viagem breve, mas bela!
Nesta 36° Viagem Apostólica, o Sucessor de Pedro confirmará
na fé os presentes na ilha onde Paulo iniciou sua obra evangelizadora após um
naufrágio, como relatado nos Atos dos Apóstolos capítulos 27 e 28. A ilha
também está na rota dos migrantes que atravessam o Mediterrâneo, tema que
marcará esta visita de dois dias.
O Papa Francisco chegou Aeroporto Internacional de Malta às
9h50 deste sábado, 2, sendo saudado ainda dentro do avião pelo núncio
apostólico Dom Alessandro D’Errico e pelo chefe do protocolo.
Já na pista do aeroporto, o Pontífice foi recebido pelo
presidente da República George Vella e esposa e por duas crianças com hábitos
tradicionais que lhe ofereceram flores.
Foram apresentadas as delegações, entoados os hinos, com a
passagem pela Guarda de Honra. Não houve discursos, mas o presidente da
república e esposa acompanharam o Papa até a Presidential Lounge and
Ministerial CIP Lounge, antes de dirigirem-se ao Palácio Presidencial para
o encontro com as autoridades, onde Francisco proferirá seu primeiro discurso
em terras maltesas.
“Bom Dia. Muito obrigado por me acompanharem nesta viagem
que é breve, mas será bela, Muito obrigado. Agora eu gostaria de saudá-los.”
Durante o voo, o Papa fez uma saudação aos
jornalistas. Interpelado por Claudio Lavanga, respondeu que uma eventual
viagem a Kiev é uma proposta que está sendo levada em consideração.
Em um quadro, a dor de um náufrago africano
Já de Eva Fernández, recebeu uma pintura feita por um
migrante nigeriano, Daniel Jude Okeoguale, que retrata o dia em que seu bote de
borracha naufragou no Mediterrâneo e não pode salvar seus amigos. Francisco
reconheceu seus traços, pois já havia recebido uma pintura sua em outra
ocasião. O quadro estava acompanhado por um testemunho da tragédia escrito em
espanhol:
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Jornalista Eva Fernández entrega ao Papa pintura do migrante africano Daniel |
“Não estou certo de que esta pintura reflita como realmente
me sinto, porque todavia meu coração sangra. Parte de minha alma foi arrancada
no dia do naufrágio. Por mais que tenha estendido minhas mãos, não pude salvar
meus irmãos da morte. O único que poderia ter puxado para o bote não quis que o
salvasse quando se deu conta de que não poderia resgatar a todos os outros. Seu
desejo era ganhar dinheiro na Europa para poder ajudar sua mãe na Nigéria.
Outro de meus irmãos queria ser um jogador de futebol profissional. Outro
sonhava em ser artista. Naquela noite, diante de meus olhos, se afogaram no
Mediterrâneo. Estou muito triste, porém prometo que não quero chorar.”
No domingo, o Papa tem um encontro marcado com os migrantes acolhidos na ilha e entre os que irão saudá-lo está Daniel.
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Papa ao lado do diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo
Bruni |
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Francisco no discurso às Autoridades e ao Corpo Diplomático:No discurso às Autoridades e ao Corpo Diplomático, o Papa
disse ver com tristeza "como o entusiasmo pela paz, surgido depois da II
Guerra Mundial, se debilitou nas últimas décadas (...), com alguns poderosos
que avançam por conta própria à procura de espaços e zonas de influência. E assim
não só a paz, mas também muitas questões importantes, como a luta contra a fome
e as desigualdades, foram efetivamente canceladas das principais agendas
políticas".
O primeiro compromisso do Papa Francisco em Malta na manhã
deste sábado, 2, foi o encontro com as autoridades, o Corpo Diplomático e os
representantes da sociedade e do mundo da cultura no Palácio Presidencial de
Valeta.
Ao agradecer as amáveis palavras do presidente George Vella,
o Pontífice recordou que os antepassados malteses deram hospitalidade ao
Apóstolo Paulo e seus companheiros, durante a sua viagem a Roma, tratando-os
com “extraordinária benevolência”.
Referindo-se à Ilha de Malta, coração do Mediterrâneo,
Francisco recordou que “há milênios, o entrelaçamento de acontecimentos
históricos e o encontro de populações fizeram daquelas ilhas um centro de
vitalidade e cultura, espiritualidade e beleza; uma encruzilhada que soube
acolher e harmonizar os influxos migratórios de muitas partes.
