Deus ou o dinheiro
José Antonio Pagola
A frase é conhecida. Nenhum exegeta duvida
de sua autenticidade. Pelo contrário, é a sentença que melhor reflete a atitude
de Jesus diante do dinheiro. Por outro lado, a contundência com que Jesus se
expressa exclui toda tentativa de suavizar seu sentido. “Não podeis servir a
Deus e ao Dinheiro”.
Hoje fala-se muito da crise religiosa
provocada pelo racionalismo contemporâneo, mas esquece-se esse “afastamento” de
Deus que tem sua origem não no agnosticismo, mas no poder sedutor do dinheiro.
No entanto, de acordo com Jesus, quem se amarra no dinheiro termina
afastando-se de Deus.
Sempre se realçou que, curiosamente, o
Evangelho não denuncia tanto a origem imoral das riquezas conseguidas de
maneira injusta quanto o poder que o dinheiro tem de desumanizar a pessoa,
separando-a do Deus vivo.
As palavras de Jesus procuram causar
impacto no ouvinte opondo frontalmente o senhorio de Deus e o do dinheiro. É impossível
ser fiel a Deus e viver escravo do dinheiro. A riqueza tem um poder subjugador
irresistível. Quando o indivíduo entra na dinâmica de ganhar sempre mais e de
viver sempre melhor, o dinheiro termina substituindo a Deus e exigindo
submissão absoluta. Nessa vida já não reina o Deus que pede solidariedade, mas
o dinheiro que só busca o próprio interesse.
Os exegetas têm analisado com rigor o texto
evangélico. O “dinheiro” é designado com o termo mammona, que só
aparece quatro vezes nos evangelhos, e sempre na boca de Jesus. É um termo que
provém da raiz aramaica aman (confiar, apoiar-se) e significa
qualquer riqueza na qual o indivíduo apoia sua existência. O pensamento de
Jesus aparece assim com mais clareza: quando uma pessoa faz do dinheiro seu
único ponto de apoio e sua única meta, a obediência ao Deus verdadeiro
desaparece.
A razão é simples. O coração do indivíduo
que caiu na armadilha do dinheiro se endurece. Ele tende a buscar apenas seu
próprio interesse, não pensa no sofrimento e na necessidade dos outros. Em sua
vida não há lugar para a solidariedade. Por isso não há lugar para um Deus Pai
de todos.
A mensagem evangélica não perdeu sua
atualidade. Também hoje é um erro fazer do dinheiro o “absoluto” da existência.
Que humanidade pode encontrar-se em quem continua açambarcando sempre mais,
esquecendo absolutamente os que passam necessidade?
JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e
Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício
Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de
Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia.
Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este
comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.
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