O cuidado com a casa comum
Rádio Vaticano
(RV) – A mensagem do Papa para o Dia Mundial de Oração e
Cuidado da Criação, celebrado em 1º de setembro, é apresentada sob um único
capítulo: “Usemos de misericórdia para com a nossa casa comum”, dividida em 6
subtítulos.
Cuidemos do que é de todos |
Quando instituiu
o Dia Mundial de Oração e Cuidado da Criação em 2015, ano do lançamento da
Encíclica Laudato Si, Francisco explicou o porquê deste dia:
“Para oferecer a
cada fiel e às comunidades a preciosa oportunidade de renovar a adesão pessoal
à sua vocação de guardiões da criação, elevando a Deus o agradecimento pela
obra maravilhosa que Ele confiou ao nosso cuidado, invocando a sua ajuda para a
proteção da criação e a sua misericórdia pelos pecados cometidos contra o mundo
em que vivemos”.
No primeiro
subtítulo que fala sobre a Terra que clama, o Papa recorda que 2015 foi o ano
mais quente da história e que, provavelmente, 2016 será ainda mais.
“Como salienta a
ecologia integral, os seres humanos estão profundamente ligados entre si e à
criação na sua totalidade. Quando maltratamos a natureza, maltratamos também os
seres humanos. Ao mesmo tempo, cada criatura tem o seu próprio valor intrínseco
que deve ser respeitado. Escutemos ‘tanto o clamor da terra como o clamor dos
pobres’ e procuremos atentamente ver como se pode garantir uma resposta
adequada”, destaca o Pontífice.
Conversão
ecológica
A seguir, o Papa
cita o Patriarca Bartolomeu que tem evidenciado os pecados contra a criação.
Neste ponto,
Francisco pede em sua mensagem que “aprendamos a procurar a misericórdia de
Deus para os pecados contra a criação que até agora não soubemos reconhecer nem
confessar; e comprometamo-nos a dar passos concretos no caminho da conversão
ecológica”,
A consciência
ecológica, todavia, toma forma somente após algumas reflexões, explica o Papa:
“Depois de um
sério exame de consciência e habitados por tal arrependimento, podemos
confessar os nossos pecados contra o Criador, contra a criação, contra os
nossos irmãos e irmãs”.
Mudar de rumo
“O exame de
consciência, o arrependimento e a confissão ao Pai, rico em misericórdia,
levam-nos a um propósito firme de mudar de vida”, destaca Francisco.
O Pontífice
recordar algumas coisas práticas apresentadas por ele na Laudato Si e que cada
um de nós pode fazer para respeitar a criação.
“Utilizar com
critérios o plástico e o papel, não desperdiçar água, comida e eletricidade,
diferenciar o lixo, tratar com zelo os outros seres vivos, usar os transportes
públicos e partilhar o mesmo veículo com várias pessoas”.
A estas pequenas
ações de grande importância somam-se os compromissos em nível global, como os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e o Acordo de Paris.
“Os governos têm
o dever de respeitar os compromissos que assumiram, enquanto as empresas devem
responsavelmente cumprir a sua parte, e cabe aos cidadãos exigir que isto
aconteça e também se aponte para objetivos cada vez mais ambiciosos”, exorta o
Papa.
Nova obra de
misericórdia
Ao concluir a
mensagem, sob uma ótica holística da vida humana que na sua totalidade inclui o
cuidado da casa comum, Francisco diz:
“Tomo a
liberdade de propor um complemento aos dois elencos de sete obras de
misericórdia, acrescentando a cada um o cuidado da casa comum".
E explica:
"Como obra
de misericórdia espiritual, o cuidado da casa comum requer 'a grata
contemplação do mundo', que 'nos permite descobrir qualquer ensinamento que
Deus quer nos transmitir por meio de cada coisa'. Como obra de
misericórdia corporal, o cuidado da casa comum requer aqueles 'simples gestos
quotidianos, pelos quais quebramos a lógica da violência, da exploração, do
egoísmo' e se manifesta o amor 'em todas as ações que procuram construir um
mundo melhor'”.
A Rádio Vaticano
transmite ao vivo nesta quinta-feira (1º/9) a Vigília de Oração com o Papa na
Basílica de São Pedro a partir das 11h50 de Brasília. (rb)
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Frei Cantalamessa em reflexão nesta quinta-feira:
Frei Cantalamessa em reflexão nesta quinta-feira:
Ecologia sem doxologia torna o universo opaco
Cidade do
Vaticano (RV) – O Papa Francisco, na tarde desta quinta-feira, 1º de
setembro, presidiu na Basílica de São Pedro às Solenes Vésperas pelo Dia
Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação. A data foi instituída pelo Santo
Padre em 2015, unindo assim a Igreja Católica a uma iniciativa que já era
realizada pelas Igrejas Ortodoxas.
