segunda-feira, 16 de maio de 2016

Dom Vincenzo Paglia:

Para Francisco, nenhuma família é excluída do amor de Deus

Cidade do Vaticano (RV) – O Papa Francisco recebeu em audiência na manhã desta segunda-feira (16/05), o Presidente do Pontifício Conselho para a Família, Arcebispo Vincenzo Paglia. Entre os temas tratados no encontro, a divulgação da Exortação pós-Sinodal Amoris laetitia, em particular entre as famílias e nas comunidades eclesiais. A Rádio Vaticano conversou com Dom Paglia:
“Não há dúvida de que, após o Sínodo, existe agora toda a perspectiva da divulgação e do apoio à Exortação Apostólica Amoris laetitia. Este é um texto que requer um aprofundamento e um ímpeto novo, para que não somente se “reveja” a pastoral familiar, mas talvez mais do que isto, para que toda a pastoral familiar adquira os traços da familiaridade; a partir de um renovado estilo nas comunidades cristãs, nas paróquias, para que sejam – realmente – uma família que acolhe, que encoraja todas as famílias para serem próximas àqueles que têm maiores problemas e dificuldades. Isto me parece particularmente importante e, neste sentido o Pontifício Conselho está empenhado de maneira particularmente forte. Tantos são os pedidos, de várias partes da Itália e do mundo, e acredito que seja uma consolação também para o Papa poder ver que o texto que ele entregou, responda efetivamente a uma necessidade profunda, quer da Igreja, quer da sociedade”.
RV: Existe uma palavra, alguma coisa, que lhe tocou particularmente na audiência de hoje com o Papa Francisco?
Dom PagliaEu diria a urgência de propagar um amor que seja robusto, construtivo, misericordioso, acolhedor, que não exclua ninguém. Assim, existe como que uma paixão de universalidade por parte do Papa para que nenhuma família seja privada da alegria do amor”.
RV: O Papa tem a peito que este documento – Amoris laetitia – seja lido também com calma – inclusive ele escreveu isto na primeira página – e portanto, também metabolizado, antes de tudo pelas famílias, não é mesmo?
Dom Paglia“Exatamente. Poderíamos dizer que este documento tem de se tornar "letra viva" através da própria vida das famílias: são elas que devem ser o documento real o verdadeiro texto. São as famílias que devem testemunhar – precisamente – a alegria do amor. Elas são o seu lugar prioritário. Conhecemos por outro lado, as suas dificuldades e os problemas; e todavia, é precisamente dela que se deve reiniciar: das famílias, que são a parte absolutamente majoritária do Povo de Deus. Na sensibilidade do Papa Francisco, sabemos bem o que quer dizer o sensus fidelium: ou seja, o sentir do povo de Deus sobre o amor, sobre a vida, sobre a existência e sobre a ajuda aos mais fracos. Tantas vezes o Papa se refere diretamente às famílias para que sejam o lugar onde se testemunha o amor de Deus, por todos, e particularmente por aqueles mais vulneráveis e mais feridos”. (JE/AG)
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Papa aos bispos italianos:
A tríplice pertença ao Senhor, à Igreja, ao Reino

Na tarde desta segunda-feira (16), no Vaticano, o Papa Francisco participou da abertura da 69ª Assembleia Geral da Conferência Episcopal Italiana. Os bispos, reunidos na Sala do Sínodo, escutaram com atenção ao pronunciamento do Papa,  pelo terceiro ano inaugurando o evento como Bispo de Roma e Primaz da Itália.
No seu discurso, depois de agradecer a presença de todos e notar novos bispos na sua composição, pouco menos de 40, pronunciou seu discurso sobre a renovação do clero a partir da formação permanente.
“Nesta tarde, não quero lhes oferecer uma reflexão sistemática sobre a figura do sacerdote. Tentemos, ao contrário, inverter a perspectiva e ouvir atentamente, em contemplação. Aproximando-nos, quase que em ponta de pé, a um dos tantos párocos que passam pelas nossas comunidades; deixemos que o rosto de um deles passe perante os olhos do nosso coração e perguntemo-nos com simplicidade: o que faz a sua vida ser saborosa? Por quem e para que entrega o seu serviço? Qual é a finalidade do seu doar-se?”
Iniciando com questionamentos sobre a figura do presbítero, Papa Francisco começou a delinear suas observações sobre possíveis respostas que “ajudarão a identificar também as propostas de formação pelas quais investir com coragem”.
Pertença ao Senhor
“O que, então, dá sabor à vida do 'nosso' presbítero? O contexto cultural é muito diverso daquele em que ele deu os primeiros passos no ministério. Inclusive na Itália, muitas tradições, hábitos e visões da vida foram afetados por uma profunda mudança de época.”
