O tempo
quaresmal deve ser para o cristão, um momento oportuno para recordar, na
vida pessoal, as ações de Jesus, pois convida a dar um salto qualitativo, à luz
da vida do Doador de Vida que convoca a cada um de nós a um itinerário de
seguimento e a fazer a experiência da via amorosa e reconciliadora, presente no
mistério pascal.
Esta realidade
tem implicações profundas na vida e não é uma tarefa fácil, uma vez que pede de
cada um, certos elementos que rompem com o comodismo, com a passividade e
requer nova postura frente à realidade e um modo novo de vivenciar a fé. Deve
superar a concepção de que basta somente o jejum, a caridade e a oração, muitas
vezes vistos de um modo banal, pela sociedade de hoje e por muitos cristãos,
como cumprimento de um preceito.
Diante da
proposta litúrgica da Quaresma, cada um deve se perguntar: O que significa este
tempo para mim? Como o vivo? Quais são os frutos espirituais conquistados e que
repercutem na vida cristã? Como estou me preparando para celebrar o grande
mistério pascal de Cristo? Ou será que este é mais um período proposto pelo
calendário litúrgico e nada me diz?
É bom que à luz
destas interrogações, cada um se ponha a perguntar e a refletir sobre a vida
espiritual pessoal. Para ajudar, neste artigo, vão alguns elementos para que cada
pessoa, na quaresma, e para a vida, possa fazer seu próprio itinerário
espiritual.
Neste tempo
profundo proposto ao crente para a preparação à Grande
Festa da Páscoa, não se pode esquecer-se da Sagrada Escritura,
especialmente daqueles textos que ajudam a refletir sobre o sentido da
misericórdia, da conversão e do amor de Deus na vida do ser humano; sobre a
libertação, a aliança com Deus e a humanidade e aqueles que se referem à
criação, ou a nova criação, à profecia, ao testemunho e as ações de Jesus: sua
vida de anúncio da Boa Nova, oração, contato com as pessoas e seu modo de fazer
o bem.
Propositalmente,
não colocarei nenhuma citação para direcionar, é importante que cada um
sinta-se estimulado a buscar estes temas é lê-los em sintonia com a realidade e
à vida.
Alguém pode
perguntar: por que buscar estes temas? O aprofundamento deles, no período quaresmal, ajudará a celebrar melhor a Páscoa.
A Quaresma é
como um tempo de enamoramento, à espera do grande festa de casamento, em que se
celebra o mais profundo mistério de fé, de humanização de Deus e a mais fiel
aliança da história, realizada na Cruz de Cristo e na sua ressurreição.
Neste sentido, a
Escritura é nossa testemunha, é porta-voz de todo o evento divino-humano e
redemptivo da história da humanidade e que fornece um itinerário à fé. Não é um
itinerário tranquilo, pois desinstala, coloca em movimento, em caminho para
encontrar a razão da fé e o sentido para a existência.
Além da
Escritura, é importante ler a vida dos Santos
e Santas da Igreja ou se há oportunidade, alguma obra que escreveram.
Vale recordar a vida de João da Cruz, Teresa de Jesus, Teresinha de Lisieux, Edith Stein, Santo Antão, Santo Afonso, e outros que fizeram uma profunda experiência
de fé: Madre Teresa de Calcutá, Dorothy Stang, Margarida Alves, pessoas que doaram sua vida por causa da
fé em Jesus, em favor dos mais frágeis. Importante recordar os santos e santas
das comunidades que, no silêncio, expressam a força para a missão da Igreja.
A preparação quaresmal
requer uma mística e nos leva a uma mística, leva o crente a transfigurar-se em Jesus. Essa transfiguração tem um elo na
vida contemplativa e prática, fé e ação e, neste sentido, a vida dos Santos e
Santas e daqueles que doaram suas vidas em favor do Reino e das vidas
fragilizadas, nos faz cada repensar o nosso itinerário de vida e de fé, porque
nos remete as raízes de nossas promessas batismais e as implicações que o
batismo tem na vida cristã.
Quando se espera
alguém para uma festa, antes há uma preparação. Na Quaresma também não é
diferente, precisa preparar o coração - centro das decisões morais, lugar onde
cada um é o que é. Uma das maneiras propostas pela Igreja é o Sacramento da Reconciliação. Infelizmente, hoje, este
sacramento vem sendo desvalorizado, tanto por parte de muitos sacerdotes, bem
como dos fiéis.
Para este
momento, sacerdote e fiel devem estar preparados, pois é um sacramento que toca
lá nas profundezas da pessoa, nas suas luzes e sombras e, busca, trazê-la à luz
que emana do mistério pascal de Cristo.
O sacerdote deve
ser um mistagogo, aquele que ajude o penitente a fazer a experiência do
mistério redentor de Jesus, na vida; e a pessoa a reencontrar novos caminhos de
vida e santidade.
Além do
sacramento da reconciliação é imprescindível, a participação na Eucaristia, a grande oração da Igreja,
momento em que celebramos a nossa páscoa na páscoa de Jesus.
São Tiago, em
algumas linhas recorda que a fé se expressa em atos concretos: meus irmãos, se
alguém diz que tem fé, mas não tem obras, que adianta isso? Por acaso a fé
poderá salvá-lo? Por exemplo: um irmão ou irmã não têm o que vestir e lhes
falta o pão de cada dia.
Então alguém de
vocês diz para eles: ‘Vão em paz, se aqueçam e comam bastante’; no entanto, não
lhes dá o necessário para o corpo. Que adianta isso? Assim também é a fé: sem
as obras, ela está completamente morta. (Tg 2, 14-17)
É comum ouvir
alguém dizer que a Quaresma é tempo de “fazer caridade”. Não é incorreto, porém, se a nossa
caridade termina com a Quaresma algo vai muito mal e é sinal de uma
espiritualidade débil. O agir caritativo e solidário deve continuar na dimensão
da pascalidade de Jesus, isto é, deve ganhar tonalidade, vigor e estímulo para
que a dimensão pascal da fé cristã torna-se um imperativo ético, porque impõe
um olhar crítico à realidade, questionando as estruturas envelhecidas do pecado
e da morte.
Não se trata de
um falso moralismo, sim de um viver angustiado, que interroga o mundo, para
ajudá-lo a ser o lugar, onde as pessoas possam plenificar-se humanamente.
Um exemplo de
ação é envolver-se com as propostas da Campanha da Fraternidade, que é uma
convocação da Igreja do Brasil, à comunidade de fé a olhar com cuidado certos problemas
e desafios, refletir sobre eles e buscar uma ação concreta, à luz da fé, da
esperança e da caridade.
A
espiritualidade quaresmal se faz seguindo os passos de Jesus. Para isso, é
preciso recordar (deixar passar pelo coração) bem de sua pessoa e caminhar com
ele, fazer os seus êxodos, sofrer com ele as tentações, as incompreensões, a
sua experiência de intimidade com o Pai e com os mais abandonados da sociedade.
Entregar-se, de
fato, esvaziar-se para que se faça a vontade do Pai e experimentar a força da
ressurreição como resposta à morte, ao egoísmo, à indiferença e a tudo aquilo
que afasta do projeto de realização do Reino na vida humana.
Pe. Rogério
Gomes, C.Ss.R
Redentorista,
formado em filosofia e teologia, graduado com doutorado em Teologia Moral.
Lecionou no ITESP e na Academia Alfonsiana de Roma. Atualmente é o Superior
Provincial da Província de São Paulo.
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Fonte: www.a12.com
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