Atento à reflexão |
“Ó homem, por
que tens de ti um conceito tão baixo, quando és tão precioso para Deus?”. Com
esta frase - extraída dos Discursos de São Pedro Crisólogo, século V - o
Pregador da Casa Pontifícia, Frei Raniero Cantalamessa, iniciou sua longa e
articulada reflexão, intitulada “Rezar pela Criação ou rezar com a Criação?”.
Desde o século V
– explicou Frei Raniero – “mudou o motivo pelo qual o homem despreza a si
mesmo, mas não mudou o fato”. “Hoje o motivo do desprezo é que o homem é menos
que nada na imensidão ilimitada do universo”.
O homem diante
do universo
Para contrastar
a afirmação de muitos cientistas ateus, que defendem a total marginalidade e
insignificância do homem no universo, Frei Raniero propõe um enunciado de
Dionísio, o Aeropagita, do século VI que diz, que “não se deve refutar as
opiniões dos outros, nem se deve escrever contra uma opinião ou uma religião
que não parece boa. Se deve escrever somente a favor da verdade e não contra os
outros”. “Não se deve absolutizar este princípios – reiterou - porque às
vezes pode ser necessário refutar doutrinas falsas e perigosas; mas é certo que
a exposição positiva da verdade é mais eficaz do que não a rejeição do erro
contrário”.
Soberania do
homem
Referindo-se
novamente ao discurso de Crisólogo, o Pregador da Casa Pontifícia diz que o
autor reafirma “a ideia bíblica da soberania do homem sobre o cosmos”, visão
completada por São Paulo que indica o lugar que Cristo ocupa nele:
“Estamos diante
de um “ecologismo humano” ou “humanístico”: um ecologismo, isto é, que não é um
fim por si só, mas em função do homem, não só, naturalmente, do homem de hoje,
mas também daquele futuro”.
Criado à imagem
e semelhança de Deus
O pensamento
cristão nunca deixou de interrogar-se sobre o porque desta transcendência do
homem em relação ao resto da criação, encontrando sempre a resposta na
afirmação bíblica de que “o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus”.
O renovado
diálogo com o pensamento ortodoxo, tornou possível à teologia dar uma
explicação realmente satisfatória para a questão, que “é saber em que consiste
ser a imagem de Deus”:
“Tudo se
alicerça na revelação da Trindade operada por Cristo. O homem é criado à imagem
de Deus, no sentido que participa da íntima essência de Deus, que é de ser em
relação de amor entre Pai, Filho e Espírito Santo”. “Eles não têm uma relação
entre si, mas são a relação”, como define Santo Agostinho.
Liberdade do
homem
Somente o homem
- enquanto pessoa capaz de relações livres e conscientes – participa desta
dimensão pessoal e relacional de Deus. “Sendo a Trindade uma comunhão de amor,
criou o homem como um “ser em relação”. É neste sentido que o homem é “a imagem
de Deus””.
O abismo entre
Deus e a criatura humana “é preenchido pela graça”, tornando-se “menos profundo
do que aquele existente entre o homem e o resto da criação”. Com a redenção
operada por Cristo, o homem tornou-se “partícipe da natureza divina”.
Triunfalismo
racial?
Esta visão
poderia levantar objeções, não somente por parte dos não-crentes: “Tudo isto
não é triunfalismo racial?”, levando a um domínio indiscriminado do homem sobre
o resto da criação, com as consequências facilmente imagináveis e, infelizmente
já em curso?:
“A resposta é:
não, se o homem se comporta realmente como imagem de Deus. Se a pessoa humana é
imagem de Deus enquanto é “um ser em comunhão”, isto quer dizer que menos se é
egoísta, fechados em si mesmos e esquecidos dos outros, mais se é pessoa
realmente humana”.
Neste sentido,
“a soberania do homem sobre o cosmos não é um triunfalismo de espécie, mas
assunção de responsabilidade pelos mais fracos, os pobres, os indefesos. O
único título que eles têm para serem respeitados, na ausência de outros
privilégios e recursos, é o de ser pessoa humana”.
Deus que ouve o
grito dos pobres
“O Deus da
Bíblia – mas também de outras religiões – é um Deus “que ouve o grito dos
pobres”, que “tem piedade dos fracos e do pobre”, que “defende a causa dos
miseráveis”, que “faz justiça aos opressores”, que “nada despreza daquilo que
criou”.
A encarnação do
Verbo trouxe uma razão a mais para “para assumir o cuidado dos fracos e do
pobre, independente da raça ou da religião a que pertença. Com a encarnação, o
homem escolheu ser “não rico e poderoso, mas pobre, fraco e indefeso”.
São Francisco
Este foi o passo
em frente que Francisco de Assis permitiu que a teologia desse, explicou o
Pregador da Casa Pontifícia, “superando o dogma necessário para contrastar a
heresia” da época, e que não podia permanecer nisto.
O que comoveu
Francisco até as lágrimas no Natal, foi a humildade a pobreza do Filho de Deus:
“Nele, o amor
pela pobreza e o amor pela criação andavam lado a lado e tinham uma raiz comum
na sua radical renúncia em querer possuir. Francisco pertence a esta categoria
de pessoa do qual São Paulo nos diz que “não tendo nada, possuíam tudo””.
Papa Francisco
O Papa Francisco
– afirma o Frei Raniero – acolhe esta mensagem quando faz “da íntima relação
entre os pobres e a fragilidade do planeta” um das “pedras angulares” da sua
Encíclica sobre o ambiente”:
“O que de fato
produz, ao mesmo tempo, os piores danos ao ambiente e a miséria de imensas
massas humanas, se não o insaciável desejo de alguns de fazer aumentar sem
medidas as próprias posses e lucros? À terra se deve aplicar aquilo que os
antigos diziam da vida: a ninguém é dada em propriedade, a todos em uso”.
Terremoto
A verdade de que
não somos os donos da terra nos é recordada por acontecimentos como “o terrível
terremoto da semana passada” e que nos leva a perguntar: “Onde estava Deus?”,
questionamento para o qual não temos uma pronta resposta:
“Algo, porém, a
fé nos permite dizer. Deus não projetou a criação como se fosse uma máquina ou
um computador, onde tudo é programado desde o início em cada detalhe, salvo a
operar periodicamente atualizações. Por analogia com o homem, podemos falar de
um tipo de “liberdade” que Deus deu à matéria de desenvolver-se segundo leis
próprias. Neste sentido ( mas somente neste), podemos até mesmo compartilhar o
ponto de vista dos cientistas não-crentes que falam de “acaso e necessidade”.
Na evolução tudo ocorre “por acaso”, mas o próprio acaso é previsto pelo
Criador e não é “por acaso””.
Assim, à
pergunta “Onde estava Deus na noite de 23 de setembro, o fiel não hesita em
responder com toda a humildade: “Ele estava ali sofrendo com as suas criatura,
acolhendo na sua paz as vítimas que batiam á porta de seu Paraíso”.
Ecologia sem
doxologia
O Frei
capuchinho recorda que existem muitas tarefas do homem em relação à criação,
“algumas mais urgentes que outras, como a água, o ar, o clima, a energia, a
defesa das espécies em risco. Disto se fala em todos os ambientes e encontros
que se ocupam de ecologia. Mas faz uma ressalva:
“Existe porém,
um dever pela criação do qual não se pode falar se não em um encontro entre
fieis e é justamente por isto que foi colocado ao centro deste encontro de
oração. Tal dever é a doxologia, a glorificação de Deus pela criação. Uma
ecologia sem doxologia torna o universo opaco, como um imenso mapa-múndi de
vidro, privado da luz que deveria iluminá-lo por dentro”.
Glorificação de
Deus
A tarefa
primordial das criaturas em relação à criação é de emprestar a ela a sua voz.
Foram necessários milhares de anos para que o universo chegasse “à luz da
consciência”, alcançada quando apareceu aquela que Teilhard de Chardin chama de
“fenômeno humano”. “Mas agora que o universo chegou à sua linha de chegada,
exige que o homem cumpra o seu dever, que assuma, por assim dizer, a direção do
coro e entoe em nome de toda a criação: “Glória a Deus no alto dos céus!””.
“Nós, crentes,
devemos ser a voz não somente das criaturas inanimadas, mas também dos nossos
irmãos que não têm a graça da fé. Não esqueçamos, em particular, de glorificar
a Deus pelas brilhantes realizações da técnica. São obras do homem, é verdade,
mas o homem, de quem é obra? Quem o fez?”.
A glorificação –
sublinha Frei Raniero – não serve naturalmente a Deus, mas a nós:
“Com ela, se
redime a criação da senilidade e da vaidade, isto é, do não-senso, em que a
arrastou o pecado dos homens e a arrasta hoje a incredulidade do mundo”.
Rezar
"com" a criação
São Francisco de
Assis – conclui o Pregador da Casa Pontifícia – tem algo a dizer ainda hoje a
propósito do ecologismo:
“Ele não reza
“pela” criação, pelo seu cuidado (no tempo dele não havia ainda necessidade),
reza “com a criação”, ou “pela causa da criação”, ou ainda “por motivo da
criação”. São todas nuances presentes na preposição “pelo” por ele usada: “Laudato
Si, meu Senhor, pelo irmão sol, pela irmã lua, pela irmã mãe terra”. O seu
canto é uma doxologia e um hino de ação de graças. Mas precisamente disto deriva
o respeito extraordinário por cada criatura pelo qual queria que até às ervas
selvagens fosse deixado um espaço para crescer”. (JE)
Assista:
Fonte: radiovaticana.va news.va
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