Apesar de vivermos atualmente um “tempo amargo e acusatório, devemos também sentir a sua dureza: no nosso ministério, quantas pessoas encontramos que estão em ânsia pela falta de referências para seguir! Quantas relações feridas!”, disse o Santo Padre. “Sobre esse contexto, a vida do nosso presbítero se torna eloquente, porque diversa, alternativa”. Precisa aceitar, assumir responsabilidades, sentir-se atuante e encarregado do seu destino.
“Sabe que o Amor é tudo. Não procura garantias terrenas ou títulos honoríficos que levam a confiar no homem; no ministério não questiona nada que vá além da real necessidade, nem está preocupado de ligar a si pessoas que lhe foram confiadas. O seu estilo de vida simples e essencial, sempre disponível, apresenta-o plausível aos olhos das pessoas e o aproxima aos humildes, numa caridade pastoral que os torna livres e solidários. Servo da vida, caminha com o coração e o passo dos pobres; faz-se rico do encontro com eles. É um homem de paz e de reconciliação, um sinal e um instrumento da ternura de Deus, atento a difundir o bem com a mesma paixão com a qual os outros curam os seus interesses.”
O segredo do presbítero “está em conformidade àquela de Jesus Cristo, verdade definitiva da sua vida. É a relação com Ele que o protege, fazendo-o alheio à mundanidade espiritual que corrompe, como também a qualquer cumplicidade e mesquinhez”.
Pertença à Igreja
E dando sequência às questões iniciais, o Santo Padre continuou:
“Para quem o nosso presbítero entrega o serviço? A pergunta, talvez, precisa ser esclarecida. De fato, antes mesmo de nos questionarmos sobre os destinatários do seu serviço, devemos reconhecer que o presbítero é assim, na medida em que se sente atuante da Igreja, de uma comunidade concreta da qual compartilha o caminho. O povo fiel de Deus permanece sendo o seio do qual nasceu, a família na qual é envolvida, a casa para onde é enviado”.
Nesse momento do seu pronunciamento, Papa Francisco fez referência ao brasileiro Dom Hélder Câmara ao falar sobre a “respiração que liberta de uma auto-referencialidade que isola e aprisiona”.
‘Quando o teu pequeno barco começará a colocar raízes na imobilidade do cais’, lembrava Dom Hélder Câmara, ‘vai para o fundo!’. Parte! E, acima de tudo, não porque tem uma missão para cumprir, mas porque estruturalmente você é um missionário. Aquele que vive no Evangelho, entra dessa forma num compartilhamento virtuoso: o pastor é convertido e confirmado da fé simples do povo santo de Deus, com o qual trabalha e que no coração vive. Essa pertença é o sal da vida do presbítero. Nesse tempo pobre de amizade social, a nossa primeira tarefa é aquela de construir comunidade; a atitude à relação é, então, um critério decisivo de discernimento vocacional.”
Do mesmo modo, observa Francisco, “para um sacerdote é vital se encontrar no cenáculo do presbitério”. Uma experiência que pode libertar “dos narcisismos e dos ciúmes clericais; faz crescer a estima, o apoio e a benevolência recíproca”.
Pertença ao Reino
“Enfim, nos questionamos qual fosse a finalidade do doar-se do nosso presbítero. Quanta tristeza fazem aqueles que, na vida, estão sempre um pouco pela metade. Calculam, ponderam, não arriscam nada por medo de se perder... São os mais infelizes! O nosso presbítero, ao contrário, com os seus limites, é um que se aventura até o final: nas condições concretas da vida e do ministério que lhe foram colocadas, ele se oferece com gratuidade, com humildade e alegria. Inclusive quando ninguém parece perceber. Inclusive quando, por intuição, humanamente percebe que talvez ninguém vai agradecê-lo suficientemente do seu doar-se sem medidas.”
O Papa Francisco o caracteriza como “o homem da Páscoa, do olhar direcionado ao Reino e para onde se sente que a história humana caminha, apesar dos atrasos, das obscuridades e contradições”.
“Está, então, delineada, queridos irmãos, a tríplice pertença que nos constitui: pertença ao Senhor, à Igreja, ao Reino. Esse tesouro em vasos de Creta precisa ser protegido e promovido! Compreendam fortemente essa responsabilidade, assumam com paciência e disponibilidade de tempo, de mãos e de coração.” (AC)
Confira o discurso na íntegra:
"Queridos irmãos,
O que me deixa particularmente feliz em abrir com vocês esta assembleia é o tema que colocaram como fio condutor dos trabalhos – A renovação do clero –, no desejo de apoiar a formação no decorrer das diversas estações da vida.
