sexta-feira, 18 de maio de 2018

Exortação Apostólica do Papa Francisco

Gaudete et Exsultate


Que alegria receber de Papa Francisco a Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate sobre a chamada à santidade no mundo atual. Não estamos diante de um tratado sobre a santidade com definições e distinções eruditas e sofisticadas. A intenção de Francisco ao escrevê-la é modesta. Ele mesmo nos diz logo no seu inicio seu objetivo: “fazer ressoar mais uma vez a chamada à santidade, procurando encarná-la no contexto atual, com os seus riscos, desafios e oportunidades, porque o Senhor escolheu cada um de nós “para ser santo e irrepreensível na sua presença, no amor” (cf. Ef 1, 4).
O apelo à santidade perpassa toda a história do cristianismo e chega até os nossos dias. E o papa Francisco ao tratar deste tema acerta no alvo. Numa cultura espiritualmente desnutrida, mas sequiosa de espiritualidade, como a nossa, longe de ser um tema e um assunto fora de moda, a santidade, é um assunto pertinente. É preciso redizê-la a uma humanidade cansada de novidades e sedenta de verdade. É preciso purificá-la de tantas ambiguidades, equívocos, mal-entendidos para que a santidade seja entendida como um programa de vida e acontecendo no altar da vida, encarnada em pessoas de carne e ossos, porque, como diz K. Rahner a “santidade em abstrato não existe”. Papa Francisco fala de santidade acontecendo “ao pé da porta” (cf. n. 7), sendo, por isso, é o rosto mais belo da Igreja (n. 9). Diante disso, não podemos deixar passar despercebida essa graça!
Francisco é filho da era inaugurada pelo Vaticano II e a Igreja que o gerou para a vida religiosa foi a Igreja do Vaticano II. Por isso, ele resgata, nesta Exortação os elementos essenciais e fundamentais da Constituição Dogmática Lumen Gentium (LG). Essa constituição devolveu a certeza de que todo ser humano é vocacionado à santidade. Rompeu-se assim, com uma eclesiologia profundamente jurisdicionista (visão burocrática de Igreja que se formou no âmbito da cultura do século XVIII e tornou-se oficial no Concílio Vaticano I). O Concílio Vaticano II voltando à noção bíblica do Povo de Deus - falou no capítulo V da “vocação universal à santidade”. Uma verdadeira reviravolta, pois, retomou a ideia dos primeiros cristãos, a qual via a Igreja como povo congregado na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo (LG 4), o Vaticano II lembra que todos os batizados e batizadas têm dignidade, liberdade, formam a comunidade dos filhos e filhas de Deus e são templos do Espírito Santo (cf. LG 9). Todo o Povo de Deus por causa do sacerdócio comum dos fiéis é chamado à plena participação e a uma vida santa. Aliás, não só os católicos, mas todos os demais cristãos e a própria humanidade são destinadas a ser Povo de Deus (cf. LG 13). Faz notar o Papa Francisco que, mesmo fora da Igreja Católica e em áreas muito diferentes, o Espírito suscita sinais de sua presença, que ajudam os próprios discípulos de Cristo (n. 9).
Em nossos dias soa muito bem retomar tudo isso e ouvir que a santidade não é privilégio de um grupo reservado. A santidade não é coisa de elite eclesial. Não é confundida com atitudes de beatice ou de carolice, ou com atitudes alienadas e com comportamentos desequilibrados e totalmente distantes do mundo real, tão comuns nos grupos neoconservadores que estão surgindo ultimamente no interior da nossa Igreja. Ser santo não significa “revirar os olhos num suposto êxtase” (n. 96).
Sendo uma prerrogativa exclusiva de Deus, ela é acessível a todos (cf. n. 56). Deus nos comunica sua santidade e nos faz participantes da sua vida divina. A santidade, portanto, não é uma qualidade física ou moral. É preciso enfatizar antes de tudo essa iniciativa de Deus para não sermos vítimas de duas falsificações da santidade que poderiam extraviar-nos: o gnosticismo e o pelagianismo (cf. nn. 35-62). São erros antigos que, no entanto, representam perenes perigos de equívocos da fé, mesmo em contextos históricos diferentes.
É, portanto um dom divino e está profundamente relacionada com a prática concreta da vida de cada dia, não sendo necessário fugir de seu estado de vida (cf. nn. 10 e 11), superando, desta forma, a ideia de igualitarismo vocacional que suprime as diferenças e contribui enormemente para o empobrecimento da comunidade cristã, mas se santificando exatamente e somente através de seu compromisso com a condição humana e cristã (n.26), respondendo os apelos divinos através da vivência evangélica do próprio estilo de vida (cf. nn. 14, 15, 16). Cada santo é “uma mensagem que o Espírito Santo extrai da riqueza de Jesus Cristo e dá ao seu povo” (n.21).
Pertencendo à família divina e entendendo-nos como frutos do amor ilimitado da Trindade, nascidos do amor de Deus e predestinados ao amor, recebemos a missão de comunicar esse amor aos demais homens e mulheres pelo testemunho, através do próprio modo de viver, através do amor e da caridade. A santidade não é nada mais do que a “caridade plenamente vivida” (n. 21). Se expressa assim, Francisco: “gosto de ver a santidade no povo paciente de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir. Nesta constância de continuar a caminhar dia após dia, vejo a santidade da Igreja militante. Esta é muitas vezes a santidade «ao pé da porta», daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus, ou – por outras palavras – da classe média da santidade” (n. 7).
Obrigado Papa Francisco por sua Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate. Veio em boa hora! Ela nos acorda e nos faz vislumbrar um caminho acessível da santidade. “Todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra” (n. 14). Santidade é avançar corajosamente na direção do futuro, do novo, do diferente, com: “suportação, paciência e mansidão” (nn. 112-121), com “alegria e sentido de humor” (cf. nn. 122-128), com “ousadia e ardor” (cf. nn. 129-139), e em oração constante (cf. nn. 147-157). Santidade que leva cada homem e a mulher a viver em plenitude, com entusiasmo e disponibilidade, mas também com muito realismo e, por isso, exige a luta e a vigilância (cf. nn. 158-165), o discernimento (cf. nn. 166-177). A santidade une liberdade e responsabilidade para atuar diretamente nos destinos da história, fazendo acontecer a transformação do mundo e do convívio social (cf. n. 21, capítulo III, sobretudo os números 63-94, com especial destaque o n. 101). Santidade é acolher os apelos de Deus, as novidades do Espírito, sem alienações, subterfúgios ou coisa parecida (cf. nn. 27, 140-146). E para não cairmos na tentação de cultivar uma falsa santidade, é indispensável compreendê-la melhor, a partir das indicações da Palavra de Deus e da experiência da Igreja, a comunidade dos santos e das santas de Deus (cf. nn. 96-109).
                                                                                             Pe. Eliseu Wisniewski, C.M
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                                              Fonte: ihu.unisinos.br    Foto: livraria.apostoladodaoracao.pt

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