A Igreja nas casas (II)
“Recebe o livro da Palavra de Deus.
Que ela seja luz para a tua vida”
Quando a Igreja no Brasil, em suas atuais
Diretrizes da Ação Evangelizadora, retoma a “casa” como referência fundamental
para as Comunidades Eclesiais Missionárias é porque compreende que “a casa
permitiu que o cristianismo primitivo se organizasse em comunidades pequenas,
com poucas pessoas, que se conheciam e compartilhavam a mesa da refeição
cotidiana. Pela partilha da mesa, com todos os batizados, se estabelecia um
novo estilo de vida, marcado pelo seguimento de Jesus Cristo. A hospitalidade
era aberta também a pecadores e pagãos” (Doc. 109, 80).
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Dom João Justino |
As casas dos primeiros cristãos eram os
lugares do encontro e da escuta da Palavra, da fração do pão – Eucaristia e da
comunhão fraterna – Caridade (cf. At 2,42). Ademais, os primeiros cristãos
saíam de suas casas para anunciar o Evangelho a todas as cidades – Missão (cf.
At 8,40). Encontram-se aí os quatro pilares da ação evangelizadora. Urge, pois,
recuperar o sentido da “igreja nas casas” ou “igreja doméstica”. Eis algumas sugestões
no espírito da IV Assembleia de Pastoral da Arquidiocese de Montes Claros, nos
parágrafos seguintes.
Igreja doméstica e Palavra de Deus: para a
fé cristã, a experiência com a Palavra de Deus é fundamental. No ritual do
catecumenato de adultos prevê-se a entrega do livro da Palavra de Deus com a
seguinte exortação: “Recebe o livro da Palavra de Deus. Que ela seja luz para a
tua vida”. Crescer na fé exige a intimidade com a Palavra. Que livro mais
importante os pais poderiam entregar aos filhos senão a Bíblia Sagrada? E não
basta colocá-la em lugar de destaque na casa. É muito importante que seja
proclamada e rezada em família. Na memória dos filhos ficará a lembrança das
parábolas de Jesus ouvidas em casa. Por que não reler, em casa, com a família,
o evangelho do domingo? A catequese familiar começa com a escuta reverente e
atenta da Palavra.
Igreja doméstica e ritualidade: faz parte
da identidade humana criar ritos e símbolos. A fé começa a ser ritualizada no
interior das casas, quando a família reserva algum espaço para ícones ou
imagens sacras e ensina os filhos a importância deles. Quando se ensina a fazer
o sinal da cruz e a rezar antes das refeições. Quando se celebram os
aniversários e as festas religiosas, e esses dias são especialmente preparados.
Quando se introduz o silêncio e o seu valor para a oração e a escuta de Deus.
Quando se valoriza a escuta de cada pessoa, com reverência e respeito ao
mistério do outro. Quando o beijo, o abraço e o carinho entre familiares
registram o amor e a benevolência. Todos esses gestos humanizam e educam para a
relação com Deus e com as pessoas que encontramos pela vida afora.
Igreja doméstica e misericórdia: na família
se vivem as mais fortes alegrias. Mas é, também, ali, em nossas casas, que há
tropeços, situações de discórdia e até de agressões. A proximidade familiar
parece facilitar a perda da paciência. Uma família cristã, que se
autocompreende como igreja doméstica, valoriza o perdão e a reconciliação.
Ninguém deve passar de um dia ao outro com rancor no coração. Antes, deve se
recordar da oração ensinada por Jesus e perdoar aquele que foi o ofensor. Em
casa se aprende que não se deve julgar os outros. É preciso, pois, viver em
casa a misericórdia de Jesus e ser promotor da misericórdia noutros ambientes da
vida.
Dom João Justino de Medeiros Silva - Arcebispo
Metropolitano de Montes Claros - MG
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