sábado, 26 de julho de 2025

Reflita com frei Almir Guimarães:

O inesgotável tema da oração

Jesus estava rezando um certo lugar” (Lc 11,1)

 Lucas é o evangelista da oração. O terceiro evangelho mostra Jesus, incontáveis vezes, retirado em oração. Sua oração é, basicamente, um se recolher para entrar na intimidade do Pai. Jesus sabe que o Pai está próximo e, no silêncio e recolhimento, ele se compraz em estar com Ele, em sintonia com os desejos e sonhos do Pai. Sua oração se inspira nos salmos. É adoração, súplica, ação de graças, louvor.  Para Jesus a oração  não fazia apenas parte da vida, mas era a própria vida. Sua existência se passava na presença de Deus, seu Pai, a cada instante.  Tudo ele partilha com o Pai.

 Somos sempre aprendizes na arte da oração. Balbuciamos fórmulas por vezes com toda a verdade de nosso ser.  De outro lado, temos receio das palavras da Escritura que condenam os que honram o Senhor com os lábios, mas cuja oração está longe do Senhor.  Precisamos nos construir em verdadeiros orantes.

 Não podemos nos acostumar a uma oração mecânica e sem viço. Muitos dizem que perderam o gosto, o hábito de rezar. Há mesmo aqueles que confessam que, ao longo dos anos, nunca tiveram encontros profundos, pessoais e suculentos com o Senhor. Acham áridas as orações aprendidas de cor e não conseguem colocar-se diante do Senhor. Há, é verdade,  muitos que não desejam outra coisa senão aprender um jeito de serem íntimos do  Senhor.  Recolhem-se, manuseiam o livro dos salmos, participam de pequenos e serenos grupos de oração.

 Tudo precisa começar com o despertar do desejo, do desejo do Senhor. Há os que não experimentam necessidade de Deus. Parece que bastam-se a si mesmos. Há, no entanto, momentos de nossas vidas em que experimentamos um imenso desejo de Deus, uma saudade do Senhor. Para começar a rezar será preciso desejar: “Minha alma te busca, Senhor, tenho sede de Deus, do Deus vivo” (Sl 42, 2-3).  No começo um desejo  confuso acompanhado de certas experiências:  vazio interior, insatisfação generalizada, sensação de inutilidade de uma vida agitada e de correria.  Desejo quase imperceptível ou muito forte. Este desejo  já é oração.  Pode ser que o  Espírito já esteja rezando no homem do desejo.

 José Tolentino Mendonça nos orienta:

> “A oração cristã não  é uma viagem ao fundo de si mesmo.  Não é um movimento introspectivo.  Não é uma diagnose de nossos pensamentos e moções externas e íntimas. A oração cristã é ser e estar  diante de Deus, colocar-se por inteiro e continuamente diante de sua presença, com uma atenção vigilante àquele que  nos convida a um diálogo sem censuras. Não é oferecer a Deus alguns pensamentos, tudo o que somos e experimentamos”.

“A oração é uma  conversão de atitude,  porque a verdadeira oração cristã descentra-nos de nós mesmos –  das nossas preocupações e afanos, de nossos desejos eróticos e pouco purificados – o orienta-nos para Deus de modo que tudo o que passamos a desejar  é a vontade de Deus, o dom de seu olhar, que, como dizia  Santo Agostinho, é mais íntimo a nós que nós mesmos” (José  Tolentino Mendonça, O tesouro escondido, Paulinas, p. 72).

 Sempre se considerou o coração, em seu sentido bíblico, como o lugar da oração. O coração é o mais íntimo da pessoa, a raiz de nosso ser, a sede da liberdade. Não se reza com a inteligência, nem com a memória ou com a sensibilidade. A pessoa ora a Deus no coração e Deus lhe fala ao coração (cf Os 2,16). Para orar é necessário despertar o coração se estiver dormindo porque vivemos na periferia de nosso ser, movidos por coisas exteriores,  derramo-nos  em reflexões superficiais.  Trata-se de buscar o Senhor com o melhor de nós mesmos.

 Orar é acolher uma Presença. Ora, a Presença do Senhor não é uma entre outras.  Sua aproximação não pode ser acolhida como uma a mais. É uma presença que vem de longe de nós mesmos, que supera nossos desejos, que questiona nossos projetos. Podemos acolhê-la ou rechaça-la. Deixar que nos escape uma vez mais ou abrirmos a porta para ela.  Quando acolhemos a presença do Senhor  descobrimo-nos a nós mesmos com  nossa grandeza e nossa pequenez, nosso anelo pelo infinito  e nossa miséria.  Chegamos a descobrir nossa interioridade. No começo, quem sabe, somos possuídos de certo temor depois há um movimento de entrega àquele que nos ama “Não abandonas aqueles que te procuram” (Sl 9, 11).

 Orar nada mais é do que prestar atenção ao gemido do Espírito que habita em nós. Urge não apaga-lo, mas acolhe-lo. Há dias em que temos a impressão que o desejo e o sopro desapareceram.  Depois ele volta com mais força: “Já estou chegando e batendo  à porta. Se alguém ouvir a minha voz  e abrir a porta, entrarei em sua casa, e juntos faremos a refeição (Ap 3.20).  Abrir a porta significa  não caminhar  sozinho  pela vida afora, mas deixar-se acompanhar por esta presença  misteriosa e não encerrar-se  na própria autossuficiência, mas abrir-se  confiantemente a Deus.

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Oração

Meu Pai,
Eu me abandono a ti,
Faz de mim, o que quiseres.
O que fizeres de mim
Eu te agradeço.
Estou pronto para tudo, aceito tudo.
Desde que tua vontade se faça em mim
E em tudo o que criaste,
Nada mais quero, meu Deus,
Com todo o amor de meu coração
Porque te amo.
E é para mim uma necessidade de amor  dar-me,
Entregar-me nas tuas mãos sem medida
Com uma confiança infinita
Porque Tu és… meu Pai!
(Charles de Foucauld)

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FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

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                                                        Fonte: franciscanos.org.br    Imagem: vaticannews.va

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