O Sínodo sobre a família
Cidade do
Vaticano (RV) - Durante o recente Sínodo dos Bispos sobre a família, realizado
no Vaticano, o Arcebispo de São Paulo, Cardeal Odilo Scherer, diariamente,
através da Rádio Vaticano, trouxe os conteúdos dos trabalhos sinodais, aos
fiéis do Brasil. Na conclusão dos trabalhos do Sínodo Dom Odilo respondeu
algumas perguntas à nossa emissora e também outras ao Jornal O São Paulo.
Publicamos a entrevista do O São Paulo.
1. A 14ª
assembleia ordinária do Sínodo foi encerrada no dia 25 de outubro. Como
descrever a experiência desse Sínodo, na condição de participante dele?
Cardeal Odilo Scherer |
Cardeal Odilo
Scherer: Foi uma experiência eclesial muito intensa e bonita. Deu para perceber
a universalidade da Igreja: sendo a mesma em toda parte, pelo mesmo Evangelho,
a mesma profissão de fé e pela mesma organização visível, ela tem, ao mesmo
tempo, faces muito diferentes, de acordo com as culturas onde ela está
inserida. Foram 3 semanas de reuniões com a presença quase diária do Papa
Francisco e com representantes dos episcopados do mundo inteiro, além de outros
membros da Igreja. Não se tratou de um Parlamento, onde a maioria decide, ou os
partidos tentam negociar composições e compromissos, para vencer um debate...
Procuramos todos falar com liberdade e colocar-nos à escuta do outro, na
tentativa de discernir o que o Espírito de Deus ensina.
2. O Sínodo
tratou de muitos temas relativos à família: no seu parecer, quais serão as
contribuições que mais deixarão marcas no presente e no futuro da família?
Cardeal Odilo
Scherer: De fato, mesmo se o tema específico foi “a vocação e a missão da
família na Igreja e na sociedade contemporânea”, foram abordados praticamente
todos os temas referentes ao casamento e à família. Creio que o resultado foi
muito positivo e algumas questões apareceram claras: uma renovada valorização
da família pela Igreja, como realidade boa e querida por Deus; o casamento
entre um homem e uma mulher dá início a uma família; a família tem uma missão importante
em relação a cada pessoa, à comunidade humana e à Igreja; muitas situações
novas e complexas envolvem hoje a família e requerem a atenção pastoral
renovada da Igreja, que precisa estar próxima das famílias marcadas pela dor e
todo tipo de sofrimento. A Igreja, ao mesmo tempo que convida todos a acolherem
a Boa Nova de Jesus, precisa olhar com paciência e misericórdia os casais e as
famílias que vivem em situações contrastantes com o ensinamento do
Evangelho.
3. Há esperança
de que no futuro haja menos casais separados, divórcios e casais em segunda
união?
Cardeal Odilo
Scherer: A Igreja é sempre animada pela esperança. Mas o Sínodo refletiu muito
sobre a necessidade da boa preparação para o casamento cristão e o casamento em
geral. Creio que a preparação para o casamento deverá ser uma das ações
principais da pastoral da família, de maneira que haja menos casamentos nulos
ou divórcios no futuro. Precisamos perseverar, na certeza de que Deus não pede
coisas impossíveis aos homens. É possível casar, perseverar e ser feliz no
casamento.
4. Antes do
Sínodo, criou-se uma grande expectativa sobre a questão da comunhão eucarística
aos divorciados e recasados. Após o Sínodo, esses casais podem ou não receber a
Eucaristia?
Cardeal Odilo
Scherer: O Sínodo não tinha a missão de “resolver” essa questão, pois a
natureza do sínodo é consultiva, e não decisória. O Sínodo refletiu com
intensidade sobre isso e ofereceu algumas indicações ao Papa em relação ao
eventual acesso à mesa eucarística dos casais que vivem em segunda união. Permanecem
válidas as indicações dadas pelo Papa São João Paulo II na Exortação Apostólica
Familiaris Consortio, de 1981. A resposta não consiste num generalizado “pode”,
ou “não pode”. Os casos não são todos iguais. Em algumas situações, pode haver
uma permissão especial para comungar. O que o Sínodo falou com clareza é que
esses casais não estão excomungados, nem devem se considerar como tais; são
filhos da Igreja e têm muitas possibilidades de se sentirem parte da Igreja e
em comunhão com Deus. Além da comunhão eucarística, há a comunhão de fé, da
escuta e vivência da Palavra de Deus, da oração comum, da caridade, da
participação na missão da Igreja...
5. O que a
Igreja ganhou com o Sínodo? Valeu a pena realizar essa assembleia?
Cardeal Odilo
Scherer: Creio que ganhou muito e o Sínodo sobre a família valeu muito a pensa.
Houve uma nova tomada de consciência em relação à família e sobre a necessidade
de uma nova pastoral familiar. Além disso, ficou muito clara a percepção de que
é necessário haver uma espécie de aliança entre a Igreja e a família. O
conceito de “Igreja doméstica”, aplicado à família cristã, vai ter maior
relevância daqui por diante. Por outro lado, não deixou de ser profético para o
mundo que a Igreja se ocupasse tão intensamente com a família nesta época, para
dizer uma palavra clara e orientadora sobre essa célula básica da sociedade e
da Igreja.
