A gente santa de Sr Deus
Nesse MÊS VOCACIONAL, gostaria de levá-los
ao encontro de personalidades que compuseram a face de uma Igreja de Cristo
vocacionada à santidade, ainda que isso lhes custasse a vida.
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Dom José Francisco |
Ele nasceu em 1906, e morreu aos 9 de
abril de 1945, num campo de concentração da Alemanha Nazista. Foi um teólogo,
pastor luterano, membro da resistência alemã e membro fundador da Igreja
“Confessante”, uma ala clandestina da igreja evangélica contrária à política
nazista.
Em 1933, ele havia proferido uma palestra
no rádio, onde criticara os “líderes” que se deificam, razão pela qual a
transmissão foi interrompida. Muitos cristãos alemães haviam acolhido
favoravelmente o advento do nazismo, por razões que só à História se concede o
direito do julgamento.
Acontece que em 1933, foi tomada uma
resolução pela qual os “não arianos” seriam impedidos de se tornarem ministros
de culto ou professores de religião. Bonhoeffer se opôs a essa tese, afirmando
que ela submeteria os ensinamentos cristãos à ideologia política: se aos “não
arianos” fosse impedido o acesso ao ministério, então os pastores teriam que
renunciar em sinal de solidariedade.
Em 1943, ele foi preso em decorrência da
ajuda a um grupo de judeus que fugiam da Alemanha. Durante os dois anos de
prisão que precederam a sua morte, em cartas, ele explorou o significado da fé
cristã em um mundo como aquele, perguntando “Quem é Cristo para nós hoje?”.
Depois da confusão da tentativa fracassada
de atentado contra Hitler, no dia 20 de julho de 1944, ele foi transferido para
o campo de concentração de Buchenwald e, por fim, para o de Flossenbürg, onde,
no dia 09 de abril de 1945, foi enforcado, junto com seu irmão Klaus e seus
cunhados. É terrível que isso acontecesse apenas 10 dias antes das tropas
soviéticas invadirem e libertarem o campo.
Fico pensando nas prisões criadas por nós
mesmos, em formas de religiosidade doente, onde Deus, praticamente, desaparece.
Ali onde a ciência nos envaidece, onde falta a escuta atenta, onde a maravilha
se transforma em distração, acabamos assistindo a esse desaparecimento como se
fosse o fato mais trivial e coerente.
Onde a gente impera, Deus desaparece.
Então, assistimos à dissolução do sentido e
caímos na vala do nada. Se Deus está morto, o nada se transforma em
acontecimento.
É por aí, que os santos foram diferentes.
Um santo nos inquieta por não ser um outro
diferente de nós. Pelo contrário, ele é, ao mesmo tempo, semelhante e
diferente, um modelo incômodo, um homem menos nivelado, menos adaptado e menos
satisfeito com o mundo. Na verdade, o santo é um homem (ou mulher) de uma
originalidade incrível, capaz de atingir um mundo que nos escapa e torná-lo
vivo e eficaz na História.
Os santos são as pegadas multicoloridas de
Deus no caminho dos homens.
Em todas as formas surpreendentes que
assumem, místicos, visionários, homens de empresas que se tornaram
multinacionais pela força de suas ideias, cada um, a seu modo, discorre sobre
um assunto só: Deus. Cada vida que viveram sobrevive nas nossas vidas, num
traço de sacralidade em cada um de nós que fica e anda e compra e vende, mas
sabe que não sobrevive sem um sentido maior. A vida, por si só, é grande, mas,
por si só, não basta. Sempre queremos mais.
Precisamos, cada vez mais, de santos.
Os santos se tornam uma espécie de
símbolo-real da superação de tudo, do mal e da dor, de qualquer limite que se
imponha ao homem como inimigo a ser combatido.
Precisamos que eles retornem a nossa
sociedade.
Vamos pensar neles no Mês Vocacional?
Não estamos mais suportando viver a esmo,
sem pontos claros de partida e de chegada, sem saber o que realmente vale a
pena ser vivido, sonhado, esperado. Cada vez mais me impressiona como eles
foram dos poucos humanos que souberam o que queriam. Tanto souberam, que
quiseram.
Voltando a Dietrich Bonhoeffer, 10 anos
depois, em 1955, o médico do campo de concentração, Hermann Fischer-Hüllstrung,
relatou o fato do seguinte modo:
“Pela porta entreaberta de uma sala no
prédio do quartel, vi o pastor Bonhoeffer ajoelhando-se, em profunda
oração com seu Deus, antes de tirar suas roupas de prisioneiro (os
executados deviam despir-se completamente e ir nus para a forca). Fiquei
profundamente chocado com a forma devocional desse homem extraordinariamente
simpático. Ele também ofereceu uma breve oração no local da execução e então,
com coragem e calma, subiu a escada para a forca. A morte ocorreu depois de
alguns segundos. Em meus quase 50 anos de atividade médica, dificilmente vi um
homem morrer com tanta devoção.”
Essa é a gente santa, vocacionada para
Deus!
Estamos prontos?
Dom José Francisco Rezende Dias - Arcebispo de Niterói (RJ)
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