Quaresma é
graça, não deixar passar este tempo em vão
Em sua mensagem, o
Papa Francisco recordou a convocação para esta Quaresma de jovens economistas
em Assis, de 26 a 28 de março, como um passo no processo de
"conversão" da economia.
Bianca
Fraccalvieri – Cidade do Vaticano - Um diálogo coração
a coração, de amigo a amigo com Jesus: é o que propõe o Papa Francisco na sua
mensagem para a Quaresma 2020.
O título escolhido
foi inspirado na 2ª carta de São Paulo aos Coríntios: “Em nome de Cristo,
suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus” (2 Cor 5, 20).
Neste tempo quaresmal,
o Pontífice estende a todos os cristãos o que escreveu aos jovens na Exortação
apostólica Christus vivit: fixar os braços abertos de Cristo crucificado e
deixar-se salvar sempre de novo. “A Páscoa de Jesus não é um acontecimento do
passado: pela força do Espírito Santo é sempre atual e permite-nos contemplar e
tocar com fé a carne de Cristo em tantas pessoas que sofrem.”
Face a face com o
Senhor
Francisco insiste
numa contemplação mais profunda do Mistério pascal, recordando que a
experiência da misericórdia só é possível “face a face” com o Senhor
crucificado e ressuscitado.
“Um diálogo
coração a coração, de amigo a amigo. Por isso mesmo, é tão importante a oração
no tempo quaresmal. Antes de ser um dever, esta expressa a necessidade de
corresponder ao amor de Deus, que sempre nos precede e sustenta.”
De fato, prossegue
o Papa, o cristão reza ciente da sua indignidade de ser amado. A oração poderá
assumir formas diferentes, mas o que conta verdadeiramente aos olhos de Deus é
que ela escave dentro de cada um de nós, chegando a romper a dureza do nosso
coração, para o converter cada vez mais a Ele e à sua vontade.
Quanto mais nos
deixarmos envolver pela sua Palavra, tanto mais conseguiremos experimentar a
sua misericórdia gratuita por nós. O convite do Pontífice, portanto, é não
deixar passar em vão este tempo de graça, na presunçosa ilusão de sermos nós o
dono dos tempos e modos da nossa conversão a Ele.
Não interromper o
diálogo com o Senhor
Esta nova
oportunidade, prossegue Francisco, deve suscitar em nós um sentido de gratidão
e sacudir-nos do torpor em que nos encontramos, às vezes estimulados por um
“uso pervertido” dos meios de comunicação
“Não obstante a
presença do mal, por vezes até dramática, tanto na nossa existência como na
vida da Igreja e do mundo, este período que nos é oferecido para uma mudança de
rumo manifesta a vontade tenaz de Deus de não interromper o diálogo de salvação
conosco.”
Colocar o Mistério
pascal no centro da vida, acrescenta o Papa, significa sentir compaixão pelas
chagas de Cristo crucificado presentes nas inúmeras “vítimas inocentes das
guerras, das prepotências contra a vida desde a do nascituro até à do idoso,
das variadas formas de violência, dos desastres ambientais, da iníqua
distribuição dos bens da terra, do tráfico de seres humanos em todas as suas
formas e da sede desenfreada de lucro, que é uma forma de idolatria”.
Encontro de Assis
Para reverter este
cenário, Francisco chama em causa a partilha na caridade e uma nova maneira de
gerir a economia, mais justa e inclusiva, recordando a convocação para esta
Quaresma de jovens economistas em Assis, de 26 a 28 de março. O magistério da
Igreja nos lembra que a política é uma forma eminente de caridade.
O Papa então
conclui:
“Invoco a
intercessão de Maria Santíssima sobre a próxima Quaresma, para que acolhamos o
apelo a deixar-nos reconciliar com Deus, fixemos o olhar do coração no Mistério
pascal e nos convertamos a um diálogo aberto e sincero com Deus. Assim,
poderemos tornar-nos aquilo que Cristo diz dos seus discípulos: sal da terra e
luz do mundo.”
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Texto
integral do Papa Francisco para a Quaresma de 2020:
MENSAGEM DO SANTO
PADRE
para a Quaresma de
2020
«Em nome de
Cristo, suplicamo-vos: reconciliai-vos com Deus» (2
Cor 5, 20)
Queridos irmãos e
irmãs!
O Senhor
concede-nos, também neste ano, um tempo propício para nos prepararmos para
celebrar, de coração renovado, o grande Mistério da morte e ressurreição de
Jesus, perne da vida cristã pessoal e comunitária. Com a mente e o coração,
devemos voltar continuamente a este Mistério. Com efeito, o mesmo não cessa de
crescer em nós na medida em que nos deixarmos envolver pelo seu dinamismo
espiritual e aderirmos a ele com uma resposta livre e generosa.
1. O
Mistério pascal, fundamento da conversão
A alegria do
cristão brota da escuta e receção da Boa Nova da morte e ressurreição de
Jesus: o kerygma. Este compendia o Mistério dum amor «tão real, tão
verdadeiro, tão concreto, que nos proporciona uma relação cheia de diálogo
sincero e fecundo» (Francisco, Exort. ap. Christus vivit, 117). Quem crê
neste anúncio rejeita a mentira de que a nossa vida teria origem em nós mesmos,
quando na realidade nasce do amor de Deus Pai, da sua vontade de dar vida em
abundância (cf. Jo 10, 10). Se, pelo contrário, se presta ouvidos à
voz persuasora do «pai da mentira» (Jo 8, 44), corre-se o risco de
precipitar no abismo do absurdo, experimentando o inferno já aqui na terra,
como infelizmente dão testemunho muitos acontecimentos dramáticos da
experiência humana pessoal e coletiva.
