Brilhe a vossa
luz
A festa bonita
da Apresentação do Senhor, celebrada no dia 2 de fevereiro, tem múltiplos
significados. Maria e José, cumprindo a Lei de Moisés e levando ao templo o
menino Jesus, para apresentá-lo a Deus, revelam a profunda religiosidade que os
animava, como acontecia com as demais famílias tementes a Deus.
O filho era
motivo de alegria, visto como sinal da bênção de Deus para o casal; mais ainda,
quando se tratava do primogênito, cuja especial pertença a Deus era reconhecida
com a apresentação ao Sacerdote, ministro de Deus. Mas também porque este filho
significava o elo de continuidade da Aliança de Deus e da esperança do povo na
realização das promessas de Deus.
Maria e José apresentam Jesus no templo |
Quando adulto,
por sua vez, ele teria a missão de zelar para que a fidelidade ao Deus da Aliança
não se extinguisse no meio dos irmãos. A vida da família era centrada na fé e
na confiança no Deus da Aliança e da Promessa. Quanta coisa bonita, sempre
válida para as famílias de nossos dias também! A iniciação à vivência da fé
começa na infância e envolve a vida inteira. A fé é pessoal, mas não “privada”,
mas envolve a vida comunitária e as relações sociais.
Com o menino
Jesus, apresentado no templo, algo novo aconteceu: Simeão, o velho sacerdote,
reconhece que este mesmo menino é o fruto das promessas de Deus e a realização
das esperanças do povo fiel: “Meus olhos viram a tua salvação, que preparaste
diante de todos os povos, luz para iluminar as nações e glória do teu povo
Israel!” (Lc 2,31-32). Da mesma forma, a profetisa Ana, velhinha piedosa, louva
a Deus e fala a todos do menino Jesus, em quem reconhece a resposta do Deus
fiel às suas promessas (cf. Lc 2,36-38).
A cena simples e
familiar é, ao mesmo tempo, solene e carregada de sentido teológico: o menino
levado ao templo era, de fato, o “senhor do templo”, casa de “seu Pai” (cf. Lc
2,49); apresentado ao sacerdote, era ele o “pastor e guia do seu povo”, que
vinha ao encontro de seu rebanho; tomado entre os braços por Simeão,
emocionado, era esse menino o verdadeiro Sacerdote da Nova Aliança; introduzido
no suntuoso templo de Jerusalém, ele era o verdadeiro templo vivo de Deus no
meio dos homens e o Pontífice, por meio do qual todos podem ter acesso direto a
Deus Pai. Cumprindo a Lei de Moisés, ele iniciava o novo e definitivo culto a
Deus, feito em espírito e verdade, na comunhão e obediência a Deus… E Maria,
sendo abençoada pelo sacerdote, introduzia no mundo a verdadeira Bênção!
Na tradição
religiosa popular, a festa da Apresentação do Senhor ficou muito relacionada
com o simbolismo da luz: “Luz para iluminar as nações”, anuncia o velho Simeão.
Na sua pregação pública, Jesus convida a segui-lo, é ele a luz do mundo: “Quem
me segue, não anda nas trevas, mas terá a luz da vida” (cf. Jo 8,12); e quem
está em comunhão com ele, também reflete essa mesma luz: “Vós sois a luz do
mundo; brilhe a vossa luz diante dos homens…” (cf. Mt 5,14-16).
O Evangelho do
reino de Deus, que tem Jesus Cristo no seu centro, é a verdadeira luz,
concedida por Deus a todos os que procuram e têm fé nele (cf. Jo 1,8). Todo
cristão, discípulo de Jesus Cristo pelo batismo, também é “discípulo da luz” e
chamado a ser “luz do mundo” e testemunha do reino de Deus. A luz não deve ser
escondida, mas colocada no alto, para que brilhe a todos os que entram na casa
(cf. Mt 5,15-16).
De um modo todo
especial, os consagrados na Vida Religiosa têm a missão de irradiar a luz de
Cristo na Igreja e no mundo; vivendo o carisma do Evangelho que lhes é próprio,
eles são chamados a mostrar a vocação alta de todos à vida e à salvação,
oferecidas por Deus em Jesus Cristo. O reino de Deus é o valor maior desta vida
e deve orientar, como grande luz, tudo o que decidimos e fazemos.
O Papa Francisco
chamou a inteira comunidade eclesial a viver o Ano da Vida Religiosa
Consagrada, como ocasião propícia para redescobrir o significado e a
importância da consagração religiosa para a vida e a missão da Igreja.
Cardeal Odilo Pedro Scherer - Arcebispo de São Paulo
(Artigo publicado
no Jornal O São Paulo – Edição 3037 – 4 a 10 de fevereiro de 2015)
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