Tempestade e Esperança
Vivemos dias em
que a terra geme. Os sinais são evidentes: florestas ardem, mares avançam,
secas prolongadas se alternam com chuvas torrenciais, guerras são travadas. Até
os filhos da Shoah produzem o seu próprio holókauston. A
natureza, ferida pela ganância e pelo descuido, devolve à humanidade a
violência com que foi tratada. A cada noticiário, cresce o sentimento de
urgência e surge o desafio de como garantir um futuro quando o presente já
parece em perigo?
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Dom Lindomar Rocha Mota |
Mas não é apenas
a casa comum que balança. As estruturas que sustentavam nossa vida política e
social mostram rachaduras profundas. Democracias conquistadas com sacrifícios
tremem sob a pressão da autocracia, da desinformação e do populismo que mascara
a tirania com discursos sedutores. A verdade é soterrada sob montanhas de
interesses. E, enquanto isso, o povo, sedento de segurança, agarra-se em muitas
promessas vazias.
E não são apenas
governos que vacilam! Instituições que antes serviam como guardiãs da
dignidade, da justiça e da ciência cedem à fragilidade humana, corrompendo-se
sob a pressão do poder, do lucro e da vaidade de indivíduos que buscam, acima
de tudo, a autopreservação. Aquilo que deveria ser pilar se torna areia, e a
confiança social escoa como água por fissuras visíveis. No vazio, erguem-se
ídolos frágeis, arremedos de religião e civilização. Desorientada, a sociedade
parece caminhar à beira do precipício.
É nesse cenário
que surge uma pergunta inevitável: onde repousa a esperança, quando os
mares sobem como muros líquidos, reclamando cidades, e os céus, que deviam ser
promessa, cobrem-se de fumaça e temor? Urge correr, mas não há para onde: a
própria terra grita contra seus filhos, e nós, surdos de ambição, não ouvimos
senão o ruído metálico das moedas de um futuro que não pode ser comprado. A
terra parece arder sob nossos pés e os pilares da civilização vacilam, resta
alguma âncora para a alma humana?
A resposta não
nasce dos centros de poder nem das tecnologias mais sofisticadas. Ela brota de
um lugar inesperado erguido no meio da dor. No coração da história, quando tudo
parecia perdido, um Homem sem coroa de ouro abriu os braços entre o céu e a
terra e exclamou: “Vinde a mim, todos vós que estais cansados e
sobrecarregados, e eu vos darei descanso”.
O Evangelho de
Cristo não é mágica nem alienação; é anúncio de que existe uma realidade maior
do que a crise. Não elimina as tempestades, mas oferece uma rocha firme. Revela
um Reino que não depende de votos nem pode ser derrubado por golpes, um Reino
onde os pobres são chamados bem-aventurados, onde a misericórdia é lei e o amor
é governo.
Enquanto o mundo
corre, exausto, atrás de suas soluções, o Evangelho sussurra uma promessa
infinda: “Eu estarei convosco todos os dias, até o fim.” Só quem
escuta essa voz descobre que há uma esperança que nenhuma tragédia consegue
sufocar.
Entre as urgências climáticas, as quedas democráticas e os ventos da tirania, há um sopro de vida que não se apaga. Ele vem do Cristo que venceu a morte e permanece conosco. É nele que, mesmo em meio às ruínas, floresce a certeza de que o amor é mais forte que o caos, e a eternidade é maior que qualquer crise.
Dom Lindomar Rocha Mota - Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
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