Esta diversidade de influxos nos leva a pensar na variedade
dos ventos, que caracterizam o país. Não é por acaso que, nos antigos mapas do
Mediterrâneo, a “Rosa dos Ventos” era colocada perto de Malta”.
Tomando a imagem da “Rosa dos Ventos”, que localiza as
correntes de ar segundo os quatro pontos cardeais (Norte, Sul, Leste e Oeste),
o Papa delineou quatro aspectos essenciais da vida social e política do país.
O vento Norte, recorda a União Europeia, onde vive uma
grande família, unida na salvaguarda da paz. A paz brota da unidade. Eis a
importância de trabalhar juntos, sem divisões, revigorando as raízes e valores,
que forjaram a unidade da sociedade maltesa. Mas, para garantir uma boa
convivência social, é preciso também reforçar os alicerces da vida comum, com
base no direito, legalidade, honestidade e justiça. Por isso, o esforço de
eliminar a ilegalidade e a corrupção deve ser forte como o vento do norte, que
purifica as costas do país, erradicando a inércia e a criminalidade. A Casa
Europeia compromete-se com a promoção dos valores da justiça e equidade social
e a tutela de uma casa mais ampla: a Casa da Criação.
O vento Norte, disse Francisco, mistura-se, às vezes, com o
vento que sopra do Oeste. Este país europeu, sobretudo os jovens,
partilham dos estilos de vida e pensamento ocidentais, dos valores da liberdade
e da democracia, mas também dos riscos da ambição do progresso, que os podem
separar das raízes.
Os malteses defendem a vida e salvam tantas pessoas. Por isso, Francisco os encorajou a continuar a defender a vida, desde o início até ao seu fim natural, mas também preservá-la sempre, sobretudo a dignidade dos trabalhadores, dos idosos e dos doentes.
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Papa saúda a multidão diante do Palácio Presidencial |
Continuando
a comparação com a “Rosa dos Ventos”, o Santo Padre convidou a olhar para Sul,
de onde vêm tantos irmãos e irmãs em busca de esperança. Malta, disse,
significa “porto seguro”. O crescente afluxo dos migrantes gera medo e
insegurança, desânimo e frustração. O fenômeno migratório marca a nossa época e
traz consigo injustiças, exploração, mudanças climáticas, conflitos e suas
consequências. Multidões de pessoas partem do sul, pobre e povoado, e se
dirigem para o norte rico. E Francisco acrescentou:
“O agravamento da emergência migratória, pensemos nos
refugiados da atormentada Ucrânia, exige respostas amplas e partilhadas. Apenas
alguns países não podem arcar com todo este problema, diante da indiferença de
outros! Países civis não podem ratificar, por interesses próprios, acordos
obscuros com criminosos que escravizam as pessoas. O Mediterrâneo precisa da
corresponsabilidade europeia, para voltar a ser teatro de solidariedade e não
lugar de trágicos naufrágios.”
Recordando o naufrágio do Apóstolo Paulo que, de modo
inesperado, chegou àquelas costas e foi socorrido, o Papa exortou, em nome do
Evangelho, que ele pregou naquela Ilha, a “abrir os corações para descobrir a
beleza de servir aos mais necessitados. Não devemos encarar o migrante como
ameaça, mas como irmão a ser acolhido, segundo o ideal cristão.
Por fim, o Pontífice referiu-se ao vento que sopra do Leste,
do Oriente, de onde provêm ventos de guerra, invasões, combates e ameaças
atômicas, que só causam mortes, destruição e ódio. Que estas sombras obscuras
não levem a dissipar o sonho de paz da humanidade. E, ao expressar seu
desejo de que o risco de uma “guerra fria alargada” não ceife mais vidas de
gerações e inteiros povos, afirmou:
“Quanto precisamos duma «medida humana» face à agressividade
infantil e destrutiva que nos ameaça, frente ao risco duma «guerra fria
alargada» que pode sufocar a vida de gerações e povos inteiros! Infelizmente,
aquele «infantilismo» não desapareceu. Ressurge prepotentemente nas seduções da
autocracia, nos novos imperialismos, na difusa agressividade, na incapacidade
de lançar pontes e começar pelos mais pobres. Disto começa a soprar o vento
gelado da guerra, que esta vez também foi alimentado ao longo dos anos. Sim,
desde há tempos que a guerra tem vindo a ser preparando com grandes
investimentos e tráficos de armas. E é triste ver como o entusiasmo pela paz,
surgido depois da II Guerra Mundial, se debilitou nas últimas décadas, bem como
o percurso da comunidade internacional, com alguns poderosos que avançam por conta
própria à procura de espaços e zonas de influência. E assim não só a paz, mas
também muitas questões importantes, como a luta contra a fome e as
desigualdades, foram efetivamente canceladas das principais agendas políticas.”