Por isso, nesta
Quaresma de 2020, quero estender a todos os cristãos o mesmo que escrevi aos
jovens na Exortação apostólica Christus vivit: «Fixa os braços abertos de
Cristo crucificado, deixa-te salvar sempre de novo. E quando te aproximares
para confessar os teus pecados, crê firmemente na sua misericórdia que te
liberta de toda a culpa. Contempla o seu sangue derramado pelo grande amor que
te tem e deixa-te purificar por ele. Assim, poderás renascer sempre de novo»
(n. 123). A Páscoa de Jesus não é um acontecimento do passado: pela força do
Espírito Santo é sempre atual e permite-nos contemplar e tocar com fé a carne
de Cristo em tantas passoas que sofrem.
2. Urgência da conversão
É salutar uma
contemplação mais profunda do Mistério pascal, em virtude do qual nos foi
concedida a misericórdia de Deus. Com efeito, a experiência da misericórdia só
é possível «face a face» com o Senhor crucificado e ressuscitado, «que me amou
e a Si mesmo Se entregou por mim» (Gl 2, 20). Um diálogo coração a
coração, de amigo a amigo. Por isso mesmo, é tão importante a oração no tempo
quaresmal. Antes de ser um dever, esta expressa a necessidade de corresponder
ao amor de Deus, que sempre nos precede e sustenta. De facto, o cristão reza
ciente da sua indignidade de ser amado. A oração poderá assumir formas
diferentes, mas o que conta verdadeiramente aos olhos de Deus é que ela escave
dentro de nós, chegando a romper a dureza do nosso coração, para o converter
cada vez mais a Ele e à sua vontade.
Por isso, neste
tempo favorável, deixemo-nos conduzir como Israel ao deserto (cf. Os 2,
16), para podermos finalmente ouvir a voz do nosso Esposo, deixando-a ressoar
em nós com maior profundidade e disponibilidade. Quanto mais nos deixarmos
envolver pela sua Palavra, tanto mais conseguiremos experimentar a sua
misericórdia gratuita por nós. Portanto não deixemos passar em vão este tempo
de graça, na presunçosa ilusão de sermos nós o dono dos tempos e modos da nossa
conversão a Ele.
3. A
vontade apaixonada que Deus tem de dialogar com os seus filhos
O facto de o
Senhor nos proporcionar uma vez mais um tempo favorável para a nossa conversão,
não devemos jamais dá-lo como garantido. Esta nova oportunidade deveria
suscitar em nós um sentido de gratidão e sacudir-nos do nosso torpor. Não
obstante a presença do mal, por vezes até dramática, tanto na nossa existência
como na vida da Igreja e do mundo, este período que nos é oferecido para uma
mudança de rumo manifesta a vontade tenaz de Deus de não interromper o diálogo
de salvação connosco. Em Jesus crucificado, que Deus «fez pecado por nós» (2
Cor 5, 21), esta vontade chegou ao ponto de fazer recair sobre o seu Filho
todos os nossos pecados, como se houvesse – segundo o Papa Bento XVI – um
«virar-se de Deus contra Si próprio» (Enc. Deus caritas est, 12). De
facto, Deus ama também os seus inimigos (cf. Mt 5, 43-48).
O diálogo que Deus
quer estabelecer com cada homem, por meio do Mistério pascal do seu Filho, não
é como o diálogo atribuído aos habitantes de Atenas, que «não passavam o tempo
noutra coisa senão a dizer ou a escutar as últimas novidades» (At 17, 21).
Este tipo de conversa, ditado por uma curiosidade vazia e superficial,
carateriza a mundanidade de todos os tempos e, hoje em dia, pode insinuar-se
também num uso pervertido dos meios de comunicação.
4. Uma riqueza que deve ser partilhada, e não
acumulada só para si mesmo
Colocar o Mistério
pascal no centro da vida significa sentir compaixão pelas chagas de Cristo
crucificado presentes nas inúmeras vítimas inocentes das guerras, das
prepotências contra a vida desde a do nascituro até à do idoso, das variadas
formas de violência, dos desastres ambientais, da iníqua distribuição dos bens
da terra, do tráfico de seres humanos em todas as suas formas e da sede
desenfreada de lucro, que é uma forma de idolatria.
Também hoje é
importante chamar os homens e mulheres de boa vontade à partilha dos seus bens
com os mais necessitados através da esmola, como forma de participação pessoal
na edificação dum mundo mais justo. A partilha, na caridade, torna o homem mais
humano; com a acumulação, corre o risco de embrutecer, fechado no seu egoísmo.
Podemos e devemos ir mais além, considerando as dimensões estruturais da
economia. Por este motivo, na Quaresma de 2020 – mais concretamente, de 26 a 28
de março –, convoquei para Assis jovens economistas, empreendedores e
transformativos, com o objetivo de contribuir para delinear uma economia mais
justa e inclusiva do que a atual. Como várias vezes se referiu no magistério da
Igreja, a política é uma forma eminente de caridade (cf. Pio XI, Discurso
à FUCI, 18/XII/1927). E sê-lo-á igualmente ocupar-se da economia com o mesmo
espírito evangélico, que é o espírito das Bem-aventuranças.
Invoco a
intercessão de Maria Santíssima sobre a próxima Quaresma, para que acolhamos o
apelo a deixar-nos reconciliar com Deus, fixemos o olhar do coração no Mistério
pascal e nos convertamos a um diálogo aberto e sincero com Deus. Assim,
poderemos tornar-nos aquilo que Cristo diz dos seus discípulos: sal da terra e
luz do mundo (cf. Mt 5, 13.14).
Franciscus
Roma, em São João
de Latrão, 7 de outubro de 2019,
Memória de Nossa
Senhora do Rosário.
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Fonte: vaticannews.va
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