A verdadeira autoridade é servir, não explorar os outros
"A autoridade
é um serviço, e como tal deve ser exercida, para o bem de todos e para a
difusão do Evangelho. É feio ver quando as pessoas com autoridade na Igreja
buscam seus próprios interesses”, disse Francisco no Angelus dominical.
Mariangela
Jaguraba/Silvonei José - Vatican News - O Papa Francisco rezou a oração mariana
do Angelus deste domingo (04/10), memória de São Francisco de Assis, com os
fiéis e peregrinos na Praça São Pedro.
No Evangelho deste
domingo, prevendo a sua paixão e morte, “Jesus conta a parábola dos vinhateiros
homicidas, para admoestar os chefes dos sacerdotes e os anciãos do povo que
estão prestes a tomar o caminho errado. Estes, de fato, têm más intenções em
relação a ele e procuram formas de eliminá-lo”.
“A narração
alegórica descreve um patrão que, depois de ter muito cuidado da sua vinha,
tendo de partir a confia aos agricultores. Depois, no tempo da colheita, ele
envia alguns servos para recolher os frutos; mas esses vinhateiros recebem os
servos com bastões e alguns até os matam”, frisou o Papa. “O patrão envia
outros servos, mais numerosos, mas eles recebem o mesmo tratamento. O ápice é
atingido quando o patrão decide enviar o seu filho: os vinhateiros não o
respeitam, pelo contrário, pensam que ao eliminá-lo poderão tomar conta da
vinha, e por isso matam-no também”. Francisco acrescentou:
A imagem da vinha
é clara: representa o povo que o Senhor escolheu e formou com tanto cuidado; os
servos enviados pelo patrão são os profetas, enviados por Deus, enquanto o
filho é a figura de Jesus. E tal como os profetas foram rejeitados, assim
também Cristo foi rejeitado e morto.
No final da
narração, Jesus pergunta aos chefes do povo: "Quando vier o dono da vinha,
então, o que fará ele a estes agricultores? E eles, tomados pela lógica da
narrativa, pronunciam eles mesmos a sua própria condenação: o patrão - dizem -
castigará severamente os malvados e confiará a vinha "a outros
agricultores, que lhe entregarão os frutos no tempo certo".
Com esta parábola
muito dura, Jesus coloca os seus interlocutores diante de suas
responsabilidades, e o faz com extrema clareza. Mas não pensemos que esta
admoestação vale apenas para aqueles que rejeitaram Jesus naquele momento. Vale
para todos os tempos, também para o nosso. Ainda hoje Deus espera os frutos da
sua vinha daqueles que enviou para trabalhar nela. Todos nós.
Segundo o
Pontífice, “em cada época, aqueles que têm autoridade, qualquer autoridade,
mesmo na Igreja, no povo de Deus podem ser tentados a fazer o seu interesse em
vez daquele de Deus. E Jesus diz que a verdadeira autoridade é quando se faz o
serviço, é servir, e não explorar os outros. A vinha é do Senhor, não nossa. A
autoridade é um serviço, e como tal deve ser exercida, para o bem de todos e
para a difusão do Evangelho. É feio ver quando as pessoas com autoridade na
Igreja buscam seus próprios interesses”.
Francisco disse
que São Paulo, na Segunda Leitura da liturgia deste domingo, “nos diz como ser
bons trabalhadores na vinha do Senhor: o que é verdadeiro, nobre, justo, puro,
amável, honrado; o que é virtude e merece louvor, tudo isto seja objeto diário
do nosso compromisso. Ele repete: o que é verdadeiro, nobre, justo, puro,
amável, honrado; o que é virtude e merece louvor, tudo isso deve ser objeto
cotidiano do nosso compromisso”.
Esta é a atitude
da autoridade e também de cada um de nós, porque cada um de nós, em nosso
pequeno círculo, tem uma certa autoridade. Deste modo, nos tornaremos uma
Igreja cada vez mais rica de frutos de santidade, daremos glória ao Pai que nos
ama com infinita ternura, ao Filho que continua a nos dar a salvação, ao
Espírito que nos abre o coração e nos impele para a plenitude do bem.
