sábado, 12 de julho de 2025

Reflexão para este sábado:

Há seres humanos jogados à beira do caminho

Frei Almir Guimarães

Em nossa vida cotidiana, às vezes tão medíocre e vulgar, pode acontecer ainda “o milagre da fraternidade”. Basta atrever-nos a renunciar a pequenas vantagens e começar a aproximar-nos das pessoas com os olhos e o coração do samaritano. (José Antonio Pagola)

 Mais um vez esse samaritano bom nos visita. Ficamos sempre encantados a parábola de Jesus narrada com tanto carinho, delicadeza e maestria pela pena de Lucas, grande escritor, sempre sensível ao tema da dor. Na verdade, ela não necessita de muita explicação. Tudo é muito claro. Não há que regatear. Os seres humanos jogados à beira do caminho requerem cuidados inadiáveis e tratamento generoso. Ali está um pedaço da humanidade está clamando por vida. É preciso parar imediatamente. Há que socorrer aqui e agora.

 Há pessoas que se encontram em situações limites. Um homem é assaltado, ferido, quase morto sem nada e sem ninguém. Jogados à beira da estrada ontem e hoje: doença imprevista, ataque de bandidos, miséria material, miséria moral, trapos humanos, gente aparentemente bem mas que camufla, gente fugindo da miséria de seus países de origem, refugiados, gente de perto e de longe, estruturas pesadas e injustas que podem fabricar jogados à beira do caminho.

  O samaritano tinha os olhos abertos. Os primeiros passantes, o sacerdote e o levita, estavam muito preocupados com o culto, com as regras da vida aprendida de cor, com as tarefas. Passaram olharam sem enxergar. O texto dá a entender que encararam o caso com certa indiferença. “Outros vão se ocupar do caso”, pensam eleas. Mas ali estava um ser humano cujo coração ainda batia e que podia continuar a bater. Quem não sabe reparar, não pode ver.

 Um homem trafega pelo mesmo caminho. Devia também ter tarefas a cumprir. Não estava a flanar. Para, observa, reflete rapidamente e toma todas as providências com rapidez e total generosidade, com encantadora generosidade: aproxima-se, faz curativos, derrama óleo e vinho nas feridas, coloca o assaltado na sua montaria, leva-o a uma pousada, paga as despesas e promete reembolsar posteriormente se mais fosse preciso ser pago. O samaritano se torna próximo do homem jogado à beira do caminho. Cabe a cada um de nós, em nossos contextos sociais, familiares, de vizinhança não somente ver, mas enxergar os que precisam de atenção para retomarem a caminhada da vida, o fôlego do existir.

 Não é assim que podemos nos satisfazer com “tudo certinho e arrumadinho” em termos de religião. Nossa fé caminha pela história e observa, além das práticas religiosas, o ser humano. Somos aqueles que nos deixamos impressionar com o sofrimento. Não podemos nos esconder atrás de nossas ocupações nem nos refugiar em nossas belas teorias. Não é suficiente gritar por nossas reivindicações, mas criar espaços em nós para os outros.

 Lucas afirma que o samaritano experimentou compaixão. Estamos no campo das atenções íntimas para com os semelhantes. José Tolentino Mendonça:

>> “A etimologia explica a compaixão (no latim, cum-passio) um “sofrer com o outro”. É uma forma de subtrair a dor à solidão que ela própria gera, dizendo àquele de quem nos aproximamos: “Você não está só, porque reconheço o seu sofrimento e tomo a sua dor, em parte para mim” A dor sequestra-nos num isolamento que pode atingir proporções inomináveis. A compaixão é essa peculiar relação humana que começa paradoxalmente aí, quando precisamos de cuidado e somos positivamente correspondidos por uma presença amigável. O grito do que sofre chega-nos frequentemente sem palavras: o silêncio indefeso diz tudo, a vida mais nua ainda do que o habitual, o olhar ferido pela adversidade. A compaixão torna-se escuta, consonância, responsabilidade pela vida, escolha solidária, gestos, permanência” (Libertar o tempo, p.51).

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Oração

Ó Espírito Santo,
dai-me um coração grande,
aberto à vossa silenciosa e forte palavra inspiradora,
fechado a todas as ambições mesquinhas,
alheio a qualquer desprezível competição humana,
compenetrado do sentido da santa Igreja.

Um coração grande,
desejoso de se tornar semelhante
ao coração do Senhor Jesus.

Um coração grande e forte,
para amar a todos,
para servir a todos,
para sofrer com todos.

Um coração grande e forte,
para superar todas as provações,
todo tédio, todo cansaço,
toda desilusão e toda ofensa.

Um coração grande e forte,
constante até ao sacrifício,
quando for necessário.

Um coração cuja felicidade seja
palpitar com o coração de Cristo
e cumprir humilde, fiel e virilmente
a vontade do Pai. Amém!

Paulo VI (1897-1978)

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FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

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                                                                 Fonte: franciscanos.org.br    Imagem: vaticannews.va

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