Mensagem para o Dia das Comunicações Sociais
Este ano, a
celebração do Dia Mundial das Comunicações Sociais será em 2 de junho, sobre o
tema «“Somos membros uns dos outros” (Ef 4, 25): das comunidades de redes sociais
à comunidade humana».
Cidade do
Vaticano - Como é tradição, na memória de São Francisco de Sales, 24 de
janeiro, foi divulgada a mensagem do Papa para o Dia Mundial das Comunicações
Sociais.
Este ano, a
celebração é no dia 2 de junho, sobre o tema «“Somos membros uns dos outros”
(Ef 4, 25): das comunidades de redes sociais à comunidade humana».
Ser-em-relação
No texto, o
Pontífice convida a refletir sobre o fundamento e a importância do “nosso
ser-em-relação”.
“Se é verdade
que a internet constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber,
também é verdade que se revelou como um dos locais mais expostos à
desinformação e à distorção consciente e pilotada dos fatos e relações
interpessoais, a ponto de muitas vezes cair no descrédito”, constata o Papa.
Se por um lado
as redes sociais servem para nos conectar melhor, por outro elas se prestam a
um “uso manipulador, visando obter vantagens no plano político ou econômico,
sem o devido respeito pela pessoa e seus direitos”.
Narcisismo
Francisco cita a
estatística de que um em cada quatro adolescentes está envolvido em episódios
de cyberbullying. Além do mais, eles estão mais expostos ao fenômeno dos
«eremitas sociais», correndo o risco de se alhear totalmente da sociedade.
Isso significa
que a comunidade de redes sociais não é, automaticamente, sinônimo de
comunidade.
Muitas vezes,
analisa o Pontífice, a identidade funda-se mais a partir daquilo que divide do
que daquilo que une, o que dá margem ao preconceito e ao individualismo desenfreado.
“Assim, aquela que deveria ser uma janela aberta para o mundo, torna-se uma
vitrine onde se exibe o próprio narcisismo.”
Para que as
conexões virtuais impliquem em verdadeiras conexões humanas, o Papa propõe as
palavras usadas por São Paulo.
A metáfora do
corpo e dos membros leva-nos a refletir sobre a nossa identidade, que se funda
sobre a comunhão e a alteridade. Como cristãos, todos nos reconhecemos como
membros do único corpo, cuja cabeça é Cristo. As pessoas não são potenciais
concorrentes.
“Deus não é
Solidão, mas Comunhão; é Amor e, consequentemente, comunicação, porque o amor
sempre comunica. (…) Só sou verdadeiramente humano, se me relacionar com os
outros.”
Do
"like" ao "amém"
A rede só será
uma oportunidade se soubermos vivenciar na prática as conexões feitas através
da tecnologia. Portanto, conclui Francisco, é preciso passar do “like” ao
"amém".
“Esta é a rede
que queremos: uma rede feita não para capturar, mas para libertar, para
preservar uma comunhão de pessoas livres. A própria Igreja é uma rede tecida
pela Comunhão Eucarística, onde a união não se baseia nos «likes», mas no
«amém» com que cada um adere ao Corpo de Cristo, acolhendo os outros.”
...........................................................................................................................................................
...........................................................................................................................................................
Leia a mensagem
na íntegra:
“Somos membros uns dos outros” (Ef 4, 25).
Das comunidades
de redes sociais à comunidade humana
Queridos irmãos
e irmãs!
Desde quando se
tornou possível dispor da internet, a Igreja tem sempre procurado que o seu uso
sirva o encontro das pessoas e a solidariedade entre todos. Com esta Mensagem,
gostaria de vos convidar uma vez mais a refletir sobre o fundamento e a importância
do nosso ser-em-relação e descobrir, nos vastos desafios do atual panorama
comunicativo, o desejo que o homem tem de não ficar encerrado na própria
solidão.
As metáforas da
“rede” e da “comunidade”
Hoje, o ambiente
dos mass-media é tão invasivo que já não se consegue separar do círculo da vida
quotidiana. A rede é um recurso do nosso tempo: uma fonte de conhecimentos e
relações outrora impensáveis. Mas numerosos especialistas, a propósito das
profundas transformações impressas pela tecnologia às lógicas da produção,
circulação e fruição dos conteúdos, destacam também os riscos que ameaçam a
busca e a partilha duma informação autêntica à escala global. Se é verdade que
a internet constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber,
verdade é também que se revelou como um dos locais mais expostos à
desinformação e à distorção consciente e pilotada dos fatos e relações
interpessoais, a ponto de muitas vezes cair no descrédito.
