da vida religiosa consagrada na atualidade
A dedicação à vida
religiosa consagrada é celebrada dentro do mês vocacional nesta terceira semana
de agosto, de 16 a 22. O Catecismo da Igreja Católica afirma, no parágrafo 926,
que: “A vida religiosa faz parte do mistério da Igreja. É um dom que a
Igreja recebe do seu Senhor, e que oferece, como um estado de vida estável, ao
fiel chamado por Deus à profissão dos conselhos”.
As pessoas que se
dedicam à vida consagrada na Igreja são homens e mulheres que, desde os
primórdios do evangelho, são chamadas a viver os conselhos evangélicos, fazem
os votos de castidade, pobreza e obediência e dedicam suas vidas integralmente
ao serviço da Igreja e da humanidade.
“A vida religiosa
é convidada a significar, nas suas variadas formas, a própria caridade de Deus,
em linguagem do nosso tempo”, destaca o trecho final do parágrafo 926 do
Catecismo da Igreja Católica.
Os consagrados são
freiras, frades, monges, padres e leigos que dedicam sua vida ao serviço do
Evangelho. E nesta semana dedicada à vida religiosa, que tem como tema “Amados
e Chamados por Deus”, o mesmo dedicado ao mês vocacional, o Portal da CNBB
conversou com três jovens religiosos.
Acompanhe abaixo
as três entrevistas na íntegra:
Padre Reinaldo de
Sousa Leitão é da Congregação dos Rogacionistas do Coração de Jesus. Está há 12
anos na vida consagrada, sete como sacerdote. Ele diz que a proximidade, o
testemunho e o trabalho dos rogacionistas na comunidade São Francisco de Assis,
em Altmaira do Maranhão (MA) – sua cidade natal, o fez discernir a
possibilidade de ser um apóstolo do Rogate, respondendo aí ao chamado de Deus
para a missão.
Quais os desafios
de ser consagrado hoje?
Viver a vocação
consagrada hoje, requer de nós, consagrados um constante esforço pessoal para
nos assemelharmos à pessoa de Jesus. Ter os mesmos sentimentos e viver de
acordo com os seus ensinamentos, inseridos na nossa própria condição humana e
socio-ambiental, requer uma consciência vocacional e missionária que esteja
voltada para o processo de doação e partilha, buscando sempre a “comum-união”,
considerando que somos parte e não totalidade da dinâmica sinodal da vida
consagrada.
Como é para você
viver os conselhos evangélicos (votos) de castidade, pobreza e obediência em um
tempo que se fala tanto em liberdade e autonomia?
Foto: arquivo pessoal |
A vida comunitária
é um dos pilares da vida consagrada, como é viver ao lado de pessoas tão
diferentes e que não foi você que escolheu?
A beleza da vida
comunitária está na partilha vocacional das singularidades, cada um com sua
história de vida, seus medos e sonhos. Como é bonito contemplar os irmãos (ãs)
vivendo juntos um ideal de vida (cf. Sl 133,1-3). Isso não quer dizer que não
teremos divergência de ideias, seria anormal, se não tivéssemos. Porém, o amor
que nos une não está baseado nas nossas “debilidades” humanas, mas nas
maravilhas de um Deus que é “amor-comunhão”, num carisma único de ligamento
fraternal que promove a superação das partes e que geram “comum-união”. Viver ao
lado de tantos irmãos consagrados, companheiros de caminhada, é uma excelente
oportunidade para perceber que não estamos sozinhos e que aprendemos a conviver
no caminhar da vida comunitária (cf. Lc 21, 13-35).
Outra dimensão da
vida consagrada é a espiritualidade, a relação com Deus. Como se dá a
experiência mística em um tempo de tantas telas, ruídos e distrações que
vivemos hoje?
Nós, rogacionistas
do coração de Jesus, temos por base espiritual fundante da nossa vida
congregacional, o mandamento de Jesus: “Rogai (Rogate), ao Senhor da messe que
envie operários para a sua messe” (cf. Mt 9, 37-38). Nesta espiritualidade do
Rogate, podemos, fortalecer a semente vocacional, cultivada na proposta da Vida
Consagrada. O papa Francisco nos motivou e alertou muito bem quando disse que
“as vocações nascem na oração e da oração. E só na oração podem perseverar e
dar fruto” (REGINA COELI, papa Francisco, 2013). Fornecer frutos vocacionais, a
partir dessa espiritualidade do Rogate, em tempos de aceleração digital é um grande
desafio, pois exige de cada religioso a capacidade de se compadecer e
sensibilizar com as mazelas humanas, até mesmo dentro deste borbulhar dos
dígitos que cada vez mais consome informações para gerar cognitivamente e
comportalmente seres digitais, numa sociedade movimentada em rede on-line. O
cuidado que devemos ter na utilização destes dispositivos móveis de rápida
mobilidade de informação, é não esfriarmos o nosso coração e apagarmos a nossa
fé, sendo indiferentes e até mesmo desumanos, em frente as reluzentes telas
gráficas, pois, os dispositivos são apenas mediações para levar ao contexto
virtual aquilo que somos ou pelo menos deveríamos testemunhar como
discípulos-missionários de Jesus Cristo.