A Festa de Pentecostes que foi apenas celebrada coloca esse objetivo na perspectiva justa. O Espírito Santo permanece, de fato, o protagonista da história da Igreja: é o Espírito que habita plenamente na pessoa de Jesus e nos conduz ao mistério do Deus vivo; é o Espírito que animou a resposta generosa da Virgem Mãe e dos Santos; é o Espírito que trabalha nos crentes e nos homens de paz e provoca a disponibilidade generosa e a alegria evangelizadora de tantos sacerdotes. Sem o Espírito, sabemos, não existe possibilidade de vida boa, nem de reforma. Rezamos e nos comprometemos a proteger a sua força, afim de que 'o mundo do nosso tempo possa receber a Boa Nova […] dos ministros do Evangelho, de onde a vida irradia fervor' (Paolo VI, Exort. Ap. Evangelii nuntiandi, 80).
Nesta tarde, não quero lhes oferecer uma reflexão sistemática sobre a figura do sacerdote. Tentemos, ao contrário, inverter a perspectiva e ouvir atentamente, em contemplação. Aproximando-nos, quase que em pontas dos pés, a um dos tantos párocos que passam pelas nossas comunidades; deixemos que o rosto de um deles passe perante os olhos do nosso coração e perguntemo-nos com simplicidade: o que faz a sua vida ser saborosa? Por quem e para que entrega o seu serviço? Qual é a finalidade do seu doar-se?
Espero que esses questionamentos possam repousar dentro de vocês no silêncio, na oração tranquila, no diálogo franco e fraterno: as respostas que florescerão os ajudarão a idenfiricar também as propostas de formação pelas quais investir com coragem.
1. O que, então, dá sabor à vida do “nosso” presbítero? O contexto cultural é muito diverso daquele em que deu os primeiros passos no ministério. Inclusive na Itália, muitas tradições, hábitos e visões da vida foram afetados por uma profunda mudança de época.
Nós, que frequentemente nos encontramos lamentando este tempo com tom amargo e acusatório, devemos também sentir a sua dureza: no nosso ministério, quantas pessoas encontramos que estão em ânsia pela falta de referências para seguir! Quantas relações feridas! Num mundo em que cada um se considera a medida de tudo, não tem mais lugar para o irmão.
Sobre esse contexto, a vida do nosso presbítero se torna eloquente, porque diversa, alternativa. Como Moisés, ele é um que se aproximou do fogo e deixou que as chamas queimassem as suas ambições de carreira e poder. Fez um fogo também das tentações de se interpretar como um “devoto”, que se refugia num intimismo religioso que de espiritual tem bem pouco.
Está de pés descalços, o nosso padre, em comparação à uma terra que é determinada a acreditar e a se considerar santa. Não se escandaliza pelas fragilidades que agitam a essência humana: ciente de ser ele mesmo um paralítico curado, é distante da frieza de um grande marcador de penalidades, como também da superficialidade de quem quer se mostrar tolerante ao bom mercado. O outro, aceita, ao contrário, de assumir responsabilidades, sentindo-se atuante e encarregado do seu destino.
Com o óleo da esperança e da consolação, se faz próximo de todos, atento a compartilhar o abandono e o sofrimento. Tendo aceitado de não dispor de si mesmo, não tem uma agenda para defender, mas entrega todas as manhãs ao Senhor o seu tempo para se deixar encontrar com as pessoas e conhecê-las. Assim, o nosso sacerdote não é um burocrata ou um anônimo funcionário da instituição; não é consagrado a um papel empregatício, nem é movido por critérios de eficiência.
Sabe que o Amor é tudo. Não procura garantias terrenas ou títulos honoríficos que levam a confiar no homem; no ministério não questiona nada que vá além da real necessidade, nem está preocupado de ligar a si pessoas que lhe foram confiadas. O seu estilo de vida simples e essencial, sempre disponível, apresenta-o plausível aos olhos das pessoas e o aproxima aos humildes, numa caridade pastoral que torna livres e solidários. Servo da vida, caminha com o coração e o passo dos pobres; faz-se rico do encontro com eles. É um homem de paz e de reconciliação, um sinal e um instrumento da ternura de Deus, atento a difundir o bem com a mesma paixão com a qual os outros curam os seus interesses.
O segredo do nosso presbítero, vocês sabem bem!, está naquele arbusto ardente que marca a chamas a existência, a conquista e está em conformidade àquela de Jesus Cristo, verdade definitiva da sua vida. É a relação com Ele que o protege, fazendo-o alheio à mundanidade espiritual que corrompe, como também a qualquer cumplicidade e mesquinhez. É a amizade com o seu Senhor a levá-lo a abraçar a realidade quotidiana com a confiança de quem crê que a impossibilidade do homem não permanece assim para Deus.