É necessário
reconhecer que se, por um lado, as redes sociais servem para nos conectarmos
melhor, fazendo-nos encontrar e ajudar uns aos outros, por outro, prestam-se
também a um uso manipulador dos dados pessoais, visando obter vantagens no
plano político ou econômico, sem o devido respeito pela pessoa e seus direitos.
As estatísticas relativas aos mais jovens revelam que um em cada quatro
adolescentes está envolvido em episódios de cyberbullying.
Na complexidade
deste cenário, pode ser útil voltar a refletir sobre a metáfora da rede,
colocada inicialmente como fundamento da internet para ajudar a descobrir as
suas potencialidades positivas. A figura da rede convida-nos a refletir sobre a
multiplicidade de percursos e nós que, na falta de um centro, uma estrutura de
tipo hierárquico, uma organização de tipo vertical, asseguram a sua consistência.
A rede funciona graças à co-participação de todos os elementos.
Reconduzida à
dimensão antropológica, a metáfora da rede lembra outra figura densa de
significados: a comunidade. Uma comunidade é tanto mais forte quando mais for
coesa e solidária, animada por sentimentos de confiança e empenhada em
objetivos compartilháveis. Como rede solidária, a comunidade requer a escuta
recíproca e o diálogo, baseado no uso responsável da linguagem.
No cenário
atual, salta aos olhos de todos como a comunidade de redes sociais não seja,
automaticamente, sinônimo de comunidade. No melhor dos casos, tais comunidades
conseguem dar provas de coesão e solidariedade, mas frequentemente permanecem
agregados apenas indivíduos que se reconhecem em torno de interesses ou
argumentos caracterizados por vínculos frágeis. Além disso, na social web,
muitas vezes a identidade funda-se na contraposição ao outro, à pessoa estranha
ao grupo: define-se mais a partir daquilo que divide do que daquilo que une,
dando espaço à suspeita e à explosão de todo o tipo de preconceito (étnico,
sexual, religioso, e outros). Esta tendência alimenta grupos que excluem a
heterogeneidade, alimentam no próprio ambiente digital um individualismo
desenfreado, acabando às vezes por fomentar espirais de ódio. E, assim, aquela
que deveria ser uma janela aberta para o mundo, torna-se uma vitrine onde se
exibe o próprio narcisismo.
A rede é uma
oportunidade para promover o encontro com os outros, mas pode também agravar o
nosso autoisolamento, como uma teia de aranha capaz de capturar. Os
adolescentes é que estão mais expostos à ilusão de que a social web possa
satisfazê-los completamente a nível relacional, até se chegar ao perigoso fenômeno
dos jovens «eremitas sociais», que correm o risco de se alhear totalmente da
sociedade. Esta dinâmica dramática manifesta uma grave ruptura no tecido
relacional da sociedade, uma laceração que não podemos ignorar.
Esta realidade
multiforme e insidiosa coloca várias questões de caráter ético, social,
jurídico, político, econômico, e interpela também a Igreja. Enquanto cabe aos
governos buscar as vias de regulamentação legal para salvar a visão originária
duma rede livre, aberta e segura, é responsabilidade ao alcance de todos nós
promover um uso positivo da mesma.
Naturalmente não
basta multiplicar as conexões, para ver crescer também a compreensão recíproca.
Então, como reencontrar a verdadeira identidade comunitária na consciência da
responsabilidade que temos uns para com os outros inclusive na rede on-line?
“Somos membros
uns dos outros”
Pode-se esboçar
uma resposta a partir duma terceira metáfora – o corpo e os membros – usada por
São Paulo para falar da relação de reciprocidade entre as pessoas, fundada num
organismo que as une. «Por isso, despi-vos da mentira e diga cada um a verdade
ao seu próximo, pois somos membros uns dos outros» (Ef 4, 25). O fato de sermos
membros uns dos outros é a motivação profunda a que recorre o Apóstolo para
exortar a despir-se da mentira e dizer a verdade: a obrigação de preservar a
verdade nasce da exigência de não negar a mútua relação de comunhão. Com
efeito, a verdade revela-se na comunhão; ao contrário, a mentira é recusa
egoísta de reconhecer a própria pertença ao corpo; é recusa de se dar aos
outros, perdendo assim o único caminho para se reencontrar a si mesmo.
