“Cuidado com a
avareza!”
Dom Antonio
Carlos Rossi - Bispo de
Frederico Westphalen (RS)
O 18º Domingo do
Tempo Comum, no Ano Litúrgico C, traz uma advertência urgente e profundamente
atual: o perigo da avareza e a ilusão de que a vida consiste na abundância
de bens. Em um mundo marcado pelo consumismo, pela corrida por mais e melhor, e
pela busca incessante de segurança material, o Evangelho deste domingo soa como
um chamado a repensar os verdadeiros valores da vida. Jesus nos alerta: “Cuidado!
Ficai atentos e guardai-vos de toda espécie de ganância, porque a vida de
alguém não consiste na abundância dos seus bens” (Lc 12,15). A mensagem central
é clara: a riqueza, por si só, não garante plenitude; o que dá sentido à
vida é a relação com Deus e o uso correto dos bens para o bem comum.
Este domingo nos
convida a uma conversão interior: a abandonar a mentalidade do “ter” para
abraçar a do “ser” e do “compartilhar”. A verdadeira riqueza não está nos
celeiros cheios, mas no coração generoso, na alma voltada para Deus e o
próximo.
O livro do
Eclesiastes (1,2; 2,21-23) apresenta uma reflexão existencial sobre o
sentido da vida. O “pregador” (Qohelet) conclui que tudo é “vaidade” — isto é,
passageiro, efêmero, sem sentido duradouro quando visto somente do ponto de
vista humano. A leitura de hoje destaca o esforço do homem que trabalha com
sabedoria, mas que, no fim, deixa tudo para alguém que não suou por isso. A
frustração é evidente: “Que proveito tem o homem com todo o seu trabalho e com
a preocupação do seu coração?” (Ecl. 2,22).
Este texto não é
pessimista, mas realista. Ele nos lembra que a vida não pode ser reduzida ao
trabalho e à acumulação. A busca desenfreada por bens materiais é vã se não for
acompanhada de sabedoria espiritual. A única resposta verdadeira ao vazio
humano é a confiança em Deus, que dá sentido ao trabalho e ao descanso.
São Paulo, na
Carta aos Colossenses (3,1-5.9-11), exorta os cristãos a “viver com Cristo”.
Ele nos convida a buscar as coisas do alto, onde Cristo está sentado à direita
de Deus, e a não se apegarem às coisas terrenas. Paulo identifica claramente os
pecados que impedem essa união com Cristo: imoralidade, paixões más, cobiça —
que ele chama de idolatria.
A cobiça, ou
avareza, é aqui apresentada como uma forma de idolatria porque coloca os bens
materiais no lugar de Deus. Quando o coração se fixa nos tesouros da terra,
afasta-se do verdadeiro tesouro: a vida em Cristo. Paulo conclui com uma bela
afirmação fundamentada na inclusão redentora do Evangelho: em Cristo, não há
distinção entre judeu e grego, escravo e livre, pois “Cristo é tudo em todos”.
A nova vida em Cristo transcende as divisões e cria uma comunidade de irmãos,
onde o amor e a partilha prevalecem.
O episódio do
Evangelho de hoje (Lucas 12,13-21) começa com um homem pedindo a Jesus que
intervenha em uma disputa de herança. Jesus recusa o papel de árbitro e
aproveita a ocasião para lançar uma advertência solene: “Cuidado com a avareza!”
Em seguida, conta a parábola do homem rico que, ao ter uma colheita abundante,
decide construir celeiros maiores para guardar tudo, pensando em viver
tranquilamente. Mas Deus lhe diz: “Tolo! Nesta mesma noite, a tua vida te será
pedida. E o que preparaste, para quem ficará?” (Lc 12,20).
A parábola é um
retrato vívido da mentalidade materialista: segurança baseada em riquezas,
planejamento exclusivamente terreno, ausência de Deus e de solidariedade. O
homem rico pensa somente em si, em seu “eu” e em seu “meu” (uso recorrente dos
pronomes possessivos). Ele esquece que a vida é um dom efêmero e que os bens
são para serem administrados, não acumulados. A verdadeira riqueza, segundo
Jesus, é “ser rico para com Deus” — ou seja, viver na justiça, na generosidade
e na fé.
A liturgia deste
domingo não nos deixa indiferentes. Ela nos interpela a examinar nossas
prioridades, nossos desejos e nosso uso dos bens. Como viver essa mensagem
durante a semana? Aqui estão três sugestões práticas:
Examinar nosso
coração diante dos bens materiais
Podemos fazer um
exercício de autoavaliação: o que ocupa o centro da minha vida? Quanto tempo
dedico a planejar o futuro financeiro comparado ao tempo que dedico à oração, à
família, ao serviço? Podemos também buscar identificar sinais de avareza em
nossa vida: medo de compartilhar, desejo excessivo de segurança, inveja do que
os outros têm. Peçamos a Deus a graça da liberdade interior.
Praticar o
desapego e a generosidade
Podemos, nesta
semana, escolher uma ação concreta de partilha: doar algo que já não usamos,
ajudar alguém em necessidade, contribuir com uma causa solidária. A
generosidade não começa com o que sobra, mas com a decisão de viver com menos
para que outros possam ter o necessário. Não nos esqueçamos: “É melhor dar do
que receber” (At 20,35).
Cultivar a
gratidão e a oração
Podemos nos
comprometer a começar e terminar o dia agradecendo a Deus pelos bens que
recebemos — não apenas materiais, mas também afetivos, espirituais e naturais.
Na oração, reconhecer que tudo vem dele e tudo é para usar com
responsabilidade. A gratidão cura o coração da ganância e nos lembra que somos
administradores, não donos, da vida e dos bens.
Conclusão
O 18º Domingo do
Tempo Comum nos lembra que a vida é mais do que posses. A verdadeira riqueza
está em viver em comunhão com Deus e com o próximo. Que esta liturgia nos
inspire a viver com simplicidade, generosidade e esperança, lembrando que “onde
estiver o teu tesouro, aí estará também o teu coração” (Lc 12,34). Que
possamos, cada dia, ser “ricos para com Deus” — não por quanto temos, mas por
quanto amamos.
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