A verdadeira compaixão não é abstrata
Cidade do
Vaticano (RV) – A Igreja e todos os cristãos demonstrem a compaixão do bom
samaritano diante das feridas do mundo, porque cuidar de quem sofre melhora as
relações sociais e acaba com a cultura do descarte. Esta é a síntese da
oitava meditação conduzida por Padre Ermes Ronchi para o Papa e a Cúria
Romana, nesta quinta-feira (10/03), que marca o quinto dia de exercícios
espirituais.
É o amanhecer de
domingo e três dias se passaram com uma imensa sensação de vazio e muitas
lágrimas. Também a mulher que se aproxima do sepulcro traz as marcas no rosto e
ter visto a pedra deslizada aumenta a angústia. Uma voz a paralisa: “Mulher,
quem procuras? Por que choras?”. A reflexão parte desta cena para descrever o
comportamento de Deus diante das dores dos homens.
Os três verbos
da compaixão
Jesus
ressuscitou, observa o pregador, “é o Deus da vida” e se “interessa pelas
lágrimas” de Madalena. “Na última hora da sexta-feira, na Cruz, tinha se
interessado pela dor e angústia de um ladrão, na primeira hora da Páscoa se
interessa pela dor e amor de Maria”. Porque, destaca Padre Ronchi, este é o
estilo de “Jesus, o homem dos encontros”: não “procura o pecado de uma pessoa,
mas se coloca sempre sobre o sofrimento e as suas necessidades”. E, então,
pergunta-se o religioso, “como ver, entender, tocar e deixar-se tocar pelas
lágrimas” dos outros?:
“Aprendendo o
olhar e os gestos de Jesus, que são aqueles do bom samaritano: ver, parar,
tocar, três verbos a não serem esquecidos jamais(...) Ver: o samaritano viu e
teve compaixão. Viu as feridas daquele homem e sentiu-se ferir (...) A fome tem
um porquê, os migrantes trazem em si montanhas de porquês, os tumores da terra
têm um porquê. Interrogar-se sobre as causas é uma atitude de discípulo. Estar
presente lá aonde se chora (...) e procurar juntos como chegar à raiz do mal e
cortá-la”.
Não “fingir que
não viu”
Pessoas passam por moradores de rua em São Paulo |
Em muitas
passagens do Evangelho Jesus vê a dor humana e sente compaixão. Esta palavra,
diz Padre Ronchi, no texto grego é traduzida como sentir “uma câimbra no
ventre”. A verdadeira compaixão não é, portanto, um pensamento abstrato e
nobre, mas uma mordida física. Aquilo que induz o bom samaritano a não
“fingir que não viu” como aconteceu com o sacerdote e o levita. Tanto porque,
afirma Padre Ronchi, “para além do fingimento não há nada, muito menos Deus”:
“A verdadeira
diferença não é entre cristãos, muçulmanos ou judeus, a verdadeira diferença
não é entre quem acredita ou quem diz não acreditar. A verdadeira
diferença é entre quem para ou quem não para diante das feridas, entre quem
para ou quem passa reto (...) Se eu passei somente uma hora junto às dores
de uma pessoa, a conheço melhor, sou mais sábio do que quem leu todos os
livros. Sou sábio da vida”.
Misericórdia não
se faz à distância
Terceiro verbo:
tocar. “Todas as vezes que Jesus se comove, toca”, recorda o pregador dos
exercícios. “Toca o intocável”, um leproso, o primeiro dos descartes humanos.
Toca o filho da viúva de Naim e “viola a lei, faz aquilo que não se pode: pega
um menino morto, o levanta e o entrega à sua mãe”:
“O olhar sem
coração produz escuridão e, depois disso, começa uma operação ainda mais
devassante: há o risco de transformar os invisíveis em culpados, de transformar
as vítimas – os refugiados, os migrantes, os pobres – em culpados e em causa
dos problemas (...) E se vejo, paro e toco. Se seco uma lágrima, eu sei, não
mudo o mundo, não mudo as estruturas da desigualdade, mas transmiti a ideia de
que a fome não é imbatível, que as lágrimas dos outros têm direito sobre
qualquer um e sobre mim, que eu não deixo à deriva o necessitado, que não foste
jogado fora, que o compartilhar é a forma mais adequada do humano. (...) Porque
a misericórdia é tudo aquilo que é essencial à vida do homem. A
misericórdia é um fato de ventre e de mãos. E Deus perdoa assim: não com um
documento, com as mãos, um toque, uma carícia”. (AC/RB)
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Fonte: radiovaticana.va news.va
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