A missão é parte
integrante da identidade dos consagrados e cada instituto tem uma específica, a
partir do carisma legado pelo fundador. Como se deu a sua identificação com a
missão da sua família religiosa?
O que nos
identifica, além, dos valores trazidos do berço familiar, com certeza é a causa
ou melhor dizendo, o carisma assumido enquanto projeto vocacional de vida. O
Rogate (Mt 9, 37) é o nosso alicerce, a nossa missão e vocação. É impensável um
religioso rogacionista que não pulsa em seu coração o desejo de promover as
vocações para que tenhamos mais operários que trabalhem em prol da construção
de uma sociedade mais justa e fraterna. Por isso, a melhor forma de dá
visibilidade ao carisma assumido é transparecer em palavras e ações este dom
concedido por Deus, através da inspiração do nosso fundador, Santo Aníbal Maria
de Francia, apóstolo da oração vocacional, pai dos órfãos e dos pobres e
patrono da animação vocacional.
Nós conversamos
também com o formando da Província Marista Brasil Centro-Sul, Bruno Felipe Rosa
que iniciou o itinerário formativo em fevereiro de 2015. Bruno conta que o
primeiro chamado dele foi através do testemunho do animador vocacional, Ir Hugo
Depiné e que ao conhecer o Carisma legado por Champagnat, passou a entender que
os Irmãos Maristas são chamados a serem agentes transformadores em uma
sociedade turbulenta e desigual.
Quais os desafios
de ser consagrado hoje?
Foto: arquivo pessoal |
Como é para você
viver os conselhos evangélicos (votos) de castidade, pobreza e obediência em um
tempo que se fala tanto em liberdade e autonomia?
Viver os conselhos
evangélicos é o ápice do seguimento de Cristo. Quando um religioso, ou
formando, compreende que para seguir radicalmente o ressuscitado, é necessário
fazer escolhas que muitas vezes vão contra a corrente, passam a viver por um
objetivo maior. Viver a castidade em um mundo de libertinagens, onde cada vez
mais os “convites” para conhecer o que a nós é indevido, faz com que sejam necessários
um discernimento e um autoconhecimento bastante profundos. Saber até onde vão
os seus limites, saber deixar clara para todas as pessoas que o rodeiam suas
opções pela vida religiosa, é sinal de compromisso e entrega. Bem como a
castidade, a pobreza e obediência tem seus desafios constantes. Quando se
compreende o verdadeiro sentido de autonomia e liberdade, passa-se a perceber
que para ser religioso hoje, é necessário ser muito livre e autônomo.
A vida comunitária
é um dos pilares da vida consagrada, como é viver ao lado de pessoas tão
diferentes e que não foi você que escolheu?
A vida
comunitária, bem como a vida de oração e a vida apostólica, me fazem acreditar
que um mundo melhor é possível. Desde que ingressei na congregação, venho
percebendo o quão importante é termos com quem partilhar a vida, falo isso a
partir de uma realidade formativa. Saber que nos momentos de dificuldades você
tem com quem desabafar, encontrar no formador uma pessoa que acolhe suas
inquietações e ajuda a refletir sobre elas, isso é recompensador. Em um mundo
onde o individualismo é mais frequente, viver em comunidade faz com que eu me
sinta diariamente a seguir firme e constante na caminhada. Não pensemos que
existem somente flores nesse jardim da vida religiosa, existem sim muitos
espinhos. No entanto, essas dificuldades encontradas podem ser utilizadas como
ponto de crescimento para toda comunidade. Estar aberto a aprender com todas as
circunstâncias, deixar de lado o egocentrismo e saber dialogar com os coirmãos
é um caminho indispensável para quem quer seguir a vida religiosa. Aos poucos
vamos aprendendo a valorizar os irmãos e pôr tudo em comum, respeitando a
singularidade de cada conviva.
