Foi divulgada, na quinta-feira (1°/02),
a mensagem do Papa Francisco para a Quaresma 2024 sobre o tema “Através do deserto, Deus
guia-nos para a liberdade”. Na mensagem, Francisco reconhece que a humanidade
de hoje atingiu “níveis de desenvolvimento científico, técnico, cultural e
jurídico capazes de garantir dignidade a todos”, mas o risco é que, sem rever
os estilos de vida, se caia na “escravidão” de práticas que arruínam o planeta
e alimentam as desigualdades.
O Santo Padre inicia o texto com um
versículo do Livro do Êxodo: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fiz sair da
terra do Egito, da casa da servidão”. “Assim inicia o Decálogo dado a Moisés no
Monte Sinai”, escreve o Papa, acrescentando que “quando o nosso Deus se revela,
comunica liberdade”.
Deserto, lugar do primeiro amor
“O povo sabe bem de que êxodo Deus está
falando: traz ainda gravada na sua carne a experiência da escravidão. Como
Israel no deserto tinha ainda dentro de si o Egito, também hoje o povo de Deus
traz dentro de si vínculos opressivos que deve optar por abandonar. Damo-nos
conta disto, quando nos falta a esperança e vagueamos na vida como em terra
desolada, sem uma terra prometida para a qual tendermos juntos”, sublinha o
Papa.
A seguir, Francisco recorda que “a Quaresma
é o tempo de graça em que o deserto volta a ser – como anuncia o profeta Oseias
– o lugar do primeiro amor. Deus educa o seu povo, para que saia das suas
escravidões e experimente a passagem da morte para a vida. Como um esposo,
atrai-nos novamente a si e sussurra ao nosso coração palavras de amor”.
Ver a realidade
“O êxodo da escravidão para a liberdade não
é um caminho abstrato. A fim de ser concreta também a nossa Quaresma, o
primeiro passo é querer ver a realidade. Também hoje o grito de tantos irmãos e
irmãs oprimidos chega ao céu”, escreve o Pontífice. A seguir, Francisco
pergunta: o grito desses nossos irmãos e irmãs “chega também a nós? Mexe
conosco? Comove-nos? Há muitos fatores que nos afastam uns dos outros, negando
a fraternidade que originariamente nos une”.
A este propósito, o Papa recorda sua viagem
a Lampedusa, em 8 de julho de 2013, ressaltando que à globalização da
indiferença ele contrapôs duas perguntas, que se tornam cada vez mais atuais:
‘Onde estás?’ e ‘Onde está o teu irmão?’. Segundo Francisco, “o caminho
quaresmal será concreto, se, voltando a ouvir tais perguntas, confessarmos que
hoje ainda estamos sob o domínio do Faraó. É um domínio que nos deixa exaustos
e insensíveis. É um modelo de crescimento que nos divide e nos rouba o futuro.
A terra, o ar e a água estão poluídos por ele, mas as próprias almas acabam
contaminadas por tal domínio. De fato, embora a nossa libertação tenha começado
com o Batismo, permanece em nós uma inexplicável nostalgia da escravidão. É
como uma atração para a segurança das coisas já vistas, em detrimento da
liberdade”.
A Quaresma é tempo de conversão, tempo de
liberdade
Segundo o Pontífice, “o êxodo pode ser
interrompido: não se explicaria de outro modo porque é que tendo uma humanidade
chegado ao limiar da fraternidade universal e a níveis de progresso científico,
técnico, cultural e jurídico capazes de garantir a todos a dignidade, tateie
ainda na escuridão das desigualdades e dos conflitos”.
“Deus não se cansou de nós. A Quaresma é
tempo de conversão, tempo de liberdade. O próprio Jesus foi impelido pelo
Espírito para o deserto a fim de ser posto à prova na sua liberdade. O deserto
é o espaço onde a nossa liberdade pode amadurecer numa decisão pessoal de não
voltar a cair na escravidão. Na Quaresma, encontramos novos critérios de juízo
e uma comunidade com a qual avançar por um caminho nunca percorrido”, escreve
ainda Francisco, ressaltando que “isto comporta uma luta: assim nos dizem
claramente o livro do Êxodo e as tentações de Jesus no deserto”.
Mais temíveis que o Faraó são os ídolos
De acordo com Francisco, “mais temíveis que
o Faraó são os ídolos: poderíamos considerá-los como a voz do inimigo dentro de
nós. Poder tudo, ser louvado por todos, levar a melhor sobre todos: todo o ser
humano sente dentro de si a sedução desta mentira. É uma velha estrada. Assim
podemos apegar-nos ao dinheiro, a certos projetos, ideias, objetivos, à nossa
posição, a uma tradição, até mesmo a algumas pessoas. Em vez de nos pôr em
movimento, nos paralisam. Em vez de nos fazer encontrar, nos dividem”.
Porém, “existe uma nova humanidade, o povo
dos pequeninos e humildes que não cedeu ao fascínio da mentira. Enquanto os
ídolos tornam mudos, cegos, surdos, imóveis aqueles que os servem, os pobres em
espírito estão imediatamente disponíveis e prontos: uma força silenciosa de bem
que cuida e sustenta o mundo”.
Agir é também parar
“É tempo de agir e, na Quaresma, agir é
também parar: parar em oração, para acolher a Palavra de Deus, e parar como o
Samaritano na presença do irmão ferido”, sublinha o Papa. Segundo ele, “a
oração, esmola e jejum não são três exercícios independentes, mas um único
movimento de abertura, de esvaziamento: lancemos fora os ídolos que nos tornam
pesados, fora os apegos que nos aprisionam. Então o coração atrofiado e isolado
despertará”.
Quaresma, tempo de decisões comunitárias
Segundo o Papa, “a forma sinodal da Igreja,
que estamos redescobrindo e cultivando nestes anos, sugere que a Quaresma seja
também tempo de decisões comunitárias, de pequenas e grandes opções
contracorrente, capazes de modificar a vida quotidiana das pessoas e a vida de
toda uma coletividade: os hábitos nas compras, o cuidado com a criação, a
inclusão de quem não é visto ou é desprezado”.
“Na medida em que esta Quaresma for de
conversão, a humanidade extraviada sentirá um abalo de criatividade: o lampejar
de uma nova esperança”, escreve ainda o Papa, recordando as suas palavras
dirigidas aos jovens da JMJ de Lisboa, no verão passado: «Procurai e arriscai;
sim, procurai e arriscai. Neste momento histórico, os desafios são enormes, os
gemidos dolorosos: estamos vivendo uma terceira guerra mundial feita aos
pedaços. Mas abracemos o risco de pensar que não estamos numa agonia, mas num
parto; não no fim, mas no início de um grande espetáculo. E é preciso coragem
para pensar assim».
“É a coragem da conversão, da saída da
escravidão. A fé e a caridade guiam pela mão esta esperança menina. Elas a
ensinam a caminhar e, ao mesmo tempo, ela as puxa para a frente”, conclui a
mensagem do Papa.
Com informações e foto VaticanNews
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