2. Torna-se, assim, mais imediato enfrentar também as outras questões das quais iniciamos. Para quem entrega o serviço o nosso presbítero? A pergunta, talvez, precisa ser esclarecida. De fato, antes mesmo de nos questionarmos sobre os destinatários do seu serviço, devemos reconhecer que o presbítero é assim, na medida em que se sente atuante da Igreja, de uma comunidade concreta da qual compartilha o caminho. O povo fiel de Deus permanece sendo o seio do qual nasceu, a família na qual é envolvida, a casa para onde é enviado. Essa atribuição comum, que flui do Batismo, é a respiração que liberta de uma auto-referencialidade que isola e aprisiona: 'Quando o teu pequeno barco começará a colocar raízes na imobilidade do cais', lembrava Dom Hélder Câmara, 'vai para o fundo!'. Parte! E, acima de tudo, não porque tem uma missão para cumprir, mas porque estruturalmente você é um missionário: no encontro com Jesus experimentou a plenitude de vida e, por isso, deseja fortemente que os outros se reconheçam nEle e possam proteger a sua amizade, nutrir-se da sua palavra e celebrá-Lo na comunidade.
Aquele que vive no Evangelho, entra dessa forma num compartilhamento virtuoso: o pastor é convertido e confirmado da fé simples do povo santo de Deus, com o qual trabalha e que no coração vive. Essa atribuição é o sal da vida do presbítero; faz com que o seu princípio distintivo seja a comunhão, vivida com os leigos em relações que sabem valorizar a participação de cada um. Nesse tempo pobre de amizade social, a nossa primeira tarefa é aquela de construir comunidade; a atitude à relação é, então, um critério decisivo de discernimento vocacional.
Ao mesmo modo, para um sacerdote é vital se encontrar no cenáculo do presbitério. Essa experiência, quando não é vivida em maneira ocasional, nem em força de uma colaboração instrumental, liberta dos narcisismos e dos ciúmes clericais; faz crescer a estima, o apoio e a benevolência recíproca; favorece uma comunhão não somente sacramental ou jurídica, mas fraterna e concreta. No caminhar junto dos presbíteros, diferentes por idade e sensibilidade, expande-se um perfume de profecia que  surpreende e fascina. A comunhão é, sem dúvida, um dos nome da Misericórdia.
Na vossa reflexão sobre a renovação do clero entra novamente o capítulo que se refere à gestão das estruturas e dos bens econômicos: em uma visão evangélica, evitem de se sobrecarregar numa pastoral de conservação, que cria obstáculo à abertura à perene novidade do Espírito. Mantenham somente aquilo que pode servir para a experiência de fé e de caridade do povo de Deus.
3. Enfim, nos questionamos qual fosse a finalidade do doar-se do nosso presbítero. Quanta tristeza fazem aqueles que, na vida, estão sempre um pouco pela metade. Calculam, ponderam, não arriscam nada por medo de se perder... São os mais infelizes! O nosso presbítero, ao contrário, com os seus limites, é um que se aventura até o final: nas condições concretas da vida e do ministério que lhe foram colocadas, ele se oferece com gratuidade, com humildade e alegria. Inclusive quando ninguém parece perceber. Inclusive quando, por intuição, humanamente percebe que talvez ninguém vai agradecê-lo suficientemente do seu doar-se sem medidas.
Mas, ele sabe, não poderia fazer diferente: ama a terra, que reconhece visitada todas as manhãs pela presença de Deus. É o homem da Páscoa, do olhar direcionado ao Reino e para onde se sente que a história humana caminha, apesar dos atrasos, das obscuridades e contradições. O Reino, a visão que o homem tem Jesus, é a sua alegria, o horizonte que lhe permite relativizar o resto, de diluir preocupações e ansiedade, de ficar livre das ilusões e do pessimismo; de proteger no coração a paz e de difundi-la com os seus gestos, as suas palavras, as suas atitudes.
Está, então, delineada, queridos irmãos, a tríplice pertença que nos constitui: pertença ao Senhor, à Igreja, ao Reino. Esse tesouro em vasos de Creta precisa ser protegido e promovido! Compreendam fortemente essa responsabilidade, assumam com paciência e disponibilidade de tempo, de mãos e de coração.
Rezo com vocês a Virgem Santa, para que a sua intercessão os proteja acolhedores e fiéis. Junto com os vossos presbíteros, possam terminam o trabalho, o serviço que lhes foi confiado e com o qual participam ao mistério da Mãe Igreja."
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