O Papa convidou os
fiéis a se unirem espiritualmente aos fiéis reunidos no Santuário de Pompeia
para a Súplica e a renovar o nosso compromisso de rezar o Terço neste mês de
outubro.
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Publicada “Fratelli tutti”,
a Encíclica social do Papa Francisco
Fraternidade e
amizade social são os caminhos indicados pelo Pontífice para construir um mundo
melhor, mais justo e pacífico, com o compromisso de todos: pessoas e
instituições. Reafirmado com vigor o não à guerra e à globalização da
indiferença.
Vatican News - Quais
são os grandes ideais mas também os caminhos concretos para aqueles que querem
construir um mundo mais justo e fraterno nas suas relações quotidianas, na vida
social, na política e nas instituições? Esta é a pergunta à qual pretende
responder, principalmente, “Fratelli tutti”: o Papa define-a como uma
"Encíclica Social" (6) que toma o seu título das
"Admoestações" de São Francisco de Assis, que usava essas palavras
"para se dirigir a todos os irmãos e irmãs e lhes propor uma forma de vida
com sabor do Evangelho" (1). A Encíclica tem como objetivo promover uma
aspiração mundial à fraternidade e à amizade social. No pano de fundo, há a
pandemia da Covid-19 que - revela Francisco - "irrompeu de forma
inesperada quando eu estava escrevendo esta carta". Mas a emergência sanitária
global mostrou que "ninguém se salva sozinho" e que chegou realmente
o momento de "sonhar como uma única humanidade", na qual somos
"todos irmãos". (7-8).
No primeiro de
oito capítulos, intitulado "As sombras dum mundo fechado", o
documento debruça-se sobre as muitas distorções da época contemporânea: a
manipulação e a deformação de conceitos como democracia, liberdade, justiça; o
egoísmo e a falta de interesse pelo bem comum; a prevalência de uma lógica de
mercado baseada no lucro e na cultura do descarte; o desemprego, o racismo, a
pobreza; a desigualdade de direitos e as suas aberrações como a escravatura, o
tráfico de pessoas, as mulheres subjugadas e depois forçadas a abortar, o
tráfico de órgãos (10-24). Estes são problemas globais que requerem ações globais,
sublinha o Papa, apontando o dedo também contra uma "cultura de
muros" que favorece a proliferação de máfias, alimentadas pelo medo e pela
solidão (27-28).
A muitas sombras,
porém, a Encíclica responde com um exemplo luminoso, o do bom samaritano, a quem
é dedicado o segundo capítulo, "Um estranho no caminho". Nele, o
Papa assinala que, numa sociedade doente que vira as costas à dor e é
"analfabeta" no cuidado dos mais frágeis e vulneráveis (64-65), somos
todos chamados a estar próximos uns dos outros (81), superando preconceitos e
interesses pessoais. De fato, todos nós somos corresponsáveis na construção de
uma sociedade que saiba incluir, integrar e levantar aqueles que sofrem (77). O
amor constrói pontes e nós "somos feitos para o amor" (88), acrescenta
o Papa, exortando em particular os cristãos a reconhecerem Cristo no rosto de
cada pessoa excluída (85). O princípio da capacidade de amar segundo "uma
dimensão universal" (83) é também retomado no terceiro capítulo,
"Pensar e gerar um mundo aberto": nele, Francisco exorta cada um de
nós a "sair de si mesmo" para encontrar nos outros "um
acrescentamento de ser" (88), abrindo-nos ao próximo segundo o dinamismo
da caridade que nos faz tender para a "comunhão universal" (95).
Afinal – recorda a Encíclica - a estatura espiritual da vida humana é medida
pelo amor que nos leva a procurar o melhor para a vida do outro (92-93). O
sentido da solidariedade e da fraternidade nasce nas famílias que devem ser
protegidas e respeitadas na sua "missão educativa primária e
imprescindível" (114).