O Papa concluiu seu discurso, dirigindo, mais uma vez, seu
olhar ao Leste europeu e um pensamento ao Oriente Médio, a fim de que sigam o
exemplo dos malteses, que geram benéficas convivências, apesar das
diversidades. É disto que precisam o Líbano, a Síria, o Iêmen e outros contextos,
dilacerados por problemas e violência”.
Manoel Tavares
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Papa saúda a multidão diante do Palácio Presidencial |
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Francisco:No único compromisso na parte da tarde
deste sábado, 2 de abril, no âmbito da 36ª Viagem Apostólica Internacional de
seu pontificado, o Papa Francisco presidiu um encontro de oração em um dos
lugares de fé mais importantes da República de Malta: o Santuário de Ta ‘Pinu.
A Igreja se encontra na ilha de Gozo a segunda maior ilha do arquipélago de
Malta.
Segundo a tradição “uma voz convidou a
recitar "três Ave Marias, uma para cada dia que meu corpo permaneceu no
túmulo". Quem a ouviu em 22 de junho de 1883 foi Carmela Grima, uma
agricultora da ilha de Gozo. Ela confidenciou o prodigioso acontecimento a um
amigo seu, Francisco Portelli, que revelou à jovem que tinha ouvido as mesmas
palavras nas proximidades do mesmo local, lugar hoje da Igreja de Ta 'Pinu, que
agora é um Santuário, e que acolheu o Papa Francisco na tarde deste sábado.
Na sua homilia durante o encontro de oração
Francisco iniciou refletindo sobre a hora de Jesus, que no Evangelho de João é
a hora da morte na cruz. Francisco disse que não constitui a conclusão da
história, mas marca o início duma vida nova. Na cruz, contemplamos o amor misericordioso
de Cristo, que estende os braços para nós e, através da sua morte, abre-nos à
alegria da vida eterna.
“Irmãos e irmãs, a partir deste Santuário
de Ta' Pinu, podemos meditar juntos sobre o novo início que brota da hora de
Jesus. Também neste lugar, antes do edifício esplêndido que vemos hoje, havia
só uma capelinha em estado de abandono. Já estava aliás decidida a sua
demolição: parecia o fim".
Mas uma série de acontecimentos mudou o
rumo das coisas, como se o Senhor quisesse dizer a esta população: «Não serás
mais chamada a “Desamparada”, nem a tua terra a “Deserta”; antes, serás
chamada: “Minha Dileta”, e a tua terra a “Desposada”». Aquela capelinha
tornou-se o Santuário nacional, meta de peregrinos e fonte de vida nova.
Francisco recordou que esteve ali como
peregrino, também São João Paulo II, cujo aniversário da morte ocorre hoje. Um
lugar que parecia perdido, hoje regenera fé e esperança no Povo de Deus.
Mas que significa voltar àquele início? Que
significa tornar às origens? perguntou Francisco.
"Antes de mais nada, disse Francisco,
trata-se de voltar a descobrir o essencial da fé. Tornar à Igreja das origens
não significa olhar para trás para copiar o modelo eclesial da primeira
comunidade cristã. Não podemos «saltar a história», como se o Senhor não
tivesse falado e feito grandes coisas também na vida da Igreja dos séculos
seguintes. Nem significa sermos demasiado idealistas, imaginando que naquela
comunidade não haveria dificuldades quando, pelo contrário, lemos que os
discípulos discutem e chegam mesmo a litigar entre eles, e nem sempre entendem
os ensinamentos do Senhor".
Voltar às origens significa, disse o Papa,
antes, recuperar o espírito da primeira comunidade Cristã, isto é, voltar ao
coração e redescobrir o centro da fé: a relação com Jesus e o anúncio do seu
Evangelho ao mundo inteiro. Isto é o essencial!
