesmo ser diminuído[14].
A recepção das espécies consagradas
São Cirilo de Jerusalém, bispo no século
IV, exaltava diante dos fiéis a importância de receber o Senhor nas espécies do
pão e do vinho consagrados. Ele exortava a ter fé nesta presença importante,
dizendo que os participantes não eram convidados a receber pão e vinho
ordinários, mas sim o corpo e o sangue do Cristo escondidos no símbolo[15].
A solenidade de Corpus Christi enfatiza a
importância do sacramento da eucaristia em nossas vidas. É a presença de Jesus
nas espécies do pão e do vinho consagrados, que devem ser amados e adorados. É
uma festa especial para todos os cristãos. Somos chamados a viver a eucaristia
a fim de que, em nossas vidas, sejamos pessoas acolhedoras na família, na
comunidade e na sociedade. Neste tempo de pandemia, sejamos solidários com todos
os sofredores desta e de outras doenças, com os povos indígenas, os povos do
campo e da cidade, mulheres e homens; e sejamos missionárias e missionários,
levando a Boa Nova do Reino de Deus para toda a sociedade. Cristo Jesus,
presente na eucaristia, deseja que testemunhemos Sua presença junto ao povo de
Deus.
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[1] Cfr. Eucaristia. In: Il
vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998, pg. 558.
[2] Cfr. Eucaristia. In: Dicionário
Patrístico e de Antigüidades cristãs. Vozes, Paulus, Petrópolis, RJ, 2002, pg.
527.
[3] Cfr. Didaqué, 14,1-2. In: Os
Padres Apostólicos, Paulus, SP, 1995, pg. 357.
[4] Cfr. Inácio aos Efésios, 20, 2.
In: Idem, pg. 89.
[5] Cfr. Inácio aos Esmirniotas,
8,1-2. In: Idem, pg. 118.
[6] Cfr. Diálogo com Trifão, 117.
In: Justino de Roma, Paulus, SP, 1995, pg. 287.
[7] Cfr. Idem, pg. 288.
[8] Cfr. I Apologia, 65, 1-5. Idem,
pgs. 81-82.
[9] Cfr. Idem, 66, 1-2, pg. 82.
[10] Cfr. Idem, 67, 3, pg. 83.
[11] Cfr. Ireneu de Lião, V, 2, 2-3.
Paulus, SP. 1995, pgs. 522-523.
[12] Cfr. Tertulliano, Apologia del
Cristianesimo, XXXIX, 1- 17. Introduzione e note di Claudio Moreschini,
traduzione di Luigi Rusca, Biblioteca Universale Rizzoli, Milano, 1996, pgs.
253-261.
[13] Cfr. Origene, Omelie sul Levitico,
7, 5. In: In: La teologia dei padri, v. 4. Città Nuova Editrice,
Roma, 1982, pg. 169.
[14] Cfr. A grande catequese, XXXVII,
7-8. In: Gregório de Nissa. Paulus, SP, 2011, pgs. 376-377.
[15] Cfr. Cirillo di Gerusalemme, Catechesi
mistagogica, 5,2-11.19-23. In: In: La teologia dei padri, v. 4, pg.
162-164.
Dom Vital Corbellini - Bispo de Marabá – PA
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História da Solenidade de Corpus Christi
A Festa de Corpus Christi surgiu em Liége,
Bélgica, no seculo XII: um Movimento Eucarístico na Abadia de Cornillon fundada
em 1124 pelo Bispo Albero de Liege.
A Festa de “Corpus Christi” é a celebração em que solenemente a Igreja comemora o Santíssimo Sacramento da Eucaristia; sendo o único dia do ano que o Santíssimo Sacramento sai em procissão às nossas ruas. Nesta festa os fiéis agradecem e louvam a Deus pelo inestimável dom da Eucaristia, na qual o próprio Senhor se faz presente como alimento e remédio de nossa alma. A Eucaristia é fonte e centro de toda a vida cristã. Nela está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, o próprio Cristo.
A Festa de Corpus Christi surgiu em Liége,
Bélgica, no seculo XII: um Movimento Eucarístico na Abadia de Cornillon fundada
em 1124 pelo Bispo Albero de Liege.
Santa Juliana de Monte Cornillon, (ou
Juliana de Liége) naquela época superiora da Abadia, foi a enviada de Deus para
propiciar esta maravilhosa Festa de Corpus Christi.
Santa Juliana de Liege sempre teve uma
grande veneração ao Santíssimo Sacramento. E esperava que tivesse uma festa
especial em sua honra. Este desejo se diz ter intensificado por uma visão que
teve da Igreja sob a aparência de lua cheia com uma mancha negra, que
significada a ausência dessa solenidade.
Juliana comunicou estas aparições ao bispo
de Liege, também ao doutor Dominico Hugh, mais tarde cardeal legado dos Países
Baixos e Jacques Pantaleon, nessa época arquidiácono de Liege, mais tarde o
Papa Urbano IV.