O direito a viver
com dignidade não pode ser negado a ninguém, afirma ainda o Papa, e uma vez que
os direitos são sem fronteiras, ninguém pode ser excluído, independentemente do
local onde nasceu (121). Deste ponto de vista, o Papa lembra também que é
preciso pensar numa "ética das relações internacionais" (126), porque
cada país é também do estrangeiro e os bens do território não podem ser negados
àqueles que têm necessidade e vêm de outro lugar. O direito natural à propriedade
privada será, portanto, secundário em relação ao princípio do destino universal
dos bens criados (120). A Encíclica também coloca uma ênfase específica na
questão da dívida externa: embora se mantenha o princípio de que toda a dívida
legitimamente contraída deve ser paga, espera-se, no entanto, que isto não
comprometa o crescimento e a subsistência dos países mais pobres (126).
Ao tema das
migrações é, ao invés, dedicado em parte o segundo e todo o quarto
capítulo, "Um coração aberto ao mundo inteiro": com as suas
"vidas dilaceradas" (37), em fuga das guerras, perseguições,
catástrofes naturais, traficantes sem escrúpulos, arrancados das suas
comunidades de origem, os migrantes devem ser acolhidos, protegidos, promovidos
e integrados. Nos países destinatários, o justo equilíbrio será entre a
proteção dos direitos dos cidadãos e a garantia de acolhimento e assistência
aos migrantes (38-40). Especificamente, o Papa aponta algumas "respostas
indispensáveis" especialmente para aqueles que fogem de "graves
crises humanitárias": incrementar e simplificar a concessão de vistos;
abrir corredores humanitários; oferecer alojamento, segurança e serviços
essenciais; oferecer possibilidade de trabalho e formação; favorecer a
reunificação familiar; proteger os menores; garantir a liberdade religiosa. O
que é necessário acima de tudo" - lê-se no documento -, é uma legislação (governance) global
para as migrações que inicie projetos a longo prazo, indo além das emergências
individuais, em nome de um desenvolvimento solidário de todos os povos
(129-132).
O tema do quinto
capítulo é "A política melhor", ou seja, a que representa uma das
formas mais preciosas da caridade porque está ao serviço do bem comum (180) e
conhece a importância do povo, entendido como uma categoria aberta, disponível
ao confronto e ao diálogo (160). Este é o popularismo indicado por Francisco,
que se contrapõe ao "populismo" que ignora a legitimidade da noção de
"povo", atraindo consensos a fim de instrumentalizar ao serviço do
seu projeto pessoal (159). Mas a melhor política é também a que protege o
trabalho, "uma dimensão indispensável da vida social" e procura
assegurar que cada um tenha a possibilidade de desenvolver as suas próprias
capacidades (162). A verdadeira estratégia contra a pobreza, afirma a Encíclica,
não visa simplesmente a conter os necessitados, mas a promovê-los na
perspectiva da solidariedade e da subsidiariedade (187). A tarefa da política,
além disso, é encontrar uma solução para tudo o que atenta contra os direitos
humanos fundamentais, tais como a exclusão social; tráfico de órgãos, e tecidos
humanos, armas e drogas; exploração sexual; trabalho escravo; terrorismo e
crime organizado. Forte o apelo do Papa para eliminar definitivamente o tráfico
de seres humanos, "vergonha para a humanidade", e a fome, porque é
"criminosa" porque a alimentação é "um direito inalienável"
(188-189).
A política da qual
há necessidade, sublinha ainda Francisco, é aquela centrada na dignidade humana
e que não está sujeita à finança porque "o mercado por si só, não resolve
tudo": os "estragos" provocados pela especulação financeira mostraram-no
(168). Assumem, portanto, particular relevância os movimentos populares:
verdadeiros "torrentes de energia moral", devem ser envolvidos na
sociedade, de uma forma coordenada. Desta forma - afirma o Papa -, pode-se
passar de uma política "para" os pobres para uma política
"com" e "dos" pobres (169). Outro desejo presente na
Encíclica diz respeito à reforma da ONU: perante o predomínio da dimensão
econômica, de fato, a tarefa das Nações Unidas será dar uma real concretização
ao conceito de "família de nações", trabalhando para o bem comum, a
erradicação da pobreza e a proteção dos direitos humanos. Recorrendo
incansavelmente à "negociação, aos mediadores e à arbitragem" -
afirma o documento pontifício - a ONU deve promover a força da lei sobre a lei
da força (173-175).
