Enviados em nome de Jesus
Frei Almir Guimarães
O Senhor escolheu setenta e dois discípulos e os enviou dois a dois, na sua frente a toda cidade e lugar aonde ele próprio devia ir.
Ouvimos neste domingo o relato do evangelho de Lucas a respeito do envio dos setenta e dois discípulos por parte de Jesus. Tema da missão. Jesus faz uma série de recomendações. Que sejam pessoas simples e atuem com despojamento, não levem muita bagagem, que preparem os caminhos que ele depois percorrerá. Os que são enviados não esqueçam que a tarefa não é simples: são como ovelhas no meio de lobos. A missão haverá de se concretizar, de modo particular, como convite à paz. Como conclusão há essa afirmação de que os nomes dos apóstolos seriam escritos no céu. Vivemos um tempo de insistência no labor da evangelização. Somos discípulos do Mestre amado e seus enviados. Vivemos o tempo do discípulo que se torna espalhador da boa nova. Não se concebe uma Igreja fechada em si mesma. Queremos uma Igreja renovada com discípulos cheios de zelo ao dizerem que são felizes porque abraçaram a Boa Nova do Evangelho.
Evangelizar, fazer missão, não quer dizer encher a cabeça das pessoas de ideias, de coisas bonitas, que rezem, que sejam “bonzinhos, obedientes e dóceis” ao que lhes é mandado. Evangelizar é continuar no hoje do mundo a missão de Jesus, que foi enviado pelo Pai para anunciar boas notícias e atingir o nó mais profundo das pessoas.
O que é, na verdade, uma boa nova? Conhecemos boas notícias na vida de todo dia: o filho que andava com a marginalidade voltou para o seio da família; os amigos que pareciam ter morrido no mar estão são e salvos; a mulher livrou-se do fantasma de uma doença com os bons resultados do tratamento. O Evangelho é boa notícia. Não é apenas a transmissão de verdades que precisam ser cridas. O Evangelho é uma Pessoa viva, Cristo amado e presente.
Evangelizar, anunciar a Boa Nova:
♦ É dizer e fazer com as pessoas compreendam que o Senhor Deus não cabe em nossas elucubrações, nossas ideias e nossas categorias. É bem mais belo e maior do que possamos imaginar. Os santos e os homens retos de coração nos ensinaram que aproximar-se dele no movimento da entrega significa dar claridade e luz à nossa vida. Ele é tudo: o bem, o grande bem, o sumo bem.
♦ Não é policial à espreita de nossas faltas para nos castigar. Ele é fornalha de dom, de amor, de entrega. Viemos dele. Ele nos inventa a cada instante e para ele nos encaminhamos. Nosso destino é o oceano do amor que é Deus enquanto viajamos. William Blake, poeta, diz termos sido “colocados na terra por um pequeno espaço de tempo para podermos aprender a suportar os raios do amor”.
♦ Evangelizar é fazer com que as pessoas possam entrar em contato com a pessoa de Jesus vivo, ressuscitado, presente no meio de nós, atuando em nossas comunidades, falando pela vida e pelos lábios dos que o amam, dos que são verdadeiros anunciadores da paz e da reconciliação.
♦ Evangelizar é tentar tocar o fundo do coração das pessoas para que se voltem para o Senhor, para o louvor de sua glória, para o cuidado amoroso das pessoas, para que recolham no albergue do coração os jogados à beira da estrada, para que extirpem de sua vida e de seu redor todo movimento de inimizade, cobiça, injustiça. Evangelizar é criar um mundo segundo o coração de Deus. Resultado da evangelização é a conversão.
♦ Evangeliza-se pela palavra, palavra sincera, simples, sem pose. Evangeliza-se, no entanto, muito mais pelo testemunho, pelo exemplo do que por documentos e palavras que o vento leva.
♦ Por sua vida familiar decente, correta, bonita as famílias que encontram Cristo evangelizam outras famílias. Religiosos límpidos e transparentes mostram ao mundo que a vale a pena viver o Sermão da Montanha, as admoestações do Senhor para uma vida sem aparatos. Evangelizam os políticos honestos e corretos que defendem a causa dos injustiçados.
♦ Certamente, uma maneira toda especial de evangelizar é por meio de gestos e manifestações de atenção: pensamos aqui no cuidado que podemos desenvolver e muitos de nossos serviços: proximidade de pessoas doentes, encarceradas, crianças soltas, jovens sem referências familiares.
♦ No final desta reflexão tantas perguntas ainda, tantos questionamentos! Nós que pensamos estar evangelizados ainda não conhecemos todo o amor da Boa Nova. Precisamos ser mais permeáveis. Há pessoas que se contentam com um cristianismo de práticas e, sem querer, perderam o veio do Evangelho. De repente, nesse mundo em que vivemos será preciso atingir a pessoas lá onde elas vivem. Como? Como fazer com que a Igreja passe de um grupo contente de ter encontrado o Evangelho para um Igreja em saída como deseja o Papa?
♦ “A primeira coisa que se aprende de Jesus nos evangelhos não é doutrina, mas um estilo de vida: uma maneira de estar na vida, uma forma de habitar o mundo, de interpretá-lo e de construí-lo; uma maneira de tornar a vida mais humana. O característico deste estilo de viver é que ele se inspira em Jesus. Nasce da relação com ele. É-nos transmitido seu Espírito. Aprendemos sua maneira de pensar, sentir, amar, orar, sofrer, confiar e morrer. Pouco a pouco vamos convertendo-nos em “discípulos” e “discípulas” de Jesus” (Ch.Theobald,SJ).
Oração
Envia-me de novoPediste minhas mãos, Senhor,
porque tinhas para mim uma tarefa;
emprestei-as a ti por um momento,
mas as retirei quase que imediatamente,
porque era duro o trabalho.
Pediste meu olhos, Jesus,
para ver sofrimentos e pobrezas;
fechei-os logo,
para não passar mais vergonha.
Pediste minha boca, Senhor,
para clamar contra a injustiça;
dei-te apenas um sussurro,
para que ninguém me acusasse de nada.
Pediste minha vida,
para trabalhar para ti;
dei-te apenas uma pequena parte,
para não comprometer-me demasiado.
Perdoa-me, Senhor,
e envia-me de novo,
porque agora sim tomarei a sério
tua cruz e tua tarefa (Anônimo)
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FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.
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