O Papa Urbano IV, naquela época, tinha a
corte em Orvieto, um pouco ao norte de Roma. Muito perto desta localidade está
Bolsena, onde em 1263 ou 1264 aconteceu o Milagre de Bolsena: um sacerdote que
celebrava a Santa Missa teve dúvidas de que a Consagração fosse algo real., no
momento de partir a Sagrada Forma, viu sair dela sangue do qual foi se
empapando em seguida o corporal. A venerada relíquia foi levada em procissão a
Orvieto em 19 junho de 1264. Hoje se conservam os corporais -onde se apoia o
cálice e a patena durante a Missa- em Orvieto, e também se pode ver a pedra do
altar em Bolsena, manchada de sangue.
O Santo Padre movido pelo prodígio, e a
petição de vários bispos, faz com que se estenda a festa do Corpus Christi a
toda a Igreja por meio da bula "Transiturus" de 8 setembro do mesmo
ano, fixando-a para a quinta-feira depois da oitava de Pentecostes e outorgando
muitas indulgências a todos que assistirem a Santa Missa e o ofício.
A morte do Papa Urbano IV (em 2 de outubro
de 1264), um pouco depois da publicação do decreto, prejudicou a difusão da
festa. Mas o seguinte Papa Clemente V tomou o assunto em suas mãos e, no
Concílio Geral de Viena (1311), ordenou mais uma vez a adoção desta festa. Em
1317 é promulgada uma recopilação de leis, por João XXII, e assim a festa é
estendida a toda a Igreja.
Após a Missa de Corpus Christi se faz a Procissão
Eucarística. Estas procissões foram dotadas de indulgências pelos Papas
Martinho V e Eugênio IV, e se fizeram bastante comuns a partir do século XIV.
Com toda a honra possível ao Rei Jesus.
Finalmente, o Concílio de Trento (em 1.500)
declara que:...seja celebrado este excelso e venerável sacramento com singular
veneração e solenidade; e reverente e honradamente seja levado em procissão
pelas ruas e lugares públicos. Assim nasceu esta maravilhosa Solenidade de
Corpus Christi.
Mons. André Sampaio
Corpus Christi e ações sociais
"Sem dar nenhuma publicidade, mas todas as paróquias no Brasil fizeram alguma campanha solidária de alimentos"
Na data de 3 de junho deste ano, 2021, mesmo em plena presença desoladora e letal da pandemia do coronavírus, celebramos a Solenidade do Santíssimo Corpo, Sangue e Divindade de Jesus Cristo. Corpus Christi é Festa da Eucaristia, da presença do Cristo Ressuscitado e do Sacramento do Amor de Deus pelo seu povo. É a fonte da vida da comunidade cristã e da família de Deus.
Essa Solenidade revela o sentido rico da espiritualidade da Aliança, expressão de unidade que acontece entre o ser divino e o ser humano, em sinal visível e concreto, presente na hóstia consagrada. Jesus Cristo continua entre as pessoas, em forma de Sacramento Eucarístico, sinal-presença de esperança para todos aqueles que O reconhecem como libertador e Salvador da humanidade.
No Novo Testamento acontece a Nova Aliança de Deus, não mais como sinal e nem como acontecimento, mas como Sacramento para edificar a vida das pessoas, porque Cristo continua unido ao povo, a quem doou a vida no seu corpo e sangue. É da Eucaristia que nasce e vive a Igreja, no sangue e na água que jorram de seu corpo, concretizados na água do batismo e na força do sangue derramado.
Então, a Igreja, que vive da força da Eucaristia, exerce uma missão no mundo para construir o Reino de Deus. Além do aspecto da evangelização, da construção da comunidade cristã e da paz, ela realiza ações sociais para ajudar as pessoas mais necessitadas. É a prática da caridade fraterna, diminuindo o sofrimento das pessoas à margem das condições mínimas para sua sobrevivência.
Esse gesto solidário foi ampliado neste tempo de pandemia. O sofrimento do povo aumentou em diversos aspectos. O maior deles é a fome e a impossibilidade de conseguir os alimentos básicos para preservar a vida. Com isto os gestos solidários foram assumidos por pessoas e instituições. Sem dar nenhuma publicidade, mas todas as paróquias no Brasil fizeram alguma campanha solidária de alimentos.
É na força da Eucaristia que melhor conseguimos enxergar o irmão sofredor. A solidariedade de Jesus Cristo com os pobres foi um testemunho modelar para todos os seus seguidores. Ele mostrou que a vida cristã não pode ficar no patamar de um mundo fechado, egoísta e sem partilha. Viver a Eucaristia é colocar a mão na massa para construir uma sociedade onde a vida tem sua dignidade.
Dom Paulo Mendes Peixoto - Arcebispo Metropolitano de Uberaba – MG
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