Outra dimensão da
vida consagrada é a espiritualidade, a relação com Deus. Como se dá a
experiência mística em um tempo de tantas telas, ruídos e distrações que
vivemos hoje?
Durante este
tempo, tenho percebido que, na minha realidade a rotina de orações tem se
tornado mais frequentes e de qualidade. Não há mais a necessidade de correr
para o local de apostolado, ele é em casa agora. Não há necessidade de perder
tempo com trânsito, o percurso agora é curto. Viver a espiritualidade em tempos
de pandemia tem sido uma aventura. Ter a possibilidade de fazer retiros mensais
em comunidade orientados pelo próprio superior, possibilita que seja ainda mais
intensa a experiência com o transcendente. Neste tempo, não foram somente a
quantidade de orações e retiros que aumentaram, afinal, espiritualidade não se
resume a isso. Mas foi um conjunto de situações que possibilitaram viver com
mais intensidade este contato íntimo com Deus. Com o distanciamento social, o
contato comigo mesmo tem se tornado cada vez maior, o outro tem ocupado lugar
muito importante na vida comunitária e nos momentos de interioridade,
aumentando também o contato com o Criador. Viver a espiritualidade neste tempo
tem sido belo e surpreendente. Às vezes é necessário parar para ouvir os
barulhos interiores e responder aos questionamentos que emanam.
A missão é parte
integrante da identidade dos consagrados e cada instituto tem uma específica, a
partir do carisma legado pelo fundador. Como se deu a sua identificação com a
missão da sua família religiosa?
Quando conheci os
Irmãos Maristas eu era um adolescente. De súbito percebi algo diferente e
atrativo. Cantavam e encantavam, irmãos e leigos. Me identifiquei de início e
continuei a me encantar pelo carisma de “tornar Jesus Cristo conhecido e amado,
principalmente os mais necessitados”, justamente por ser um desses que o
Carisma abrangia. É uma alegria pensar que da mesma forma que eles fizeram com
que eu me encantasse, hoje, posso fazer outros se encantarem por tudo isso.
Sempre gostei muito de estar no meio de crianças e jovens. Muito disso diz
respeito a minha realidade familiar, do interior. Por isso, ao ver que os
Irmãos trabalhavam com este público, o encanto aumentou e me senti chamado a
viver essa proposta. Tornar Jesus Cristo conhecido e amado é o objetivo,
mas é necessário muito desprendimento e despojamento para que isso seja capaz.
Abandonar os velhos ditames e estar aberto a um evangelho vivo, que se revela a
partir de um mundo em constante transformação, para poder enfim viver este
Carisma.
Nessa mesma linha,
conversamos ainda com Ronaldo Luzzi, Irmão Marista da Província Marista Brasil
Centro-Sul, que está na congregação há 13 anos e há nove fez os primeiros
votos. Ele conta a possibilidade real de vivenciar valores autênticos e
trabalhar dedicadamente pelo Reino de Deus, do jeito de Maria o fez discernir
pela vida religiosa e que o fato de poder ir ao encontro dos jovens lá onde
eles estão” e que a máxima “jovens evangelizando jovens” chamou muito a atenção
e o fez ser quem ele é hoje.
Quais os desafios
de ser consagrado hoje?
Foto: arquivo pessoal |
Como é para você
viver os conselhos evangélicos (votos) de castidade, pobreza e obediência em um
tempo que se fala tanto em liberdade e autonomia?
Os Conselhos são
um estilo de vida e uma opção diária. Não há valor naquilo que não faça sentido
na profundeza da vida da pessoa. Portanto, e necessariamente, na minha opinião,
a vivência dos Conselhos não pode se atribuir a uma “arbitrariedade” da vida consagrada,
como se fizessem parte de um pacote do qual não se pode desvencilhar, mas sim a
uma opção livre e consciente do grande valor que os Conselhos encerram em si.
Ou seja, não há sentido em vive-los por aquilo que significam etimologicamente,
mas sim, e muito mais, por aquilo para o que apontam como derramamento final de
seu curso, por assim dizer. Os Votos são um sinal visível do seguimento
irrestrito ao grande projeto do Reino de Deus em Jesus Cristo. É isso que
precisa motivar sua vivência absoluta e apenas isso será capaz de suplantar
toda a contracorrente que assola sua definição mais hermenêutica. No fim,
parece que os consagrados, cada vez mais, têm se tornado aquele “sinal de
contradição” no mundo e isso realmente tem confundido cada vez mais as mentes
dos mais céticos, principalmente.
A vida comunitária
é um dos pilares da vida consagrada, como é viver ao lado de pessoas tão
diferentes e que não foi você que escolheu?