Do sexto capítulo,
"Diálogo e amizade social", emerge também o conceito de vida como
"a arte do encontro" com todos, também com as periferias do mundo e
com os povos originais, porque "de todos se pode aprender alguma coisa,
ninguém é inútil, ninguém é supérfluo" (215). Particular, então, a
referência do Papa ao "milagre da amabilidade", uma atitude a ser
recuperada porque é "uma estrela na escuridão" e uma "libertação
da crueldade, da ansiedade que não nos deixa pensar nos outros, da urgência
distraída" que prevalecem em época contemporânea (222-224). Reflete sobre
o valor e a promoção da paz, o sétimo capítulo, intitulado "Percursos dum
novo encontro", no qual o Papa sublinha que a paz é "proativa" e
visa formar uma sociedade baseada no serviço aos outros e na busca da
reconciliação e do desenvolvimento mútuo. A paz é uma "arte" em que
cada um deve desempenhar o seu papel e cuja tarefa nunca termina (227-232).
Ligado à paz está o perdão: devemos amar todos sem exceção - lê-se na Encíclica
-, mas amar um opressor significa ajudá-lo a mudar e não permitir que ele
continue a oprimir o seu próximo (241-242). Perdão não significa impunidade,
mas justiça e memória, porque perdoar não significa esquecer, mas renunciar à
força destrutiva do mal e da vingança. Nunca esquecer "horrores" como
a Shoah, os bombardeamentos atómicos em Hiroshima e Nagasaki, perseguições e
massacres étnicos - exorta o Papa - devem ser sempre recordados, novamente,
para não nos anestesiarmos e manterem viva a chama da consciência coletiva. E
também é importante fazer memória do bem. (246-252).
Parte do sétimo
capítulo se detém, então, sobre a guerra: "uma ameaça constante", que
representa a "negação de todos os direitos", "o fracasso da
política e da humanidade", "a vergonhosa rendição às forças do
mal". Além disso, devido às armas nucleares, químicas e biológicas que
afetam muitos civis inocentes, hoje já não podemos pensar, como no passado,
numa possível "guerra justa", mas temos de reafirmar fortemente
"Nunca mais a guerra! A eliminação total das armas nucleares é "um
imperativo moral e humanitário"; em vez disso - sugere o Papa - com o
dinheiro do armamento deveria ser criado um Fundo Mundial para acabar de vez
com a fome (255-262). Francisco expressa uma posição igualmente clara sobre a
pena de morte: é inadmissível e deve ser abolida em todo o mundo. "O
homicida não perde a sua dignidade pessoal - escreve o Papa – e o próprio Deus
Se constitui seu garante" (263-269). Ao mesmo tempo, a necessidade de
respeitar "a sacralidade da vida" (283) é reafirmada onde
"partes da humanidade parecem sacrificáveis ", tais como os
nascituros, os pobres, os deficientes, os idosos (18).
No oitavo e último
capítulo, o Pontífice se detém sobre "Religiões ao serviço da fraternidade
no mundo" e reitera que o terrorismo não se deve à religião, mas a
interpretações erradas de textos religiosos, bem como a políticas de fome,
pobreza, injustiça e opressão (282-283). Um caminho de paz entre a religiões é,
portanto, possível; por isso, é necessário garantir a liberdade religiosa,
direito humano fundamental para todos os crentes (279). Uma reflexão, em
particular, a Encíclica faz sobre o papel da Igreja: ela não relega a sua
missão à esfera privada e, embora não fazendo política, não renuncia à dimensão
política da existência, à atenção ao bem comum e à preocupação pelo
desenvolvimento humano integral, segundo os princípios evangélicos (276-278).
Enfim, Francisco
cita o "Documento sobre a fraternidade humana em prol da paz mundial e da
convivência comum", assinado por ele mesmo em 4 de fevereiro de 2019 em
Abu Dhabi, junto com o Grande Imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyib: desta pedra
miliar do diálogo inter-religioso, o Pontífice retoma o apelo para que, em nome
da fraternidade humana, o diálogo seja adoptado como caminho, a colaboração
comum como conduta, e o conhecimento mútuo como método e critério (285).
Vatican News Service – IP - SP
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