6. Falou-se em
“lei da gradualidade”, aplicada à situação dos divorciados e recasados
civilmente. Que significa isso?
Cardeal Odilo
Scherer: É um conceito usado na teologia moral e sistemática: nem todos fazem a
profissão de fé com a mesma intensidade, podendo haver um crescimento e
amadurecimento na fé. Para a mesma ação humana objetiva, a responsabilidade
moral subjetiva pode ser diferente, dependendo de uma série de fatores; nem
toda ação virtuosa tem o mesmo grau de perfeição, podendo haver crescimento na
virtude. Em relação aos casais divorciados, a responsabilidade pela quebra da
aliança matrimonial não é sempre igual para as duas partes. Assim também, os
casais que vivem em segunda união, também podem estar vivendo graus diversos de
responsabilidade moral subjetiva por essa situação; uma, é a de quem causou a
separação e outra, a situação da parte inocente numa separação. Este é um fator
a ser considerado no acompanhamento dos casais em segunda união.
7. O Relatório
final do Sínodo, nos parágrafos 84 e 85, fala do acompanhamento pastoral dos
casais em segunda união, da necessidade de confrontar-se com a sua consciência.
Significa que depois disso já podem aproximar-se da comunhão eucarística?
Cardeal Odilo
Scherer: Na consciência moral, a pessoa se confronta com Deus e toma suas
decisões morais. A consciência moral subjetiva é importante, mas ela precisa
confrontar-se com a norma moral objetiva. No caso do divórcio e de uma nova
união, há uma questão moral objetiva, que não pode ser desconsiderada e as
decisões não podem ficar simplesmente por conta da consciência subjetiva. Por
isso é necessário que esses casais busquem e recebam a ajuda do sacerdote para
fazer o adequado discernimento. O Sínodo evitou de deixar a decisão
simplesmente por conta da consciência moral subjetiva.
8. No parágrafo
86 fala-se da necessidade do acompanhamento pastoral pelo sacerdote, para fazer
o discernimento sobre casa situação. O padre pode decidir sobre a participação
desses casais na comunhão?
Cardeal Odilo
Scherer: Acompanhamento, inclusão e misericórdia foram conceitos usados com
abundância no Sínodo A Igreja, nas realidades locais, precisa acompanhar, ou
seja, tornar-se próxima das situações de casais em crise, ou que se
divorciaram, ou que se casaram de novo no civil, após uma separação. Apesar de
tudo, essas pessoas não devem ser abandonadas, condenadas ou excluídas da
comunidade; há necessidade de discernir, orientar, indicar vias de participação
na vida e missão da Igreja. Há situações em que será necessário encaminhar para
o reconhecimento da nulidade. A participação da comunhão eucarística é
importante, mas esta não deve ser a única preocupação pastoral. Nas indicações
dadas pelo Sínodo não consta que o padre esteja autorizado a decidir pelo
casal, de modo generalizado, sobre a participação na comunhão eucarística.
9. Haverá ainda
uma palavra do Papa sobre o assunto?
Cardeal Odilo
Scherer: O Sínodo consultivo e, por si mesmo, não lhe cabia tomar nenhuma
decisão. O Papa convocou a assembleia do Sínodo para ouvir a Igreja sobre as
questões relativas ao casamento e a família, através dos seus pastores locais.
Isso foi feito, o Papa ouviu atentamente e recebeu o relatório final, com as
indicações dos participantes do Sínodo. Agora, depois de algum tempo,
certamente haverá uma palavra “de autoridade” do Papa, como aconteceu nos
Sínodos anteriores. Vamos continuar a rezar e aguardar.
Cardeal Odilo
Pedro Scherer - Arcebispo de São Paulo
Fonte: radiovaticana.va Publicado em O
SÃO PAULO, 26.10.2015 Foto: santaangela.com.br
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Comunhão dos divorciados recasados:
uma questão aberta
uma questão aberta
Cidade do Vaticano (RV) – Depois da publicação do Documento final da XIV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos sobre a família, muitas foram as interpretações da imprensa a respeito das decisões tomadas quanto à comunhão aos divorciados recasados.
A respeito deste tema, o Programa Brasileiro entrevistou o Arcebispo de São Paulo, Cardeal Odilo Pedro Scherer:
Turistas na Praça São Pedro |
“O texto final que foi votado reflete a dificuldade de se dizer uma palavra unânime sobre este assunto, porque há muita divergência sobre que tipo de atitudes devem ser tomadas. Pode ou não pode: não é este o caminho escolhido. É claro que seria a solução simples, mas não é esta que nós podemos dar. A questão é complexa e questões complexas não podem ser respondidas simplesmente com um sim ou não. Enfim, existem múltiplas situações e o Sínodo, que não é ainda a palavra do Papa, não decidiu nada sobre isso. Eventualmente, o Papa poderá decidir que não podem se aproximar da mesa eucarística ou poderá dizer ‘em tais e tais situações, observadas tais normas, poderão se aproximar da mesa eucarística’. Então isso ainda permanece uma questão aberta. O Sínodo, enquanto tal, indicou alguns caminhos que poderiam ser seguidos, mas o Sínodo não decidiu nada sobre isto.” (SP/BF)
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Fonte: radiovaticana.va
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