segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Refletindo com Dom José Francisco

A conversão da Igreja Paroquial

A Congregação para o Clero promulgou, no dia 20 de julho, uma instrução chamada A CONVERSÃO PASTORAL DA COMUNIDADE PAROQUIAL A SERVIÇO DA MISSÃO EVANGELIZADORA DA IGREJA. Sem a menor dúvida, é nas paróquias que se encontra o primeiro núcleo-base da Igreja. Qualquer outra manifestação eclesial só acontecerá dentro de uma paróquia. Onde houver um cristão-católico, ele estará imerso numa realidade paroquial, seja ela em âmbito geográfico ou missionário. Todos os que cremos, vivemos numa paróquia.
Por isso é tão importante conhecer esse documento.
Dom José Francisco Rezende Dias
Que começa falando da reflexão do Vaticano II, a respeito da Igreja, esposa de Cristo. Notáveis foram as transformações sociais e culturais dos últimos decênios. Não é possível que isso não se refletisse nas comunidades paroquiais. O Espírito de Deus é absolutamente criativo: o mesmo Espírito que presidiu a criação do universo, hoje incentiva novas experiências. Sob a orientação cuidadosa de seus Pastores, o anúncio do Evangelho, cada vez mais, corresponde às inquietações do mundo moderno.
Criatividade, para o Papa Francisco, significa «procurar novas estradas», «procurar a estrada para que o Evangelho seja anunciado», com novas possibilidades e liberdade, a grande herança do Espírito de Deus.
Mas nada substitui a verdadeira conversão pastoral num sentido missionário, permanentemente disposto a romper limites, sobretudo os geográficos, num convite às comunidades paroquiais para saírem delas mesmas, e promoverem reformas estruturais. Todo corpo vivo só se mantém vivo se suas células forem constantemente renovadas. Mesmo na velhice, as células se renovam. Só a morte põe fim à renovação.
O Papa afirmou: «Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: «Dai-lhes vós mesmos de comer» (Mc 6, 37).
A Igreja quer se reformar.
Na mão direita, ela segura a Palavra de Deus, fonte da própria vida. Com a outra mão, ela abraça o mundo, certa de que o mundo espera e precisa desse abraço. O Verbo Divino «se fez carne e veio habitar no meio de nós» (Jo 1,14). Essa é a garantia do amor de Deus por nós. Essa novidade não pode se dissolver como éter. “Para continuar o percurso da Palavra, é necessário que nas comunidades cristãs se atue uma decisiva escolha missionária, capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação».
Que palavras fortes! Estamos à altura delas?
É sempre numa paróquia que essa pergunta ecoa; é nela que a resposta pode acontecer. A paróquia no meio do mundo é a consequência lógica da Encarnação de Jesus Cristo, sinal da presença permanente do Senhor Ressuscitado no meio do seu Povo.
Esse é o primeiro momento, depois da era das navegações no século XVI, em que o mundo novamente se expande. Um novo mundo exige novas configurações. Com a realidade da Paróquia não poderia ser diferente. O mundo pós-moderno se move o tempo todo, a cultura digital dilatou os confins da existência. Cada vez mais, a vida das pessoas se identifica menos com contexto imutável. O território humano é presidido pela pluralidade. Isso traz maravilhamentos e desafios. Tudo se modificou de maneira irreversível: a compreensão do espaço, da linguagem e dos comportamentos. Nunca o homem experimentou uma compreensão tão grande e tão dilacerada de si e da vida social. Rapidez das alterações, mudança dos modelos culturais, facilidade para os deslocamentos, velocidade da comunicação transformaram a percepção de tudo o que havia antes.
É nesse contexto que a paróquia está inserida, e nem podia ser diferente. A quem pensa que o contexto não rege as opções, resta a pergunta cabal: em que mundo você vive?
Diante do espaço virtual, os lugares de pertença tornaram-se múltiplos, as relações interpessoais cada vez mais voláteis. É preciso acompanhar o tempo, porque o tempo não nos acompanha.
Cada vez mais, a paróquia é chamada a adequar seu serviço às exigências dos fiéis e das alterações históricas. Discernir o momento histórico é a mãe de todos os discernimentos. Só quando cada batizado se tornar, realmente, discípulo de Jesus e missionário do Evangelho, à luz que emana da Igreja, podemos dizer que a sociedade humana encontrou seu rumo e seu prumo. Até lá, resta muito a viver e a fazer.
Somos missionários dentro das paróquias. Por isso, é importante repensar uma nova experiência de paróquia e de Igreja. Tanto o povo cristão como os sacerdotes têm o compromisso de ser “sal e luz do mundo” (Mt 5,13-14), “lâmpadas no candelabro” (Mc 4, 21), estampando uma face renovada e evangelizadora, capaz de reler os sinais dos tempos, num testemunho coerente de vida no Evangelho e para o Evangelho.
Os tempos são outros. Não podemos ser os mesmos.
Nos sinais dos tempos, fala a voz do Espírito. Precisamos entender e gerar novos sinais: a paróquia é chamada a perceber e a se perceber dentro desse mudo em mudanças. Que isso não seja um peso, mas um desafio acolhido com o mesmo entusiasmo da juventude. Em alguma parte de nós, um jovem insiste em permanecer. Conduzido com cuidado e atenção, ele será uma força viva, mesmo porque não existem forças mortas.
Os discípulos do Senhor aprenderam a esperar os tempos e os modos de Deus, e a alimentar a certeza de que Ele estará sempre presente entre os seus, até o fim dos tempos. Não estamos sozinhos. O Espírito Santo – coração da Igreja – nos reúne onde quer que estejamos espalhados. É preciso confiar. A confiança opera milagres impensáveis.
A proclamação do Evangelho acontece através de homens e mulheres que anunciam com a vida aquilo em que acreditam. É Jesus quem nos pede a «avançar sempre mais profundo» (Lc 5,4), a lançar as redes na certeza de uma pesca abundante.
Ser solidário, hoje, é a grande proposta e a maior garantia de que o Evangelho e a Igreja não perderam seu lugar na contextura do mundo. A “cultura do encontro” promove o diálogo, a solidariedade e a abertura a todos, fazendo emergir a centralidade da pessoa. A paróquia é onde estamos juntos, onde cada um percebe que existe e é querido. O mundo nos olhará com outros olhos se um dia realizarmos o sonho de que ele não foi capaz: aproximar as pessoas. A paróquia é esse asilo no mundo moderno.
Que nossos braços e nosso coração estejam sempre abertos a acolher quem vier, como conseguir se achegar. É Cristo quem chama, é Cristo quem acolhe e, não nos esqueçamos, é Cristo quem chega. “O que fizerem ao menor dos meus irmãos, é a mim que estão fazendo” (Mt 25,40).
Não podemos negar essa alegria ao Senhor.
A todos meu abraço e minha bênção.
+ Dom José Francisco Rezende Dias
Arcebispo Metropolitano de Niterói
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