"Rejeitemos a lógica das armas e
invertamos o rumo, transformando as enormes despesas militares em investimentos
para combater a fome, a falta de cuidados da saúde e da educação", disse
Francisco em seu primeiro discurno no Bahrein.
Mariangela Jaguraba - Vatican News
O Papa Francisco encontrou-se, nesta quinta-feira (03/11), com as Autoridades, Representantes da sociedade civil e o Corpo diplomático no Palácio Real Sakhir, em Awali, no Bahrein, no âmbito de sua 39ª Viagem Apostólica Internacional por ocasião do "Fórum do Bahrein para o Diálogo: Oriente e Ocidente para a Coexistência Humana".
Francisco agradeceu ao Rei do Bahrein, Sua
Majestade Hamad bin Isa bin Salman Al Khalifa, pelo "amável convite para
visitar o Reino do Bahrein", pelo "caloroso e generoso
acolhimento" e suas palavras de boas-vindas.
"Aqui, onde as águas do mar circundam
as areias do deserto e imponentes arranha-céus se erguem ao lado dos
tradicionais mercados orientais, cruzam-se realidades muito diferentes:
convergem antiguidade e modernidade, fundem-se história e progresso, e
sobretudo pessoas da mais variada proveniência formam um original mosaico
de vida", disse o Papa no início de seu discurso.
Pesquisa e valorização de seu passado
A fala do Papa foi norteada pelo «emblema
de vitalidade» que caracteriza o país: a «árvore da vida» (Shajarat-al-Hayat).
"Uma majestosa acácia, que, há séculos, sobrevive numa zona deserta, onde
a chuva é muito escassa. Parece impossível que uma árvore tão longeva resista e
prospere em tais condições. Na opinião de muitos, o segredo estaria nas raízes,
que se estendem por dezenas de metros sob o solo, recorrendo aos depósitos
subterrâneos de água."
"As raízes! O Reino do Bahrein
empenha-se na pesquisa e valorização do seu passado, que fala de uma terra
extremamente antiga, para onde acorriam os povos: sempre foi lugar de encontro
entre populações diferentes", sublinhou Francisco, ressaltando que a maior
riqueza das raízes do Bahrein "se vê na sua variedade étnica e cultural,
na convivência pacífica e no tradicional acolhimento da população".
Segundo o Papa, os vários "grupos
nacionais, étnicos e religiosos que coexistem" no Bahrein
"testemunham que é possível e se deve conviver em nosso mundo", que
se tornou uma "aldeia global, na qual dando como certa a globalização,
ainda é em muitos aspectos desconhecido «o espírito da aldeia»", formado
de "hospitalidade, solicitude pelo outro e fraternidade".
Trabalhar em prol da esperança
De acordo com Francisco, vemos o
"crescimento em larga escala da indiferença e mútua suspeita, da extensão
de rivalidades e contraposições que se esperavam superadas, de populismos,
extremismos e imperialismos que põem em perigo a segurança de todos. Não
obstante o progresso e tantas conquistas civis e científicas, aumenta a
distância cultural entre as várias partes do mundo e, às benéficas
oportunidades de encontro, antepõem-se perversas atitudes de conflito".
Em vez disso, pensemos na árvore da vida e
distribuamos, nos desertos áridos da convivência humana, a água da fraternidade:
não deixemos evaporar-se a possibilidade do encontro entre civilizações,
religiões e culturas, não permitamos que sequem as raízes do humano!
“Trabalhemos juntos, trabalhemos em prol do
todo, em prol da esperança! Estou aqui, na terra da árvore da vida, como
semeador de paz, para viver dias de encontro, participar do Fórum de diálogo
entre Oriente e Ocidente em prol da coexistência humana pacífica.”
O Pontífice disse que esses dias passados
no Bahrein "marcam uma etapa preciosa no percurso de amizade que tem vindo
a intensificar-se, nos últimos anos, com vários líderes religiosos islâmicos:
um caminho fraterno que, sob o olhar do Céu, quer favorecer a paz na
Terra".
Contribuição de diferentes povos
Francisco manifestou apreço "pelas
conferências internacionais e as oportunidades de encontro que este Reino
organiza e favorece, centrando-se especialmente na temática do respeito, da
tolerância e da liberdade religiosa".
Voltando à árvore da vida, o Papa sublinhou
que "os vários ramos de diferentes tamanhos que a caracterizam, com o
passar do tempo, deram vida a espessas ramagens, fazendo crescer a sua altura e
circunferência. Neste país, foi a contribuição de tantas pessoas de diferentes
povos que consentiu um notável progresso produtivo".
“Isto tornou-se possível graças à
imigração, que regista no Reino do Bahrein uma das taxas mais elevadas do
mundo: cerca de metade da população residente é estrangeira e trabalha de forma
significativa para o progresso de um país, onde – tendo deixado a própria
pátria – se sente em casa.”
Todavia não se pode esquecer que, nos
nossos dias, há ainda muita falta de trabalho e demasiado trabalho desumano:
isto acarreta não só graves riscos de instabilidade social, mas representa um
atentado à dignidade humana. De fato, o trabalho não é necessário apenas para
se ganhar a vida, mas constitui também um direito indispensável para nos
desenvolvermos integralmente e moldarmos uma sociedade à medida do ser humano.
Promoção em toda a área dos direitos
A seguir, o Papa chamou a atenção para a
crise do trabalho em todo o mundo. "Muitas vezes falta o trabalho,
precioso como o pão; frequentemente é pão envenenado, porque escraviza".
Ele pediu para que "sejam garantidas condições de trabalho seguras e
dignas do ser humano, que não impeçam, mas favoreçam a vida cultural e
espiritual; que promovam a coesão social, em prol da vida comum e do próprio
progresso dos países".
O Bahrein pode gloriar-se de preciosas
conquistas neste sentido: penso, por exemplo, na primeira escola feminina
surgida no Golfo e na abolição da escravatura.
“Continue sendo farol na promoção em toda a
área dos direitos e condições justas e cada vez melhores para os trabalhadores,
as mulheres e os jovens, garantindo ao mesmo tempo respeito e solicitude por
quantos se sentem mais à margem da sociedade, como os emigrantes e os reclusos:
o desenvolvimento verdadeiro, humano, integral mede-se sobretudo pela atenção
que lhes é prestada.”
A questão ambiental
A árvore da vida, que se ergue, solitária,
na paisagem deserta, sugeriu ao Papa refletir sobre "dois âmbitos
decisivos para todos e que interpelam primariamente quem, governando, detém a
responsabilidade de servir o bem comum".
Em primeiro lugar, a questão ambiental:
quantas árvores são derrubadas, quantos ecossistemas devastados, quantos mares
poluídos pela ganância insaciável do homem, cuja conta se deve pagar depois!
Não nos cansemos de trabalhar em prol desta dramática pendência, realizando
opções concretas e previdentes, pensando nas gerações mais jovens, antes que
seja demasiado tarde e se comprometa o seu futuro.
“Que a Conferência das Nações Unidas sobre
as Mudanças Climáticas (COP27), que terá lugar no Egito dentro de poucos dias,
constitua um passo em frente no referido sentido!”
Fazer a vida prosperar
Em segundo lugar, "a vocação de
todo ser humano na terra: fazer a vida prosperar". Infelizmente, vemos
hoje e cada vez mais "ações e ameaças de morte". O Papa pensou em
"particular na realidade monstruosa e insensata da guerra, que semeia por
toda a parte destruição e erradica a esperança. Na guerra, aparece o lado pior
do ser humano: egoísmo, violência e mentira. Sim, porque a guerra, qualquer
guerra, constitui também a morte da verdade".
Rejeitemos a lógica das armas e invertamos
o rumo, transformando as enormes despesas militares em investimentos para
combater a fome, a falta de cuidados da saúde e da educação. Tenho no coração a
tristeza por tantas situações de conflito.
“Olhando para a Península Arábica, cujos
países desejo saudar com cordialidade e respeito, dirijo um pensamento especial
e sentido ao Iêmen, martirizado por uma guerra esquecida que, como qualquer
guerra, não leva a nenhuma vitória, mas apenas a amargas derrotas para todos.”
Recordo na oração sobretudo os civis, as
crianças, os idosos, os doentes, e imploro: calem-se as armas, comprometemo-nos
por toda parte e de verdade em prol da paz!
"A respeito disto, a Declaração do Reino do Bahrein reconhece que a fé religiosa é «uma bênção para todo o gênero humano», o alicerce «para a paz no mundo». Estou aqui como fiel, como cristão, como homem e peregrino da paz, porque hoje, mais do que nunca, somos chamados a nos comprometer seriamente com a paz", concluiu.
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