Crise na representação
A sociedade
brasileira carrega nos ombros o peso de muitos problemas, um deles
especialmente grave: a crise envolvendo os representantes do povo. O que tem
sido protagonizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, causa perplexidade.
São fatos com desdobramentos que atingem fortemente a democracia, colocam em
risco seus funcionamentos e propósitos. Por isso mesmo, há uma demanda imediata
para que se estabeleça amplo processo de revisão das práticas e posturas nesses
âmbitos, para que elas sejam balizadas por parâmetros éticos. Assim, os
representantes do povo, em suas responsabilidades políticas, poderão valorizar
e garantir a dimensão moral necessária à atividade para a qual foram eleitos.
Todos devem trabalhar pelo bem comum dos brasileiros |
Quem exerce a
representação deveria estar sempre a serviço da coletividade. No entanto, há um
daninho vício de se valer do lugar que se ocupa para adquirir mais prestígio e
outras vantagens pessoais. Isso compromete o bem comum e explica o constante
“bate-boca”, os sucessivos e recíprocos ataques, que objetivam a conquista de
privilégios. Fica evidente que a corrupção política é a mais grave
deformação do sistema democrático, por ser uma traição vergonhosa aos
princípios da moral e da justiça social. O sério comprometimento no
funcionamento do Estado nasce da corrupção, que influencia as relações entre
governantes e governados e tira a credibilidade da representação política. Um
déficit que leva ao enfraquecimento das instituições representativas.
A Doutrina
Social da Igreja Católica afirma que a corrupção política distorce na raiz a
função dessas instituições, “porque as usa como terreno de barganha política
entre solicitações clientelares e favores dos governantes.” Lamentavelmente,
esse mal se tornou um vício na sociedade brasileira. Até quem pode agir de modo
diferente, por não ter afundado, ainda, nas dinâmicas da corrupção, corre o
risco de ser envolvido nos processos que comprometem o exercício da
representação política. Consequentemente, prevalecem os interesses que
são restritos a pequenos grupos.
Se a dinâmica
que prioriza interesses particulares não for vencida, a representação política
na sociedade brasileira só servirá para aumentar a exclusão social e fomentar
um gosto vicioso: o de ocupar cargos para apenas se apropriar do poder,
desconsiderando o bem do povo. Tudo mudaria se a cultura dos que estão na
administração pública, em qualquer nível, fosse marcada pelo objetivo de servir
aos cidadãos. Porém, na contramão desse ideal, o Estado permanece
apropriado pelos interesses que contrariam o bem comum, guiado por
encaminhamentos que não são suficientemente lúcidos. Prevalecem as escolhas que
sacrificam o povo, principalmente o mais pobre.
Urgente é
investir na representação política para inverter os descompassos em curso,
promover novas posturas, sem os vícios que fazem os governantes gastarem a
maior parte do tempo com infrutíferas discussões e acusações. Só uma nova
cultura nas dinâmicas da representação política poderá reverter esses quadros
desoladores. O investimento pode ser alto, o percurso a trilhar certamente é
longo, mas uma profunda mudança na representação política é fundamental. Sem a
necessária moralidade e a consequente qualidade no exercício da representação
política, continuará aberta a ferida na democracia brasileira.
Walmor Oliveira de Azevedo - Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, MG
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Fonte: cnbb.org.br Ilustração: santateresinhacumbica.blogspot.com.br
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