Ser cristão não
significa ser triste nem ser estranho ao lazer, à festa, à hilaridade. Um velho
adágio lembra que “um santo triste é um triste santo”. A beleza, a estética, a
arte são manifestações do Absoluto. Nelas o mistério escondido se faz tocável.
Vamos hoje refletir sobre a teologia da festa.
1. A festa
e a comunidade. Uma das melhores maneiras de se reunir a comunidade é a festa.
Ela tem a função de fomentar a comunhão, possibilitar a partilha, unir a
comunidade. A festa facilita o encontro, o estar juntos, o diálogo e a
reciprocidade.
2. A festa e a
criatividade. Por ocasião da festa, a criatividade humana tem uma ocasião
propícia para se exercitar. As pessoas desenvolvem seus dons, oferecem suas
qualidades, despertam suas potencialidades. A festa ativa a fantasia e nos
torna criativos.
3. A festa e a
cultura. Nos festejos populares, encontramos as grandes expressões
culturais dos povos. Por meio das festas, a cultura se perpetua no tempo,
nascem novos incentivos culturais, e o povo se expressa mais espontaneamente.
4. A festa e os
novos relacionamentos. A festa propicia comunicação, relacionamentos
novos, início de grandes amizades. Festejar é, antes de tudo, encontrar- -se. A
festa aproxima as pessoas, congrega as famílias, movimenta as cidades.
5. A festa e a
reconciliação. Quantos inimigos voltam a se abraçar e quantos adversários
dão-se as mãos por ocasião de uma festa. As mágoas são desfeitas, e a paz volta
aos corações, pois a festa tem “um poder nidificador”, um poder de
reconciliação.
6. A festa e a
saúde. Muita gente é doente porque não usufrui de seu direito ao lazer,
porque não sabe se alegrar, não gosta da festa. Ser cristão não é ser sisudo,
nem estranho. A festa é terapêutica, porque ela descontrai, anima, consola, faz
esquecer os negativismos. Quantas pessoas se curam depois que se abrem ao
humor, à hilaridade, à festa. Precisamos lutar para que todos os brasileiros
possam gozar de seu direito a ter férias e lazer.
7. A festa e o
cotidiano. Um dos maiores inimigos do ser humano é a rotina. Ela é o cupim
das belezas essenciais. Tem o poder de bagatelizar as mais altas experiências e
profundezas da vida. A festa vem quebrar a rotina, romper com a chatice da
monotonia. Ela renova o entusiasmo pelas coisas comuns, restaura o gosto de
viver, inspira vibração ao cotidiano.
8. A festa e o
pecado. Festa não é bagunça. Requer ordem, respeito, dignidade. Festa sem
ética é anarquia e, às vezes, pecado. Quantas festas são pura exploração do
dinheiro do povo, contribuindo para a alienação da consciência social. Os
romanos enganavam o povo com “pão e circo”. Outra sombra da festa é viver um
contínuo balanço de “sombra e água fresca”, relegando o trabalho para o segundo
plano. “Certos lazeres só estimulam o desejo de dinheiro, de agressão e de
erotismo” (R. Clair). Quanto mau gosto em certos esportes atrevidos. Um
futebolismo sem limites é ótimo ópio para a consciência crítica dos
brasileiros. Enfim, festa sem ética degenera em corrupção e permissivismo.
9. A festa e
Deus. Nem a técnica, nem o progresso conseguem preencher o coração humano.
Na experiência da festa, decretamos a ineficácia da máquina e do progresso
material. “Só Deus basta”, dizia Santa Teresa. Construir o mundo sem Deus é
construí-lo contra o homem. O materialismo mutila a pessoa humana fazendo dela
“um excepcional de corpo robusto e alma franzina” (T. L. Penido). A festa rompe
com o materialismo e encaminha o homem na direção de Deus, que é a suprema
alegria e plenitude. A sociedade atual, dilacerada pelo materialismo, corre
loucamente atrás das seitas, dos orientalismos e das mistificações. “O homem
moderno é mágico.” Sem Deus, andamos desenfreadamente em busca de magias,
astrologia, macumba, horóscopos e outras mistificações.
10. A festa e a
eternidade. Quando festejamos, suspendemos o relógio, rompemos com o
cotidiano e com a fragilidade das coisas. A festa nos abre para a
transcendência, para a eternidade; livra-nos da prisão do mundo e das coisas e
nos impulsiona à direção do além, do eterno. Festejar é gritar que as coisas
são insuficientes e que tendemos para o infinito.
Dom Orlando
Brandes - Arcebispo de Aparecida
.................................................................................................................................................
Fonte: a12.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário