a guerra
é absurda, é preciso desarmar a Terra
Publicamos a
carta que o Papa Francisco escreveu ao diretor do jornal italiano Corriere
della Sera, Luciano Fontana, em resposta a uma mensagem sua de proximidade ao
Pontífice neste momento de doença, na qual lhe pede que reitere um apelo pela
paz e pelo desarmamento nas colunas do jornal diário milanês.
Prezado diretor,
gostaria de
agradecer pelas palavras de proximidade com as quais desejou estar presente
neste momento de doença em que, como já disse, a guerra parece ainda mais
absurda. A fragilidade humana, de fato, tem o poder de nos tornar mais lúcidos
em relação ao que dura e ao que passa, ao que nos faz viver e ao que mata.
Talvez seja por isso que, com tanta frequência, tendemos a negar os limites e a
evitar pessoas frágeis e feridas: elas têm o poder de questionar a direção que
escolhemos, como indivíduos e como comunidade.
Gostaria de
encorajar o senhor e todos aqueles que dedicam trabalho e inteligência para
informar, através de instrumentos de comunicação que agora unem nosso mundo em
tempo real: sentir toda a importância das palavras. Elas nunca são apenas
palavras: são fatos que constroem os ambientes humanos. Elas podem conectar ou
dividir, servir a verdade ou se servir dela. Precisamos desarmar as palavras
para desarmar as mentes e desarmar a Terra. Há uma grande necessidade de
reflexão, de calma, de um senso de complexidade.
Enquanto a
guerra apenas devasta as comunidades e o meio ambiente, sem oferecer soluções
para os conflitos, a diplomacia e as organizações internacionais precisam de
nova força vital e credibilidade. As religiões, além disso, podem se valer da
espiritualidade dos povos para reacender o desejo da fraternidade e da justiça,
a esperança de paz.
Tudo isso exige
comprometimento, trabalho, silêncio e palavras. Sintamo-nos unidos nesse
esforço, que a Graça celeste não deixará de inspirar e acompanhar.
Francisco
Roma,
Policlínica Gemelli, 14 de março de 2025
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Desarmamento e
novo vigor à diplomacia
Do Gemelli o Papa Francisco reitera o absurdo da guerra enquanto o mundo se apressa em se rearmar.
Poucas palavras,
mas significativas, que infelizmente chegam nas mesmas horas em que se reacende
a guerra no Oriente Médio com novos bombardeios israelenses em Gaza. Do
Hospital Gemelli, o Papa Francisco vê de forma ainda mais clara e lúcida o
absurdo da guerra. E em sua carta ao editor do jornal italiano Corriere della
Sera, ele mais uma vez levanta sua voz - semelhante à do Batista que clama no
deserto - para reiterar que a guerra devasta comunidades e o meio ambiente.
O mundo,
incluindo a Europa, está correndo para se rearmar, pronto para investir enormes
somas para encher os arsenais já transbordantes com armas capazes de destruir
dez vezes toda a humanidade. O Sucessor de Pedro, fragilizado e enfraquecido
pela doença, não desiste de nos mostrar o caminho para deter a corrida rumo ao
abismo da Terceira Guerra Mundial. Ele nos convida, antes de tudo, a desarmar
as palavras e as mentes. Ele nos convida a desarmar a Terra.
Em uma época em
que até mesmo as negociações e os encontros de cúpula ocorrem em mundo visão, e
onde parecem prevalecer a linguagem simplificada, a demonização do adversário,
a polarização e as fake news, Francisco convida à reflexão, à calma, ao senso da
complexidade da realidade. Acima de tudo, ele nos convida a redescobrir a
diplomacia em um mundo que parece tê-la esquecido, e a restaurar o vigor e a
credibilidade das organizações internacionais, que devem ser fortalecidas e não
esvaziadas de sua força.
O fato de que o
caminho a seguir é o desarmamento, e não o rearmamento, também foi lembrado
ontem pelo cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado, quando questionado
sobre o ReArm Europe à margem da primeira edição da Mesa do Ramadão - Iftar,
organizada pela Embaixada do Marrocos junto à Santa Sé: “aqueles que optam por
se rearmar devem, mais cedo ou mais tarde, enfrentar a realidade de que as
armas, por mais que pareçam um impedimento, estão destinadas a serem usadas.
Devemos insistir, em nível internacional, que haja um desarmamento geral e
controlado. E isso tem sido uma constante na política da Santa Sé desde a
Primeira Guerra Mundial”. Parolin acrescentou: “não podemos, portanto, estar
satisfeitos com a direção que estamos tomando, onde, ao contrário, estamos
testemunhando um fortalecimento dos arsenais”.
Andrea Tornielli
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