O que é carregar a cruz?
José Antonio Pagola
A cruz é o critério decisivo para verificar o que merece trazer o nome de cristão. Quando as gerações cristãs o esquecem, sua religião se aburguesa, se dilui e se esvazia da verdade. Por isso, nós crentes precisamos perguntar-nos qual é o significado mais original do apelo de Jesus: “Quem não carregar sua cruz atrás de mim não pode ser meu discípulo”.
Embora pareça surpreendente, nós cristãos desenvolvemos frequentemente diversos aspectos da cruz, esvaziando-a de seu verdadeiro conteúdo. Assim, há cristãos que pensam que seguir o Crucificado é buscar pequenas mortificações, privando-se de satisfações e renunciando a prazeres legítimos para chegar – através do sofrimento – a uma comunhão mais profunda com Cristo.
Sem dúvida, é grande o valor de uma ascese cristã, e mais ainda numa sociedade como a nossa, mas Jesus não é um asceta que vive buscando mortificações; quando fala da cruz, não está convidando a uma “vida mortificada”.
Há outros para quem “carregar a cruz” é aceitar as contrariedades da vida, as desgraças ou adversidades. Mas os evangelhos nunca falam destes sofrimentos “naturais” de Jesus. Sua crucificação foi consequência de sua atuação de obediência absoluta ao Pai e de amor aos últimos.
Sem dúvida precisamos valorizar o conteúdo cristão desta aceitação, do “lado escuro e doloroso” da vida, a partir de uma atitude de fé; mas, se queremos descobrir o sentido original do chamado de Jesus, precisamos recordar com toda a simplicidade o que era “carregar a cruz”.
Carregar a cruz fazia parte do ritual da execução: o réu era obrigado a atravessar a cidade carregando a cruz e levando o titulus, um cartaz onde aparecia seu delito. Desta maneira, era mostrado como culpado perante a sociedade, excluído do povo, indigno de continuar vivendo entre os seus.
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JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.
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