Bondade escandalosa de Deus
José Antonio Pagola
Provavelmente era outono e nos povoados da
Galileia se fazia intensamente a vindima. Jesus via nas praças aqueles que não
possuíam terras próprias, esperando para serem contratados para ganhar o
sustento do dia. Como ajudar a essa pobre gente a intuir a bondade misteriosa
de Deus para com todos?
Jesus contou-lhes uma parábola surpreendente.
Falou-lhes de um senhor que contratou todos os jornaleiros que encontrou. Ele
mesmo foi à praça do povo várias vezes, em horas diferentes. Ao final do dia,
embora o trabalho tivesse sido absolutamente desigual, pagou a todos uma
diária: o que a família deles precisava para viver.
O primeiro grupo protestou. Não se queixam
de receber mais ou menos dinheiro. O que os ofende é que o senhor “tratou os
últimos como a nós”. A resposta do senhor ao que é o porta-voz deles é
admirável: “Vais ter inveja por eu ser bom?”
A parábola é tão revolucionária que
certamente depois de vinte séculos não nos atrevemos ainda a tomá-la a sério.
Será verdade que Deus é bom inclusive para aqueles que dificilmente podem
apresentar-se diante dele com méritos e obras? Será verdade que em seu coração
de Pai não há privilégios baseados no trabalho mais ou menos meritório daqueles
que trabalharam em sua vinha?
Todos os nossos esquemas cambaleiam quando
aparece o amor livre e insondável de Deus. Por isso achamos escandaloso que Jesus
pareça esquecer-se dos “piedosos”, carregados de méritos, e se aproxime
precisamente dos que não têm direito a recompensa alguma da parte de Deus:
pecadores que não observam a Aliança ou prostitutas que não têm acesso ao
templo.
Às vezes ficamos presos aos nossos
cálculos, sem deixar a Deus ser bom para todos. Não toleramos sua bondade
infinita para com todos: há pessoas que não o merecem. Achamos que Deus deveria
dar a cada um o que ele merece e só o merecido. Menos mal que Deus não é como
nós. De seu coração de Pai, Ele sabe dar também seu amor salvador a essas
pessoas que nós não sabemos amar.
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JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e
Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício
Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de
Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia.
Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este
comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.
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