O nome de Deus é misericórdia
Acaba de ser publicado, em Roma, o livro – O nome de Deus é misericórdia -, produzido pelo jornalista italiano Andrea Tornielli a partir de entrevistas e longas conversas com o Papa Francisco sobre o tema da misericórdia. Em breve, também estará ao alcance dos leitores em língua portuguesa.
Mais que
reflexões sobre a misericórdia, apropriadas para o Ano Santo extraordinário da
Misericórdia, o livro é um convite a fixar a atenção no centro da fé religiosa:
Deus, que é misericórdia, e a se confrontar com a própria atitude religiosa: se
quiser ser verdadeira, ela precisa, acolher a misericórdia de Deus de maneira
confiante, vivendo de forma coerente com ela.
Capa do livro em italiano |
Aceitar a
misericórdia de Deus requer uma boa dose de humildade, conceito que anda sumido
nas relações humanas e até pode falsear as atitudes religiosas. Na vida social,
assumem-se posturas soberbas diante dos que não conseguem acompanhar o mundo
“dos melhores”, muitas vezes feito de vaidades e dissimulações. Os pequenos e
fracos podem também uma boa ocasião para a autopromoção e para uma bondade
apenas de verniz. A misericórdia leva a descer ao nível do outro, na sua
miséria, para acolhê-lo no olhar, nos braços e no coração.
Nas atitudes
religiosas também pode haver soberba e autossuficiência, como já alertou Jesus
no caso do fariseu e do publicano, que foram ao templo para rezar. O fariseu
foi contar suas vantagens para Deus, como a dizer que já era perfeito em tudo e
que Deus lhe devia tanto... Jesus desaprovou essa forma soberba de se
relacionar com Deus, que também pode estar presente na lamúria contra Deus, ou
quando se colocam todos os males na conta de Deus, sem reconhecer a
responsabilidade humana.
Essa forma
farisaica de praticar a religião, em vez de partir do reconhecimento da
soberania de Deus, parte da exaltação da própria vaidade. Ela pode estar
presente também no indiferentismo de quem pergunta candidamente: “Deus? Para
quê, Deus? Não preciso de Deus e resolvo tudo por mim mesmo”. O indiferentismo
e o ateísmo prático desconhecem a experiência da misericórdia de Deus, que
salva, perdoa, restaura e dá sentido à existência.
Mas também pode
estar presente na falta de consciência dos próprios pecados e da necessidade de
pedir o perdão a Deus: é a pretensão soberba de assumir a condição de árbitro
supremo sobre o bem e o mal: “Pecado? Não tenho pecados e não preciso pedir
perdão de nada”. São Paulo, antes da sua conversão, conheceu essa soberba e
pretendeu ser perfeito pelo seu próprio esforço, não se dando conta de quanto
estava fora do caminho! Mas após o encontro surpreendente com Jesus, às portas
de Damasco, ele mudou de ideia e passou a reconhecer: “Jesus Cristo veio ao
mundo para salvar os pecadores, primeiro dos quais sou eu mesmo”.
Muitos clamam
logo por uma “mudança nas estruturas”, ou até por “modernização da doutrina e
da moral da Igreja”. Na verdade, o que a Igreja e a humanidade toda precisam é
de um banho de verdade e autenticidade. E faz parte dessa renovação o humilde e
sincero reconhecimento de que só Deus é Deus e que o homem não é Deus. Nem por
isso, o homem é esmagado ou aniquilado, mas encontra a base do seu verdadeiro
valor. Trocar estruturas, sem mudar de atitudes, é como colocar vinho novo em
barricas velhas...
Deus é
todo-poderoso e, por isso mesmo, também pode ser todo misericordioso. A
misericórdia faz parte da soberania e supera a justiça da lei. Por ser justo e
poderoso, Deus pode perdoar e erguer do pó o indigente, curar o doente, mostrar
a luz do caminho e dar o sentido à vida do homem.
Cardeal Odilo Pedro Scherer - Arcebispo de São Paulo (SP)
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Fonte: cnbb.org.br Ilustração: misericordia.org.br
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