A metáfora do
corpo e dos membros leva-nos a refletir sobre a nossa identidade, que se funda
sobre a comunhão e a alteridade. Como cristãos, todos nos reconhecemos como
membros do único corpo cuja cabeça é Cristo. Isto ajuda-nos a não ver as
pessoas como potenciais concorrentes, considerando os próprios inimigos como
pessoas. Já não tenho necessidade do adversário para me autodefinir, porque o
olhar de inclusão, que aprendemos de Cristo, faz-nos descobrir a alteridade de
modo novo, ou seja, como parte integrante e condição da relação e da
proximidade.
Uma tal
capacidade de compreensão e comunicação entre as pessoas humanas tem o seu
fundamento na comunhão de amor entre as Pessoas divinas. Deus não é Solidão,
mas Comunhão; é Amor e, consequentemente, comunicação, porque o amor sempre
comunica; antes, comunica-se a si mesmo para encontrar o outro. Para comunicar
conosco e Se comunicar a nós, Deus adapta-Se à nossa linguagem, estabelecendo
na história um verdadeiro e próprio diálogo com a humanidade (cf. Conc. Ecum.
Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, 2).
Em virtude de
termos sido criados à imagem e semelhança de Deus, que é comunhão e
comunicação-de-Si, trazemos sempre no coração a nostalgia de viver em comunhão,
de pertencer a uma comunidade. Como afirma São Basílio, «nada é tão específico
da nossa natureza como entrar em relação uns com os outros, ter necessidade uns
dos outros».
O panorama atual
convida-nos, a todos nós, a investir nas relações, a afirmar – também na rede e
através da rede – o caráter interpessoal da nossa humanidade. Por maior força
de razão nós, cristãos, somos chamados a manifestar aquela comunhão que marca a
nossa identidade de crentes. De fato, a própria fé é uma relação, um encontro;
e nós, sob o impulso do amor de Deus, podemos comunicar, acolher e compreender
o dom do outro e corresponder-lhe.
É precisamente a
comunhão à imagem da Trindade que distingue a pessoa do indivíduo. Da fé num
Deus que é Trindade, segue-se que, para ser eu mesmo, preciso do outro. Só sou
verdadeiramente humano, verdadeiramente pessoal, se me relacionar com os
outros. Com efeito, o termo pessoa conota o ser humano como «rosto», voltado
para o outro, comprometido com os outros. A nossa vida cresce em humanidade
passando do caráter individual ao caráter pessoal; o caminho autêntico de
humanização vai do indivíduo que sente o outro como rival para a pessoa que
nele reconhece um companheiro de viagem.
Do “like” ao
“amém”
A imagem do
corpo e dos membros recorda-nos que o uso da social web é complementar do
encontro em carne e osso, vivido através do corpo, do coração, dos olhos, da
contemplação, da respiração do outro. Se a rede for usada como prolongamento ou
expectativa de tal encontro, então não se atraiçoa a si mesma e permanece um recurso
para a comunhão. Se uma família utiliza a rede para estar mais conectada, para
depois se encontrar à mesa e olhar-se olhos nos olhos, então é um recurso. Se
uma comunidade eclesial coordena a sua atividade através da rede, para depois
celebrar juntos à Eucaristia, então é um recurso. Se a rede é uma oportunidade
para me aproximar de casos e experiências de bondade ou de sofrimento distantes
fisicamente de mim, para rezar juntos e, juntos, buscar o bem na descoberta
daquilo que nos une, então é um recurso.
Assim, podemos
passar do diagnóstico à terapia: abrir o caminho ao diálogo, ao encontro, ao
sorriso, ao carinho... Esta é a rede que queremos: uma rede feita, não para
capturar, mas para libertar, para preservar uma comunhão de pessoas livres. A
própria Igreja é uma rede tecida pela Comunhão Eucarística, onde a união não se
baseia nos gostos [«like»], mas na verdade, no «amém» com que cada um adere ao
Corpo de Cristo, acolhendo os outros.
Vaticano, na
Memória de São Francisco de Sales, 24 de janeiro de 2019.
FRANCISCUS
..................................................................................................................................................
Fonte: vaticannews.va
Nenhum comentário:
Postar um comentário