Nossas
Constituições Maristas dizem que “Somos diferentes e complementares”. Essa
máxima traduz um pouco daquilo que buscamos em nossa vida comunitária, que é o
enlaçamento de nossas principais virtudes pessoais em detrimento do
desemaranhar das nossas dificuldades mais penosas. A casa é feita das pessoas
que as compõem e disso não temos como fugir. É evidente que no campo fértil da
vida comunitária nascerá o melhor trigo e também o mais danoso joio.
Importante, no entanto, é a madurez da consciência daquilo que nos irmana sob o
mesmo teto. Estamos dispostos numa mesma congregação e com uma mesma missão e é
isso que precisa prevalecer. Quando entendemos a radicalidade de nossos votos e
a seriedade de nossa vida, os exemplos dos que nos precederam e espelhados na
vida do Fundador e de nossa Boa Mãe, Maria Santíssima, é certo que as vicissitudes
do dia a dia passam a figurar sempre em segundo plano.
Outra dimensão da
vida consagrada é a espiritualidade, a relação com Deus. Como se dá a
experiência mística em um tempo de tantas telas, ruídos e distrações que
vivemos hoje?
Deus é Deus. Independe
de nós e de qualquer parâmetro que possa nos afligir nesse ou em qualquer
tempo. Essa radicalidade da presença constante de Deus em nossa vida nos remete
a um ensinamento profundo do Fundador, São Marcelino Champagnat, que também
viveu num tempo adverso. Dizia que conseguia rezar com a mesma tranquilidade
tanto nos bosques silenciosos de L’Hermitage (casa mãe da instituição) quanto
nas ruas do centro de Paris (para onde foi algumas vezes buscar a aprovação
legal do instituto). Ou seja, mais está em nossa condição mesma de “homens de
Deus” essa capacidade de rezar e praticar nossa espiritualidade, que é Marial e
apostólica, do que naquilo que o meio nos consegue oferecer. É claro que não
estamos isentos de tudo isso que o mundo está passando, pelo contrário, fomos
largamente lançados ao “olho do furacão”, mas é justamente aí que precisamos
buscar pela paciência de Deus e acreditar na sua presença mesmo em meio ao
caos. No dia a dia fazemos uma opção consciente por momentos de pura intimidade
com Deus em nossa oração costumeira comunitária. Intensificamos nossa oração
pessoal e passamos a contemplar mais. Também descobrimos que se pode rezar de
forma muito menos protocolar, de forma muito menos sistemática e sem muitos
daqueles antigos parâmetros que antes nos prendiam tanto. Descobrimos, enfim,
que Deus habita ali onde está o nosso coração e também se pode transmiti-lo com
muita nitidez e encanto pelas telas e microfones de nossas salas e recantos
virtuais mais autênticos. Deus é Deus.
A missão é parte
integrante da identidade dos consagrados e cada instituto tem uma específica, a
partir do carisma legado pelo fundador. Como se deu a sua identificação com a
missão da sua família religiosa?
Essa identificação
carismática procede do chamado vocacional que todos têm. É Deus quem chama e
isso independe, muitas vezes, de nós. Tão logo o coração se abre ao chamado de
Deus, em nós começa a surgir um ensaio de resposta. Essa réplica a Deus vai se
dando de acordo com a nossa capacidade e com a condição de nossa “maturidade”
espiritual. Posso afirmar que quando entendi que Deus me chamava a essa vocação
específica de Irmão Marista Ele se valia daquilo que meu coração era capaz de
compreender naquele momento da minha vida, ou seja, Deus nos respeita naquilo
que somos e no momento que estamos. Meu despertar vocacional e minha
identificação carismática se deram muito pelo testemunho de vida e de trabalho
dos primeiros Irmãos que conheci. Conforme fui crescendo em idade e
experiências, também fui crescendo vocacionalmente, por assim dizer. Jesus
quando chama seus discípulos e depois seus Apóstolos, permite que eles caminham
com Ele tempo suficiente para purificarem suas aspirações vocacionais até um
ponto de certa madureza. Dito isto, posso afirmar que minha identificação com a
missão (carisma) da minha instituição é algo sempre em construção,
principalmente pelo fato de que chega um momento em que descobrimos que,
independente do que faça a instituição, qual seja sua missão, trabalho ou mesmo
carisma, o chamado sempre é pelo seguimento da pessoa e do projeto de Jesus
Cristo, que é o próprio Reino de Deus.
.............................................................................................................................................................
Fonte: cnbb.org.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário