dar voz a quem não tem voz, transformar dor em esperança
“Vós, artistas e
pessoas de cultura, sois chamados a ser testemunhas da visão revolucionária das
Bem-Aventuranças. A vossa missão não se limita a criar beleza, mas a revelar a
verdade, a bondade e a beleza escondidas nos recantos da história, a dar voz a
quem não tem voz, a transformar a dor em esperança”: diz o Papa na homilia da
Missa por ocasião do Jubileu dos Artistas e do Mundo da Cultura, presidida este
domingo na Basílica de São Pedro pelo cardeal José Tolentino de Mendonça.
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A Eucaristia –
centro e ápice da vida cristã – celebrada na manhã deste domingo, 16 de
fevereiro, na Basílica Vaticana, foi o ponto alto do Jubileu dos Artistas e do
Mundo da Cultura, que se realiza dos dias 15 a 18 deste mês com cerca de 10 mil
participantes de mais de 100 nações dos cinco continentes. A Missa, que deveria
ser presidida pelo Santo Padre – que se encontra internado deste sexta-feira
passada no Hospital Policlínico Gemelli devido a uma bronquite de que foi
acometido -, foi presidida pelo prefeito do Dicastério para a Cultura e a
Educação, cardeal José Tolentino de Mendonça.
O purpurado
português leu a homilia do Papa preparada para a ocasião - que Francisco quis
que fosse compartilhada com as 4 mil pessoas presentes na Basílica de São Pedro
-, na qual detém-se sobre o Evangelho do dia (Lc 6,17.20-26) em que Jesus
proclama as bem-aventuranças.
O Pontífice
observa que já as ouvimos muitas vezes e, no entanto, não deixam de nos
maravilhar: “Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus. Felizes
vós, os que agora tendes fome, porque sereis saciados. Felizes vós, os que
agora chorais, porque haveis de rir”. Estas palavras contradizem a lógica do
mundo e convidam-nos a olhar a realidade com olhos novos, com o olhar de Deus,
que vê para além das aparências e reconhece a beleza, até mesmo na fragilidade
e no sofrimento.
A segunda parte
contém palavras duras e de repreensão: “ai de vós, os ricos, porque recebestes
a vossa consolação! Ai de vós, os que estais agora fartos, porque haveis de ter
fome! Ai de vós, os que agora rides, porque gemereis e chorareis!” O contraste entre
“felizes vós” e “ai de vós” recorda-nos a importância de discernir onde
colocamos a nossa segurança, frisou o Santo Padre, dirigindo-se em seguida aos
artistas e ao mundo da cultura em geral.
“Vós, artistas e
pessoas de cultura, sois chamados a ser testemunhas da visão revolucionária das
Bem-Aventuranças. A vossa missão não se limita a criar beleza, mas a revelar a
verdade, a bondade e a beleza escondidas nos recantos da história, a dar voz a
quem não tem voz, a transformar a dor em esperança.”
Vivemos numa
época de crises complexas, continuou o Papa, que são econômicas e sociais mas,
antes de mais, são crises da alma, crises de sentido. Coloquemo-nos a questão
do tempo e a questão do rumo. Somos peregrinos ou errantes? Caminhamos com uma
meta ou andamos à deriva, perdidos? O artista é aquele ou aquela que tem a
função de ajudar a humanidade a não se desnortear, a não perder o horizonte da
esperança.
“Mas atenção:
não é uma esperança fácil, superficial e desencarnada. Não! A verdadeira
esperança entrelaça-se com o drama da existência humana. Não é um refúgio
confortável, mas um fogo que arde e ilumina, como a Palavra de Deus. Por isso,
a arte autêntica é sempre um encontro com o mistério, com a beleza que nos
supera, com a dor que nos interpela, com a verdade que nos chama. Caso
contrário, “ai (de nós)”! O Senhor é severo no seu apelo.”
Francisco
acrescentou que o artista, com sua obra, realiza um discernimento e ajuda os
outros a discernir no meio dos diferentes ecos dos acontecimentos deste mundo.
Os homens e as mulheres de cultura são chamados a avaliar estes ecos, a
explicar-no-los e a iluminar o caminho por onde nos conduzem: se são cantos de
sereia que seduzem ou apelos da nossa mais verdadeira humanidade.
“Pede-se-vos -
disse o Pontífice aos artistas e aos homens e mulheres de cultura em geral - a
sabedoria para distinguir o que é como “como a palha que o vento leva”, do que
é sólido “como a árvore plantada à beira da água corrente” e capaz de dar
fruto.
“Queridos
artistas, vejo em vós guardiães da beleza que sabe inclinar-se sobre as feridas
do mundo, que sabe escutar o grito dos pobres, dos sofredores, dos feridos, dos
presos, dos perseguidos, dos refugiados. Vejo em vós guardiães das
Bem-Aventuranças! Vivemos num tempo em que se erguem novos muros, em que as
diferenças se tornam um pretexto para a divisão em vez de serem uma
oportunidade de enriquecimento recíproco. Mas vós, homens e mulheres de
cultura, sois chamados a construir pontes, a criar espaços de encontro e
diálogo, a iluminar as mentes e a aquecer os corações.”
O Papa
prosseguiu afirmando que alguns poderão, em suas ponderações e questionamentos,
dizer: “Mas para que serve a arte num mundo ferido? Não há coisas mais
urgentes, mais concretas e mais necessárias?”. A arte, respondeu Francisco, não
é um luxo, mas uma necessidade do espírito. Não é uma fuga, mas uma
responsabilidade, um convite à ação, um apelo, um grito. Educar para a beleza
significa educar para a esperança. E a esperança nunca está separada do drama
da existência: ela atravessa a luta quotidiana, as fadigas da vida, os desafios
deste nosso tempo.
“No Evangelho
que escutámos hoje, Jesus proclama felizes os pobres, os aflitos, os mansos, os
perseguidos. É uma lógica invertida, uma revolução da perspectiva”, observou o
Pontífice. A arte é chamada a participar nesta revolução. O mundo precisa de
artistas proféticos, de intelectuais corajosos, de criadores de cultura.
Concluindo sua
homilia lida pelo cardeal Tolentino de Mendonça, o Santo Padre fez uma premente
exortação aos artistas e ao mundo da cultura em geral:
“Deixai-vos
guiar pelo Evangelho das Bem-Aventuranças e que a vossa arte seja anúncio de um
mundo novo. Que a vossa poesia no-lo mostre! Nunca deixeis de procurar,
interrogar, arriscar. Porque a verdadeira arte nunca é acomodada; ela oferece a
paz da inquietação. E lembrai-vos: a esperança não é uma ilusão; a beleza não é
uma utopia; o vosso dom não é um mero acaso, é uma chamada. Respondei com
generosidade, com paixão, com amor”.
Raimundo de Lima – Vatican News
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Francisco desde o hospital:
agradeço pelas orações
com que me acompanhais nestes dias de internação
Internado no
Hospital Policlínico Gemelli devido a uma bronquite de que foi acometido,
Francisco entregou o Angelus dominical, difundido pela Sala de Imprensa da
Santa Sé. No texto, o Pontífice agradece pelo carinho, a oração e a proximidade
com que está sendo acompanhado nestes dias, assim como aos médicos e
profissionais de saúde deste Hospital por seus cuidados. O Santo Padre se
dirige aos artistas por ocasião de seu Jubileu e pede orações pelos países em
guerra.
A seguir, o
texto do Angelus do Papa Francisco, difundido ao meio-dia deste domingo (16/02)
pela Sala de Imprensa da Santa Sé:
Hoje, no
Vaticano, foi celebrada a Eucaristia dedicada em particular aos artistas que
vieram de várias partes do mundo para viver os Dias do Jubileu. Agradeço ao
Dicastério para a Cultura e a Educação pela preparação desse evento, que nos
lembra a importância da arte como linguagem universal que difunde a beleza e
une os povos, ajudando a trazer harmonia ao mundo e a silenciar todo grito de
guerra.
Cumprimento aos
artistas por ocasião de seu Jubileu
Quero
cumprimentar todos os artistas que participaram: eu gostaria de ter estado no
meio de vós, mas, como sabeis, estou aqui no Policlínico Gemelli porque ainda
preciso de tratamento para minha bronquite.
Dirijo minhas
saudações a todos os peregrinos presentes em Roma hoje, em particular aos fiéis
da Diocese de Parma, que vieram em uma peregrinação diocesana, conduzidos por
seu Bispo.
Orações pelos
países em guerra
Convido todos a
continuarem a rezar pela paz na atormentada Ucrânia, na Palestina, em Israel e
em todo o Oriente Médio, em Mianmar, no Kivu e no Sudão.
Agradeço-vos
pelo carinho, a oração e a proximidade com que me acompanhais nestes dias,
assim como gostaria de agradecer aos médicos e profissionais de saúde deste
Hospital por seus cuidados: eles fazem um trabalho precioso e tão cansativo,
vamos apoiá-los com a oração!
E agora
confiemo-nos a Maria, a “Cheia de graça”, para que nos ajude a ser, como Ela,
cantores e artífices da beleza que salva o mundo.
Raimundo de Lima – Vatican News
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