terça-feira, 10 de agosto de 2021

Reflita com Dom José Francisco:

A gente santa de Sr Deus

Nesse MÊS VOCACIONAL, gostaria de levá-los ao encontro de personalidades que compuseram a face de uma Igreja de Cristo vocacionada à santidade, ainda que isso lhes custasse a vida.

Dom José Francisco
Uma dessas personalidades é Dietrich Bonhoeffer.

Ele nasceu em 1906, e morreu aos 9 de abril de 1945, num campo de concentração da Alemanha Nazista. Foi um teólogo, pastor luterano, membro da resistência alemã e membro fundador da Igreja “Confessante”, uma ala clandestina da igreja evangélica contrária à política nazista.

Em 1933, ele havia proferido uma palestra no rádio, onde criticara os “líderes” que se deificam, razão pela qual a transmissão foi interrompida. Muitos cristãos alemães haviam acolhido favoravelmente o advento do nazismo, por razões que só à História se concede o direito do julgamento.

Acontece que em 1933, foi tomada uma resolução pela qual os “não arianos” seriam impedidos de se tornarem ministros de culto ou professores de religião. Bonhoeffer se opôs a essa tese, afirmando que ela submeteria os ensinamentos cristãos à ideologia política: se aos “não arianos” fosse impedido o acesso ao ministério, então os pastores teriam que renunciar em sinal de solidariedade.

Em 1943, ele foi preso em decorrência da ajuda a um grupo de judeus que fugiam da Alemanha. Durante os dois anos de prisão que precederam a sua morte, em cartas, ele explorou o significado da fé cristã em um mundo como aquele, perguntando “Quem é Cristo para nós hoje?”.  

Depois da confusão da tentativa fracassada de atentado contra Hitler, no dia 20 de julho de 1944, ele foi transferido para o campo de concentração de Buchenwald e, por fim, para o de Flossenbürg, onde, no dia 09 de abril de 1945, foi enforcado, junto com seu irmão Klaus e seus cunhados. É terrível que isso acontecesse apenas 10 dias antes das tropas soviéticas invadirem e libertarem o campo.  

Fico pensando nas prisões criadas por nós mesmos, em formas de religiosidade doente, onde Deus, praticamente, desaparece. Ali onde a ciência nos envaidece, onde falta a escuta atenta, onde a maravilha se transforma em distração, acabamos assistindo a esse desaparecimento como se fosse o fato mais trivial e coerente.

Onde a gente impera, Deus desaparece.

Então, assistimos à dissolução do sentido e caímos na vala do nada. Se Deus está morto, o nada se transforma em acontecimento.

É por aí, que os santos foram diferentes.

Um santo nos inquieta por não ser um outro diferente de nós. Pelo contrário, ele é, ao mesmo tempo, semelhante e diferente, um modelo incômodo, um homem menos nivelado, menos adaptado e menos satisfeito com o mundo. Na verdade, o santo é um homem (ou mulher) de uma originalidade incrível, capaz de atingir um mundo que nos escapa e torná-lo vivo e eficaz na História.

Os santos são as pegadas multicoloridas de Deus no caminho dos homens.

Em todas as formas surpreendentes que assumem, místicos, visionários, homens de empresas que se tornaram multinacionais pela força de suas ideias, cada um, a seu modo, discorre sobre um assunto só: Deus. Cada vida que viveram sobrevive nas nossas vidas, num traço de sacralidade em cada um de nós que fica e anda e compra e vende, mas sabe que não sobrevive sem um sentido maior. A vida, por si só, é grande, mas, por si só, não basta. Sempre queremos mais.

Precisamos, cada vez mais, de santos.

Os santos se tornam uma espécie de símbolo-real da superação de tudo, do mal e da dor, de qualquer limite que se imponha ao homem como inimigo a ser combatido.  

Precisamos que eles retornem a nossa sociedade.

Vamos pensar neles no Mês Vocacional?

Não estamos mais suportando viver a esmo, sem pontos claros de partida e de chegada, sem saber o que realmente vale a pena ser vivido, sonhado, esperado. Cada vez mais me impressiona como eles foram dos poucos humanos que souberam o que queriam. Tanto souberam, que quiseram.

Voltando a Dietrich Bonhoeffer, 10 anos depois, em 1955, o médico do campo de concentração, Hermann Fischer-Hüllstrung, relatou o fato do seguinte modo:

“Pela porta entreaberta de uma sala no prédio do quartel, vi o pastor Bonhoeffer ajoelhando-se, em profunda oração com seu Deus, antes de tirar suas roupas de prisioneiro (os executados deviam despir-se completamente e ir nus para a forca). Fiquei profundamente chocado com a forma devocional desse homem extraordinariamente simpático. Ele também ofereceu uma breve oração no local da execução e então, com coragem e calma, subiu a escada para a forca. A morte ocorreu depois de alguns segundos. Em meus quase 50 anos de atividade médica, dificilmente vi um homem morrer com tanta devoção.”

Essa é a gente santa, vocacionada para Deus!

Estamos prontos?

                                          Dom José Francisco Rezende Dias - Arcebispo de Niterói (RJ)

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