Francisco destacou que a Igreja maltesa
gloria-se duma história preciosa da qual extrair tantas riquezas espirituais e
pastorais. “Todavia, a vida da Igreja – tenhamo-lo sempre presente – nunca é só
«uma história passada a recordar», mas um «grande futuro a construir», dócil
aos desígnios de Deus”.
O Santo Padre afirmou “não nos pode bastar
uma fé feita de usos e costumes recebidos por tradição, de celebrações solenes,
belas iniciativas populares, momentos fortes e emocionantes; precisamos duma fé
fundada e renovada no encontro pessoal com Cristo, na escuta diária da sua
Palavra, na ativa colaboração na vida da Igreja, na alma da piedade popular”.
Francisco disse em seguida que a crise da
fé, a apatia da prática religiosa sobretudo no pós-pandemia e a indiferença de
muitos jovens relativamente à presença de Deus não são questões que devemos
«açucarar» pensando que, apesar de tudo, ainda subsiste um certo espírito
religioso. Na realidade, às vezes o suporte exterior pode ser religioso, mas
por trás desses andaimes a fé vai envelhecendo.
O Papa advertiu então que é preciso vigiar
para que as práticas religiosas não se reduzam à repetição dum repertório do
passado, mas expressem uma fé viva, aberta, que difunda a alegria do Evangelho.
O Santo Padre destacou então que também os
malteses iniciaram, através do Sínodo, um processo de renovação, e lhes
agradeceu por este caminho. Este é o momento de voltar àquele começo, ao pé da
cruz, olhando para a primeira comunidade Cristã, para ser uma Igreja que tem a
peito a amizade com Jesus e o anúncio do seu Evangelho, e não a busca de espaço
e atenções.
“Não tenhais medo de empreender – como já
fazeis – percursos novos de evangelização e anúncio, talvez até arriscados, mas
que tocam a vida”.
Francisco voltou então mais uma vez para as
origens, para Maria e João junto da cruz. Nos primórdios da Igreja, temos o seu
gesto de mútua entrega. Com efeito, o Senhor confia cada um deles aos cuidados
do outro: João a Maria e Maria a João. Realmente não se tratou dum simples
gesto de compaixão – Jesus teria confiado a sua Mãe a João, para que Ela não
ficasse sozinha depois da morte d’Ele – mas duma indicação concreta do modo
como viver o mandamento supremo: o do amor. O culto a Deus passa pela
proximidade ao irmão.
Quão importante é na Igreja o amor entre os
irmãos e o acolhimento do próximo!
“Caríssimos, o mútuo acolhimento, não como
pura formalidade, mas em nome de Cristo, é um desafio permanente. É-o antes de
mais nada para as nossas relações eclesiais, porque a nossa missão produz fruto
se trabalharmos na amizade e na comunhão fraterna”.
Mas o acolhimento é também o teste decisivo
para verificar quão efetivamente esteja permeada a Igreja pelo espírito do
Evangelho.
Maria e João acolhem-se não no refúgio
ameno do Cenáculo, mas junto da cruz, naquele lugar tenebroso onde se era
condenado e crucificado como criminoso. Também nós não podemos acolher-nos
apenas entre nós à sombra das nossas belas igrejas, enquanto fora muitos irmãos
e irmãs sofrem e são crucificados pelo sofrimento, a miséria, a pobreza e a
violência.
“No rosto destes pobres, é o próprio Cristo
que Se apresenta a vós. Esta foi a experiência do Apóstolo Paulo que, depois
dum terrível naufrágio, foi calorosamente acolhido pelos vossos antepassados….
Eis o Evangelho que somos chamados a viver: acolher, ser peritos em humanidade,
acender fogueiras de ternura quando o frio da vida paira sobre aqueles que
sofrem”.
Enfim o agradecimento do Papa aos numerosos
missionários malteses "que espalham a alegria do Evangelho por todo o
mundo, aos inúmeros sacerdotes, às religiosas e aos religiosos e a todos
vós".
“Como disse o vosso bispo D. Teuma, sois uma ilha pequena mas de coração grande. Sois um tesouro na Igreja e para a Igreja”.
Silvonei José
.................................................................................................................................................. Fonte: vaticannews.va
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